• Nenhum resultado encontrado

como um verdadeiro profeta do Antigo Testamento, Emerson segue dizendo: “Os livros são a melhor coisa que existe, bem usados; impropriamente, entre os piores”

No documento MESTRADO EM FILOSOFIA SÃO PAULO 2008 (páginas 73-77)

Verso 51 He creepeth and peepeth, Ele move-se furtivamente e espreita,

E, como um verdadeiro profeta do Antigo Testamento, Emerson segue dizendo: “Os livros são a melhor coisa que existe, bem usados; impropriamente, entre os piores”

(Ibid, 49) pois “os livros são para as horas de ócio do intelectual. Quando ele é capaz de ler Deus [recordemos que Emerson é um panteísta e que, portanto, Deus, para ele, é a Natureza] diretamente, o momento é por demais precioso para ser perdido com os transcritos das leituras de outras pessoas” (nossos grifos).175

Em suma, “[O] intelectual deve ser livre – livre e corajoso” (Ibid, 57; nosso grifo). Emerson, no mesmo The American Scholar (1837; “O Intelectual Norte- Americano”) dirá: “Ciência nada mais é do que descobrir analogias” [acrescentaríamos, “entre a Natureza e as Leis da Mente”].176 No ensaio tardio, Worship (“Adoração”), que faz parte do livro de ensaios The Conduct of Life (1860; “A Conduta da Vida”), Emerson dirá “Se o seu olho está no eterno, seu intelecto crescerá,177 e as suas opiniões e ações terão

174 SWRWE. The American Scholar, 46; nossos grifos. 175 SWRWE. The American Scholar, 50.

176 Citado em Stanley Cavell. Emerson’s Transcendental Études. Capítulo 1. Pensando em Emerson, p. 17. 177 “Os símbolos crescem”, dirá Peirce.

uma beleza com as quais nenhum aprendizado ou vantagem combinada de outras pessoas poderá rivalizar” (RWE.org; nosso grifo).

No ensaio The Transcendentalist (1843; “O Transcendentalista”) ele dirá que “para que tudo saia certo” basta “que a alma seja ereta” (‘upright’) (“upright” é mais do que “ereto”, pois subentende “ter caráter!” (nosso grifo).178 Emerson é claro: “O caráter é mais elevado do que o intelecto. Pensar é a função. Viver é o funcionário” (“Living is the functionary”).

“O rio volta à sua fonte. Uma grande alma será forte tão forte no viver quanto no pensar. Falta-lhe um órgão ou meio para comunicar estas verdades? Ele ainda pode recorrer a esta força Elemental que é viver. Isto é um ato total. Pensar é um ato parcial” (SWRWE. The American Scholar, 54; nosso grifo). Neste sentido – com a “Escola do Senso Comum” escocesa como fundamento – podemos dizer que Emerson e Peirce compartilham de um mesmo parentesco, no que tange ao Pragmatismo. Não esqueçamos que Peirce denominou alhures sua forma de pragmatismo de Critical Common Sense (“Senso Comum Crítico”), que é sinônimo de

Pragmaticismo (“ação + reflexão”; ver Pragmatism (1907; “Pragmatismo” em EP 2, p.

433). Há, portanto, no Pragmatismo peirceano uma ênfase no primado da “ação”. Até porque, segundo ele, “só podemos conhecer qualquer fenômeno analisando como ele age no decurso do tempo”. A Semiótica (sua Lógica) tem o papel de ajudar o indivíduo (seja lá qual for) a refletir sobre sua conduta (“feixe de hábitos”; Ética) que, tem como horizonte a

Admirabilidade (Estética). “Ora, o autocontrole, em última instância, depende de uma comparação das nossas ações com um ideal admirável por si mesmo, independente de qualquer outra coisa que não seja ele mesmo. Nisso se constitui a razoabilidade concreta”.179

No mais extraordinário de todos os ensaios de Emerson – que, infelizmente, não aparece nas antologias, mas que fomos buscar na RWE.org -, quer seja, Literary Ethics (24 de julho de 1838; “Ética Literária), Emerson diz:

“Nada é mais simples do que a grandeza; de fato, ser simples é ser grande. A visão do gênio vem ao se renunciar à mui oficiosa atividade do entendimento, e deixando vir o mais amplo privilégio do sentimento espontâneo. Disto deve tudo o que é vivo e genial no pensamento proceder. As pessoas moem e moem no moinho do truísmo e nada sai daí a não ser o que entrou. Mas o momento

178 SWRWE, The Transcendentalist, 90. 179 Ver Lúcia Santaella. Estética, p. 201.

que abandonam a tradição por um pensamento espontâneo, então, poesia, esperança, virtude, aprendizado e ‘causos’, tudo isso vem em seu socorro” (RWE.org; nossos grifos).

Afinal, como diz Emerson, “o que importa, é a qualidade do momento e não o número de dias, eventos ou atores” (Ibid, 99; nossos grifos).180

Em sua resposta ao enigma nos ensaios de 1841 -, mais especificamente o ensaio

History (1841; História), RWE vai dizer que “há, na superfície, uma infinita variedade

de coisas; no centro há a simplicidade da causa” (SWRWE, History). “Para Emerson e Thoreau” -, diz Cavell - e, acrescentaríamos Pascal [1623-64; Pensamento 139] e Mestre Eckhart (c.1260-c.1328; ver Sermões, p. 233)] -, “você deve aprender a ficar sentado quieto em casa ou em algum ponto atraente nos bosques, como se fosse casar com o mundo, antes de, se algum dia, for pegar o fardo dos outros” (Stanley Cavell. Emerson’s

Transcendental Études. Being Odd, Getting Even (“Sendo Estrangeiro, Tirando a Forra”), p. 108.

