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Sumário. Texto Integral. Tribunal da Relação do Porto Processo nº

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Tribunal da Relação do Porto Processo nº 0412474

Relator: SOUSA PEIXOTO Sessão: 14 Junho 2004

Número: RP200406140412474 Votação: UNANIMIDADE

Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.

ACIDENTE DE TRABALHO CULPA DA ENTIDADE PATRONAL

CONTRATO DE SEGURO FOLHA DE FÉRIAS

PROVA DOCUMENTAL

Sumário

I - Não é necessário o uso de meios de protecção contra quedas em altura, se o telhado for de fraca inclinação, estiver protegido em toda a volta por uma platibanda e as chapas da cobertura, em zinco, tiverem resistência para suportar mais de 100 Quilogramas e o único risco de queda residir na

existência de uma fiada de chapas de fibra de vidro, por cima das quais não era preciso andar para realizar o trabalho.

II - Tal telhado, para efeitos do disposto no artigo 8 n.2 alínea f) do Decreto-Lei 441/91, não pode ser considerado zona de risco grave para um aprendiz de serralheiro, com 17 anos de idade.

III - No contrato de seguro na modalidade de folhas de férias, o tomador do seguro tem de indicar, relativamente aos aprendizes, a retribuição

efectivamente paga e a retribuição equiparada, sob pena de a seguradora apenas responder pela retribuição declarada.

IV - Fora dos casos previstos nos artigos 638-A e 639 do Código de Processo Civil, não é admissível a junção aos autos de depoimentos prestados por terceiros.

Texto Integral

Acordam na secção social do Tribunal da Relação do Porto:

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1. Os presentes autos referem-se a um acidente de trabalho de que foi vítima B..., no dia 14 de Novembro de 2001, quando trabalhava por conta da sociedade C... L.da que tinha a sua responsabilidade por acidentes de trabalho transferida para a X... Companhia de Seguros, por contrato na modalidade de folhas de férias.

Na fase conciliatória, o acordo não foi possível pelo facto de o sinistrado não ter concordado com o resultado do exame médico, pelo facto de a seguradora entender que o acidente tinha ocorrido por negligência grosseira do sinistrado e por entender que à data do acidente só estava transferido o salário de

334,20 euros x 14 + 77,44 euros x 11) e pelo facto de a entidade empregadora entender que a sua responsabilidade estava totalmente transferida.

Em consequência daquela falta de acordo, a acção passou à fase contenciosa, tendo o sinistrado demandado as referidas entidade empregadora e

companhia de seguros.

Na sua contestação, a entidade empregadora alegou que a sua

responsabilidade estava totalmente transferida, pois, apesar de o sinistrado exercer as funções de aprendiz de serralheiro e ser remunerado de acordo com essa categoria, a sua responsabilidade estava transferida pelo salário médio de um trabalhador com a categoria profissional correspondente à sua aprendizagem, conforme o disposto no n.º 3 do art.º 10.º das Condições Gerais da Apólice com o n.º 001.

Por sua vez, a companhia de seguros contestou, alegando que o acidente tinha ocorrido por violação das regras de segurança por parte da entidade

empregadora e, sem prescindir, por culpa da própria vítima.

Com a contestação seguradora juntou quatro documentos (participação do acidente apresentada pela entidade empregadora e três autos de declarações por ela recolhidos no processo interno de averiguações), tendo o M.mo Juiz ordenado o desentranhamento dos três últimos documentos, em despacho proferido após os articulados de resposta às contestações apresentados pelas três partes (fls. 122-123).

Inconformada com aquele despacho, a companhia de seguros interpôs recurso de agravo que, após contra-alegações do autor, foi admitido com subida

diferida (fls. 145).

