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Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social

Cleide Rodrigues Picolo

AS MANIFESTAÇÕES PÚBLICAS PELOS GRUPOS PRÓ E CONTRA O IMPEACHMENT DE DILMA ROUSSEFF NAS REDES SOCIAIS ON-LINE

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FACULDADE DE COMUNICAÇÃO

Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social

Cleide Rodrigues Picolo

AS MANIFESTAÇÕES PÚBLICAS PELOS GRUPOS PRÓ E CONTRA O IMPEACHMENT DE DILMA ROUSSEFF NAS REDES SOCIAIS ON-LINE

Dissertação apresentada em cumprimento parcial às exigências do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social, da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), para obtenção do grau de Mestre.

Orientadora: Professora Dra. Cicilia Peruzzo (agosto de 2016 a dezembro de 2017) e Professora Dra. Camila Escudero (janeiro a agosto de 2018).

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FICHA CATALOGRÁFICA

P587m Picolo, Cleide Rodrigues

As manifestações públicas pelos grupos pró e contra o impeachment de Dilma Rousseff nas redes sociais on-line / Cleide Rodrigues Picolo. 2018.

155 p.

Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) --Escola de Comunicação, Educação e Humanidades da Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2018.

Orientação de: Cicilia Maria Krohling Peruzzo. Coorientação de: Camila Escudero.

1. Manifestações públicas - Brasil 2. Redes sociais on-line 3. Imprensa brasileira 4. Imprensa e política - Brasil 5. Impeachment - Brasil 6. Rousseff, Dilma Vana, 1947 I. Título.

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Picolo, foi defendida e aprovada com louvor (summa cum laude) em 13 de setembro de 2018, perante banca examinadora composta por Camila Escudero (Presidente/UMESP), Pablo Ortellado (Titular/USP) e Roberto Joaquim de Oliveira (Titular/UMESP):

Profa. Dra. Camila Escudero

Orientadora e Presidente da Banca Examinadora

Prof. Dr. Luiz Farias

Coordenadora do Programa de Pós-graduação

Programa: Pós-graduação em Comunicação Social Área de concentração: Processos Comunicacionais

Linha de Pesquisa: Comunicação comunitária, territórios de cidadania e desenvolvimento social

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Dedico esta dissertação à minha mãe, em memória, Jocelina da Silva Rodrigues,

por sempre acreditar nos meus sonhos e projetos, ao meu marido, Marcelo Lima Picolo, pela compreensão e apoio às minhas escolhas, e ao meu filho, Gabriel Rodrigues Picolo, por entender, ao seu modo, minha ausência e

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A realização deste trabalho só foi possível graças a uma série de pessoas que participaram, estiverem presentes e/ou proporcionaram condições para o seu desenvolvimento. Farei aqui menção a apenas parte deste grupo imenso que me acompanhou nesta jornada, com pedido de desculpas e compreensão àqueles que eu deixarei de mencionar pelo restrito e reservado espaço nesta nota de agradecimentos. Primeiramente agradeço à generosidade da professora Marli dos Santos, que já havia me orientado na pós-graduação em Jornalismo Institucional na PUC-SP e a quem recorri para iniciar o mestrado na UMESP. Ao ler meu projeto de pesquisa, abriu mão de me guiar neste trabalho por entender que outra colega poderia contribuir ainda mais para sua concretização. Assim, cheguei até a professora Cicilia Peruzzo que não apenas me orientou durante a maior parte deste percurso como também fez com que eu amadurecesse minhas ideias. Tão generosa quanto a querida Marli, ela compartilhou seu conhecimento e sua experiência que muito nortearam os rumos desta pesquisa. Uma reviravolta na gestão acadêmica da universidade, que não é o caso relatar, fez com que eu ganhasse uma nova contribuição para finalização do projeto. Assim, agradeço à professora Camila Escudero por me auxiliar na realização deste sonho, pela parceria e confiança. Meus agradecimentos à minha irmã Meire da Silva Rodrigues por me dar refúgio em sua casa

por horas e dias para redigir essa dissertação e pelo carinho durante todo esse processo. Por fim, sou grata à UMESP e ao Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) pela confiança e

pelo investimento financeiro que permitiram que eu concluísse esta pesquisa de mestrado, dando condições de compartilhar todas essas descobertas com outros pesquisadores, e claro, com futuros profissionais de comunicação que hei de encontrar nas instituições de

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QUADRO 1 – Amostragem por semana construída nos veículos de imprensa: Folha de S. Paulo e O Globo ... 19 QUADRO 2 – Mapa dos grupos nos ambientes on-line (Sites e redes sociais) ... 73 QUADRO 3 – Análise dos convites virtuais por categoria (Descrição e tratamento do material) ... 99 QUADRO 4 – Raio-X dos convites do Facebook (Uma síntese das ações dos grupos pró e contra o impeachment) ... 100 QUADRO 5 – Análise dos convites por categoria – MBL (Descrição e tratamento do material) ... 104 QUADRO 6 – Análise dos convites por categoria – Vem pra Rua (Descrição e tratamento do material) ... 107 QUADRO 7 – Análise dos convites por categoria – Povo Sem Medo (Descrição e tratamento do material) ... ...109 QUADRO 8 – Análise dos convites por categoria – Frente Brasil Popular (Descrição e tratamento do material) ... 113 QUADRO 9 – Reportagens da Folha de S.Paulo e de O Globo (Amostragem – Semana Construída) ... 129 QUADRO 10 – Análise exploratória de reportagens do dia 17 de março de 2016 na grande mídia e imprensa alternativa ... 139

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INTRODUÇÃO...12

CAPÍTULO I – DOS CONCEITOS CLÁSSICOS SOBRE COMUNIDADE AO ATIVISMO NAS REDES ...22

1.1. Comunidade: abordagens do conceito clássico às manifestações atuais ... 22

1.2. Comunidades nas mídias e redes sociais e suas conexões... 30

1.2.1. Novas formas de sociabilidade e comunidades virtuais ... 31

1.2.2. Os atores e as conexões: os elementos das redes sociais na internet ... 34

1.2.3. Transformação da sociabilidade e individualismo em rede ... 37

1.2.4. Na era da internet, emerge um novo bloco na esfera pública ... 41

1.3. Ativismo nas redes sociais on-line: conceitos e experiências mundiais ... 44

1.3.1. Revoluções “glocais”: breves aspectos de ativismo digital – Primavera Árabe, Occupy Wall Street e passagens pela América Latina ... 49

CAPÍTULO II – MOVIMENTOS SOCIAIS E POPULARES E OS GRUPOS DAS REDES NO IMPEACHMENT DE DILMA ...55

2.1. Movimentos sociais e populares ... 55

2.1.1. Movimentos sociais e populares na América Latina ... 60

2.1.2. Uma passagem sobre movimentos sociais e populares no Brasil: dos anos de 1970 à contemporaneidade ... 66

2.2. Participação e comunicação popular na era da internet ... 68

2.3. Os grupos nas redes sociais on-line no impeachment de Dilma Rousseff ... 72

2.3.1. MBL: protestos pelo impeachment, captação de recursos e escalada política ... 73

2.3.2. Vem pra Rua: visibilidade no impeachment e abertura de caminho na política 75 2.3.3. Frente Brasil Popular: contra o impeachment, agremiação de movimentos sociais e defesa política e ideológica de esquerda ... 78

2.3.4. Frente Povo Sem Medo: contra o impeachment, nasce “sem” ligação com legenda política, e se transforma em frente de esquerda alternativa ao PT ... 80

