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Contextos interculturais de integração no mercado de trabalho: os aprendentes chineses de PLE em Portugal

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Academic year: 2021

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Contextos interculturais de integração no mercado de trabalho:

O caso dos aprendentes chineses de Português Língua Estrangeira

em Portugal

Xinna Han

Maio, 2017

Dissertação de Mestrado em Português como Língua Segunda e

Estrangeira

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Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Português como Língua Segunda e Estrangeira, realizada sob a orientação científica da Profª. Doutora Ana Maria Martinho

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Contextos interculturais de integração no mercado de trabalho:

O caso dos aprendentes chineses de Português Língua Estrangeira em Portugal

Xinna Han

RESUMO

Nas últimas décadas, a China tem sido palco de profundas transformações económicas e sociais, resultantes da política de abertura e das reformas levadas a cabo em anos recentes. Com uma classe média endinheirada e altamente competitiva, o sector da educação está também numa fase de transição, e por isso assiste-se cada vez mais a estudantes chineses que prosseguem no exterior a sua educação superior, nomeadamente em Portugal. Esta migração de estudantes enquadra-se na chamada Nova diáspora

chinesa e está a ter um grande impacto nas finanças, na economia e no mercado de

trabalho em Portugal, onde, cada vez mais, se assume o domínio da língua chinesa como uma mais-valia no momento de recrutar. Esta dissertação pretende compreender a aposta que os jovens chineses fazem nos dias de hoje quando decidem estudar Português Língua Estrangeira. As famílias chinesas têm muitas vezes de fazer grandes sacrifícios para que os seus filhos possam estudar na universidade e tirar um curso com maior empregabilidade, e os próprios estudantes têm de trabalhar para poderem pagar as despesas na Europa.

Sobretudo devido ao aumento das relações de troca com países de língua portuguesa como Angola, a licenciatura de Português passou, em menos de uma década, a estar no foco destes jovens, que lutam pelo seu lugar no mundo. Mas, afinal, até que ponto compensa arriscarem numa língua completamente diferente da sua e difícil de aprender? Estes jovens conseguem integrar-se na sociedade portuguesa apesar da latente barreira linguística e cultural? A presente dissertação analisa o percurso dos jovens chineses desde que começam a estudar português na China, analisando motivações e contextos socioeconómicos da sua escolha; a sua chegada a Portugal e respetiva experiência de aprendizagem nas universidades portuguesas e de integração social; e termina com a análise do período pós-licenciatura em Portugal e a sua entrada no mercado de trabalho. A pesquisa para o tema foi feita através de revisão da literatura especializada e da observação direta e indireta, designadamente através de questionário aplicado a

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estudantes chineses presentemente em Portugal, da faixa etária entre os 20 e os 30 anos, em frequência do curso de PLE ou situação de procura iminente do primeiro emprego.

Palavras-chave: Estudantes Chineses; Integração Intercultural; Português Língua Estrangeira (PLE); Migração; Haigui (Sea Turtles).

ABSTRACT

Over the last decades, China has staged deep economic and social transformations, resulting from the opening policies taken by this country in more recent years. With a wealthy and highly competitive middle class, the education sector is also in transition, so we increasingly see more Chinese students going abroad to continue their academic education, namely in Portugal. These students’ migration conforms to the so-called New Chinese Diaspora and has been having a huge impact in financial, economic and labor market in Portugal, where increasingly the knowledge of the Chinese language is a huge asset when recruiting. This dissertation aims at understanding the challenge taken this days by the young Chinese when they decide to study Portuguese as a Foreign Language.

The Chinese families, most of the time, have to make big sacrifices so that their children can go to the university and take a course with bigger employability, and the students themselves have to work to pay their expenses in Europe. Mostly due to the increase of the economic trade relations with the Portuguese speaking countries, such as Angola, the Major in Portuguese as become, in less than a decade, the focal point of this youth, struggling for their place in the world. But one could ask if when looking for a degree is worth the risk when learning a language completely different and difficult to learn? Does this youth succeed in integrating in the Portuguese society apart from the language and cultural barriers?

The present thesis analyses the journey of the Chinese youth since they start studying Portuguese in China, looking at their motivations and at the socio economic contexts of their choice; it also reflects on their arrival in Portugal and the respective learning experience in the Portuguese universities and of social integration; and finishes

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by analyzing the post-graduation period and their entrance in the labor market. The research for this topic was made by reviewing the existing specialized literature and the direct and indirect observation, namely trough an inquiry to Chinese students presently in Portugal, ages from 20 to 30 years old, in the situation of the imminent search for the first employment.

Key-words: Intercultural Integration; Chinese Students; Portuguese as a Foreign Language; Migration; Haigui (Sea Turtles).

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ÍNDICE

i. Introdução ... 1

ii. Enquadramento do estudo ... 2

ii.i. Formulação do problema ... 4

ii.ii. Objetivo do estudo ... 5

ii.iii. Descrições de termos ... 6

ii.iv. Definição da problemática ... 8

ii.v. Definição do objeto ... 8

ii.vi. Metodologia ... 9

1. PARTE I - A língua Portuguesa na China ... 10

1.1. O ensino-aprendizagem de PLE na China ... 10

1.2. A expansão do ensino de PLE na China ... 12

1.3. A afirmação da importância económica do Português ... 16

1.4. Investimento da China em Portugal ... 17

1.5. A escolha do Português: expectativas de empregabilidade ... 19

2. PARTE II - O percurso em Portugal dos alunos de PLE ... 21

2.1. Mobilidade internacional dos alunos chineses ... 21

2.2. A escolha de Portugal como destino ... 23

2.3. A integração dos estudantes chineses ... 25

2.4. Características do aprendente Chinês ... 29

2.5. Desafios na aprendizagem do PLE ... 32

3. PARTE III - Integração dos alunos de PLE no mercado de trabalho ... 39

3.1. Mercado de trabalho e conjuntura internacionais ... 39

3.2. O Fenómeno do retorno de cérebros chineses: as “tartarugas marinhas” ... 41

3.3. Oportunidades profissionais para os alunos de PLE ... 43

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4.1. Caracterização da amostra ... 47

