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Ciênc. saúde coletiva vol.8 número4

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Academic year: 2018

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1 Departamento de Medicina Preventiva, UFBA. plpen a@uol.com .br e pen a@ufba.br

Tratase do debate exem plarm en te desen -volvido por Arrighi (2003), ao descrever a cha-mada Economia Política dos Sistemas Mundo, segundo o qual estaríamos vivendo um proces-so de transição entre “as antigas vantagens que sustentam a hegemonia do Ocidente” para “um retorn o ao balan ço relativo dos cen tros m úl-tiplos exibidos n o sistem a m un dial do século 12”

.

Isto em resposta ao recente fortalecimento econômico de estados muito distantes dos cen-tros hegem ônicos do Ocidente, com o o que se observa n a Ásia Orien tal atu alm en te. Assim , em bora con cen tran do u m in egável poderio militar, os estados ocidentais não contam com recursos humanos ou financeiros para centrali-zar um poder global. Tensão que pode ser resu-mida nos seguintes termos:

Será que muitos dos

problemas enfrentados pelos Estados Unidos não

decorrem do fato de que, diferentemente da

Grã-Bretanha na onda de globalização do século 19,

os EUA não dispõem de um Império Indiano

pa-ra cobrir seus déficits no balanço de pagamentos

e para fornecer a mão-de-obra militar de que

ne-cessita para policiar o mundo?

(Arrighi, 2003).

Ora, este aspecto, que den ota a con stan te crise e in stabilidade n o sistem a, n ão deixa de existir, em outras bases, tam bém n o in terior dos próprios m ovim entos antiglobalizantes.

Cham o a aten ção aqui para a in stigan te an álise sobre a Con ferên cia Mun dial sobre o Racism o, Discrim in ação Racial, Xen ofobia e Intolerâncias Correlatas, realizada em 2001, na África do Sul (Blackwell & Naber, 2002). As au-toras m ostram que aquele encontro reiterou a dependência entre globalização neoliberal e es-tratificação racial, discrim in ação sexual e ex-ploração de classe. Entretanto, as autoras assi-nalam a multiplicidade de arenas e relações de poder no interior do encontro, que ultrapassa-ram largamente as esferas comerciais e macro-políticas para criar ruídos que perpassaram a própria articu lação dos m ovim en tos sociais, porque estes, via de regra, reproduzem a estru-tu ra m esm a das sociedades con tem porân eas, notadamente no que diz respeito ao confronto ocidente

versus

oriente.

Assim , os m ovim en tos an tiglobalizan tes estão, eles próprios, submetidos às tensões cul-turais, religiosas, filosóficas que têm sido dura-m ente atingidas pela chadura-m ada globalização li-beral. Fica evidente, então, que o jogo de forças é ainda extremamente duvidoso e intrincado e que a balança penderá, historicamente, para os que forem capazes de agregar respeito à diver-sidade, tolerân cia e solidariedade em escala

planetária. Em term os históricos trata-se, cer-tamente, de um desafio inteiramente novo.

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Por uma agenda global

para movimentos sociais

Toward a global agenda

for social m ovem ents

Paulo Gilvane Lopes Pena

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mente avançam em relação ao que se conhecia no âmbito de outros movimentos sociais estru-turados, a exem plo do que cham aríam os de "cibersindicalismo", com suas lutas locais e in-tern acion ais e suas estruturas n um éricas/ co-m u n icacion ais/virtu ais. Esta reflexão teórica do termo globalização é importante para a de-fin ição do objeto de com preen são e das suas relações complexas com a conjuntura e as mu-danças estruturais nas sociedades, que m arca-ram o final do século 20.

