• Nenhum resultado encontrado

A epidemiologia, os valores e o significado de paradigma.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "A epidemiologia, os valores e o significado de paradigma."

Copied!
6
0
0

Texto

(1)

A epidemiologia, os valores e o significado

de paradigma

Ep id e mio lo g y, value s, and the me aning

o f p arad ig m

1 Secretaria d e Saú d e d e Pern a m b u co.

Ru a N u n es M a ch a d o 119/603, Recife, PE

50050- 590, Bra sil.

Dja lm a Agrip in o d e M elo Filh o 1

Abst ract Use of t h e t erm p a ra d igm h a s recen t ly rea ch ed t h e ep id em iologica l m ilieu . Th is a rt i-cle p rov id es a crit ica l a n a lysis of a cla ssifica t ion of “ep id em iologica l p a ra d igm s” a s p rop osed b y Alm ei d a - Fi lh o. It w a s i n i t i a lly a scert a i n ed t h a t v a lu es w ere n ot con si d ered fu n d a m en t a l ele-m en t s for t h e con st ru ct ion of p a ra d igele-m s, a n d t h a t t h ey t h erefore d ist a n ced t h eele-m selves froele-m t h e Ku h n ian m at rix . Syst em at iz at ion sou gh t t o u n it e an t it h et ical t en d en cies an d t h u s seem ed closer t o t h e Fou ca lt i a n ep i st ém e. Fi n a lly, h egem on y w a s con si d ered a m ore a p p rop ri a t e t erm t h a n p a ra d igm for syst em a t iz in g ep id em iologica l p eriod s, sin ce t h e v a lu es of t h e d ifferen t w a t ersh ed s are com m it t ed t o p art icu larit y (p rin cip ally social class).

Key words Ep id em iology; Ph ilosop h y; Ep id em iologic M et h od s; Sociology

(2)

Introdução

No p re fá cio d e su a cé le b re e p o lê m ica o b ra , A Est ru t u ra d a s Rev olu ções Cien t ífica s, Ku h n (1990:13) co n sid e ra p a ra d igm a “as realiz ações cien t ífica s u n iv ersa lm en t e recon h ecid a s q u e, d u ra n t e a lgu m t em p o, forn ecem p rob lem a s e solu ções m od ela res p a ra u m a com u n id a d e d e p ratican tes d e u m a ciên cia”.

A c o n c e p ç ã o p ó s- m o d e r n a d e filo so fia , ciên cia e a rte, to d a via , ten to u p ro p a ga r a id éia d a re la t ivid a d e d o s p a râ m e t ro s q u e e le va r ia m a d óx aà co n d içã o d e ep istém e, im p o ssib ilita n d o, p orta n to, a con stru çã o d e p a ra d igm a s. Sen -d o a ssim , a n ecessi-d a -d e -d e ru p tu ra co m a p a r-ticu la rid a d e e o con sen so sob re a u n iã o d o Ver-d a Ver-d e iro, Ver-d o Be m e Ver-d o Be lo p a ra se a lc a n ç a r a

ep ist ém e, d e fe n d id o d e sd e o s a n t igo s gre go s, d everia m ser q u estio n a d o s.

Pro cu ra n d o ser fiel a o s p rin cíp io s d a a n tiga tra d içã o filo só fica , este texto p reten d e a n a lisa r a c la ssific a ç ã o, e la b o ra d a p o r Alm e id a - Filh o (1992), so b re p a ra d igm a s e p id e m io ló gic o s, con d en sa d a em d ois textos: “Os p a ra d igm a s d a ep id em io lo gia” e “Esb o ço d e u m n ovo p a ra d ig-m a p a ra a e p id e ig-m io lo gia”, q u e co ig-m p õ e ig-m o li-vro A clín ica e a ep id em iologia.

O p rim eiro d eles é d ivid id o em d u a s p a r tes: n a p r im e ira , Alm e id a - Filh o re visa e d isc u t e a ca tegoria ep istem ológica d e p a ra d igm a a p a rtir d e Ku h n (1990); n a segu n d a , id en tifica , a tra vés d e se u s e le m e n t o s e sse n c ia is, o s p a ra d igm a s d o m in a n te s n a e p id e m io lo gia . O se gu n d o te xt o vislu m b ra a e m e r gê n c ia d e u m n ovo p a ra -d igm a .