4.2. Recolha de dados ... 47

4.3. Tratamento de dados ... 48

4.4. Análise de dados ... 48

4.4.1. Perfil global dos aprendentes de PLE ... 48

4.4.1.1. Motivações para estudar PLE ... 49

4.4.1.2. Proficiência na Língua Portuguesa ... 49

4.4.1.3. Aquisição linguística e integração ... 54

4.4.1.4. Conciliação do trabalho com estudo ... 57

4.4.1.5. Conclusões sobre o perfil geral dos inquiridos ... 58

4.4.2. Aprendentes de PLE a frequentar o curso ... 59

4.4.2.1. Situação académica dos aprendentes ... 60

4.4.2.2. Expectativas profissionais pós-curso ... 60

4.4.2.3. Condições de trabalho pretendidas ... 61

4.4.2.4. Conclusões sobre a situação e expectativas dos estudantes ... 62

4.4.3. Alunos de PLE no mercado de trabalho ... 63

4.4.3.1. Situação profissional pós-curso ... 63

4.4.3.2. Condições laborais ... 64

4.4.3.3. Continuação dos estudos de PLE ... 65

4.4.3.4. Conclusões sobre ex-alunos de PLE no mercado de trabalho ... 65

4.5. Resumo da análise ... 66

5. Conclusão ... 68

6. Bibliografia ... 71

7. Lista de Tabelas ... 75

8. Anexos ... 75

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8.2. Apêndice B-Gráficos do Tratamento de Dados ... 79 8.3. Quadro Europeu Comum de Referência para Línguas (QECRL) ... 88

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Lista de Abreviaturas

DGEEC - Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência LP - Língua Portuguesa

PALOP - Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa PLE - Português Língua Estrangeira

QECRL - Quadro Europeu Comum de Referência para Línguas SEF - Serviço de Estrangeiros e Fronteiras

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Já não são crianças, mas ainda não sabem bem o que o futuro lhes reserva. Sonhos, muitos, mas não há tempo para sonhar. Este é o momento; o momento de avidamente lutar pelo seu lugar no mundo. Tantos outros ficaram para trás, por isso não se pode perder tempo. Às costas, carregam o fardo de mudar a vida da sua família, trazendo a honra aos pais e, diriam os mais tradicionais, aos próprios antepassados. Agora na casa dos vinte…Mais uns anos e é necessário constituir família, arranjar um companheiro, casar, ter filhos; juntar dinheiro para uma casa - talvez um dia, quem sabe, num país mais barato que a China, seja possível comprar um apartamento. Ou quem sabe, voltar milionário e comprar um belo T3 em Xangai, com vista para o rio? -Não há tempo para sonhar. Só com o melhor emprego do mundo. Quem sabe ele não está do outro lado do planeta? Numa paisagem paradisíaca do Nordeste brasileiro? Ou numa fábrica de indústria de ponta nos arredores de Maputo? Ou num confortável escritório com ar condicionado da singela Lisboa, onde o ritmo de vida é mais lento e há vagar para ler poesia e beber um café? O filme da sua vida começou a ganhar cor agora. As amarguras do passado já lá vão; a solidão de estudante dedicado, os amores perdidos, os amigos não esquecidos na terra distante; a voz da sua mãe na cozinha, enquanto prepara a sua comida preferida…O aroma incomparável da comida chinesa…Não. Talvez mais tarde haja tempo para saborear a vida. As cidades pulsam na China a um ritmo imparável, como um comboio veloz que não pára quando passa por nós. É necessário saltar, em andamento, para apanhar um bom lugar em primeira classe. Os estrangeiros abriram mais uma empresa na sua província. Grande investimento. Certamente estão a recrutar quem fale a sua língua. Que bom seria se a sua voz pudesse ser o interlocutor deles, o seu guia, para os seus negócios de milhões, nesta China de sonho que se espraia a seus pés…

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i. Introdução

Todos os anos, os jovens chineses deparam-se com um grande desafio: a procura do primeiro emprego. Para aqueles que tiveram a sorte de conseguir tirar um curso universitário, este é um momento decisivo. É o momento de entrada na sociedade; de começar a contribuir para a economia familiar; de dar a esperança à família que tudo investiu para a sua formação, às vezes juntando todos os bens que possuía para o fazer. Mas não estão sozinhos na fila: 15 milhões é o número de licenciados chineses que saíram para o mercado trabalho em 20151. Mais 5 milhões do que toda a população portuguesa junta. São números avassaladores, tal como a competitividade que lhes está associada. Por isso, na hora de escolher um curso há que planear bem as coisas. Os chineses que estão a terminar o ensino secundário consultam, por isso, os rankings das melhores universidades e dos cursos universitários com mais saídas profissionais no mercado nacional e internacional nesse ano. Entre os cursos em destaque, nos últimos anos, está sempre a Língua Portuguesa. Mas isso não é surpresa para qualquer pessoa minimamente atenta às notícias internacionais. Os chineses investem em Portugal e em força por toda a Europa, comprando as dívidas dos países europeus e ações de grandes empresas nacionais. Os chineses estão em Angola e Moçambique, e noutros países africanos, onde constroem grandes cidades e ajudam os países em desenvolvimento a criar a infraestrutura necessária à vida dos seus povos, em troca de matérias-primas e privilégios comerciais. Estão em grande peso no gigante Brasil, país rico em recursos naturais, porta de entrada para a América do Sul. E todos estes sítios têm uma coisa em comum: a sua língua- a Língua Portuguesa.

Que oportunidades profissionais aguardam os jovens chineses que estudam português? Onde seguirão eles a sua carreira profissional, numa empresa chinesa ou portuguesa? Qual será o seu primeiro salário? Será que o seu nível de língua lhes permite usar a língua portuguesa como língua de trabalho? Terão valido a pena todos os anos de sacrifício e dedicação? O mercado português procura cada vez mais falantes bilingues Português-Chinês. Não só pelos investimentos chineses nas empresas portuguesas, pelos vários bancos e associações empresariais chinesas que abrem todos os dias em Portugal, mas também pelos vários milhões de turistas chineses que visitam agora Portugal,

1 http://observador.pt/2015/03/10/cerca-de-15-milhoes-de-jovens-chineses-entrarao-no-mercado-de-trabalho-em-2015/

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gastando centenas de euros em cada compra de luxo. A comunidade chinesa conta já com 20 mil chineses em Portugal, será que esta nova vaga de estudantes chineses vem para ficar?

Esta dissertação divide-se em 4 grandes partes ou capítulos. A Parte I - A Língua

Portuguesa na China dedica-se à análise do estado da aprendizagem do Português na

China e da sua expansão nas últimas décadas em resultado da afirmação económica desta língua, consequência das relações da China com os PALOP e com o investimento chinês no mundo. Ao mesmo tempo, identificam-se os motivos da escolha do Português associados a expectativas de empregabilidade dos jovens chineses.