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Proferido o despacho saneador, seleccionados os factos assentes, elaborada a base instrutória e ordenada a abertura do apenso para fixação da

incapacidade, realizou-se o julgamento, com gravação da prova, e, dadas as respostas aos quesitos, foi proferida sentença, condenando as rés a pagar ao sinistrado: a) o capital de remição, acrescido de juros de mora,

correspondente à pensão anual e vitalícia de 328,81 euros, devida a partir de 13.4.2002, sendo a companhia de seguros responsável pelo pagamento do capital de remição correspondente à pensão anual de 290,31 euros e a ré entidade patronal pelo pagamento do capital de remição correspondente à pensão anual de 38,50 euros; b) a quantia de 1.826,80 euros, acrescida de juros de mora, a título de indemnização por incapacidade temporária, sendo a ré companhia de seguros responsável pelo pagamento de 1.612,90 euros e a co-ré entidade empregadora pelo pagamento de 213,90 euros.

Inconformadas com a sentença, ambas as rés recorreram, suscitando as questões que adiante serão referidas e a ré companhia de seguros requereu, ainda, que fosse apreciado o recurso de agravo por si interposto.

O autor, e só o autor, contra-alegou defendendo a confirmação da decisão e, sem conceder, interpôs recurso subordinado pedindo, caso o recurso da ré viesse a ser julgado procedente e caso se viesse a entender que o acidente ocorreu por culpa da ré entidade patronal, que esta fosse condenada como responsável principal pela reparação agravada do acidente e a ré seguradora como responsável subsidiária pelo pagamento das prestações normais.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

2. Os factos

Na 1.ª instância foram dados como provados os seguintes factos:

Assentes por acordo:

a) No dia 14/11/2001, cerca das 9 horas, o Autor sofreu um acidente na zona industrial de ..., Valongo,

b) Quando trabalhava sob as ordens, direcção e fiscalização da Ré C...

L.da,

c) Exercendo as funções de aprendiz de serralheiro,

d) Mediante o salário anual de 67.000$00 x 14 + 15.510$00 x 11.

e) A Ré C... L.da dedica-se à actividade de metalurgia e metalomecânica.

f) O acidente ocorreu quando o Autor se encontrava em cima de um telhado a substituir umas chapas de cobertura desse telhado,

g) Uma delas cedeu,

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h) Originando a queda do Autor de uma altura de, pelo menos, cerca de seis metros.

i) Em consequência deste acidente advieram para o Autor sequelas de fractura de L1.

j) O Autor recebeu alta, por cura clínica, em 12 de Abril de 2002.

k) Do acidente resultou para o Autor I.T.A. de 15/11/2001 a 12/04/2002.

l) O Autor não recebeu das Rés, até ao momento, qualquer quantia a título de indemnização pelo período de I.T.A. que o afectou.

m) O Autor nasceu a 04/03/84.

n) D... subscreveu a proposta de contrato de seguro do ramo acidente de trabalho que se encontra junta aos autos a fls. 13 a 15.

o) Na sequência dessa proposta, D... Couto e a Companhia de Seguros Y... celebraram o contrato de seguro do ramo acidente de trabalho titulado pela apólice n.º 04, pelo prazo de um ano e seguintes, com início em 21/05/80.

p) A Companhia de Seguros Y... emitiu, em 30/09/91, a apólice junta aos autos a fls. 17, na qual consta como segurado “C... L.da”, como período de vigência do contrato “um ano e seguintes”, como período inicial “17/07/91 a 01/11/91”, lendo-se nas condições especiais aí exaradas que o contrato

«garante a cobertura dos trabalhadores e respectivos salários constantes das folhas de férias» e que «os direitos e obrigações desta apólice que pertenciam a D... são transferidos para C... L.da ».

q) Em 01/01/2000, a Companhia de Seguros X... S.A. emitiu a apólice junta aos autos a fls. 18, na qual figura como tomador “C... L.da”, como prazo de duração do contrato “um ano e seguintes”, como modalidade de “seguro por folha de férias” e que “garante a cobertura dos trabalhadores e

respectivos salários constantes das folhas de férias, pessoal seguro na base de 14 meses/ano”.