Uma ds coisas que quem fizer isso vai ver, diz Emerson em Nature (1836; “A Natureza”), é que “[A] charmosa paisagem que eu vi esta manhã é indubitavelmente composta de algumas vinte ou trinta fazendas. Os Miller possuem este campo, os Locke aquele, e os Manning, as terras além. Mas nenhum deles possui a paisagem” (SWRWE, Nature, p. 5; nossos grifos). Por quê? Porque

“Há uma propriedade no horizonte que nenhuma pessoa possui exceto aquele que é capaz de integrar todas as partes, quer seja, o poeta. Esta é a melhor parte da fazenda destas pessoas e, no entanto, seus títulos de propriedade não lhe conferem esse direito” (Ibid, 5 e 6; nossos grifos).

Novamente, temos aqui um símbolo indicial: a Qualidade – e se pensarmos com Peirce, a Primeiridade, com sua Liberdade, Variedade, Frescor, Novidade -; em uma palavra, Deus, está sempre Agora’Aqui – por isso ninguém deveria se espantar com a primeira, a mais chocante, e a última frase de RWE nesse ensaio: (1ª) “Há uma mente comum a todos os homens” (...) “Sobre os trabalhos desta mente, a história é registro” (SWRWE, History, 123); (2ª) “Eu acredito na Eternidade” (...) “Toda a história torna- se subjetiva; em outras palavras não há propriamente história, apenas biografia” (SWRWE, History, 127; “uma única biografia”, devemos esclarecer, “a do Absoluto”) e,

180

Aqui, como em quase toda a sua obra, Emerson está sempre mais centrado na Primeira Categoria, na

(3ª) “O idiota, o índio, a criança e o caipira estão mais perto da luz pela qual a natureza deve ser lida, do que o dissecador da antigüidade” (SWRWE, History, 144; nossos grifos).

Vale a pena inserir aqui um notável dado biográfico: Richardson Jr. diz que, em 1825, quando RWE estava cheio de dúvidas devido ao ceticismo humeano: “Emerson tinha se dado conta já há algum tempo de que qualquer teísmo intelectualmente defensável teria que se defrontar com as objeções céticas de Hume” (...) “especialmente a negação deste sobre a ligação entre causa e efeito, uma negação que abriu caminho para o ceticismo brutal de Holbach” (Richardson Jr., 64). Vai se recuperar na fazenda de seu tio Ladd em Newton; trabalha no campo. E é lá que encontra um homem da terra de nome Tarbox que lhe diz: “as pessoas estão sempre rezando e todas as preces são atendidas”. [Já está lá em Lucas, 18.1]. Emerson percebe como ao scholar fica vedada essa crença; mas, a verdade é que “Emerson sempre o colocou Tarbox no topo da lista daqueles que o beneficiaram na vida” (Richardson Jr., 64). Curiosamente, Emerson estava quase cego na época – devido ao ceticismo humeano? – e Tarbox significa, em inglês, “caixa de alcatrão”; difícil não pensar na “Noite Escura da Alma” de um São João da Cruz (1542- 91) ou na cegueira de Saulo de Tarso (c. 5-67 EC) a caminho de Damasco (Atos dos Apóstolos, 22: 6-11)]. Mas a salutar ciência vem em nosso socorro: “O problema ocular que atingiu Emerson no início de 1825 foi quase que certamente uveitis, uma inflamação reumática do olho” (...) “cuja causa deve ter sido a tuberculose, que era pandemia à época. Metade dos adultos de Boston teve-a; um terço de todas as mortes foram devidas a ela” (Richardson Jr., 63).

De qualquer maneira, para Richardson Jr., “a vida e a obra de Emerson - de fato, o próprio Transcendentalismo – constituem uma refutação de Hume” (Richardson Jr., 31; nosso grifo), como já vimos anteriormente. No ensaio tardio, Worship (“Adoração”), que faz parte do livro de ensaios The Conduct of Life (1860; “A Conduta da Vida”), Emerson diz

“Pois tais pessoas [que possuem um grau de sentimento moral mais elevado do que o nosso] estão mais perto do segredo de Deus do que os outros; estão banhadas em águas mais doces; elas ouvem notícias, elas têm visões, ao passo que as outras não vêem nada. Nós acreditamos que a santidade confere certo ‘insight’, porque, não pela força particular, mas pela pública, nós podemos compartilhar e saber a natureza das coisas” (RWE. org; nossos grifos).

Podemos dizer, com Cavell, que Emerson possui uma “Ética de Auto- Melhoramento” (Russell B. Goodman, artigo para a Enciclopédia Stanford de Filosofia), mas esta ética (conduta), como o Pragmatismo peirceano, está vinculada (1) à reflexão, que para Emerson significa uma “Metafísica do Processo” (proposta quase que totalmente em seu ensaio “Círculos”; 1841; como veremos adiante) e (2) à sua “Epistemologia de Estados de Espírito”, exposta, basicamente, em seu ensaio “Experiência” (1844; como veremos adiante).

Volvamos ao poema...

VIII

No documento MESTRADO EM FILOSOFIA SÃO PAULO 2008 (páginas 73-77)

Outline

Documentos relacionados