A Parte II - O Percurso em Portugal dos Alunos de PLE pretende fazer um enquadramento da mobilidade internacional dos alunos chineses, nomeadamente para Portugal, e da sua integração na universidade e na sociedade portuguesas; são ainda estudadas as principais características dos aprendentes chineses de PLE e os respetivos desafios da aprendizagem.

A Parte III - Integração dos alunos de PLE no mercado de trabalho reporta a situação do mercado de trabalho e da conjuntura internacional no momento do nosso estudo, nomeadamente a afirmação da China como potência económica internacional, e o consequente retorno dos cérebros chineses à pátria. São também apontadas as oportunidades profissionais para os alunos de PLE na atualidade, dadas as suas competências bilingues.

A Parte IV - Trabalho de Campo é o cerne desta dissertação e relata os resultados da nossa investigação junto dos estudantes chineses de PLE em Portugal no ano letivo de 2016/2017, analisando o seu perfil global, para depois aprofundar, por um lado, a situação dos aprendentes de PLE ainda a frequentar o curso e igualmente a situação dos alunos de PLE que se encontram já no mercado de trabalho.

ii. Enquadramento do estudo

O nosso estudo sobre a integração dos alunos chineses de PLE no mercado de trabalho português assume-se como pioneiro na temática abordada, o que nos leva a assumir algum grau de risco e atrevimento, ao caminhar por vias ainda não muito exploradas no mundo académico em Portugal e até mesmo a nível internacional. No entanto, pela atualidade da questão e pelo impacto profundo que esta vinda de estudantes

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chineses representa a nível global, como espelho das tendências migratórias chinesas para outros países europeus, e a nível local, mostrando as dinâmicas no mercado de trabalho português associadas às competências bilingues chinês-português, resolvemos dedicar-nos ao seu estudo.

Este trabalho enquadra-se na temática da língua portuguesa como língua segunda e da sua importância no contexto de migração de estudantes internacionais, nomeadamente na sua integração no mercado de trabalho. A nível da aprendizagem e ensino da Língua Portuguesa como língua estrangeira para chineses, o nosso “guia” foram os vários trabalhos de investigação de Ançã e Grosso e também os estudos de Gonçalves (2016), Caldeira (2012) e Silva (2010) sobre a importância da língua no processo de integração dos migrantes, enquanto ferramenta que os torna agentes com participação na vida social e ativa, de forma autónoma e sempre em diálogo com a sua cultura de origem.

As questões interculturais de integração dos estudantes chineses de Português, bem como as representações dos mesmos foram igualmente uma base de sustentação da nossa dissertação, presente em Dias (2016), Liu (2012), Meireles (2008), Mourato (2014), bem como as expectativas de empregabilidade dos mesmos, analisadas em Pereira (2014).

Abordam-se nesta dissertação aspetos contextualizantes da linguaculture (como em Agar) dos estudantes chineses e da sua influência na aprendizagem do Português enquanto língua estrangeira, no processo necessário de adaptação a um novo ambiente linguístico e cultural transportado pela aprendizagem da língua em imersão. Acreditamos, tal como Silva (2010, p. 58) explicitou, que “A língua é o passaporte que nos permite o ingresso e a integração numa comunidade, quer sejamos cidadãos autóctones quer sejamos oriundos de outro Estado”. Ela é o principal requisito de uma integração plena e harmoniosa, e que, quando pouco proficiente, pode mesmo debilitar o exercício da cidadania e da harmonia social. Como fez ver este autor:

A falta de destreza na manipulação do código linguístico conduz, na vivência quotidiana, a uma perda de direitos. A língua pode tornar-se um factor de despromoção social e privar um cidadão de um direito ou incapacitá-lo para negociar ou reivindicar a sua posição e os seus interesses. […] um factor de discriminação e de segregação do estrangeiro ou daquele que é diferente. E pode mesmo constituir um factor ainda mais determinante que o da cor da pele ou da religião.

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Daí que a exclusão linguística seja o nosso principal alvo a combater e a estudar. E para tal, foi necessário analisar os diferentes fatores socioeconómicos e culturais que estão presentes na construção da identidade cultural e linguística dos aprendentes chineses de PLE e que influenciam a sua aprendizagem da língua portuguesa num contexto nacional e internacional, onde estes jovens vão depois afirmar-se como profissionais, como falantes bilingues, mas também e, sobretudo, como pessoas com a sua própria identidade. No nosso estudo, esta identidade é vista como em Stuart Hall, como um todo, constantemente em transformação e adaptação ao meio, o que traz também mudanças para esse meio, para a sociedade onde se vai inserir.

ii.i. Formulação do problema

O problema em análise nesta dissertação prende-se com a vinda dos jovens estudantes chineses de PLE para Portugal e a sua consequente necessidade de integração na sociedade portuguesa, nomeadamente no que diz respeito ao acesso ao mercado de trabalho, em contexto de procura do primeiro trabalho. Pretende-se saber quais os fatores de integração mais importantes para um estudante chinês de PLE que queira trabalhar em Portugal; que obstáculos encontra e que oportunidades considera que existem no mercado português.

Acreditamos que no final do curso de PLE em Portugal, o mercado de trabalho português oferece inúmeras oportunidades a estes jovens, pelo facto de falarem ambas as línguas e de o investimento chinês estar a florescer no momento presente em Portugal o que isso pode ser uma forte razão para estes jovens não voltarem à China para procurar emprego ou saírem de Portugal para irem trabalhar noutro país de língua portuguesa. No entanto, as diferenças culturais podem ser um entrave à sua permanência e a uma integração consolidada, e a tendência parece ser a de os jovens chineses se manterem num círculo de outros chineses quando é hora de escolher um posto de trabalho: intermediários chineses; emprego em empresas chinesas; patrões chineses; formas de trabalhar chinesas, etc. Ou até mesmo de voltarem, após o fim do curso, à sua terra natal, fazendo parte do grande grupo de jovens estudantes retornados à China ou, como são chamados, as

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“tartarugas marinhas” (“haigui”2). Por outro lado, questionamos se o nível de proficiência na língua portuguesa com que os alunos saem do curso é suficiente ou se pode apresentar-se como um entrave à entrada destes jovens no activo, incapacitando, até um certo nível, a utilização da língua portuguesa como língua de trabalho.

ii.ii. Objetivo do estudo

O objetivo desta dissertação prende-se com a intenção de apontar uma tendência na relação destes jovens chineses que vêm estudar PLE para Portugal com o mercado de trabalho português. A dissertação analisa várias dimensões da questão, com o fim de verificar se, num período máximo de 3 anos após o fim do curso de licenciatura em PLE em Portugal, os estudantes se integram ou não no mercado de trabalho português, nomeadamente, se conseguem ou não arranjar aqui o seu primeiro trabalho na área de estudo.