Paradigmas epidemiológicos: a propost a de Almeida-Filho

Segu n d o Alm eid a -Filh o (1992), A Estru tu ra d as Rev olu ções Cien t ífica s, d e Ku h n (1990), e xp õ e b a sica m e n t e t rê s se n t id o s p a ra o t e r m o p a ra -d igm a. O p rim eiro, p róxim o -d a con cep ção a-d o-tad a p elo sen so com u m , faz referên cia a u m p ad rã o o u m o ad elo a ser segu iad o. O segu n ad o, co n sid e ra d o ca te go ria e p iste m o ló gica fu n d a m e n -ta l, co n stitu i u m in stru m en to d e tra b a lh o p a ra o cien tista , p o ssib ilita n d o o o r ga n iza r o ra cio -cín io, selecion ar q u estões e fu n d am en tar exp li-ca çõ es em co n stru çõ es ló gili-ca s. O terceiro e ú l-tim o sen tid o em erge d o q u e se p od e ch a m a r d e visã o d e m u n d o, segu n d o a q u a l o p a ra d igm a é co m p o sto p o r e le m e n to s fo rm a is e d e co n te ú -d o, cara cteriza-d os b asicam en te p or gen era liza-çõ e s sim b ó lica s, d e se n h o s d e m o d e lo s h e u rís-t ico s o u o n rís-t o ló gico s e va lo re s co m p a r rís-t ilh a d o s p o r u m a d eterm in a d a co m u n id a d e cien tífica .

Ap ó s o s c o m e n t á r io s t e ó r ic o - c o n c e it u a is, Alm eid a -Filh o (1992) d escreve a su a sistem a ti-za çã o, o n d e sã o a p re se n ta d o s trê s p a ra d igm a s ep id em io ló gico s. O p rim eiro, id en tifica d o co m a ca u sa lid a d e, a ssu m e a d o en ça , tra n sp o sta d a Clín ica , com o seu ob jeto e u tiliza m od elos ca u -sa is cu ja red u çã o m a tem á tica é feita a tra vés d e fu n çõ e s lin e a re s sim p le s, se n d o a d e m o n st ra -çã o exp erim en ta l o seu critério d e p rova . O segu n d o, re d u t o d a m a io r ia d o s e p id e m io lo gis -t a s, d e n o m in a d o d e p a ra d igm a d o risco, p e rs-cru t a u m o b je t o -re síd u o, fo rm a d o p e la ‘so b ra’ d o q u e n ã o é exp lica d o p ela d eter m in a çã o p ro-b a ro-b ilística , u tiliza fu n çõ es lin ea res exp a n d id a s e seu p o ten cia l exp lica tivo a d vém d a p red içã o. Po r ú lt im o, Alm e id a - Filh o (1992) e n t re vê a e m e rgê n cia d e u m t e rce iro p a ra d igm a , a lice r ça d o n a cria çã o d e ob jetos tota liza d os, a p reen -d d o s a t ra vé s -d e m o -d e lo s -d e sist e m a s -d in â m icos cu ja eficá cia exp lica tiva p rovém d a in ferên -c ia e st r u t u ra l, -c a ra -c t e r iza d a e m in e n t e m e n t e p ela in d eterm in a çã o.

Valores e paradigmas: uma relação necessária?

A fim d e q u e se p o ssa m fa ze r a lgu m a s d igre ssõ e s e n t re va lo r e p a ra d igm a , é n e ce ssá r io re co rrer, p rim eira m en te, à filosofia q u e se em b a -sa n a ten sã o en tre ser e d ever, fo rm a n d o a u n id a id e e n t re o Ve rid a id e iro e o Be m , ist o é , o id e -ve r- se r co n st it u in t e d o “crit ério d e m ed id a d e realid ad e ou n ão-realid ad e d o ser”, p o is o p ró -p r io d e ve r-se r “é d e fat o o elem en t o m ais real” (Heller, 1983:16-7). A filo so fia su rge a q u i co m o u m gu ia n ecessá rio p a ra q u e a ciên cia “d esfeti

-ch ize (ou d esreifiqu e) os su jeitos, a ação, a fala e a con sciên cia d os seres h u m an os” (Heller, 1991: 214); tarefa d ifícil, em b ora in ad iável, p ois, a “ge

-n eraliz ação d e u m a co-n sciê-n cia com p letam e-n te fetich iz ad a sign ificaria certam en te o fim d a fi-losofia” (Heller, 1983:10).

(3)

p r ia ç ã o é fe it a filo so fic a m e n t e, ist o é , e sc o -lh e n d o - se e vive n d o - se u m a filo so fia (He lle r, 1983).