r) Em 07/11/2000, a Companhia de Seguros X... S.A. emitiu a apólice junta aos autos a fls. 19, na qual figura como tomador “C... L.da”, como prazo de duração do contrato “um ano e seguintes”, como modalidade de seguro

“seguro por folha de férias” e que “garante a cobertura dos trabalhadores e respectivos salários constantes das folhas de férias, pessoal seguro na base de 14 meses/ano”.

s) A Ré C... L.da entregou na Ré Companhia de Seguros X... S.A. a denominada “relação de pessoal seguro do mês de Setembro de 2001”, junta aos autos a fls. 20, na qual declara que o Autor foi admitido em 12/09, como aprendiz de serralheiro, tendo trabalhado nesse mês durante 19 dias, e tendo recebido a título de ordenado 42.435$00 e 9.165$00 a título de subsídio de alimentação.

t) Entregou junto da mesma Ré a “relação de pessoal seguro do mês de

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Outubro de 2001”, junta aos autos a fls. 152, na qual declara que o Autor detém a categoria de aprendiz de serralheiro, tendo trabalhado nesse mês 30 dias, e auferiu 67.000$00 de ordenado e 15.510$00 de subsídio de

alimentação.

u) E entregou-lhe a “relação de pessoal seguro no mês de Novembro de 2001”, junta aos autos a fls. 153, na qual declara que o Autor detém a categoria de aprendiz de serralheiro, trabalhou nesse mês 14 dias, tendo auferido 31.268

$00 de ordenado e 6.345$00 de subsídio de alimentação, estando de “baixa Seg. 14/11”.

v) No art. 10º, n.º 3 das condições gerais do contrato de seguro celebrado entre as Rés consta o seguinte: «Se a pessoa segura for praticante, aprendiz ou estagiário, ou se estiver em qualquer situação que deve considerar-se de formação prática, a retribuição segura deve corresponder à retribuição mensal média ilíquida de um trabalhador da mesma empresa ou empresa similar e categoria profissional correspondente à sua formação, a

aprendizagem ou estágio».

x) No telhado referido em c) existia uma clarabóia coberta de telhas de fibra de vidro.

z) Nessa clarabóia existia um buraco derivado de um pequeno incêndio que, tempo antes, se dera na caldeira da fábrica onde a equipa dos trabalhadores da Ré C... L.da trabalhava.

Das respostas aos quesitos da base instrutória (entre parêntesis, indica o n.º do quesito em causa):

aa) O telhado referido em f) era composto por várias quebras de água e a cobertura da quebra de água onde se encontrava o Autor quando se deu o acidente era composta por duas fiadas de telhas de zinco, sendo que na parte central dessa quebra de água a cobertura era comporta por três fiadas de telhas, sendo que as fiadas das extremidades eram compostas por telhas de zinco enquanto a fiada do centro era composta por telhas de fibra de vidro (1º).

bb) Antes de iniciar os trabalhos referidos em f), o encarregado da Ré C...

L.da instruiu todos os trabalhadores desta afecta aos trabalhos, incluindo o Autor, que na movimentação em cima do telhado deveriam caminhar na direcção dos parafusos que prendiam as telhas à estrutura metálica que suportava o telhado (2.º).

cc) No decorrer dos trabalhos o Autor caiu de cima do telhado da zona da fiada composta pelas telhas de fibra de vidro (3.º, 4.º, 5.º, 6.º e 7.º).

dd) Essa queda processou-se de uma altura de oito metros (8.º).

ee) A cobertura da quebra de água onde se encontrava o Autor quando se deu o acidente, na parte que era coberta por fiadas de telhas de zinco, era

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composta por chapas de zinco duplo com isolamento interior (9.º).

ff) Essas chapas de zinco tinham resistência para suportar mais de cem quilos de peso (10.º).

gg) Os trabalhos que a Ré C... estava a executar consistiam na

substituição da totalidade das chapas de fibra de vidro e de algumas chapas de zinco que se encontrassem danificadas (14.º).

hh) Esse trabalho era efectuado tirando uma a três das chapas a substituir e colocando-se em seguida as chapas novas (15.º).

ii) Para a execução daquele trabalho os trabalhadores apenas careciam de circular sobre as chapas de zinco (16.º).