Consideramos que as questões interculturais envolvidas neste processo de migração de estudantes são bastante relevantes, nomeadamente pela experiência pessoal da autora desta dissertação, e que estão ainda pouco estudadas. Daí acharmos que o tema merece ser analisado cuidadosamente, tendo em vista uma melhoria dos processos de integração dos jovens chineses de PLE no mercado e na sociedade portuguesa, pois que a sua aposta na língua portuguesa e na vinda para Portugal é grande e pode ser também uma mais-valia para Portugal, enquanto país de acolhimento, reunindo condições para se tornar um destino de estudantes chineses a médio prazo. Assim, a minha tese tem como objetivo não só divulgar o que se tem feito no âmbito do ensino e da investigação em PLE a falantes de língua materna chinesa, mas também abrir portas à comunicação intercultural e motivar estudantes, docentes e pessoal na contínua descoberta do ensino-aprendizagem de PLE.

2 Haigui-em chinês 海hǎiguī, significa retornados do ultramar/estrangeiro; pronuncia-se da mesma forma que 海hǎi龟guī, tartaruga marinha, trocadilho que passou a ser utilizado pelos académicos e analistas chineses para designar a nova onda de estudantes chineses retornados, em resultado de encontrarem mais

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ii.iii. Descrições de termos

Antes de iniciar a apresentação propriamente dita do nosso trabalho, é importante referir que os aprendentes chineses da licenciatura de PLE pertencem ao grupo dos chamados “estudantes internacionais”. De acordo com o Relatório sobre os Estudantes Internacionais do SEF3, entende-se por estudante internacional no ensino superior:

(...) o nacional de país terceiro aceite por um estabelecimento de educação superior e admitido no território de um Estado-Membro para frequentar, a título de actividade principal, um programa de estudos a tempo inteiro conducente à obtenção de um título do ensino superior, reconhecido pelo Estado-Membro, nomeadamente um diploma, um certificado ou um doutoramento num estabelecimento de ensino superior, podendo abranger um curso de preparação para tais estudos, nos termos da sua legislação nacional. (REM, 2011: 129). Neste sentido, o nacional de país terceiro corresponde a um cidadão que não tenha a nacionalidade de um estado-membro da UE.

A entrada de estudantes internacionais em território nacional para efeitos de estudos requer, em primeiro lugar, a concessão de um visto de residência. Este visto reveste a natureza de visto nacional de longa duração. Posteriormente é pedida uma autorização de residência. O primeiro título tem como função regular a entrada de estrangeiros no país, sendo que o segundo título tem por objetivo habilitar os estrangeiros a permanecerem e a exercerem uma atividade em território nacional. A autorização de residência é concedida pelo SEF, válida por um período de um ano e renovável por iguais períodos. No caso em que os estudantes internacionais tenham permanecido em Portugal por um período igual ou superior a cinco anos, enquanto titulares de autorização de residência temporária, é-lhes conferido o benefício de uma autorização permanente.

Relativamente ao contacto dos estudantes internacionais com o mercado de trabalho português, a legislação portuguesa prevê que os estudantes internacionais titulares de autorização de residência para efeitos de estudo possam exercer uma atividade profissional subordinada, na medida em que a mesma não seja desenvolvida como atividade principal. Assim, os estudantes podem ter uma atividade profissional desde que

3A Imigração de Estudantes Internacionais para a União Europeia: O Caso Português, SEF,

Lisboa, 2012.

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a mesma decorra fora do período consagrado ao programa de estudos, a tempo parcial; para tal, devem obter autorização prévia por parte do SEF, ter um contrato de trabalho e estarem inscritos na segurança social. Importa notar que estes estudantes não estão autorizados a desenvolver uma atividade profissional independente. Quando terminam os estudos, os estudantes internacionais podem pedir um visto de trabalho. Uma vez titulares de autorização de residência para efeitos de exercício de atividade profissional, eles passam a ter os mesmos direitos laborais que um cidadão nacional e acesso às mesmas medidas de incentivo à empregabilidade, nomeadamente:

(…) inscrever-se no Centro de Emprego da sua zona de e candidatarem-se a emprego, gozando dos seguintes direitos: direito a um acolhimento eficiente e a um atendimento personalizado; direito à informação, designadamente oferta formativa e oferta de emprego, meio socioeconómico, profissões e condições de trabalho e emprego, benefícios sociais, mercado de emprego e mercado social de emprego; apoio técnico na elaboração do próprio projeto de inserção ou reinserção social e profissional; auxílio imediato e gratuito na procura de emprego que convenha às suas necessidades; direito a orientação profissional com vista a potenciar a sua empregabilidade; apoio técnico na procura ativa de emprego; direito a apoio à mobilidade profissional e geográfica; e proteção no desemprego nos termos da lei. Podem também beneficiar de prestações técnicas (no âmbito da orientação profissional) e aceder a outras medidas e programas de emprego e formação.4

Estas e outras políticas de inclusão de populações imigrantes em Portugal estão definidas no II Plano para a Integração dos Imigrantes. Este plano, estabelecido para o período entre 2010 e 2013, procurou juntar as instituições e os organismos relacionados com o acolhimento dos imigrantes e levar a cabo a execução e avaliação das políticas públicas, transversais e sectoriais, relevantes para a integração dos imigrantes e das minorias étnicas, bem como promover o diálogo entre as diversas culturas, etnias e religiões.

O apoio do governo e instituições públicas é de facto um fator muito relevante para a integração dos imigrantes, para que toda a sociedade possa compreender a importância de um acolhimento eficaz e harmonioso para o bem-estar social. E no caso

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dos estudantes internacionais, isso ainda é mais relevante pois os jovens são o futuro. Os estudantes internacionais são, segundo o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, “um incentivo a ambientes sociais e académicos multiculturais, promovendo a tolerância e o respeito por diferentes etnias, religiões e tradições. Por outro lado, contribuem e vivem experiências linguísticas diversificadas, quer através do conhecimento e/ou aperfeiçoamento da língua portuguesa, da partilha da língua materna, ou do desenvolvimento da comunicação em língua inglesa”5. Cabe, por isso, a cada membro da estrutura de acolhimento entender os benefícios de ter no seu país estes jovens e fazer o seu melhor na altura de os receber e integrar.