2.3.5. Considerações sobre os atores do impeachment nas redes sociais on-line ... 83

CAPÍTULO III – GOVERNO DILMA E AS MANIFESTAÇÕES: UMA ANÁLISE DAS AÇÕES DOS GRUPOS NO FACEBOOK .. ... 85

3.1. Governo Dilma: da eleição à crise política e econômica... 85

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line ... 97

3.2.1. Um panorama sobre os convites “virtuais” dos grupos do impeachment ... 99

3.2.2. Particularidades das publicações dos principais eventos dos grupos na rede .. 103

3.2.2.1 Dilma Rousseff na mira do MBL e Vem pra Rua ... 104

3.2.2.2 Frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular: Michel Temer e o golpe .... 109

3.2.3. Considerações gerais sobre a participação dos grupos no Facebook ... 118

CAPÍTULO IV – MANIFESTAÇÕES PÚBLICAS: REPERCUSSÃO NA IMPRENSA A PARTIR DAS AÇÕES ARTICULADAS NAS REDES SOCIAIS...120

4.1. Abordagens sobre a ação jornalística, a ética no jornalismo e a noticiabilidade de um acontecimento ... 120

4.1.1. Questões sobre ética e manipulação da realidade no jornalismo ... 122

4.1.2. O acontecimento que vira notícia ... 124

4.1.3. Passagem pelo conceito de imprensa alternativa ... 125

4.1.4. A cartilha seguida pelos veículos de imprensa da pesquisa ... 127

4.2. As manifestações públicas e presença dos grupos das redes sociais on-line no noticiário de O Globo e Folha de S.Paulo ... 129

4.2.1. Os grupos “virtuais” e a cobertura no jornal O Globo ... 130

4.2.2. Protestos e manifestações do impeachment sob o prisma da Folha de S.Paulo ... 134

4.2.3. Os vestígios das ações de comunicação dos grupos “virtuais” na grande mídia ... 136

4.3. Grampo telefônico da conversa de Dilma e Lula: o estopim da crise política sob os “olhares” da grande mídia e imprensa alternativa ... 138

4.3.1. Considerações sobre a prática jornalística na contemporaneidade ... 143

CONSIDERAÇÕES FINAIS...145

REFERÊNCIAS...151

ANEXOS – Posts dos convites virtuais dos grupos do Facebook...156

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a partir de grupos organizados e articulados na rede social Facebook. O objetivo foi observar a influência e a relação das tecnologias digitais como um instrumento facilitador para promover a mobilização e o engajamento social, e provocar mudança no contexto histórico e político da sociedade brasileira. As teorias sobre cibercultura, comunidade, movimentos sociais e participação popular foram a base para refletirmos sobre a relevância da internet neste processo. Fizemos análises de conteúdo e exploratória de publicações de fanpages com foco nas estratégias de comunicação e interação dos grupos com seguidores, e de reportagens para verificar a aderência dessas estratégias na imprensa. Notamos que esses grupos tiveram relevante participação, especialmente na agilidade e ampliação da informação do processo de transformação social, como outras alas da esfera pública; e o impeachment foi um processo gradativo, que sofreu influência de diversos atores e fatores do contexto social e institucional. Palavras-chave: Manifestações públicas; Redes sociais virtuais; Ativismo; Imprensa brasileira; Impeachment de Dilma Rousseff.

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Rousseff a partir de grupos organizados y articulados en la red social Facebook. El objetivo fue observar la influencia y la relación de las tecnologías digitales como un instrumento facilitador para promover la movilización y el compromiso social, y provocar cambio en el contexto histórico y político de la sociedad brasileña. Las teorías sobre cibercultura, comunidad, movimientos sociales y participación popular fueron la base para reflexionar sobre la relevancia de Internet en este proceso. Hemos hecho análisis de contenido y exploratorio de publicaciones de fanpages con foco en las estrategias de comunicación e interacción de los grupos con seguidores, y de reportajes para verificar la adherencia de esas estrategias en la prensa. Notamos que estos grupos tuvieron relevante participación, especialmente en la agilidad y ampliación de la información del proceso de transformación social, como otras alas de la esfera pública; y el impeachment fue un proceso gradual, que sufrió influencia de diversos actores y factores del contexto social e institucional.

Palabras clave: Manifestaciones públicas; Redes sociales virtuales; activismo; Prensa brasileña; Impeachment de Dilma Rousseff.

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Rousseff from organized and articulated groups in the social network Facebook. The objective was to observe the influence and the relationship of digital technologies as a facilitating tool to promote social mobilization and engagement, and to bring about change in the historical and political context of Brazilian society. Theories about cyberculture, community, social movements and popular participation were the basis for reflecting on the relevance of the internet in this process. We did content and exploratory analyzes of fanpage publications focusing on the strategies of communication and interaction of groups with followers, and from reports to verify the adherence of these strategies in the press. We note that these groups had relevant participation, especially in the agility and expansion of the information of the process of social transformation, like other wings of the public sphere; and impeachment was a gradual process that was influenced by several actors and factors in the social and institutional context.

Keywords: Public manifestations; Virtual social networks; Activism; Brazilian Press; Impeachment of Dilma Rousseff.

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INTRODUÇÃO

Temos notado que a sociedade contemporânea está cada vez mais conectada por meio da internet e de equipamentos móveis, inserida num processo sem volta. Os investimentos em tecnologias de informação e comunicação não param, contribuindo para a expansão da rede. Consequentemente, este contexto passa a influenciar e transformar a vida das pessoas. Os brasileiros fazem parte deste cenário global e utilizam as ferramentas tecnológicas disponíveis em suas práticas cotidianas, com tendência para ampliação de seu uso, assim como em outros locais do mundo.

O Relatório da União Internacional de Telecomunicações (UIT), das Organizações das Nações Unidas (ONU), divulgado em agosto de 2017, mostrava que 48% da população mundial usava internet. A previsão era que, ao fim de 2017, 4,3 bilhões de pessoas no mundo teriam acesso à internet móvel (MAIS..., 2017, 2 ago.2017). Essa representatividade de acesso à internet também se verifica no Brasil. O país é o quarto em número de usuários de internet, com 120 milhões de pessoas conectadas, ou seja, 59% dos brasileiros têm acesso à rede.

Por meio de aparelhos móveis que cabem em nossas mãos, podemos ter acesso a informações diversas, de uma simples receita de bolo a noticiários e fatos históricos. A tecnologia nos permite, na atualidade, enviar e receber mensagens de textos, fotos e vídeos simultaneamente ao acontecimento. Neste contexto, as redes de mídias sociais digitais possibilitam velozmente a disseminação de conteúdos diversos e a ampliação da conexão entre cidadãos, derrubando fronteiras e migrando do campo virtual para o real, ou seja, as ferramentas tecnológicas têm se tornado um potencial instrumento facilitador de comunicação, mobilização e engajamento social, criando novas formas de sociabilidade.

Temos observado o quanto essa sociedade em rede tem se apropriado das ferramentas disponíveis para se relacionar e interagir entre si para promover transformações sociais, políticas e culturais. Segundo Castells (1999, p.565), as “redes constituem a nova morfologia social de nossas sociedades e a difusão da lógica de redes modifica de forma substancial a operação e os resultados dos processos produtivos e de experiência, poder e cultura”.

Com relação à onda de protestos e manifestações ancoradas na internet ocorridas no mundo, inclusive no Brasil, Sorj (2014) nos traz uma reflexão pertinente daquilo que ele denomina de fenômenos sociais “glocais”, ou seja, uma fusão de realidades locais e globais. O autor diz que esses movimentos não são novos e que “no mundo atual, de comunicação instantânea, é de esperar que os fenômenos locais tenham influência quase imediata em outras

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latitudes” (SORJ, 2014, p.87). Ao analisar tais contextos, ele observa que é fundamental considerar questões sociais e institucionais:

Sem dúvida, as características específicas de cada tecnologia de comunicação influenciam os processos sociais, e os novos meios de comunicação disseminam a informação em tempo real e de forma viral. Porém, os motivos que levam as pessoas às ruas para exprimir insatisfação e anseios de mudança devem ser procurados nos contextos sociais e institucionais, não nas tecnologias. [...] os novos meios de comunicação têm sua importância potencializada pelo declínio das instituições que, anteriormente, sem necessidade de telefone celular ou da internet, eram capazes de levar milhares às ruas (SORJ, 2014, p.88-89).

Este estudo analisa as manifestações públicas pró e contra o impeachment de Dilma Rousseff a partir de grupos organizados e articulados na rede social on-line Facebook. O objetivo é observar a influência e a relação das tecnologias digitais como um instrumento facilitador para promover a mobilização e o engajamento social, e provocar mudança no contexto histórico e político da sociedade brasileira. As teorias sobre cibercultura, comunidade, movimentos sociais e participação popular, além de observações e análises da atualidade foram a base para refletirmos sobre a relevância da internet neste processo. Fizemos análises de conteúdo e exploratória a partir estudo empírico de publicações das fanpages de quatro grupos que articularam manifestações públicas por meio de espaços on-line, com foco nas estratégias de comunicação e interação com os seguidores, e de reportagens veiculadas na imprensa para verificar a aderência dessas estratégias de comunicação na mídia. Por meio de revisão bibliográfica, contextualizamos ainda, brevemente, o cenário socioeconômico e político do Brasil para compreendermos as grandes manifestações públicas em tempos das redes sociais.