Resposta aos quesitos elaborados no decurso da audiência (fls. 194):

jj) Na altura da queda estavam em cima do telhado a efectuar os trabalhos, pelo menos, seis trabalhadores (I).

kk) Nenhum desses trabalhadores usava cinto de segurança ou qualquer outro dispositivo contra quedas em altura (II).

ll) O telhado da fábrica tinha a toda a sua volta uma parede (platibanda), que era mais alta que o telhado (III).

mm) A quebra de água onde se encontrava o Autor quando se deu a queda tinha 8 metros de comprimento (IV).

nn) Entre a base e o topo dessa quebra de água interpunha-se uma inclinação de 1,75 metros de altura (V).

Decisão proferida no apenso:

oo) Em consequência directa e necessária das lesões emergentes do acidente o Autor ficou afectado de 7,5% de I.P.P.

*

Uma das questões suscitadas pela companhia de seguros prende-se com a decisão da matéria de facto. Com efeito, aquela recorrente impugnou as respostas dadas aos quesitos 2.º, 10.º e 16.º que na sua opinião deviam ter sido dados como não provados, com base nos depoimentos prestados pelo autor e pelas testemunhas E..., F..., G... e H..., as únicas, aliás, que foram inquiridas.

Importa, por isso, conhecer da referida impugnação, uma vez que, nesta parte, não há razões para rejeitar o recurso, uma vez que a recorrente deu

cumprimento ao disposto nos n.ºs 1 e 2 do art. 690.º-A do CPC.

Os quesitos em questão tinham o seguinte teor:

2.º - Antes de iniciar os trabalhos referidos em F), o encarregado da ré C...

L.da instruiu todos os trabalhadores desta, afectos aos trabalhos, que na

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movimentação em cima do telhado deveriam caminhar apenas pela bordadura do telhado e nunca transitar pelo seu meio, nem se aproximarem da clarabóia?

10.º - E essas chapas de ferro tinham resistência para suportar centenas de quilos de peso?

16.º - E para a execução do mesmo (trabalho), os trabalhadores apenas careciam de circular sobre as chapas de ferro?

E as respostas que receberam foram as seguintes:

Quesito 2.º: Antes de iniciar os trabalhos referidos em f), o encarregado da Ré C... L.da instruiu todos os trabalhadores desta, afectos aos trabalhos, incluindo o Autor, que na movimentação em cima do telhado deveriam caminhar na direcção dos parafusos que prendiam as telhas à estrutura metálica que suportava o telhado..

Quesito 10.º: Provado apenas que essas chapas de zinco tinham resistência para suportar mais de cem quilos de peso.

Quesito 16.º: Provado que para a execução daquele trabalho, os trabalhadores apenas careciam de circular sobre as chapas de ferro.

Ora, ouvidas atentamente as três cassetes da gravação da prova, não vemos qualquer razão para alterar as respostas dadas aos quesitos em causa, muito menos para os dar pura e simplesmente como não provados. Com efeito, relativamente à resposta dada ao quesito 2.º, o próprio autor reconheceu que lhes foi dito para andarem por cima da estrutura metálica, o que foi

confirmado pelas testemunhas E... e G... Quanto à resposta dada ao quesito 10.º, a testemunha E... disse que as chapas metálicas (zincadas) aguentavam com duas ou três pessoas e a testemunha G... disse que aguentavam perfeitamente o peso de um pessoa. Aliás, como resulta do depoimento desta testemunha, eram em cima das chapas de zinco que ele andava. Por sua vez, quanto à resposta dada ao quesito 16.º, ela decorre dos depoimentos de todas as testemunhas, nomeadamente do depoimento da testemunha G... (que era o chefe de equipa).