ii.iv. Definição da problemática

A presente dissertação pretende confirmar o nível de empregabilidade no caso dos estudantes chineses que vêm para Portugal estudar Português Língua Não Materna ou Língua Segunda e conhecer a sua relação com o mercado de trabalho português, no âmbito da procura do primeiro emprego e da melhoria das condições de empregabilidade futura. Uma vez que a principal motivação destes jovens para escolherem o curso de português é arranjar um bom emprego, até que ponto a aposta destes jovens chineses na Língua Portuguesa se mostrou uma mais-valia para encontrarem um bom trabalho? Esta é a questão-chave deste estudo, que coloca na balança vários elementos com o fim de fazer refletir as perspetivas de empregabilidade dos estudantes chineses de PLE que vêm estudar para Portugal.

ii.v. Definição do objeto

Pretende-se com esta dissertação compreender a situação atual dos estudantes chineses que frequentam a Licenciatura de Português Língua Estrangeira em Portugal e que estão em situação de entrada no mercado de trabalho ou que estejam a trabalhar há menos de 3 anos. São jovens ente os 20 e os 30 anos que, em geral, já estudaram um ou dois anos no curso de Licenciatura de Português na China e vêm para Portugal para aperfeiçoar as suas competências na língua portuguesa.

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Estes jovens partilham em grande parte os valores e características de um jovem estudante chinês em qualquer parte do mundo, no entanto para fazerem parte do nosso estudo necessitaram de reunir as seguintes condições:

- Escolha de Portugal para prosseguir os seus estudos de PLE

- Frequência em Portugal de parte ou totalidade de Licenciatura em Português Língua Estrangeira/Segunda há menos de 3 anos.

- Situação iminente de procura do primeiro trabalho, neste caso trabalho remunerado.

Estes jovens conseguem integrar-se na sociedade portuguesa apesar da latente barreira linguística? A língua portuguesa age ou não como uma “faca de dois gumes”, em que, por um lado, apresenta uma oportunidade de carreira profissional de sucesso e prosperidade, mas, por outro, exige esforços e sacrifícios monumentais a estes jovens, superiores ao próprio investimento? Qual a preparação que trazem das universidades chinesas? E, caindo de pára-quedas em Portugal, o que acontece quando se tenta aprender uma língua sem se estar ainda integrado na cultura local? Após o curso, qual o resultado da sua “aposta de tudo ou nada” quando se colocam os pesos nos pratos da balança? A barreira da língua é ultrapassada? Está o mercado de trabalho português disponível para absorver estes jovens? Ou será que eles ingressam diretamente no mercado de trabalho chinês?

ii.vi. Metodologia

O estudo levado a cabo inscreve-se numa metodologia qualitativo-interpretativa, compreendendo a perceção dos valores e das representações que os estudantes têm da sua experiência em Portugal de frequência de licenciatura de PLE e da entrada no mercado de trabalho português, desenvolvendo assim uma interação investigador-sujeito. A questão de partida é tanto indutiva como dedutiva, pois parte da observação de factos, como também de modelos e teorias reconhecidas. Pretendeu-se desenvolver uma aproximação à temática através de revisão da literatura especializada e da observação direta e indireta, designadamente através da realização de um questionário aos estudantes.

O trabalho de campo teve, por isso, um papel bastante importante na realização desta dissertação, pois que permitiu aferir dados que não estão ainda disponíveis em

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outros estudos sobre o mesmo tema. Os sujeitos do trabalho de campo serão os alunos chineses a estudar Português Língua Estrangeira/Língua Segunda numa universidade em Portugal, no período em que estudam PLE numa universidade portuguesa e no período posterior imediato, que corresponde ao fim da frequência da licenciatura de PLE em Portugal e à procura do primeiro emprego, até um período máximo de 3 anos. A investigação será realizada através de uma amostra aleatória de estudantes chineses, licenciados e mestres, com idades compreendidas entre os 20 e os 30 anos.

1. PARTE I - A língua Portuguesa na China 1.1. O ensino-aprendizagem de PLE na China

Na China, um país que representa em termos populacionais 18% da humanidade (1.368 milhões de habitantes6), a entrada no mercado de trabalho pode ser um grande desafio. Por muitas que sejam as oportunidades trazidas pelo desenvolvimento económico, a competitividade no mercado de trabalho é enorme. E as condições laborais de uma pessoa que tenha feito estudos de nível superior são bastante diferentes. Por isso, todas as famílias desejam que os seus filhos possam ir para a universidade. Como destaca Ye (2014, p. 42),

a grande motivação para a maioria dos jovens que se matriculam no ensino universitário na China é a possibilidade de arranjar um bom emprego, uma aspiração especialmente forte para os jovens provenientes de terras ou famílias pobres porque para eles o acesso ao ensino superior constitui praticamente a única oportunidade de mudar a sua própria vida, como também a sorte da família.

No entanto, ir para a universidade é ainda um sonho inalcançável para muitos jovens chineses. Segundo o relatório do Ministério da Educação chinês lançado em Março de 2016, ainda só 40% dos jovens entre os 18 e os 22 anos frequentam o ensino de nível terciário, estimando-se que por 2019 esse valor ronde os 50%.7. Na hora de escolher um curso, os chineses fazem uma cuidadosa prospeção de mercado, consultando os rankings das melhores universidades e dos cursos com mais saídas, nos quais se inclui o português, na categoria de Língua Estrangeira pouco falada. Fala-se de taxas de colocação de 100%:

6 http://24.sapo.pt/atualidade/artigos/um-em-cada-mil-chineses-e-milionario 7 http://www.chinadaily.com.cn/china/2016-04/08/content_24365038.htm

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“Enquanto a maioria dos finalistas do ensino superior da China lutava ao máximo por um posto de trabalho, não era raro ver um finalista em Estudos Portugueses hesitar em optar entre várias ofertas de emprego.” (Ye, 2014, p. 53). A escolha do Português prende-se com razões económicas relacionadas sobretudo com a participação das empresas chinesas na reconstrução nacional pós-guerra de Angola e da intensificação das relações económico-comerciais entre a China e os países lusófonos. (Ye, 2014, p. 43). Calcula-se que neste momento “entram no mercado 300 graduados, um aumento de mais de 10 vezes num período de 10 anos”.