Em re la ç ã o à re c e p ç ã o p a rc ia l, t a m b é m existem três su b ca tego ria s: q u a n d o se p rio riza o m o m en to rela tivo a o “co m o d eves a gir”, fa la -se e m re c e p ç ã o p o lít ic a ; q u a n d o -se d e st a c a o “co m o d eves viver”, a recep çã o to rn a -se ‘ilu m i-n a d o ra’ e, q u a i-n d o se p õ e e i-n t re p a r ê i-n t e se s o “co m o d e ve s p e n sa r”, a re ce p çã o é to m a d a co -m o gu ia d o co n h eci-m en to.

O n a scim e n t o d a ciê n cia m o d e rn a , in icia lm e n t e d a s n a t u r a is e p o st e r io r lm e n t e d a s so -c ia is, p o ssib ilit a a a u t o n o m ia d a m o d a lid a d e d e recep çã o co m o gu ia d o co n h ecim en to, h a ja vist a o fa t o d e o s c ie n t ist a s d a n a t u re za e st a -rem , ca d a vez m a is, u tiliza n d o a filo so fia co m o b a liza d o ra d a s rela çõ es en tre su a d iscip lin a e a so cie d a d e ; co m d e st a q u e, cit a m - se a s d iscu ssõ e s so b re a s e xp e r iê n c ia s c o m o n ú c le o a t ô -m ico o u so b re a p o ssib ilid a d e d e -m o d ifica çã o d o có d igo gen ético (Heller, 1983).

No ca so d a s ciên cia s so cia is, a u tiliza çã o d a filo so fia d á se, n ã o só u lt im a m e n t e, m a s se m p re, m e sm o q u a n d o e la fa lto u a o se u co m p ro -m isso : a p sico lo gia d e Fre u d e a so cio lo gia d e We b e r e Du rkh e im cr ia ra m su a s p ró p r ia s filo -so fia s. Sa b e - se q u e a re ve la çã o e a o rd e n a çã o d e fa t o s so cia is n ã o co n st it u i ciê n cia , é n e ce s-sá r ia , t o d a via , “u m a t eoria q u e forn eça a b a se p a ra liga r os fa t os e t ra n sform á - los, d e d a d os, em fatos esp ecíficos d a teoria” (Heller, 1983:49). A o rd e n a çã o, p o rta n to, d everá ser feita n ã o só a t ra vé s d o m é t o d o, m a s t a m b é m d o va lo r. En q u a n t o a q u e le p rové m , n a m a io r ia d o s c a -so s, d a filo -so fia o u d a s p ró p r ia s ciê n cia s, e st e a d vé m d e d u a s fo n t e s. A p rim e ira e n co n t ra -se m ergu lh a d a n a p a rticu la rid a d e d a co n sciên cia co t id ia n a , n ã o lib e r t a d o s p re co n ce it o s. Cr it i-ca r o s va lo re s a d vin d o s d e ssa fo n t e, co m a fi-n a lid a d e d e co fi-n stru ir o co fi-n h ecim efi-n to ciefi-n tífico, n ã o sign ifica d e fe n d e r a n e u tra lid a d e a xio -ló gica n a t e o r ia so cia l, p o is a lé m d e o in t e n t o n ã o se r a lc a n ç á ve l, o re su lt a d o fin a l (c a so o fo sse) n ã o seria , ta m b ém , d esejá vel. A segu n d a fon te, q u e b u sca rom p er com o im ed ia tism o d a vid a cotid ia n a , refere-se a u m “sistem a d e valo-res” o u a u m a “h ierarqu ia d e valores d e u m a fi-losofia e su a a p lica çã o con scien t e e a u t ocon s-cien te n a criação d e u m a teoria”; n esse sen tid o, o s va lo re s e st a r ia m , a go ra d e fo r m a a d e q u a d a e d esejá vel, n o cern e d a s teoria s socia is (Heller, 1983:50).