Mantém-se, por isso, nos seus precisos termos a decisão proferida sobre a matéria de facto.

3. Recurso de agravo

Relativamente ao recurso de agravo importa ter presente o disposto no n.º 2 do art. 710.º do CPC, nos termos do qual os agravos só são providos quando a infracção cometida tenha influído no exame ou decisão da causa ou quando, independentemente da decisão do litígio, o provimento tenha interesse para o

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agravante.

Ora, como já foi referido, o recurso de agravo tem por objecto o despacho que mandou desentranhar os três documentos cujas cópias constam de fls. fls.107, 108 e 109 dos autos. Tais documentos mais não são do que declarações

recolhidas pela seguradora, junto do sinistrado e das testemunhas G... e H..., acerca das circunstâncias em que o acidente ocorreu.

O interesse do agravante na manutenção dos documentos nos autos prende-se apenas com a decisão do litígio e, por isso, o agravo só podia ser provido caso se verificasse que o desentranhamento não devia ter sido ordenado e que o mesmo tinha tido influência naquele decisão. Todavia, facilmente se constata que os ditos documentos nenhuma influência podiam ter tido na decisão da causa, uma vez que os seus autores foram todos ouvidos na audiência de discussão e julgamento, onde tiveram ocasião de mais detalhadamente

explicar as circunstâncias em que o acidente ocorreu. Tal circunstância seria o suficiente para negar provimento ao recurso, nos termos do n.º 2 do citado art. 710.º.

De qualquer modo, ainda que assim não fosse, sempre se dirá que a junção dos ditos documentos foi bem indeferida, uma vez que, como já foi dito, se traduzem em depoimentos prestados fora do processo, sem garantias de

contraditório, o que a lei não permite, salvo nas situações referidas nos artigos 638.º-A e 639.º do CPC, que no caso não ocorreram.

4. Recurso de apelação da ré-seguradora

O objecto do recurso em apreço restringe-se à questão de saber se o acidente ocorreu ou não por culpa da co-ré entidade empregadora. Tal culpa, segundo a seguradora, resultaria da não utilização de meios de protecção contra quedas e de o sinistrado ter sido enviado para uma zona de risco sem ter a necessária formação e preparação.

Relativamente à não utilização de meios de protecção contra quedas em altura, nomeadamente o cinto de segurança, na sentença recorrida diz-se o seguinte:

«A Ré seguradora alega que, nos termos do disposto nos arts. 18º, n.º 1, al. a) e 37º, n.º 2 da LAT, apenas é subsidiariamente responsável pelas

consequências emergentes do acidente uma vez que este ocorreu por culpa exclusiva da co-Ré entidade patronal, que não facultou ao Autor qualquer dispositivo de segurança individual ou colectiva.

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Decorre das disposições legais invocadas pela Ré seguradora que quando o acidente resulte de falta de observância de regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho, é responsável, em primeira linha, pelas consequências dele emergentes a entidade patronal, que fica constituída na obrigação de

indemnizar o trabalhador em termos agravados, respondendo a seguradora apenas a título subsidiário e nos termos gerais, isto é, sem qualquer

agravamento.

Para que actue este regime legal torna-se porém necessário que se verifiquem os seguintes pressupostos cumulativos: a- que ocorra uma situação de falta de observância de regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho; b- que o acidente seja consequência directa e necessária da inobservância dessas regras de segurança, higiene e saúde no trabalho.

O ónus da alegação e prova da factualidade integrativa da verificação de tais pressupostos legais impende, nos termos do n.º 2 do art. 342º do Cód. Civil, sobre a seguradora, uma vez que perante a existência de contrato de seguro incumbe àquela o ónus de alegação e prova do facto impeditivo da sua

responsabilidade.