Apesar de existir uma história de mais de 500 anos de relações diplomáticas com Portugal, e da presença portuguesa em Macau até 1999, só nos últimos anos o país começou a ter maior registo de atenção da parte chinesa. A própria língua portuguesa, a sexta língua mais falada do mundo, com 250 milhões de falantes, não mereceu atenção dos chineses durante muitas décadas, preterida, tal como outras, pelo Inglês, a língua da abertura ao exterior, das novas oportunidades, e “dos americanos”. Mas hoje em dia, e seguindo um acentuado crescimento de há 10 anos para cá motivado sobretudo pelo estreitar das relações e trocas com países de língua portuguesa como Angola e o Brasil, a língua portuguesa passou a ser considerada uma das línguas de futuro na China, garantia de emprego para qualquer jovem chinês que nela se especialize. Esse jovem poderá tornar-se, por exemplo, num bom tradutor para um negócio em Angola, um jornalista de turismo em Macau, ou, quem sabe, um advogado para os imigrantes chineses no Brasil; poderá ocupar um cargo administrativo da EDP em Portugal, ou na Galp em Moçambique. Ou, se as suas capacidades assim o permitirem, poderá tornar-se um diplomata ou embaixador no âmbito das relações internacionais chinesas, que estão em amplo desenvolvimento. Enfim, são inúmeras as oportunidades profissionais que aguardam os jovens chineses bilingues no par linguístico Português-Chinês.

São por isso, hoje, cerca de 20 as universidades na China a oferecer curso de Licenciatura em Estudos Portugueses. Em resultado desta conjuntura, os alunos chineses de Português Língua Estrangeira escolhem muitas vezes Portugal para aperfeiçoarem os seus conhecimentos da língua de Camões. Na maior parte das vezes a expensas próprias, eles juntam as suas poupanças e da sua família para embarcarem na maior aposta das suas vidas - a língua portuguesa, e passam, em média, dois anos a estudar em terras lusas. Cá, eles encontram uma nova cultura, completamente diferente da sua, e uma sociedade na qual nem sempre se conseguem integrar. A língua é uma barreira notória, e demoram

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vários anos até conseguir falar “alguma coisa” de Português. A sala de aula também nem sempre está preparada para receber um falante de chinês, e os livros de língua nem sempre são os melhores amigos. Por isso, é na sua cultura que muitas vezes se refugiam, nos seus colegas chineses, no mundo que conhecem, ao mesmo tempo que se maravilham com as diferenças culturais exóticas.

1.2. A expansão do ensino de PLE na China

Os números não mentem…no período de apenas uma década, houve uma autêntica explosão de cursos de PLE na China. No final do século passado, neste caso até 1999, ano marcante por ser o ano da entrega de Macau, existiam apenas três universidades em toda a China com licenciaturas em Estudos Portugueses. Em 2010 havia já 16 cursos oferecidos nas universidades chinesas. Para ficarmos com um historial desta evolução, apresentamos a seguir uma tabela presente no estudo de Wang (2014, p. 88):

TABELA Nº 1- Anos de Abertura das Licenciaturas de Português na China

Universidade Ano de início da Licenciatura em Português Local Universidade de

Comunicações da China 1960 Pequim

Universidade de Estudos

Estrangeiros de Pequim 1961 Pequim

Universidade de Estudos

Estrangeiros de Xangai 1977 Xangai

Universidade de Estudos

Estrangeiros de Tianjin 2005 Tianjin

Universidade de Estudos

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Instituto de Radiodifusão

de Nanjing 2005

Nanjing, província de Jiangsu

Universidade de Pequim 2007 Pequim

Universidade de Estudos Estrangeiros de Xi’an 2007 Xi’an, provincia de Shaanxi Universidade de Estudos Estrangeiros de Dalian 2008 Dalian, província de Liaoning Universidade Normal de Harbin 2008 Harbin, província de Heilongjiang Universidade de Línguas Estrangeiras do Exército 2008 Luoyang, província de Henan Instituto de Estudos Estrangeiros de Jilin Huaqiao 2008 Changchun, província de Jilin Universidade de Economia

e Comércio Internacional 2009 Pequim

Universidade de Estudos Estrangeiros de Guangdong 2009 Guangzhou, província de Guangdong ULCP 2010 Pequim Universidade de Estudos Internacionais de Sichuan 2010 Chongqing, província de Sihuan

Fonte: Wang Jiang Mei, A Urgência da Criação de uma licenciatura em Português nas

Universidades Chinesas no Contexto do Estudo das Línguas Estrangeiras Pouco Utilizadas

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Esta enorme expansão do ensino de Português na China surgiu no contexto geral da expansão do ensino superior do país, iniciada no final da década de 90 do século XX, em resultado das políticas de abertura económica da China e consequente reestruturação interna do mercado. O que aconteceu foi que, com o encerramento de muitas empresas estatais, surgiram milhões de desempregados pela primeira vez na história do país, e para adiar a entrada de novas gerações de jovens no mercado de trabalho, atenuando a enorme pressão de emprego, em 1999 o Ministério da Educação chinês promulgou o Plano de

Ação para a Revitalização da Educação Face ao Século XXI. Logo nesse ano foram

admitidos 513 200 estudantes universitários em relação ao ano anterior, representando um acréscimo de 47,4%. (Ye, 2014, p. 43).

Em 2013, por ocasião da sua participação como orador na 2ª Conferência Internacional sobre o Futuro da Língua Portuguesa no Sistema Mundial, o Professor Carlos Ascenso André dava a conhecer ao mundo uma perspetiva muito animadora: 21 licenciaturas de Língua Portuguesa no território da República Popular da China. O Professor Carlos Ascenso André da Universidade de Coimbra mudou-se para Macau em 2012, para dirigir o Centro Pedagógico e Científico de Língua Portuguesa do Instituto Politécnico de Macau e dedicou-se a fazer um levantamento sobre o estado do ensino de Português na China. No material disponibilizado online pelo professor, resultante da sua recolha em 21 universidades chinesas e com as informações apresentadas pela página web da embaixada de Portugal em Pequim, é apresentado o panorama desse ano de 2013:

TABELA Nº 2- Números dos Cursos de Português nas Universidades Chinesas (2013)

Nº de licenciaturas 21 licenciaturas (26 se considerarmos Macau) Nº de mestrados 2 mestrados (4 se considerarmos Macau) Nº de estudantes 1350 estudantes de licenciatura (mais de 2000 com

Macau) Nº de novos estudantes por

ano

540 novos estudantes por ano (mais de 750 com Macau)

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Para além destes dados, o professor adiantou ainda a previsão de que, entre 2013 e 2018, haverá 3 a 4 mil estudantes de ensino superior (5 mil com Macau) a estudar português. E que em 2013, “nalgumas universidades o português já é a segunda nota mais alta de entrada".