Ao se p r o c e d e r a o c o t e ja m e n t o d a c o n t r ib u içã o h elleria n a so ib re a p ertin ên cia d o s va lo -res n a s teo ria s co m a s reflexõ es d e Alm eid a -Fi-lh o re la tiva s a o s p a ra d igm a s e p id e m io ló gico s, ve r ific a - se q u e , a o p r io r iza r o s a sp e c t o s e m

i-n ei-n tem ei-n te ep istem o -m eto d o ló gico s, a cla ssi-fic a ç ã o d e Alm e id a - Filh o p a re c e m in im iza r a im p o r t â n cia d o s va lo re s, vist o q u e e le s se e n -co n t ra m a u se n t e s d o e le n -co d e e le m e n t o s d e e st r u t u ra çã o d e su a p ro p o st a d e cla ssifica çã o d o s p a ra d igm a s e m e p id e m io lo gia . Um a o b se r va çã o d o p ró p r io Ku h n (1990:224) é d e sfa -vo rá ve l a e ssa p o siçã o : “Um p arad igm a gover-n a, em p rim eiro lu gar, gover-n ão u m objeto d e estu d o, m as u m gru p o d e p ratican tes d a ciên cia. Qu alq u er est u d o d e p esalq u isa s orien t a d a s p or p a ra -d igm a ou q u e lev a m à -d est ru içã o -d e p a ra -d ig-m a, d eve coig-m eçar p ela localiz ação d o gru p o ou gru p os resp on sáveis”.

Ap esa r d a a u sên cia d os va lores em su a cla ssifica çã o, Alm e id a Filh o p a re ce n ã o a d e r ir in -ten cio n a lm en te a o p o sitivism o. Qu a n d o a n a li-sa a o b ra ku h n ia n a , e le le m b ra q u e o p a ra d ig-m a “orga n iz a e legit im a v a lores com p a rt ilh a -d os. (...) Por m ais qu e os cien tistas in sistam em qu e con stroem u m a valu e-free scien ce, Ku h n d iz q u e ist o n ã o ocorre, q u e a p rá t ica cien t ífica se baseia em valores bastan te en raiz ad os e em n or-m a s b eor-m d efin id a s, a p esa r d e n ã o- d it a s” (Al-m eid a -Filh o, 1992:94).

A a u sê n cia d e u m a d iscu ssã o so b re va lo re s im p lica p elo m en o s d o is risco s. O p rim eiro d e-les, a ssin a la d o n a so cio lo gia web eria n a , refere-se a o fa t o q u e a d m it e a c o n ju n ç ã o d e va lo re s n ã o re fle t id o s, o u se ja , va lo re s id e n t ific a d o s c o m a p a r t ic u la r id a d e, c o m o c o n h e c im e n t o verd a d eiro. O segu n d o d eles, a p o n ta d o n a filo-so fia h e lle r ia n a , re fo rça a t o le râ n cia co m a si-m u lta n eid a d e d e va lo res co n tra d itó rio s d en tro d e u m m esm o p a ra d igm a .

A p a rtir d essa co n sta ta çã o, co m o exp lica r o fa to d e o s va lo res n ã o terem sid o co n sid era d o s p a ra fo r ja r o s p a ra d igm a s e p id e m io ló gic o s? Um a h ip ó te se q u e p o d e ria e xp lica r e ssa e lip se t e n t a a p roxim a r a sist e m a t iza çã o d e Alm e id a -Filh o d o estru tu ra lism o fo u ca u ltia n o, exp resso e m As Palavras e as Coisas, d ista n cia n d o -a , to-d a via , to-d o h isto ricism o ku h n ia n o.

A ant ít ese e o oxímoro: t ensões ent re Kuhn e Foucault

No estu d o sob re a s d escon tin u id a d es ocorr id a s n a ep istém e o cid en ta l, ren a scen tista , clá ssica e m o d e rn a , Fo u ca u lt n ã o b u sca e sp e cificid a d e s, p r ivile gia o s a sp e ct o s sin crô n ico s d o s d iscu r so s, re cu sa a re fle xã o so b re su a gê n e se, ‘su t u ra n d o’ o q u e n a a p a rên cia se m o stra in co eren -te (Dosse, 1993).

(4)

a ju st e s, se r c o m p a ra d o c o m a ep ist ém efo u -ca u lt ia n a : “Tra t a se d e v erd a d eiros su rgim en -t os, d ilacera ções, d e qu e se con -t en -t a em an o-t ar a s m od a lid a d es e o lu ga r, sem se form u la r a qu estão d e seu p rocesso d e em ergên cia” (Do sse, 1993:373).