No caso presente, embora a Ré seguradora não tenha concretizado quais os dispositivos de segurança individual e/ou colectiva que, na sua perspectiva, não foram facultados pela Ré patronal ao Autor e cuja falta foi causal do acidente, na sequência da discussão realizada na audiência de julgamento, veio a apurar-se que o Autor, na altura da queda, não usava cinto de

segurança nem qualquer outro dispositivo contra quedas, não obstante estar a trabalhar em cima de um telhado, a uma altura de oito metros do solo,

importando consequentemente averiguar se o não uso daquele do cinto configura uma situação de violação de regras de segurança.

Emerge do art. 44º do Dec. Lei n.º 41.821, de11/08/58 que nos trabalhos a realizar em cima de telhados, o não uso de cinto de segurança nem sempre configura uma situação de violação de regras de segurança. É que o uso de tais dispositivos de segurança só é legalmente exigível quando o telhado, pela sua inclinação, natureza, estado da superfície, condições atmosféricas, etc.

ofereça perigo de queda em altura.

Ora, a circunstância de, na altura da queda, o telhado onde o Autor trabalhava ter a toda a sua volta uma parede (platibanda) mais alta que o telhado, a

escassa inclinação desse telhado – a quebra de água onde o Autor se

encontrava tinha 8 metros de comprimento e entre a sua base e o seu topo interpunha-se uma inclinação de 1,75 metros de altura – aliada à circunstância de, na execução dos trabalhos, os trabalhadores precisarem apenas de

circular sobre as chapas de zinco que cobriam o telhado e o facto destas

chapas terem resistência para suportar mais de cem quilos de peso, levam-nos

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a concluir que, no caso em análise, não se encontra demonstrado que na execução dos trabalhos que o Autor efectuava quando se deu a queda existia uma situação de risco de queda tal que reclamasse o uso pelo último e demais trabalhadores de cinto de segurança ou de outro dispositivo de segurança contra quedas em altura.

E não estando demonstrado a realidade acabada de expor importa concluir que a Ré seguradora não logrou demonstrar nos autos que no acidente em apreço tivesse existido uma situação de violação de regras de segurança no trabalho.»

Estamos inteiramente de acordo com a fundamentação produzida pelo M.mo Juiz e dispensamo-nos de outras considerações no que diz respeito à violação das regras de segurança pela não utilização de meios de protecção contra quedas em altura.

Relativamente à alegada culpa da entidade empregadora por ter mandado o sinistrado trabalhar para cima do telhado sem ter formação e preparação para tal tipo de trabalho, o que segundo a recorrente constituiria uma violação do disposto na alínea f) do n.º 2 do art.º 8.º do D.L. n.º 441/91, de 14/11, diremos que tal violação, salvo o devido respeito, também não existe.

Nos termos da disposição legal citada, o empregador é obrigado a assegurar aos trabalhadores condições de segurança, higiene e saúde em todos os aspectos relacionados com o trabalho, devendo, para tal efeito, aplicar as medidas necessárias, tendo em conta, entre outros, o princípio de que o acesso a zonas de risco grave só deve ser permitido a trabalhadores com aptidão e formação adequada e apenas quando e durante o tempo necessário.

A recorrente entende que não era razoável mandar o sinistrado para cima do telhado, sendo ele um mero aprendiz e estando apenas há dois meses ao serviço da co-ré entidade patronal. Mas, salvo o devido respeito, não nos parece que seja assim. Tal só aconteceria se o telhado onde o trabalho se desenrolava pudesse ser considerado como um local de risco grave, o que da matéria de facto provada não resulta, certo que tal prova pertencia à

seguradora, nos termos do art.º 342.º, n.º 2, do CC.

Com efeito, como resulta da factualidade provada, não havia risco de queda para o exterior do telhado, por existir uma platibanda a toda a sua volta, mais alta do que o telhado, as chapas de zinco tinham resistência para suportar mais de 100 Kg de peso e a inclinação do telhado não era muito acentuada (8

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metros de cumprimento e 1,75 de altura). Deste modo, o único risco de queda residia nas chapas de fibra de vidro, mas, como também ficou provado, para realizar o trabalho em questão não era preciso andar por cima dessas chapas.