Com base neste contexto, consideramos relevante o estudo acerca de manifestações públicas no Brasil articuladas por meio das redes sociais digitais. Por ser um tema muito amplo, a proposta foi fazer um recorte e analisar as manifestações públicas pró e contra o de impeachment de Dilma Rousseff na internet a partir de manifestações de grupos organizados nas mídias e redes sociais virtuais. Para este trabalho, selecionamos quatro deles com forte representatividade na articulação das manifestações públicas e com considerável número de seguidores em suas fanpages e os dividimos igualmente em dois segmentos: Movimento Brasil Livre (MBL) e Vem pra Rua (a favor do impeachment); e Frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular (contra o impeachment).

O processo de impeachment de Dilma Rousseff, oficialmente autorizado no dia 12 de maio de 2016 por meio de votação no Senado e concluído em 31 de agosto do mesmo ano

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com a destituição da presidente do cargo, começou a ser desenhado muito antes. O pedido de impeachment foi aceito em 2 de dezembro de 2015 pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sob a acusação de crime de responsabilidade fiscal. Em 17 de abril de 2016, a Câmara aprovou o processo, com 367 votos a favor e 137 contra, que seguiu para o Senado. No dia 12 de maio do mesmo ano foi aprovada a abertura do processo, com 55 votos a favor e 22 contra. Dilma (PT) foi afastada do cargo por 180 dias, e assumiu o vice Michel Temer (PMDB) como presidente em exercício. No dia 31 de agosto de 2016, o Senado condenou Dilma por crime de responsabilidade no exercício do mandato, com votação de 61 a favor e 20 contra. Ela foi destituída do cargo. Assumiu o vice-presidente Michel Temer. O processo seguiu o rito da Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950.

Dilma Rousseff estava no cumprimento do segundo mandato como presidente da República e sua reeleição não foi fácil. Ela venceu as eleições no segundo turno, com 51,6% dos votos válidos, em 2014. Houve uma notória polarização no cenário político e disputa de poder interna em seu novo governo. A divisão das alas políticas no governo e no Congresso Nacional reverberou na sociedade brasileira.

A presidente teve significativa queda de popularidade no início de seu segundo governo. Segundo pesquisa realizada pelo Ibope com 2002 pessoas de 140 cidades em setembro de 2015, e divulgada pela Confederação Nacional da Indústria, o percentual da população que dizia confiar em Dilma recuou de 51% para 20%, de dezembro de 2014 a setembro de 2015. No mesmo período houve queda de 52% para 14% com relação aos que aprovavam sua maneira de governar (DILMA..., 2015, s.p). Seu governo também estava fragilizado pelo avanço das investigações da Operação Lava Jato da Polícia Federal. Somando a este cenário, o governo recebia críticas por conta do baixo crescimento econômico, medidas de ajuste fiscal, descaso de dinheiro público, entre outras questões que impactam o dia a dia da população. Além disso, o governo sofria pressão da grande mídia.

De março a dezembro de 2015, foram registrados ao menos nove atos e manifestações públicas a favor e contra o governo, com presença significativa de pessoas nas ruas (MAPA das manifestações no Brasil, Portal G1, s.d., s.p.). Novos protestos ocorreram 2016, tendo seu ápice em 13 de março de 2016, quando o pedido de impeachment passa a ganhar força no país. A partir de então, diversos manifestos são articulados nos ambientes das redes sociais virtuais por grupos contra e a favor do impeachment da presidente. Além disso, as manifestações entraram na pauta da grande mídia e imprensa alternativa.

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Dessa forma, levantamos a seguinte pergunta de pesquisa: como se deu a articulação e ações de grupos pró e contra o impeachment de Dilma Rousseff por meio das redes sociais on-line nas manifestações públicas de 2016 no Brasil e a aderência destas atividades na grande mídia e imprensa alternativa?

Nossa hipótese é de que a atuação dos atores nos ambientes virtuais contribuiu para dar visibilidade a suas ações no mundo off-line. Concebemos as ferramentas tecnológicas como potenciais instrumentos de articulação, mobilização, empoderamento e engajamento social para proposição de transformações sociais, desde que os cidadãos delas se apropriem. No contexto do impeachment, a análise acerca dos motivos que levaram ao afastamento de Dilma do Palácio do Planalto perpassa por diversos outros fatores além das articulações de atores nas redes sociais, entre os quais interesses econômicos, políticos, políticos partidários, posicionamento dos meios de comunicação, em níveis local e global.

Este estudo teve como objetivo geral analisar as manifestações públicas pró e contra o impeachment de Dilma Rousseff a partir de grupos organizados e articulados nas redes sociais on-line e a aderência dessas ações nos ambientes virtuais nos meios de comunicação – grande imprensa e imprensa alternativa. A partir daí, traçamos quatro objetivos específicos para o desenvolvimento desta pesquisa: 1) Mapear e analisar os principais grupos pró e contra o impeachment de Dilma que se articularam manifestações públicas por meio de redes sociais digitais; 2) Analisar a relação das tecnologias digitais como um instrumento facilitador para promover a mobilização e o engajamento social, e provocar mudança no contexto histórico e político da sociedade; 3) Observar as estratégias de comunicação dos grupos Movimento Brasil Livre (MBL) e Vem pra Rua (a favor do impeachment); e Frente Brasil Popular e Povo Sem Medo (contra o impeachment) nos ambientes das redes e mídias sociais on-line, em particular, no Facebook; e 4) Observar a aderência das atividades organizadas e articuladas pelos grupos estudados na grande imprensa – Folha de S.Paulo e O Globo; e imprensa alternativa – Caros Amigos, Agência de Notícias Carta Maior e Jornalistas Livres.

Este trabalho se justifica por uma série de questões. Na atualidade, início deste século 21, a presença das tecnologias de informação e comunicação (TIC) está no cotidiano de uma parcela significativa da sociedade mundial e sentimos a força dessa representatividade na vida da população brasileira. As pessoas não apenas estão conectadas por equipamentos móveis, como também fazem uso deles para externar aquilo que pensam. O uso das mídias sociais digitais dispensa, por vezes, a mediação de canais tradicionais de comunicação, fazendo dos cidadãos protagonistas de suas próprias histórias. Além disso, a internet e as mídias e redes

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sociais disponibilizam ferramentas que facilitam o engajamento dos usuários por possuírem custos reduzidos para a participação, compartilhamento e circulação de conteúdos. O Facebook é um instrumento que converge para a linha da mobilização social.

O processo de impeachment de Dilma Rousseff por si só trata-se de um tema relevante no campo da pesquisa. Primeiro pelo fato dela ser a segunda chefe de Estado no Brasil a enfrentar um processo dessa ordem desde a redemocratização, 24 anos após Fernando Collor. Como já mencionado, o governo da presidente também estava fragilizado pelo avanço das investigações da Operação Lava Jato e sofria críticas da sociedade por conta do baixo crescimento econômico, medidas de ajuste fiscal, descaso de dinheiro público, entre outras questões que impactam o dia a dia da população.

Notamos quão utilizado foram os recursos tecnológicos e as mídias e redes sociais on-line por grupos que atuaram pró e contra o processo de impeachment de Dilma. Daí, o interesse da pesquisa pela influência e a relação das tecnologias digitais nas grandes manifestações públicas nesse período de transformação social que marcou a história e a política do Brasil. Além disso, nos interessou saber como classificar tais grupos. Seriam estes movimentos sociais, movimentos populares, comunidades virtuais ou, tão somente, um grupo de pessoas que se uniu por uma causa coletiva num momento único da história do país? A pesquisa se justifica ainda porque buscamos compreender a participação e a presença dos brasileiros nessas grandes manifestações públicas em tempos de redes sociais digitais, considerando que “o espaço público virtual funciona efetivamente mais como foro catártico do que como espaço deliberativo. [...] A ação política, aquela com consequências decisivas sobre os rumos da história, continua sendo presencial e não virtual” (SORJ, 2014, p. 90).