Os co m p o n e n t e s d a ep ist ém em o d e r n a e s-t ã o, se gu n d o Fo u c a u ls-t , b e m sin c r o n iza d o s, a p o n to d e o p ró p rio m a r xism o in te gra r-se, se m tu rb u lên cia , à p la cid ez d a s á gu a s d e u m im en -so o c e a n o e p ist ê m ic o : “N o n ív el p rofu n d o d o saber ocid en tal, o m arxism o n ão in trod u z iu n e-n h u m corte real; alojou -se sem d ificu ld ad e, co-m o u co-m a figu ra p len a, t ran qü ila, con fort á vel e, recon h eça-se, satisfatória p or u m tem p o (o seu ), n o in t erior d e u m a d isp osiçã o ep ist em ológica qu e o acolh eu fav oravelm en t e (p ois foi ela ju s-tam en te qu e lh e d eu lu gar) e qu e ele n ão tin h a, em troca, n em o p rop ósito d e p ertu rbar n em so-bretu d o o p od er d e alterar, p or p ou co qu e fosse, p ois q u e rep ou sa v a in t eira m en t e sob re ela . O m arxism o está n o p en sam en to d o sécu lo XIX co-m o p eix e n’á gu a : o q u e q u er d iz er q u e n ou t ra p a rt e q u a lq u er d eix a d e resp ira r. Se ele se op õe à s t eoria s ‘b u rgu esa s’ d a econ om ia e se, n essa op osição, p rojeta con tra elas u m a reversão rad i-ca l d a Hist ória , esse con flit o e esse p rojet o t êm p or con d içã o d e p ossib ilid a d e n ã o a ret om a d a d e tod a a História n as m ãos, m as u m acon teci-m en to qu e tod a a arqu eologia p od e situ ar coteci-m p recisão e qu e p rescreveu sim u ltan eam en te, se-gu n d o o m esm o m od o, a econ om ia bu rse-gu esa e a econ om ia rev olu cion á ria d o sécu lo XIX. Seu s d eb a t es p od em a git a r a lgu m a s on d a s e d ese-n h ar su lcos ese-n a su p erfície: são tem p estad es ese-n u m cop o d ’águ a” (Fo u ca u lt, 1990:277).

To r n a n d o q u a se a b so lu t a a d im e n sã o sin -crô n ica d e su a s estr u tu ra s, e m d e trim en to d o s a sp ectos d ia crôn icos, d a s m ed ia ções e d os p ro c e sso s d e t ra n sfo r m a ç ã o e p re fe r in d o a ‘ge o -gra ficid a d e’ à h ist o ricid a d e, Fo u ca u lt e Alm e i-d a -Filh o i-d ilu em , em seu s resp ectivos ‘ocea n os’, o q u e c o n sid e ra m e sb o ç o s, p ro le gô m e n o s, a p oria s e a ch ega s d e u m d iscu rso d estitu íd o d e

statu s d e ep istém eo u d e p a ra d igm a .

Co n st a t a se , n a c la ssific a ç ã o d e Alm e id a -Filh o, co m b a se n a s ca ra ct e ríst ica s a t r ib u íd a s a os ob jetos in vestiga d os, a a u sên cia d e u m a in d ica çã o p recisa p a ra o en q u a d ra m en to d o m o -vim e n t o d a e p id e m io lo gia so c ia l. Ta lve z p o r co n sid erá la in ca p a z d e ter co n str u íd o u m n o vo ob jeto a ser a n a lisa d o a tra vés d e in stru m en -to s e te cn o lo gia s a d e q u a d o s e e fica ze s, Alm e i-d a -Filh o, q u a n i-d o está fa zen i-d o a lgu m a s i-d igres-sõ e s so b re a e m e rgê n cia d e u m n ovo p a ra d ig-m a , d iz: “Em m u it os m od elos d e in v est iga çã o d a ch am ad a ep id em iologia social, p or exem p lo, p rop õem -se objetos totaliz ad os, sistem as d in

âm icos e abord agen s p rocessu ais h istóricoestru -tu rais. E com o se op eracion aliz a essa p reten são? Com a con d u çã o d e est u d os d e ca so, en q u et es op erá ria s e a v a lia ções d e d a d os secu n d á rios? N a m in h a op in iã o, d est a form a p rod u z em - se ap en as cartas d e in ten ções qu e n ão se cu m p rem com a d escu lp a d e qu e os objetos são com p lexos e in su bord in ad os e as técn icas são p obres e com -p rom et id a s. Porém , n a m esm a e-p ist em ologia qu e fu n d am en taria tal ju stificativa (e qu e n u m fu tu ro p róx im o tod os com p artilh arem os, esp e-ro) d iz - se q u e os ob jet os d o con h ecim en t o sã o m esm o com p lex os p or d efin içã o, con st ru íd os p ela p rá t ica e q u e a s t écn ica s p a ra a su a a b or-d agem são p or ele or-d om in aor-d as” (Alm eid a -Filh o, 1992:122).