Para Pierre Bourdieu (1998), o "neolibera-lism o" se constitui em um program a prescrito para o planeta pela potência am ericana. Algu-m as condições favoreceraAlgu-m a prescrição deste programa sem contestação, a ponto de se esta-belecer um a hegem onia do Consenso de Was-hin gton , que se im pôs com o o "pen sam en to único". Uma das condições foi a crise do Esta-do de Bem-Estar Social na Europa; outro foi o afu n dam en to da ex-Un ião Soviética, sim bo-licam en te m arcado pela queda do m uro de Berlim. Neste contexto emergiu a denominada unipolaridade comandada pelos EUA, tornan-do possível as condições históricas para a pres-crição deste programa planetário, sem grandes alternativas em evidência e lutas sociais de re-sistência na sua fase inicial. O program a adota u m m odelo pau tado n a tríade: liberação das fronteiras nacionais para impor a livre circula-ção do m ercado; reform a do estado, n a pers-pectiva da im plem entação do estado m ínim o; flexibilização do trabalho, elim inando as bar-reiras de proteção do trabalhador e im pon do tam bém a liberdade para a exploração do tra-balho pelo capital. Essa nova reordenação eco-nômica, colocada sob o signo da liberdade para o capital, é, com efeito, uma "violência estrutu-ral", que subordina os estados nacionais às exi-gências das liberdades econômicas, suprime to-das as leis de proteção do trabalho (Freitas, 2001) e de mercado nacionais, interdita

déficits

e inflações, privatiza serviços públicos e, sobre-tudo, reduz vertigin osam en te as despesas pú-blicas e sociais. O Brasil aplicou de forma rigo-rosa este program a n o "ciclo n eoliberal", que in iciou com o govern o Collor e fin alizou, n o segun do govern o Cardoso. As con seqüên cias econôm icas e sociais são conhecidas, m as ain-da exigem estudos para uma avaliação em pro-fun didade desse processo. O program a n eoli-beral tem gerado con seqü ên cias plan etárias qu e resu ltam tam bém de tran sform ações es-truturais do desenvolvim ento do capitalism o. Nesse sentido, caso os movimentos sociais se

li-m iteli-m a uli-m a ação apenas contrária à globali-zação corporativa neoliberal, outros programas planetários, que atendam apenas aos interesses de desen volvim en to capitalista, poderão ser prescritos, como alude Pierre Bourdieu.

A crise estrutural do capitalism o acen tua-da nos anos 90 tem com o referência a crise do trabalho. A história do capitalism o in dustrial con tém fases con traditórias de autom ação de processos produtivos

,

desem prego, conquistas sociais, assim com o, contrariam ente, constru-ção de novas dimensões técnico-sociais de cria-ção de emprego. Com a invencria-ção do “chip” nos anos 50, uma nova revolução técnica foi inicia-da, desen cadean do um in sidioso e gigan tesco fenômeno de “numerização” dos processos pro-dutivos, serviços, lazer, tornando-se hoje um paradigma planetário que se impõe até mesmo com o um instru m en to n as lutas populares. Nesse contexto de revoluções técnicas, a rees-truturação produtiva se utilizou dessa n ova qualidade – a autonomia e flexibilidade operacional das técnicas – determ inando um a con -seqüen te flexibilização do trabalho con com i-tante a um incremento espetacular da redução de postos de trabalho. Nos países desenvolvi-dos, o processo de automação, associado à rees-truturação produtiva, resultou no desemprego estrutural em m assa, fun dado essen cialm en te n o desen volvim en to técn ico e n a au sên cia de políticas protetoras do trabalho. Chegou-se mes-mo a falar no fim do trabalho (Rifkin, 1996), ou na sua metamorfose profunda, gerando a perda da sua centralidade (Gorz, 1988). A profundi-dade dessa crise trouxe para o centro da qu es-tão social o conceito de exclusão.