Para o desenvolvimento desta dissertação, na área da Comunicação Social, fizemos pesquisa bibliográfica sobre as teorias de cibercultura, comunidade – das clássicas às contemporâneas –, movimentos sociais, movimentos populares e participação popular. Também fizemos pesquisa em sites das organizações estudadas para contextualizar como estes grupos estão inseridos no cenário histórico, social e institucional do país daquele momento a partir de suas origens de formação. Em seguida, realizamos estudo empírico das publicações dos grupos Movimento Brasil Livre (MBL), Vem pra Rua; e Frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular, no Facebook, de março a agosto de 2016, período que compreendeu da primeira grande manifestação pública daquele ano pelo pedido de impeachment de Dilma até a conclusão do processo de afastamento da então presidente da República.

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Para verificar as estratégias de comunicação voltadas ao engajamento social e à participação popular dos grupos nas redes sociais, realizamos análise de conteúdo e estudo exploratório de publicações no Facebook e notícias veiculadas na imprensa. A proposta da pesquisa foi apresentar “concepções teóricas da abordagem, articulando-se com a teoria, com a realidade empírica e com os pensamentos sobre a realidade” (MINAYO, 2009, p.15). Entendemos que tais elementos deram subsídios para compreendermos as grandes manifestações públicas em tempos de redes sociais digitais.

Com relação à pesquisa bibliográfica, partimos do princípio de que são de suma importância materiais que versem sobre mídias e redes sociais, manifestações públicas e participação popular na contemporaneidade como livros, artigos, monografias e outras publicações. Esse conteúdo deu suporte à pesquisa, uma vez que “todo projeto deve conter os pressupostos teóricos com os quais as interpretações irão de confrontar” (SANTAELLA, 2006, p.184). Concebemos ainda que uma “pesquisa nunca é uma atividade solitária, (...) você segue os passos de outras pessoas, beneficiando-se de seu trabalho, seus princípios e suas práticas” (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS, 2008, p.94).

Com base neste pressuposto, seguimos “as trilhas bibliográficas” de pesquisadores como Tönnies (1947), Buber (1987), Bauman (2003); Maffesoli (2014); Castells (1999; 2003; 2013); Santaella (2013), Recuero (2011), Rüdiger (2011), Cupani (2011), Habermas (2014), Martuccelli (2015), Sorj (2014, 2015, 2016), Peruzzo (1998; 2009a, 2009b; 2013; 2014); Gohn (2006, 2010); Martuccelli (2015); Alvarez, Dagnino e Escobar (2000); Somma (2015), Gomes (2005), Singer (2015), Bucci (2003; 2016) e Villaverde (2016), Chaparro (1994), Abramo (2003), Sousa (2000), Silva (2010) e Fernandes (2013).

Para sabermos sobre a constituição, organização e formação dos grupos estudados, fizemos o estudo de documentos postados no Facebook e nos sites dessas organizações. As plataformas digitais pesquisadas foram:

A) MBL: http://mbl.org.br/; e https://www.facebook.com/mblivre/ B) Vem pra rua: http://www.vemprarua.net/; e

C) https://www.facebook.com/VemPraRuaBrasil.org

D) Frente Brasil Popular: http://www.frentebrasilpopular.org.br/; e https://www.facebook.com/FrenteBrasilPopular

E) Povo sem Medo: http://www.povosemmedo.org/; e https://www.facebook.com/povosemmedonacional/

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Realizamos a análise de conteúdo e estudo exploratório de convites virtuais de eventos e a interação dos seguidores nas fanpages dos grupos, além de reportagens veiculadas na imprensa sobre as manifestações públicas. O trabalho de análise de conteúdo seguiu os três “polos cronológicos” de organização do estudo: a pré-análise; a exploração do material; e o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação (BARDIN, 2011, p.121). Os dados empíricos foram codificados, ou seja, tratados, por meio de análise quantitativa e qualitativa.

A abordagem quantitativa e a qualitativa não têm o mesmo campo de acção. A primeira obtém dados descritivos através de um método estatístico. (...) é mais objectiva, mais fiel e mais exacta, visto que a observação é mais controlada. A segunda corresponde a um procedimento mais intuitivo, mas também mais maleável e mais adaptável a índices não previstos, ou à evolução das hipóteses (BARDIN, 2011, p.141).

A finalidade desta análise de conteúdo foi, através dos dados encontrados e tratados, identificar as estratégias de comunicação dos grupos estudados voltadas ao engajamento social e participação popular no Facebook no processo de impeachment da Dilma Rousseff. Os textos encontrados nos sites das organizações também foram analisados. Todo material foi confrontado com os conceitos teóricos a fim de refletirmos sobre as manifestações públicas no Brasil no referido processo político no contexto das novas tecnologias de comunicação.

No Facebook, o estudo consistiu na análise de conteúdo e pesquisa exploratória de convites virtuais de eventos e interações dos seguidores no período de 1º de março a 31 de agosto de 2016. Foram analisadas 89 publicações com base nas categorias:

1) Participação: Classificados os números de convidados, comparecimentos e interessados ao evento. Porém, a análise considerou apenas o item “compareceram”, que mensura a participação/presença no evento.

2) Ação/mensagem: Considerada a informação primária da publicação/convite (imagens de foto, desenho, logomarca e texto), ou seja, o post propriamente dito, sendo descartado o conteúdo do detalhe do evento.

3) Argumento: Analisadas todas as informações do convite (imagens de foto, desenho e texto) e conteúdo complementar presente no "detalhe" da publicação. 4) Protagonistas: Relacionados os atores sociais presentes no convite,

considerando-se a informação primária (post) e complementar (detalhe do enunciado).

5) Símbolos identitários: Considerados todos os elementos do convite (informação primária e detalhe do enunciado) como foto, desenho, logomarca e texto.

6) Repercussão: Analisada a publicação a partir da interação e do relacionamento do seguidor na rede social com os envolvidos (grupo e/ou outros seguidores). A partir

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de likes e comentários – elementos que indicam interação – realizou-se pesquisa exploratória sob os seguintes aspectos: a) interação nas fanpages do grupo com os seguidores e dos seguidores com o grupo e/ou entre eles; e b) posicionamento a partir da “conversa” no Facebook. Se o seguidor “concorda” ou “discorda” da publicação, e se teor do posicionamento expresso pelo seguidor foi “ofensivo” ou “não ofensivo”.

Também foram feitas duas pesquisas exploratórias nos meios jornalísticos. A primeira observou a influência dos eventos públicos articulados e organizados pelo Facebook dos grupos estudados na Folha de S.Paulo e O Globo, os dois maiores jornais em circulação média diária no país. A análise de 64 reportagens compreendeu o período de 1º de março a 28 de agosto, por meio da técnica de amostragem não probabilística intencional.

[É] impossível obter informação de todos os elementos que formam parte do grupo que se deseja estudar; seja porque o número de elementos é demasiado grande, os custos são muito elevados ou ainda porque o tempo pode atuar como agente de distorção (...). Essas e outras razões obrigam muitas vezes a trabalhar com uma só parte dos elementos que compõem um grupo (RICHARDSON, 2008, p. 157).

A seleção racional dos elementos a fazerem parte da amostra ocorreu a partir do sistema de “semana construída”, que consiste no sistema de amostragem em que as datas são estratificadas pelos dias da semana considerando uma variação “sistemática” e consecutiva dos dias (RIFFE, 1993). Desta forma, “os elementos que formam a amostra relacionam-se intencionalmente de acordo com certas características estabelecidas no plano e nas hipóteses formuladas pelo pesquisador” (RICHARDSON, 2008, 161). Com base nesses critérios, elaboramos quatro semanas construídas, a saber:

QUADRO 1 – Amostragem por semana construída nos veículos de

imprensa: Folha de S. Paulo e O Globo

Período de 1º Março a 28 de Agosto de 2016

Dias da semana Dias do mês

Segunda-feira 11 de abril 30 de maio 18 de julho

Terça-feira 1º de março 19 de abril 7 de junho 26 de julho Quarta-feira 9 de março 27 de abril 15 de junho 3 de agosto Quinta-feira 17 de março 5 de maio 23 de junho 11 de agosto Sexta-feira 25 de março 13 de maio 1º de julho 19 de agosto

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Sábado 2 de abril 21 de maio 9 de julho 27 de agosto

Domingo 3 de abril 22 de maio 10 de julho 28 de agosto

Realizamos ainda estudo exploratório de um “acontecimento” pontual do contexto do impeachment: a divulgação do grampo telefônico da conversa entre a presidente da República e Lula, após a nomeação dele à frente da Casa Civil, no dia 16 de março de 2016. Verificamos a cobertura na grande mídia – Folha de S.Paulo e O Globo – e imprensa alternativa – Caros Amigos, Agência de Notícias Carta Maior e Jornalistas Livres – do episódio que teria sido o estopim da crise política do governo Dilma, configurando-se como mais um dos fatores sociais e institucionais do contexto do impeachment. Foram investigadas 44 notícias referentes ao “acontecimento” e/ou geradas a partir dele, incluindo observações quanto à presença ou não dos grupos estudados nas pautas dos veículos.