Co m e n t a n d o a s co n t r ib u içõ e s a lt e r n a t iva s d e Ta m b e llin i e La u re ll, e m re la çã o à ca u sa li-d a li-d e e m Ep ili-d e m io lo gia , Alm e ili-d a -Filh o (1989: 90) a fir m a : “Recon h eço p len a m en t e a p rov iso-ried ad e d e am bas as p rop ostas (acred ito qu e os p róp rios au tores já evolu íram em su as p osições) e resp eit o p rofu n d a m en t e o seu ca rá t er d e p io-n eirism o d a d a s a s circu io-n st â io-n cia s em q u e se a p resen t a ra m . En t ret a n t o, creio q u e n en h u m a d ela s p reen ch e a a m b içã o origin a l d e d esloca r u m sist em a d e p rop osições p reced en t e, com o fim d e su bstitu í-lo p or u m sistem a n ovo, d e efi-cá cia igu a l ou su p erior. Ta lv ez o con t ex t o d a ép oca em q u e em ergira m t en h a p reju d ica d o o seu p ot en cia l d e con t rib u içã o a o d eb a t e em p au ta”.

Nova s c r ít ic a s, a go ra d e st in a d a s n ã o só à p ro p o sta teó rico -m eto d o ló gica d e La u rell, m a s ta m b ém à con trib u içã o d e Breilh , sã o feita s. Al-m e id a -Filh o (1993) d iz q u e ta n to u Al-m a , q u a n to ou tra b u sca m su p era r o con ceito d e ‘risco’, p rop o n d o o u tra s n o çõ es co m o ‘rop erfil erop id em io ló -gico d e cla sse so cia l’, n o ca so d e Breilh , e ‘n exo b io p síq u ic o’, n o c a so d e La u re ll; e n t re t a n t o, su a s p ro p o st a s sã o, d o p o n t o d e vist a t e ó r ico -m e t o d o ló gico, in sa t isfa t ó r ia s, p r in cip a l-m e n t e a la u rellia n a q u e ‘retorn a’ à n oçã o clín icofisio -ló gica d e ‘p erfil p a to -ló gico in d ivid u a l’.

Se rá q u e o fa t o d e Alm e id a Filh o co n sid e ra r, em su a cla ssifica çã o, a ru p tu ra co m o co n c e it o d e r isc o c o m o se n d o u m a c o n d iç ã o n e -cessá ria (e ta lvez su ficien te) p a ra o su rgim en to d e u m o u t ro p a ra d igm a p e r m it ir ia ‘a n in h a r’ – c o m o o fe z Fo u c a u lt c o m o m a r xism o, n u m a m e sm a e st r u t u ra , h a ja vist a o s in va r ia n t e s já cita d os – os d iscu rsos: Ep id em iology: Prin cip les an d M eth od s, d e Ma cMa h o m & Pu gh , e Ep id e

-m iologia : Econ o-m ía , M ed icin a y Polít ica, d e Breilh ?

(5)

-to res esteja m ‘a n in h a d o s’, ta m b ém , a xio lo gica-m e n t e ; o q u e se r ia , se gica-m so gica-m b ra d e d ú vid a , u m a p r ovo c a ç ã o e sd r ú xu la , p a r a n ã o d ize r m o rd a z. A in t e n cio n a lid a d e n o p ro p ó sit o visa p rovo ca r u m esp a n to (th au m az ein) a fim d e se a vu lta r a a n títe se, isto é , o a sp e cto d ia crô n ico, o u o oxím o ro q u e p ro p õ e revela r a p o ssib ilid ad e ad e e ssa ca ra ct e ríst ica se r, t a m b é m , sin cro -n iza d a .

Considerações finais: o ret orno a Kuhn

A c o n t r ib u iç ã o d e Ku h n à t e o r ia d o c o n h e c i-m en to a d véi-m d a a n á lise h istór ica d e d escob er-t a s e in ve n ç õ e s e xc lu siva m e n er-t e o c o r r id a s n o c a m p o d a s c iê n c ia s n a t u r a is. En t re t a n t o, d iz e le : “Perm an ece em aberto a qu estão a resp eito d e qu e áreas d as ciên cias sociais já ad qu iriram tais p arad igm as. A História su gere qu e a estrad a p ara u m con sen so estável n a p esqu isa é extraor-d in ariam en te árextraor-d u a” (Ku h n , 1990:35).