A an álise dessas popu lações socialm en te m arginalizadas rem ete aos conceitos clássicos de "vagabundo" – com o na era feudal (Castel, 1995),

lum pem proletário

em Marx,

anom ia

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vas técnicas, eliminação de postos de trabalho, redução do suporte social pela crise do Estado de Bem-Estar Social, enfraquecimento dos me-can ism os de solidariedade, lutas sin dicais e conquistas corporativas, levando-os a riscos de doenças e dependências quím icas associadas a precárias con dições de vida. Neste sen tido, o "excluído" não pode ser inserido em uma re-lação m ecânica e estática com a sociedade que o rejeitou, pois n ão há m ais aquela con dição social originária da sua exclusão. São os "novos pobres" dos países desen volvidos, resultan tes da crise estrutural do capitalism o em associa-ção com o programa neoliberal de perda de di-reitos sociais de proteção. Para a América Lati-na, as populações "excluídas" estão sob condi-ções sociais de miséria extrema, cuja adição de fenômenos estruturais como o desemprego tec-nológico, ainda inicial, e o desemprego prescri-to pelo programa neoliberal, agrava uma reali-dade cruel, jamais vista na nossa história. Jean Ram on et (2001) propõe um con ceito que lhe parece m ais próxim o dessa realidade: "guerra social". Muitos "excluídos" estão, n a verdade, inseridos em um a m odalidade de guerra dife-rente da convencional entre países, ou de uma guerra civil tradicional. Ramonet comparou os dados de mortes por violência do Rio de Janei-ro com todas as outras guerras convencionais da época, in cluin do a guerra dos Bálcãs, os conflitos do Oriente Médio, as guerras africa-n as, e coafrica-n cluiu que os íafrica-n dices do Rio eram m ais expressivos que todas as citadas guerras jun tas. A an álise dem ográfica do Brasil tam -bém expressa uma sobremortalidade de jovens, em faixa etária típica de condições demográfi-cas de países em guerra.

Aproximando-se mais desse fenômeno, es-tudos antropológicos qualitativos têm expres-sado a gravidade da situação de violência e fo-m e n as periferias das gran des cidades, cofo-m o mostra Freitas (2003). Um número expressivo da população favelada do Brasil e da Am érica Latina encontra-se sob o controle para-estatal do narcotráfico. Podemos qualificar a situação, resumidamente, como a ausência de Estado ou quando este presta serviços o faz de maneira ex-tremamente precária. Bandos de narcotrafican-tes subjugam populações de regiões inteiras de favelas, redefinindo suas fronteiras. Mais ain -da, controla a circulação de cidadãos, m uitas vezes estabelecen do form as de "passaportes" para liberar acesso a pessoas estran has às re-giões governadas; organizam m ilícias e verda-deiros exércitos de controle territorial sob a

égi-de do terror e da punição mortal a qualquer ti-po de resistência ao narcodom ínio. Trata-se, pois, de uma organização urbana de economia interna baseada na distribuição de drogas como modalidades de "trabalho" e, absolutamente, fo-ra do controle do Estado; uma organização em que a circulação da população é regulada com toques de recolhimento e restrições de espaços públicos; m an uten ção de n orm as e con dutas criminosas de atividades diversas, lazer, produ-ção e comércio, porém com regras que se asse-m elhaasse-m a uasse-m sisteasse-ma jurídico paralelo coasse-m jul-gam entos sum ários com requintes de cruelda-des. É esta a construção de um a narcocultura, com seus heróis, festejos e ritos que impedem a ação do Estado com a vigilância sanitária, pes-quisadores do IBGE e das universidades, inspe-ções de toda ordem – fazendária, do trabalho, e outras; criam processos de formação de narcoa-gentes, controlam as religiões e sobretudo eli-minam ou submetem ao seu controle absoluto as diversas organizações e m ovim entos sociais de luta de defesa do interesse dessas populações narcossubjugadas. Ainda considerando que es-tas populações são tam bém vítim as da "exclu-são" tecn ológica, do an alfabetism o in form a-cional, dificilmente terão conhecimento e aces-so às redes numéricas de lutas dos movimentos sociais altermundialistas. Finalmen te, a dimen-são dessa questão deixou de ser localizada e se generalizou a ponto de o narcotráfico governar m ilhões de favelados, além de estar in filtrado nos três poderes formais, tratando-se de um fe-nômeno dos grandes centros urbanos da Amé-rica Latina (exceção de Cuba), muitas vezes do-m in an do países que se torn arado-m verdadeiros narcopaíses.