A partir deste trajeto, dividimos a dissertação em quatro capítulos. O primeiro intitulado “Dos conceitos clássicos sobre comunidade ao ativismo nas redes” teve o objetivo de dar embasamento teórico à pesquisa, sendo a espinha dorsal para o desenvolvimento do trabalho. A partir de pesquisa bibliográfica, seu desdobramento se deu sob três tópicos. Primeiramente, apresentamos os conceitos de comunidade, partindo das definições clássicas até as manifestações atuais. Depois discorremos sobre as comunidades nas mídias e redes virtuais e como os indivíduos se conectam por meio dessas plataformas. Por fim, trouxemos reflexões sobre ativismo nas redes sociais on-line na contemporaneidade.

No segundo capítulo, denominado “Movimentos sociais e populares e os grupos das redes no impeachment de Dilma”, promovemos uma reflexão sobre o que são movimentos sociais e populares, de abordagens clássicas a contemporâneas; bem como o que vem a ser participação e comunicação popular no contexto do ativismo digital. O levantamento de conceitos e teorias foi feito com foco nas ações sociais da sociedade civil na América Latina e no Brasil a partir de pesquisa bibliográfica. Esse arcabouço teórico nos deu subsídios para traçarmos os perfis dos quatro grupos selecionados – Movimento Brasil Livre (MBL) e Vem pra Rua; e Frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular – e compreendermos quem foram esses protagonistas no âmbito das manifestações públicas pró e contra o impeachment de Dilma Rousseff nesta nova sociedade em rede.

No capítulo três, que chamamos de “O governo Dilma e as manifestações: uma análise sobre as ações dos grupos das redes sociais no Facebook”, apresentamos os resultados da análise das fanpages dos quatro grupos que atuaram no movimento do impeachment a partir das redes sociais. Para dar suporte à análise, fizemos uma breve reconstituição do cenário

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social e institucional dos governos Dilma (2011-2016) a partir de revisão bibliográfica. Na sequência, foi realizado o estudo empírico – análise de conteúdo e pesquisa exploratória – de convites virtuais de eventos e interações dos seguidores no Facebook a fim de observar como se deram as estratégias de comunicação voltadas ao engajamento e à participação popular utilizadas nas redes de relacionamento dos grupos, de 1º de março a 31 de agosto de 2016.

No capítulo quatro – Manifestações públicas: repercussão na imprensa a partir das ações articuladas nas redes sociais – observamos a influência dos eventos públicos articulados e organizados pelos grupos nas redes sociais na cobertura da grande mídia e imprensa alternativa sobre as manifestações que envolveram o impeachment de Dilma Rousseff, a fim de verificar se suas estratégias de comunicação no Facebook se reverteram em pauta. Teorias relacionadas à ação jornalística, ética e manipulação no jornalismo, noticiabilidade de um acontecimento e imprensa alternativa foram abordadas por meio de pesquisa bibliográfica. Foram feitas duas pesquisas exploratórias nos meios jornalísticos. A primeira observou a influência dos eventos públicos articulados e organizados pelo Facebook dos grupos estudados na Folha de S.Paulo e O Globo, sendo analisadas 64 reportagens. Verificamos ainda a cobertura na grande mídia – Folha de S.Paulo e O Globo – e imprensa alternativa – Caros Amigos, Agência de Notícias Carta Maior e Jornalistas Livres – da divulgação do grampo telefônico da conversa entre a presidente da República e Lula, após a nomeação dele à frente da Casa Civil, no dia 16 de março de 2016. Houve a análise de 44 notícias referentes ao “acontecimento” e/ou geradas a partir dele, incluindo observações quanto à presença ou não dos grupos estudados nas pautas dos veículos. Nas considerações finais, destacamos os principais resultados encontrados, articulando-os com os objetivos, hipóteses e referencial teórico utilizado neste trabalho.

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CAPÍTULO I – DOS CONCEITOS CLÁSSICOS SOBRE

COMUNIDADE AO ATIVISMO NAS REDES

Muito já se discutiu e ainda se debate sobre o que vem a ser comunidade. Por não haver um conceito único, uníssono, universal é que o termo inspira reflexões de ordem diversas. Nossa proposta não é esgotar o debate sobre o tema, ao contrário, é fomentar novas indagações a partir de transformações e mudanças sociais advindas de uma sociedade que, hoje, se relaciona, se conecta e compartilha interesses comuns pelas redes sociais.

Este capítulo tem o objetivo de dar embasamento teórico à pesquisa, sendo a espinha dorsal para o desenvolvimento do trabalho. A partir de pesquisa bibliográfica, seu desdobramento se dá sob três tópicos. O primeiro apresenta os conceitos de comunidade, partindo das definições clássicas até as manifestações atuais. O segundo discorre sobre as comunidades nas mídias e redes virtuais e como os indivíduos se conectam por meio dessas plataformas. Por fim, o último tópico traz reflexões sobre ativismo nas redes sociais on-line na contemporaneidade. Para dar conta do assunto, foram estudados autores como Tönnies (1947), Buber (1987), Bauman (2003); Maffesoli (2014); Castells (1999; 2003; 2013); Santaella (2013), Recuero (2011), Rüdiger (2011), Cupani (2011), Habermas (2014), Martuccelli (2015), Sorj (2014, 2015, 2016), entre outros. A consulta aos pesquisadores nos deu pistas que para melhor compreendermos as comunidades do século 21 que, entre outras formas de apropriação, fazem uso das ferramentas tecnológicas para promover ações de engajamento e participação popular nos espaços públicos.

1.1. Comunidade: abordagens do conceito clássico às manifestações atuais

Comunidade é um termo muito em voga. Usa-se para se referir a um espaço territorial como um bairro, uma determinada localidade; para tratar de um grupo de indivíduos cujos participantes comungam de interesses comuns, são ligados por laços parentescos ou ainda se relacionam pelas redes sociais sem jamais terem se encontrado. De modo mais amplo nos remete a convívio, compartilhamento, pertencimento, coletividade, entre outros significados. “A palavra ‘comunidade’ (...) sugere uma coisa boa: o que quer que ‘comunidade’ signifique, é bom ter ‘comunidade’, ‘estar em comunidade’” (BAUMAN, 2003, p.7). Talvez essa sensação de algo bom e positivo tenha sido construída gradativamente ao longo do tempo a partir de ressignificações que acompanham o desenvolvimento e a evolução da sociedade.

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O sociólogo alemão Ferdinand Tönnies é uma das principais referências no que concerne à definição clássica sobre “comunidade”, no entanto, seus conceitos foram subsequentemente criticados. Em sua obra, “Comunidade e Sociedade” (Gemeinschaft und Gesellschaft), publicada em 1887, Tönnies concebe comunidade a partir das “ações oriundas das vontades e forças [do homem], quando no sentido de conservação (...) formariam uma união. Esta, quando configurada predominantemente pela vontade natural, seria caracterizada como comunidade (gemeinschaft)”. Para Tönnies (1973, p.96-97) comunidade está relacionada a uma vida real e orgânica, enquanto que sociedade trata-se de uma representação virtual e mecânica. “Tudo o que é confiante, íntimo, que vive exclusivamente junto, é compreendido como vida em comunidade (...). A sociedade é o que é público, é o mundo”. Ele observa que o homem está em comunidade com os seus desde o seu nascimento e esta união ocorre tanto no bem como no mal.