O atual primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, no seu discurso de abertura do Fórum Macau 2016, resumia com ânimo as razões para a importância do ensino de Português na China: “Em conjunto, a China e os países lusófonos representam 17% da produção mundial de riqueza e 22% da população mundial.”8. De facto, no ano de 2015, as trocas comerciais entre ambos os países alcançaram os 100 mil milhões de dólares, com a China a tornar-se um parceiro comercial de relevo e o mercado de exportação em maior crescimento para os países lusófonos. O primeiro-ministro chinês apontou também que o programa “Belt and Road” chinês é altamente compatível com os planos de desenvolvimento dos países lusofalantes, e que ambas as partes têm interesses partilhados e um papel de relevo no sucesso mútuo. Para além disso, a China hoje em dia alberga um milhar de empresas criadas pelos países de língua portuguesa, e investiu perto de 50 biliões de dólares nesses países, existindo acordos de cooperação em praticamente todas as áreas, desde o ensino à proteção ambiental. 9

Devido a isso, há cada vez mais universidades portuguesas e brasileiras a estabelecerem relações de cooperação com universidades na China, para fins de mobilidade de estudantes. Da mesma forma, foram criados já pelo menos dois Centros de Estudos Portugueses, na Universidade de Estudos Estrangeiros de Pequim e na Universidade de Comunicação da China, em parte com apoio institucional português. De relevo tem sido também o papel do Instituto Camões, nomeadamente através da atribuição de bolsas de estudo a académicos chineses e envio de leitores de português para as universidades chinesas. Em termos de cooperação na área da cultura e do ensino, importa relembrar que, a nível governamental, ambos os países assinaram já em 1982 o Tratado Sino-Português para a Cooperação na Cultura, Ciência e Tecnologia, bem como em 2002 o Memorando para a Cooperação entre o Ministério da Educação Chinês e o Ministério da Ciência, Tecnologia e do Ensino Superior, pelo que a intenção de estreitamento das relações na área do ensino e investigação já vem de longe.

8 http://www.china.org.cn/china/Off_the_Wire/2016-10/12/content_39467552.htm 9 http://www.china.org.cn/china/Off_the_Wire/2016-10/12/content_39467552.htm

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1.3. A afirmação da importância económica do Português

A língua portuguesa é considerada na China como parte da categoria de “línguas estrangeiras pouco utilizadas”, pois apesar de ser a sexta língua mais falada no mundo, de facto, durante muitos anos foi desvalorizada na China, por um lado porque as trocas económicas com Portugal ou outros países de língua portuguesa não tinham outrora o peso que têm hoje no novo milénio, por outro, porque nunca houve um grande investimento da parte portuguesa em executar políticas de língua e de preservação da língua portuguesa em território chinês, como podemos ver pela situação de hoje em Macau, onde a língua foi praticamente erradicada, apesar de ser língua oficial até 2049.

No entanto, esse não era caso único da língua portuguesa. À exceção do Inglês, muitas outras línguas foram descuradas durante décadas na China. Hoje em dia as coisas estão muito diferentes, e o conceito de “língua estrangeira pouco utilizada” ganhou uma nova conotação, uma conotação de línguas estratégicas na altura de se escolher uma carreira profissional. Isto aconteceu sobretudo com a entrada da China em 2011 na Organização Mundial do Comércio, momento a partir do qual passaram a ser necessários cada vez mais profissionais especializados em língua que até então eram praticamente desconhecidas e pouco utilizadas no país. Passaram desde então a ser recrutados tradutores, intérpretes, professores e outros profissionais que falassem várias línguas estrangeiras para que a China pudesse estabelecer laços de cooperação e reforçar os já existentes. Segundo Wang (2014), um inquérito realizado em 2005/2006 revelou um aumento na casa dos 40% da necessidade de pessoas conhecedoras de línguas pouco utilizadas. Na tabela abaixo, resumimos os fatores apontados por esta investigadora para este aumento tão significativo.

TABELA Nº 3- Fatores do Aumento do estudo das línguas Estrangeiras pouco utilizadas (LEPU)

Desenvolvimento da Economia Chinesa - com o rápido crescimento económico chinês, as instituições chinesas participam cada vez mais na cena económica internacional e investem ativamente no mercado de negócios estrangeiros.

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Deslocação de várias empresas estrangeiras para a China, de capital estrangeiro e misto, aumentando a necessidade de comunicação em diferentes línguas para além do inglês, nomeadamente nas LEPU.

Alteração das políticas chinesas sobre regras de estudo no estrangeiro e mudança da situação internacional, com maior deslocação de chineses para estudarem fora da China por conta própria, o que motivou países das LEPU a entrarem na competição pela angariação de alunos chineses.

Organização de grandes eventos e exposições na China, como os Jogos Olímpicos de 2008 em Pequim, que necessitaram de 55 línguas; a expo Xangai, onde participaram 246 países e organizações, eventos estes onde os estudantes de línguas puderam pôr as suas capacidades em prática.

Fator de competitividade no mercado profissional, sendo esta a principal razão da procura pelas LEPU, na qual se insere o Português. As taxas de empregabilidade apontadas rondam os 100%.

1.4. Investimento da China em Portugal

Relativamente ao investimento da China no estrangeiro, as empresas chinesas têm vindo a investir de forma inédita em Portugal. A nível empresarial e institucional, o processo de aquisições a que por vezes se dá o nome de “grande negócio da China” ou até mesmo de “invasão chinesa” iniciou-se em 2011, com o país sob intervenção da troika, numa altura em que reinava o medo de Portugal não conseguir baixar o seu défice e em que a dívida pública asfixiava as finanças nacionais. Aconteceu no momento do auge da internacionalização das empresas chinesas e em que Portugal estava sedento de dinheiro10.

Desde então os investidores chineses já aplicaram em Portugal um total de €12,5 mil milhões. Para referência de estudo, sintetizam-se na tabela a seguir as aquisições mais significativas dos chineses em Portugal até ao momento presente.