Dessa forma, conceitos como lumpempro-letário, anomia social ou mesmo desfiliação são insuficien tes para compreender esta realidade. Não há anomia na desordem social das favelas. Ocorre uma emergência de nova ordem social, de natureza hedionda, advinda do narcotráfi-co, delimitando narcorregiões, em perspectivas de constituição de narconações e narcopovos. Essa nova ordem se expressa em guerras sociais e representa um fenômeno continental, que re-sulta dos mesmos processos de crise do capita-lism o e da aplicação do program a neoliberal.

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so-1 Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia H um an a. Fiocruz.

m in ayogo@en sp.fiocruz.br 866

ciais; e a guerra social, típica no Brasil e em paí-ses semelhantes que aderiram radicalmente ao program a n eoliberal. Nesse sen tido, a discus-são do conceito de globalização e a agenda de lu tas dos m ovim en tos alterm u n dialistas po-dem con tem plar esta e ou tras dim en sões do seu espectro da atuação. Quem fala pelos nar-co-oprimidos? Pelos exércitos de crianças obri-gadas a guerrear na África? Os movimentos an-tiglobalização ou altermun dialistas e seus ins-tru m en tos técn icos em redes plan etárias po-dem con siderar a am pliação do espectro de ação, in cluir tais "hiperexcluídos" de todo o planeta, globalizando sua agenda de lutas. Tra-ta-se da construção de cam inhos que superem a generalização das guerras sociais, civis e im -perialistas, a em ergên cia de n arcorregiões e narconações e a consolidação de um futuro si-m ultân eo da husi-m an idade esi-m con dições que assegurem o próprio futuro do planeta.

De fato, este texto proporciona ótim as re-flexões ao processo de globalização e a em er-gência de lutas sociais de âmbito planetário. As descrições qu e faço objetivam apen as reu n ir material para contribuir com este debate.

Referências bibliográficas

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Rifkin J. (1995) 1996.La fin du travail. Ed. La Découverte, Paris.

Os movimentos sociais e o novo papel

dos estados-nação diante do fenômeno

da globalização

Social m ovem ents and the new

role of n ation -states vis-à-vis

the globalization phen om en on

Carlos M inayo

1

A leitu ra do artigo “A globalização dos m ovi-m entos sociais: resposta social à Globalização Corporativa Neoliberal” m e suscita um a série de questões de natureza diversa. Concentrarei a discussão em dois pontos que, a m eu ver, m e-receriam m aior aten ção ou deveriam receber tratam en to m ais cauteloso: a) a com preen são que os autores apresentam sobre a globalização e o papel atual do Estado-nação; b) a valoriza-ção atribuída às redes virtuais.

Parto do pressuposto de que todas as teo-rias são parciais e sua fecundidade reside, dtre outros fatores, nos tipos de questão que en-focam . Con sidero, portan to, que os au tores, apesar de seu em pen ho em qu alificar o fen ô-m eno coô-m plexo da globalização, sobre o qual incidem inúmeras dimensões centrais da ativi-dade social, não incorporaram suficientemente algu n s elem en tos essen ciais para o en ten di-m ento desse fenôdi-m eno e, particulardi-m ente, do papel estratégico do Estado na atual conjuntu-ra. Concordo com as críticas à “coisificação” e às sim plificações de analistas favoráveis à glo-balização, que a apresentam como um processo sem sujeito cujos efeitos e con seqüên cias são vistos com o hom ogêneos e universais. Consi-dero, porém que, em sua argum en tação, aca-bam por cair no erro que criticam .

Referências

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