Ao revisitar Tönnies para discorrer sobre comunidade, sociedade e sociabilidade, Brancaleone (2008, p.100-101) observa que o alemão registrou três padrões de sociabilidade comunitária, a partir dos princípios de conviabilidade: os laços de consanguinidade, de coabitação territorial e de afinidade espiritual, cada qual convergindo para um respectivo ordenamento interativo, como comunidade de sangue (parentesco), lugar (vizinhança) e espírito (“amizade”). Segundo o autor, “no circuito das relações societárias, Tönnies denominou por vontade arbitrária aquilo que é produto da sociabilidade mercantil, orientada em grande medida pelo cálculo, o tráfico e o contrato”.

Outro pesquisador contemporâneo, Mocellim (2011) observa um certo pessimismo em Tönnies no que concerne à modernidade.

De certo modo, pode-se verificar em Tönnies uma visão pessimista da modernidade. De seu ponto de vista, aquilo que a Sociologia chamou de “social” se encontra principalmente na comunidade. É nela que se encontram a relação social mútua e os códigos morais compartilhados; é nela que o afeto predomina e determina os laços entre as pessoas. Porém, com a modernidade e a decadência da vida comunitária, o que se vê mesmo é a decadência deste “velho social”. A sociedade emergente é, para ele, sinônimo de atomização e individualização radicalizada e, assim, não pode representar uma forma de reconstrução da vida comunitária e de seu aspecto afetivo, pessoal e agregador (MOCELLIM, 2011, p.112).

Para Mocellim (2011, p.113), o sociólogo francês Émile Durkheim se aproxima da formulação de comunidade vista em Tönnies ao trabalhar com o conceito de solidariedade mecânica (arcaica) no que concerne vida comunitária das pequenas aldeias. A individualização também é abordada “em decorrência da diferenciação dos indivíduos nas

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sociedades orientadas pela solidariedade orgânica” (moderna). Na visão de Mocellim, os dois autores são referentes embora as conclusões sobre as diferentes formas de solidariedade de Durkheim não sejam tão parecidas com os conceitos de comunidade e sociedade cunhados por Tönnies. As semelhanças e diferenças de pensamentos acerca da formulação de comunidade entre os dois autores clássicos, segundo Mocellim são:

(...) em Durkheim há uma visão otimista da modernidade, principalmente se for pensada sua perspectiva em contraposição à de Tönnies. Também para Durkheim, da mesma forma que para Tönnies, aquilo que a Sociologia chamou de “social” se encontra principalmente na comunidade. No caso, comunidade é sinônimo da solidariedade mecânica, e o fato social é aquele fato coercitivo que caracteriza essa solidariedade. Não há, para ele, porém, com a modernidade, uma decadência das formas de vida social. A modernidade, com sua solidariedade orgânica, ao mesmo tempo em que gera diferenciação e individualização, gera também uma nova forma de integração que se fundamenta na interdependência de indivíduos qualitativamente diferentes. Mesmo diante do risco da dissociação do social, Durkheim não considera a modernidade como uma ordem essencialmente anômica – a anomia é apenas transitória. A sociedade caracterizada pela solidariedade orgânica é tão natural quanto aquela caracterizada pela solidariedade mecânica. Não se trata de uma sociedade que se mantém unida apenas artificialmente, mas de uma gradual mudança do meio pelo qual as sociedades se integram (MOCELLIM, 2011, p.112).

Outro pesquisador a avançar na conceituação sobre comunidade é o filósofo e escritor austríaco Martin Buber (1987, p.37-39), em que ele refuta a ideia de comunidade originária do instinto natural definida como pré-social e defende que “a forma de vida humana em comum não pode ser imposta de fora; (...) deve emergir do interior em cada tempo e lugar”. Na visão do autor, a comunidade se baseia nos laços de escolha, não mais nos laços de sangue. Esta se caracteriza como pós-social, “uma vez que ultrapassa a sociedade e normas, e se sustenta sobre bases completamente diversas. Ela não quer reformar; a ela importa transformar”.

(...) nossa comunidade não quer revolução, ela é revolução. Ela ultrapassou, porém, o antigo sentido de revolução. Para nós, revolução não significa destruir coisas antigas, mas viver coisas novas. Não estamos ávidos por destruir, mas ansiosos por criar. (...) Os homens que na atual sociedade foram atirados em uma engrenagem movida pelo proveito, de modo o atrofiar sua criatividade livre sob o jugo do trabalho que visa o proveito, serão, nesta nova vida, elevados à nova ordem das coisas, onde reina não o princípio utilitário, mas o princípio criador e libertador de suas forças subjulgadas (BUBER,1987, p.38-39).

Na nova comunidade concebida por Buber (1987, p.39), “a unidade instrutiva do homem primitivo que foi dividida e decomposta (...), voltará sob novas formas em um nível superior e sob a luz de uma consciência criadora”. Peruzzo e Berti (2010, p.4), numa

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interpretação de Buber, dizem que a comunidade é também “um organismo vivo configurado pelo Eu e pelo Tu, ou seja, pelo espírito comunal das pessoas e dos grupos formados por essas pessoas, rejeitando o individualismo atomístico (o ser sozinho) e o coletivismo totalitário (vivência em grupo, mas forçada)”. O filósofo austríaco vai além ao entender comunidade como “um espaço mútuo e intermediário entre esses dois tipos de convivência social”. Para ele, “nossa vida comunitária não é mais ‘viver-um-no-outro’ primitivo, mas um ‘viver-ao-lado-do-outro’ ajustado” (BUBER, 1987, p.53).

Uma grande associação humana só pode ser denominada comunidade quando for formada por pequenas comunidades vivas, por organismos celulares fortes em coexistência sem mediação, que entram em relação direta e vital, uns com os outros, como seus membros o fazem, e que se unem em vista desta associação igualmente de modo direto e vital. (BUBER,1987, p.56).

As definições sobre o que vem a ser comunidade têm se transformado acompanhando as mudanças e evolução social. Novas discussões emergem a partir de referenciais do passado. A cada novo debate, acrescentam-se novos pontos de vista que enriquecem os estudos sobre o assunto. Nada se perde, ao contrário, o debate instiga outros pesquisadores que, ao trazer novas contribuições, ampliam ainda mais os estudos acerca deste tema. Entre os autores contemporâneos está o sociólogo polonês Bauman (2003, p.16-18) que nos provoca a refletir sobre a comunidade da atualidade contrapondo ao “entendimento comum” que “fluía naturalmente”, segundo a concepção de Tönnies. Para o sociólogo polonês, a comunidade “não pode sobreviver ao momento em que o entendimento se torna autoconsciente, estridente e vociferante” (BAUMAN, 2003, p.17).

Ainda segundo Bauman (2003, p.18), o entendimento comunitário seria moldado de uma “mesmidade” que se esvai quando o equilíbrio entre a comunicação “de dentro” e “de fora” começa a mudar e passa a ter mais peso que as trocas mútuas internas. Com o surgimento dos meios de transporte e de comunicação, que permitem que a informação chegue tão rápida aos seus destinos sem que haja a mobilidade humana, a vida comunitária concebida por Tönnies fica cada vez mais insustentável.

A distância, outrora a mais formidável das defesas da comunidade, perdeu muito sua significação. O golpe mortal na “naturalidade”, do entendimento comunitário foi desferido, porém, pelo advento da informática: a emancipação do fluxo de informação proveniente do transporte dos corpos. A partir do momento em que a informação passa a viajar independentemente de seus portadores, e numa velocidade muito além da capacidade dos meios mais avançados de transporte (...), a fronteira entre o “dentro” e o “fora” não pode mais ser estabelecida e muito menos mantida. (...) A comunidade de entendimento comum, mesmo se alcançada,

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permanecerá, portanto, frágil e vulnerável, precisando para sempre de vigilância, reforço e defesa (BAUMAN, 2003, p.18-19).

A partir de então, a unidade passa a ser construída artificialmente (BAUMAN, 2003). O entendimento comum é fruto de argumentação e persuasão, não mais “natural”. O acordo ao qual se chega ao final do processo traz consigo a memória de lutas e escolhas feitas no decorrer desta jornada. Qualquer acordo que se estabeleça nesta comunidade será formulado após muita reflexão, contestação e discussão. Também será um “contrato preliminar”, cujo acordo necessita de renovação periódica, diferentemente da comunidade de entendimento compartilhado e duradouro como era no passado. Em Bauman (2003), a vida comunitária tem uma relação conflituosa entre segurança e liberdade, sendo difíceis de conciliá-las sem atrito.