Bastava ter o cuidado de não as pisar para que a queda não acontecesse e, tendo o sinistrado 17 anos, bem se pode dizer que esse dever de cuidado estava perfeitamente ao seu alcance.

Improcede, pois, o recurso em apreço.

5. Recurso da entidade empregadora

O objecto do recurso interposto pela entidade empregadora prende-se com o montante do salário transferido.

Na sentença recorria entendeu-se que a responsabilidade da seguradora era restrita ao salário que, relativamente ao sinistrado, foi declarado na folha de féria do mês do acidente, mas a entidade patronal considera que a

responsabilidade da seguradora também abrange o salário equiparado, uma vez que o sinistrado era aprendiz e que como tal era indicado nas folhas de férias. Invoca, para tal, o disposto no n.º 3 do art. 10.º das Condições Gerais da Apólice, nos termos do qual “se a pessoa segura for praticante, aprendiz ou estagiário, ou se estiver em qualquer situação que deva considerar-se de

formação prática, a retribuição deve corresponder á retribuição anual média ilíquida de um trabalhador da mesma empresa ou empresa similar e categoria profissional correspondente à sua formação, aprendizagem ou estágio.”

Todavia e salvo o devido respeito, a recorrente entidade empregadora não tem razão. Com efeito, está provado que o contrato de seguro por ela celebrado com a co-ré X... era na modalidade de prémio variável, também designado por folhas de férias. Ora, nos termos do art. 16.º, al. c) da respectiva Apólice Uniforme (aprovada pelo Regulamento n.º 27/99, Norma n.º 12/99-R, do I.S.P., de 8 de Novembro de 1999, publicada no D.R., II Série, de 30.11.99, pág.

18.062 e seguintes, tratando-se de prémio variável, o tomador do seguro é obrigado “a enviar mensalmente à seguradora, até ao dia 15 de cada mês, as folhas de retribuições pagas no mês anterior a todo o seu pessoal e que devem ser duplicados ou fotocópias das remetidas à segurança social, devendo ser mencionada a totalidade das remunerações previstas na lei, como parte

integrante da retribuição para efeito de cálculo, na reparação por acidente de trabalho, devendo ainda ser indicados os praticantes, os aprendizes e os

estagiários.”

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E nos termos do art. 12.º da referida Apólice Uniforme, no caso de a retribuição declarada ser inferior à efectivamente paga, ou não havendo declarações de qualidade de praticante, aprendiz ou estagiário, e respectivas retribuições de equiparação, o tomador do seguro responderá pela parte excedente das indemnizações e pensões e proporcionalmente pelas despesas de hospitalização, assistência clínica, transportes e estadas, ... (sublinhado nosso).

Ora, como resulta do citado art. 12.º, o tomador do seguro, tratando-se de trabalhadores aprendizes, terá de indicar nas folhas de férias não só a

retribuição realmente paga e sua qualidade de aprendizes, mas também terá de indicar a retribuição equiparada, nos termos do n.º 3 do art. 10.º.

No caso em apreço, a entidade patronal limitou-se a indicar a retribuição efectivamente paga e a indicar a qualidade de aprendiz, mas não indicou a retribuição equiparada. Por isso, sobre ela recai a obrigação de pagar a

pensão e a indemnização relativa à diferença entre a retribuição equiparada e a retribuição declarada na folha de féria do mês do acidente, o que implica a improcedência do recurso.

6. Recurso subordinado do autor

Este recurso ficou prejudicado pela improcedência do recurso de apelação interposto pela seguradora.

7. Decisão

Nos termos expostos, decide-se negar provimento a todos os recursos.

Custas pelos vencidos (seguradora e entidade patronal).

PORTO, 14 de Junho de 2004 Manuel Joaquim Sousa Peixoto João Cipriano Silva

José Carlos Dinis Machado da Silva

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