De sse fra gm e n to, d u a s q u e stõ e s in stiga d o-ra s p o d e rã o e m e rgir. A p rim e io-ra e xp re ssa u m a d ú vid a : h á p a ra d igm a s n a s ciê n cia s so cia is? A segu n d a p a rece p roib ir a existên cia sim u ltâ n ea d e vá r io s p a ra d igm a s d e n t r o d e u m a m e sm a ciên cia , p ois ob ter o statu sim p lica u m a esta b ilid a d e, p o r isso é feito o a lerta so b re a a rd u id a -d e -d o ca m in h o.

Tom a n d o-se o ob jeto ep id em iológico com o sen d o u m ob jeto socia l e con sid era n d o-se a p e-n a s a p rim eira q u estã o, p o d er-se-ia vislu m b ra r u m a p rim eira sa íd a . O en volvim en to d e va lores e m su a s in vestiga çõ es, q u e sã o p o sta s em p rá t ica d e n t ro d e u m a so cie d a d e b a se a d a n a s re -la çõ e s d e su b o rd in a çã o e d o m ín io, im p lica ria , a p a re n t e m e n t e , a e xis t ê n c ia s im u lt â n e a d e vá r io s p a ra d igm a s e p id e m io ló gic o s (Ba r re t o, 1990). N ã o o b st a n t e , e ssa n ã o se r ia a m e lh o r sa íd a p a ra o p rob lem a , p ois a lém d e ca ir n o re-la tivism o h isto ricista d a s vá ria s ‘verd a d es’, fo rta leceria a tese d a im p o ssib ilid a d e d e co n str u -çã o d e u m sa b er verd a d eiro (ep istém e), h a ven -d o a p e n a s u m a o p in iã o (d óx a). Ta l so lu çã o e s-t a r ia , e m p a r s-t e, s-t a m b é m d iss-t a n cia d a s-t a n s-t o d e Ku h n c o m o d a s o r ige n s gre ga s d a filo so fia -ciên cia .

O se gu n d o re cu r so se r ia fa ze r u m a le it u ra (a p re ssa d a ) d a se gu n d a q u e st ã o e a d m it ir a p o ssib ilid a d e d a vigê n c ia d e u m p a ra d igm a e p id e m io ló gic o, ve n c e d o r d a d isp u t a c o m o se u a n t e c e sso r, e m c a d a u m d o s m o m e n t o s h ist ó r ic o s. Po r é m , a n t e s d e ir a d ia n t e , d e ve r-se-ia recon h ecer q u e a leitu ra d in â m ica torn ou recôn d ito o ‘con sen so está vel’ im p lica n d o con -se q ü e n t e m e n t e a a d m issã o d e su a e xist ê n c ia d e n t r o d a s so c ie d a d e s fu n d a d a s n a s re la ç õ e s

d e su b o rd in a çã o e d o m ín io. Se gu n d o Bre ilh & Gra n d a (1985) e Bre ilh (1991), t a l fa t o n ã o se verifica n a h istó ria d a e p id e m io lo gia ; p o r co n segu in te, em term o s ku h n ia n o s, a p a ren tem en -t e, -t a m b é m n ã o se p o d e r ia fa la r d e p a ra d igm a ep id em iológico. Na verd a d e o q u e é ou foi con -sid e ra d o p a ra d igm a t ra t a r- se - ia re a lm e n t e d e u m a h egem on ia, n o sen tid o gram scian o d o ter-m o (Bo b b io et a l., 1992), d e u ter-m a d a s verten tes.

Ne ssa p e r sp e c t iva , a d o t a d a p o r Bre ilh & Gra n d a (1985) e Ro d r igu e s d a Silva (1990), o d isc u r so d a e p id e m io lo gia so c ia l n ã o e st a r ia d ilu íd o em ‘o cea n o s ep istêm ico s’ cu ja p la cid ez e st r u t u ra l p a re c e se r e t e r n a , se m c a lm a r ia s. Tra t a n d o o, a o c o n t r á r io, c o m o c o n t ra h e ge -m ô n ico, já q u e n ã o se p o d e, t e n d o e -m vist a a s crítica s d e Alm eid a Filh o, co n sid erá lo co n tra p a ra d igm á t ico, e m e rge, p e lo m e n o s, u m a o u tra d im en sã o d o p ro b lem a , ta m b ém ep istem o ló gica , rela tiva à d iscu ssã o so b re co n h ecim en to e va lo r ve rd a d e iro s p ro d u zid o s e m so cie d a -d e s -d e su b o r-d in a çã o e -d o m ín io -d e cla sse s, -d e gên eros etc.