Pessoas que sonham com a comunidade na esperança de encontrar a segurança de longo prazo que tão dolorosa falta lhes faz em suas atividades cotidianas, e de libertar-se da enfadonha tarefa de escolhas sempre novas e arriscadas, serão desapontadas. A paz de espírito, se a alcançarem, será do tipo “até segunda ordem”. (...) a comunidade realmente existente se parece com uma fortaleza sitiada, continuamente bombardeada por inimigos (muitas vezes invisíveis) de fora e frequentemente assolada pela discórdia interna; trincheiras e baluartes são os lugares onde os que procuram o aconchego, a simplicidade e a tranquilidade comunitárias terão que passar a maior parte do tempo. (...) A promoção da segurança sempre requer o sacrifício da liberdade, enquanto esta só pode ser ampliada à custa da segurança. Mas segurança sem liberdade equivale a escravidão; e liberdade sem segurança equivale a estar perdido e abandonado (BAUMAN, 2003, p.19-24).

A partir dessas observações, Bauman nos instiga a refletir sobre quão confortável e boa é a vida comunitária na contemporaneidade. Não nos parece que as “comunidades” sejam tão seguras e que proporcionem liberdade plena. A segurança é efêmera na medida em que ao integrar um grupo, mesmo que com diversos pontos afins, as divergências internas e os conflitos vão emergir desta relação comunitária. A liberdade, por sua vez, está diretamente ligada à questão da segurança. Quando um indivíduo expande sua liberdade, corre o risco de ter sua segurança ameaçada, cujo grau de intensidade é proporcional à sua exposição. Assim nos perguntamos: que liberdade é essa que nos escraviza? Qual é a segurança proporcionada pela vida comunitária se não temos liberdade para sermos ou fazermos o que bem quisermos? Em suma, viver em comunidade é seguir normas pré-estabelecidas em nossas relações sociais.

Outra questão a ser observada em Bauman (2003) é a “identidade” que se torna a substituta da comunidade. Ela incorpora a individualidade ao pertencimento a grupos ou filiações a estilos de vida, mas é sempre um pertencimento temporário, revogável e precário e incapaz de trazer a segurança trazida pela comunidade. Segundo o polonês (BAUMAN, 2003,

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p.21), “‘identidade’ significa aparecer: ser diferente e, por essa diferença, singular – e assim a procura da identidade não pode deixar de dividir e separar”. Ele complementa:

E no entanto a vulnerabilidade das identidades individuais e a precariedade da solitária construção da identidade levam os construtores da identidade a procurar cabides em que possam, em conjunto, pendurar seus medos e ansiedades individualmente experimentados e, depois disso, realizar os ritos de exorcismo em companhia de outros indivíduos também assustados e ansiosos (BAUMAN, 2003, p.21).

Bauman (2003, p.62-68) trabalha com o conceito de comunidade estética que, dentre os requisitos, destacam-se que esta deve ser fácil de decompor e também de construir; e o compromisso firmado não deve ser irrevogável: “o vínculo constituído pelas escolhas jamais deve prejudicar, e muito menos impedir, escolhas adicionais e diferentes”. Isso significa que o relacionamento e a manutenção de vínculos entre os participantes caracterizam-se pela flexibilidade, liberdade de escolha, instantaneidade. Um sinônimo de comunidade estética, na visão do sociólogo polonês, seria a de “comunidades-cabides”, cuja característica comum é a “natureza superficial, perfunctória e transitória dos laços que surgem entre seus participantes”. Nesta também não se verifica, entre seus membros, uma rede de responsabilidades éticas, de compromissos a longo prazo. Este tipo de comunidade está na contramão de uma comunidade ética, ou seja, “tecida de compromissos de longo prazo, de direitos inalienáveis e obrigações inabaláveis”.

Esses dois modelos muito diferentes de comunidade são muitas vezes misturados e confundidos no “discurso comunitário” hoje em moda. Uma vez misturados, as importantes contradições que os opõem são falsamente apresentadas como problemas filosóficos e dilemas a serem resolvidos pelo refinamento do raciocínio – em lugar de serem apresentadas como o produto dos genuínos conflitos sociais que na realidade são (BAUMAN, 2003, p.68).

Outro contemporâneo que aborda a vivência comunitária é o sociólogo francês Michel Maffesoli (2014). O autor não menospreza o passado, ao contrário, se apoia nele, com um olhar crítico, para cunhar o conceito de comunidade organizada a partir de grupos tribais. Ou seja, regressa ao passado para propor um novo debate sobre o tema na atualidade.

O quotidiano e seus rituais, as emoções e paixões coletivas, simbolizadas pelo hedonismo de Dionísio, a importância do corpo em espetáculo e do gozo contemplativo, a revivescência do nomadismo contemporâneo, eis tudo o que acompanha o tribalismo pós-moderno. Para evitar ser repetitivo (...), sintetizarei as “palavras” novas por meio de dois grandes eixos essenciais: de um lado, o que salienta os aspectos “arcaicos” e juvenis do tribalismo. De outro, o que salienta sua dimensão comunitária e a saturação do conceito de Indivíduo (MAFFESOLI, 2014, p.XXI-XXII).

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Em Maffesoli, está presente um hibridismo de estilos de vida, em que as diversas características antes ofuscadas na modernidade voltam à tona e se reintegram ao social. Isso inclui diretamente o tribalismo, como vivência comunitária. Com base nesta linha de raciocínio, Maffesoli (2014, p.19) pontua que “se a distinção é, talvez, uma noção que se aplica à modernidade, por outro lado, ela é totalmente inadequada para descrever as diversas formas de agregação social que vêm à luz”.

Estas [formas de agregação social] têm contornos indefinidos: o sexo, a aparência, os modos de vida, até mesmo a ideologia são cada vez mais qualificados em termos (“trans...”, “meta...”) que ultrapassam a lógica identitária e/ou binária. Em resumo, e dando a esses termos sua acepção mais estrita, pode-se dizer que assistimos tendencialmente à substituição de um social racionalizado por uma socialidade com dominante empática (MAFFESOLLI, 2014, p.19-20).

Na visão de Maffesoli (2014, p.252), o tribalismo “pode ser perfeitamente efêmero, e se organiza conforme as ocasiões em que se apresentam”. Dessa forma, se constituem “tribos” de múltiplos vieses, como esportivas, de amigos, sexuais, religiosas, entre outras. Sua duração varia de acordo com o grau de investimento de seus protagonistas. Nota-se que as tribos contemporâneas são muito dinâmicas e heterogêneas. Em nossa visão, as ferramentas tecnológicas da sociedade moderna contribuem para a difusão e organização de indivíduos em grupos tribais múltiplos e diversos. Daí a noção de identidade híbrida e sociedade em rede, em que as pessoas estão conectadas em diferentes e diversas formas e agrupamentos sociais.

Em sua análise acerca de conceitos de vida comunitária, Mocellim (2001, p.124) revisita autores clássicos e contemporâneos e, a partir deles, observa que:

As tribos aparecem (...) como uma possibilidade de integração dentro das sociedades modernas. Aqui não existe mais a Gesellschaft [sociedade em Tönnies], mas uma solidariedade orgânica [sociedade em Durkheim], em que indivíduos se integram em diversos níveis, de acordo com seus atributos específicos. As tribos, mesmo contando com membros passageiros e sendo elas mesmas passageiras, conferem um sentido comum e mostram-se como uma reconstrução da vida comunitária, ainda que difusamente. A vivência tribal permite o reconhecimento da individualidade, mas não leva ao atomismo. Ela opera uma integração entre tribo e indivíduo, compondo uma identidade que integra a participação em diversas tribos e que atesta não ser a vivência contemporânea puramente individualista.

Outro olhar sobre comunidade é trazido por Peruzzo e Berti (2010, p.5-6) que, ao interpretarem Roger Silverstone, trabalham com o conceito de comunidades vividas, cuja abordagem ocorre no campo das relações conflitantes da vida social. Os indivíduos sonham “com o comum e as realidades partilhadas que estão na base” da comunidade. No entanto,

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reforça que comunidade sempre implica reivindicação, “um conjunto de reivindicações de ser parte de algo partilhável e particular. (...) As comunidades são vividas, mas também imaginadas”.