(6)

Referências

ALM EID A- FILH O, N ., 1989. Ep id em iologia sem N ú -m eros: U-m a In t rod u çã o Crít ica à Ciên cia Ep id e-m iológica. Rio d e Ja n eiro: Ca m p u s.

ALMEIDA-FILH O, N., 1992. Os p a ra d igm a s d a ep id e-m io lo gia . In : A Clín ica e a Ep id em iologia(N . Al-m e id a - Filh o, o rg.), p p . 90- 104. Rio d e Ja n e iro : Ab ra sco.

ALM EID A- FILH O, N ., 1993. La in ve st iga c ió n y la p ra ct ica d e la e p id e m io lo gia e n Am e r ica La t in a : d e sa fio s t e ó r ic o s y m e t o d o ló gic o s. Ta ller sob re Est u d io d e la Sit u a ción d e Sa lu d segu n Con d i-cion es d e Vid a. Sa lva d or. (m im eo.)

BARRETO, M. L., 1990. A e p id e m io lo gia , su a h ist ó ria e crises: n ota s p a ra p en sa r o fu tu ro. In : Ep id em io-logia : Teoria e Ob jet o(D. C. Co st a , o rg.), p p . 19-38, Sã o Pa u lo: Hu citec/ Rio d e Ja n eiro: Ab ra sco. BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N. & PASQUINO, G., 1992.

Dicion ário d e Política. Vo ls. 1 e 2, 4ae d ., Bra sília : Ed itora Un iversid a d e d e Bra sília .

BREILH , J. & GRAN D A, E., 1985. Os n ovo s r u m o s d a e p id e m io lo gia . In : As Ciên cia s Socia is em Sa ú d e n a Am érica La t in a : Ten d ên cia s e Persp ect iv a s(E. D. Nu n es, o rg.), p p. 141-53, Bra sília : Orga n iza çã o Pa n a m erica n a d e Sa ú d e.

BREILH , J., 1991. Ep id em iologia: Econ om ia, Política e Saú d e. Sã o Pa u lo: Un esp / Hu citec.

DOSSE, F., 1993. História d o Estru tu ralism o: O Cam p o do Sign o, 1945/1966. Vol. 1, São Pau lo: En saio/ Cam -p in as: Ed itora UNICAMP.

FOU CAU LT, M ., 1990. As Pa la v ra s e a s Coisa s: Um a Arq u eologia d a s Ciên cia s Hu m a n a s.5ae d ., Sã o Pa u lo: Ma rtin s Fon tes.

HELLER, A., 1983. A Filosofia Rad ical. Sã o Pa u lo: Bra -silien se.

H ELLER, A., 1991. A so cio lo gia co m o d esfetich iza çã o d a m od ern id a d e. Novos Estu d os CEBRAP,30:214. KUH N, T. S., 1990. A Estru tu ra d as Revolu ções Cien

tí-ficas. 3aed ., Sã o Pa u lo: Persp ectiva .

Referências

Documentos relacionados

niger (35,5 UI.L -1 ), quando cultivados com farelo de trigo, em condições similares com as empregadas no presente trabalho (GAWANDE; KAMAT, 1999). A comparação entre os isolados

Tren d s in ca ries p reva len ce in No rth Am erican ch ild ren.. Statistical Meth - od s in Ep id

Con gen ital Ch agas d isease in Bolivia: ep id em io - logical asp ects an d p ath ological fin d in gs.. Am erican Jou r- n al of Ep id

Ep id em iology an d clin ical featu res associated with Blastocystis h om in is in -. fe

Palavras-chave Cárie Den t ária; Den t ição Prim ária; Prevalên cia; Ep id em iologia... Den tal caries p revalen ce in relation to socioeco- n om ic statu s of n u rsery sch ool

Den gu e ep id em ic in th e State of Rio d e Jan eiro, Brazil: Virological an d ep id em i- ological asp ects.. Den gu e typ e 2 ou tbreak in th e sou th of th e state of Bah

1 father’s schooling and presence, mother’s skin color, family income; 2 father’s schooling and presence, mother’s skin color, maternal work; 3 maternal work... M od ern Ep id

Cet obscur objet de l’ép id em io- logie.. Ep id em iologic

Важливе місце зайняло також вивчення проблем глобального розвитку, міжнародної безпеки, особливостей зовнішньої політики держав світу, шляхів розв’язання існуючих міжнародних конфліктів