Notamos por meio de consultas bibliográficas a autores clássicos e contemporâneos que a discussão sobre o que vem a ser comunidade não se esgota. Os conceitos são ressignificados, re-atualizados, se complementam e seguem o ritmo das transformações sociais num processo contínuo. As formatações do passado devem e merecem ser revisitadas porque são a partir delas que novos debates emergem. O passado é o ponto de partida para a construção e reconfiguração dos conceitos da atualidade. Das abordagens clássicas sobre vivência comunitária de entendimento comum compartilhado por todos os membros (a Gemeinschaft, de Tönnies) ou das relações comunitárias das pequenas aldeias (Durkheim), notamos que as discussões sobre o tema se fizeram a partir de uma realidade social e factual, do presente daquele momento. Ou seja, faziam sentido para aquela configuração de sociedade. Ocorre que a sociedade não está estagnada. Ela se remodela o tempo todo dinamicamente. Os ambientes, os espaços se transformam, assim como as pessoas que compõem a sociedade.

Então, o que vimos com autores contemporâneos como Buber (1987), Bauman (2003) e Maffesoli (2014) foram formatações complementares às definições clássicas que se reconfiguraram e ganharam novas roupagens a partir da evolução da sociedade. Nas comunidades modernas, seja na sociedade-líquida de Bauman ou pós-moderna organizadas por grupos tribais de Maffesoli, as tecnologias de informação e comunicação (TICs) têm um papel fundamental. Há de se considerar ainda que, tanto os conceitos clássicos quanto os contemporâneos, a significação do termo comunidade remete a algo positivo, que tem se perpetuado ao longo da história da civilização. Além disso, muitos dos princípios de comunidade do passado se mantêm na contemporaneidade.

Isso significa que a compreensão do conceito comunidade contemporâneo perpassa pelos clássicos da teoria de Sociologia. Esse mergulho no passado contribui para a formatação de novas construções que ganham formas e molduras de acordo com a evolução humana e social. Certamente, surgirão novos debates no futuro, considerando as transformações sociais e a sua correlação com o advento de novas tecnologias de informação e comunicação (TIC). A atualização dos conceitos de comunidade é uma necessidade constante se tomarmos como referência a velocidade com que as TIC se transformam e se reconfiguram, influenciando, assim, o ritmo e a forma de relacionamento das pessoas e grupos da sociedade da atualidade.

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1.2. Comunidades nas mídias e redes sociais e suas conexões

Na sociedade contemporânea não há mais barreiras que impeçam a conexão entre as pessoas e a formação de agrupamentos sociais se estes tiverem a seu dispor ferramentas tecnológicas. Se no passado questões como território, proximidade, espaço eram cruciais para a constituição de uma comunidade, na atualidade os indivíduos precisam apenas ter acesso à internet1 para se conectarem e se organizarem em agrupamentos sociais para além do espaço off-line. O desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação (TIC) facilitou e permitiu a aproximação entre pessoas nos ambientais digitais. As redes de mídias sociais on-line são canais que permitem o elo de conexão entre cidadãos em todo o mundo.

O sociólogo espanhol Castells (2003, p.8) concebe a internet como “uma alavanca na transição para uma nova forma de sociedade – a sociedade de rede”. Segundo ele, a internet “é um meio de comunicação que permite, pela primeira vez, a comunicação de muitos com muitos, num momento escolhido, em escala global”.

A internet é o tecido de nossas vidas e (...) em nossa época poderia ser equiparada tanto a uma rede elétrica quanto ao motor elétrico, em razão de sua capacidade de distribuir a força da informação por todo o domínio da atividade humana. (...) a internet passou a ser base tecnológica para a forma organizacional da Era da Informação: a rede. Uma rede é um conjunto de nós interconectados [e ganhou] vida nova em nosso tempo transformando-se em redes de informação energizadas pela internet. As redes têm vantagens extraordinárias como ferramentas de organização em virtude de sua flexibilidade e adaptabilidade inerentes, características essenciais para se sobreviver e prosperar num ambiente em rápida mutação (CASTELLS, 2003, p.7).

É irrefutável a influência da internet e os desdobramentos que se deram na sociedade a partir de sua disseminação em escala global. Hoje, por exemplo, a conectividade e a interação entre as pessoas dispensam, inclusive, o uso do computador. Os equipamentos móveis, como smartphones que têm funcionalidades e características de computadores, são capazes de promover a conexão e a propagação de informações entre pessoas de qualquer lugar do planeta em tempo real. Na visão de Castells (2003, p.10), a internet transformou o modo como as pessoas se comunicam. Por outro lado, as diferentes maneiras de usá-la também têm

1 A criação e o desenvolvimento da internet ocorreram nas três últimas décadas do século XX. Seu surgimento é

consequência de uma “fusão singular de estratégia militar, grande cooperação científica, iniciativa tecnológica e inovação contracultural”. Sua origem data dos anos de 1960, a partir da Arpanet, uma rede de computadores montada pela Advanced Research Projetcts Agency (ARPA), cujo objetivo era estimular a pesquisa em computação interativa. A partir de outubro de 1994, com a produção e comercialização do Netscape Navigator, tem-se sua disseminação em escala mundial. Surgem novos navegadores, ou mecanismos de pesquisa, criando-se, então, uma verdadeira teia mundial. No final de 1995, quando ocorre a disseminação da world wide web, eram aproximadamente 16 milhões de usuários conectados por computador no mundo. No início de 2001, já havia mais de 400 milhões de pessoas utilizando a internet (CASTELL, 1999, 2003).

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transformado a própria internet. A partir de então, “um novo padrão sociotécnico emerge dessa interação”.

A presença da internet no cotidiano da sociedade moderna deve-se também ao fato desta ser uma tecnologia de comunicação livre, ou seja, “particularmente maleável, suscetível de ser profundamente alterada por sua prática social, e conducente a toda uma série de resultados sociais potenciais” (CASTELLS, 2003, p.10). Um olhar complementar a esse é o da pesquisadora de novas tecnologias, Santaella (2013, p.25), ao afirmar que “antes que as plataformas de redes sociais tivessem sido desenvolvidas, já estava no genoma da internet a tendência para as redes de agrupamentos humanos”.

Assim, a internet está cada vez mais imbuída na sociedade. O Relatório da União Internacional de Telecomunicações (UIT), das Organizações das Nações Unidas (ONU), divulgado em agosto de 2017, mostrava que 48% da população mundial usava internet. A previsão era que, ao fim de 2017, 4,3 bilhões de pessoas no mundo teriam acesso à internet móvel (MAIS..., 2017, 2 ago.2017). Essa representatividade de acesso à internet também se verifica no Brasil. O país é o quarto em número de usuários de internet, com 120 milhões de pessoas conectadas, ou seja, 59% dos brasileiros têm acesso à rede. Apesar do contingente significativo de pessoas conectadas no território nacional, dados da pesquisa TIC Domicílios, do Núcleo de Informação e Comunicação do Comitê Gestor da Internet (CGI-Br), apontam desigualdade no acesso à internet, com 59% de lares conectados nos centros urbanos, contra 26% nas áreas rurais (BRASIL..., 2017, 3 out.2017).

De qualquer forma, é notória a presença da internet na sociedade contemporânea em escala mundial e, consequentemente, no Brasil. Em virtude desta inserção no cotidiano das pessoas, tem-se a participação mais intensa de cidadãos em diferentes tipos de agrupamentos virtuais por meio das redes sociais, as chamadas comunidades virtuais.

1.2.1. Novas formas de sociabilidade e comunidades virtuais

A inserção da internet no dia a dia da sociedade moderna transformou a maneira como as pessoas se relacionam, ou seja, a forma de sociabilidade entre os indivíduos mudou e continua se reconfigurando ininterruptamente. Passamos a falar de comunidades virtuais, de pessoas que se relacionam nos ambientes digitais on-line, e muitas vezes, sequer conhecem aqueles com quem interagem. Essa legião de internautas tem ainda uma imensa flexibilidade de transitar em diferentes agrupamentos sociais como já mencionamos nesta pesquisa. Mas, o

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