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TABELA Nº 4- Aquisições chinesas mais significativas em Portugal11

Nome da Empresa Ano da

aquisição Detalhes

EDP 2011

Venda de 21,35% da elétrica portuguesa à China Three Gorges, por 2,69 mil milhões de

euros

REN 2012 Os chineses da State Grid ficaram com 25% do capital, pagando 387 milhões de euros Fidelidade

Seguros e Multicare

2014 Fosun pagou mil milhões de euros por 30% do mercado segurador português

Banco de Investimento

BESI

2014

venda da unidade de investimento à sociedade o Haitong Bank de Hong Kong por 379

milhões de euros

TAP 2016

A Azul compra 40% da portuguesa TAP por 100 milhões de dólares em acordo com a

Hainan Airlines (HNA)

Estas e outras aquisições justificam-se por Portugal ser um país de charneira, e funcionar para os chineses como a porta de entrada para a Europa, nomeadamente para outros países em que a obtenção de um visto de residência é mais difícil. Em resultado destes acontecimentos, hoje a China está em Portugal como em nenhum outro país da Europa, com uma presença forte em áreas estratégicas, como a energia e a banca, e em vários domínios de relevo da economia, que vão desde a saúde, os seguros, o imobiliário, o turismo, a aviação, os media, etc. Ainda mais relevante para a China é que, com o apoio

11 Com base nas informações de http://expresso.sapo.pt/economia/2016-11-20-Grupo-Fosun-alarga-investimento-em-Portugal-depois-da-Fidelidade-e-Luz-Saude e http://observador.pt/2016/11/14/china-reforca-investimento-em-portugal-mas-as-exportacoes-para-a-china-caem/

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de Portugal, ela está em melhor posição de negociar com os restantes países de língua portuguesa com os quais tem importantes relações económicas, sobretudo Angola e Brasil. Todo este dinamismo das relações promove a necessidade de comunicação em Chinês e Português, aumentando a necessidade de profissionais chineses de língua portuguesa. Tal como reconhece Raquel Vaz Pinto, investigadora do Instituto Português de Relações Internacionais da Universidade de Lisboa, quando entrevistada pelo jornal Expresso12, “A lusofonia, embora não seja o único, é de facto um dos factores que tem atraído os investidores chineses”. Segundo a investigadora,

Portugal tem uma grande vantagem na perspetiva da China, as possíveis parcerias com o mercado lusófono, sobretudo Angola e Moçambique, e também o Brasil, embora este caso seja mais complexo. Há também Macau, que passou a ser uma espécie de placa giratória e uma porta de entrada, favorecendo Portugal nesta circunstância de país europeu e lusófono.

As relações económicas com a China atravessam de facto um momento de ouro. E a língua portuguesa também.

1.5. A escolha do Português: expectativas de empregabilidade

Segundo a investigação de Dias (2016) que fez um inquérito aos alunos chineses de PLE da Universidade de Lisboa para compreender os fatores da sua integração em Portugal, estes, quando questionados sobre a razão para o estudo de português, apontam motivações profissionais como o principal facto, representando esta motivação 64%.

As segundas opções mais mencionadas, ex aequo, relacionam-se com questões de gosto pessoal ou de curiosidade (18%). O gosto por aspetos culturais e a recomendação por parte de familiares são mencionadas, cada uma, por 9% da amostra.” Estes e outros dados permitiram a Dias concluir que, para a maior parte dos alunos, as motivações profissionais estavam na origem da escolha desta licenciatura e a principal razão da sua vida para Portugal era a “possibilidade de estudar a língua portuguesa num ambiente de imersão linguística (Dias, 2016,

p. 31).

(30)

Ainda sobre as expectativas de empregabilidade da língua portuguesa, de acordo com Pereira (2014, p. 43) que efetuou um estudo em 2013 sobre os estudantes chineses que então frequentavam a licenciatura de PLE na Universidade de Dalian13e as suas expectativas em relação ao curso de Português, os alunos elegeram “a possibilidade de ganhar muito dinheiro” como o principal motivo responsável pela escolha do curso de Português. “Na sua busca por trabalho, ao mesmo tempo que terminam os estudos, afirmaram encontrar bastantes anúncios de emprego que pedem conhecimentos de Português.” (Pereira, 2014, p. 63). Resolvemos apresentar as conclusões do seu trabalho de investigação abaixo, relativamente às respostas da maioria dos estudantes chineses em relação ao que anteviam como o futuro da pós-graduação do curso de PLE:

• Grande parte dos estudantes gostava de usar a língua portuguesa no futuro • Pretendem trabalhar fora da China. Os países de eleição seriam/são o Brasil,

Angola e Portugal.

• Acreditam que os conhecimentos que possuem em Português os ajudarão a conseguir trabalho e todos sentem que vale a pena estudar a língua.

• Até dezembro do ano de fim de curso, 33% dos alunos já tinham um posto de trabalho.

Para os alunos que já tinham acabado o curso no período de até 2 anos anteriores e já em fase de procura de primeiro trabalho pós-graduação é de notar também que:

• 72% dos graduados estavam a trabalhar • Trabalhavam na sua maioria na China

• As empresas em que trabalhavam eram todas chinesas

• 62% usam a língua portuguesa nas tarefas profissionais diariamente

• 50% dos antigos alunos disseram que usam tanto a variante de Português Europeu como a de Português do Brasil

• 38% viajavam muito, sendo os principais destinos Angola e Brasil

São dados animadores que confirmam as expectativas dos estudantes, com uma taxa de empregabilidade elevada ao fim de 1 ou 2 anos de 72%. Apesar de as empresas

13 A Universidade de Dalian tem intercâmbio com a Universidade de Aveiro e com a Universidade de Lisboa. O estudo e o respetivo trabalho estatístico foram feitos com uma amostra dividida em 2 grupos de sujeitos: o Grupo I constituído por alunos do 4º ano do curso (o último do mesmo) a decorrer em 2013 e o Grupo II que já tinha terminado os seus estudos nos anos letivos 2011-2012 e 2012-2013.

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onde arranjam colocação serem todas chinesas, a língua portuguesa é utilizada como língua de trabalho, com a curiosidade de haver uma mistura de português de Portugal e do Brasil (o que não é estranho ao facto de o ensino neste curso ser ministrado nestas duas vertentes em muitas universidades chinesas).

2. PARTE II - O percurso em Portugal dos alunos de PLE 2.1. Mobilidade internacional dos alunos chineses

De acordo com o Relatório sobre o Desenvolvimento dos Estudantes Chineses no Estrangeiro de 2016 emitido pelo governo chinês14, em 2015 a China contribuiu com um total de 1.26 milhões de estudantes internacionais, representando 25% do número total mundial de estudantes a estudar fora do seu país de origem. 523.700 novos alunos chineses partiram para o estrangeiro para estudar no ensino superior, representando um aumento de 13.9% relativamente a 2014. Efetivamente, resultante da abertura nas políticas de mobilidade dos estudantes, consequência da abertura económica desde 1978 e do estreitar de laços de cooperação económica entre a China e a União Europeia, a mobilidade de estudantes chineses é um fenómeno com um peso crescente, promovida por programas da União Europeia como o Erasmus. Em Portugal, no ano de 2015/2016 num total de 13.282 alunos de programas de frequência do ensino superior por estrangeiros em mobilidade de créditos (ou seja, com vista à obtenção de créditos académicos reconhecidos na China), 253 eram de nacionalidade chinesa15, e dos programas de reconhecimento de grau (com vista à obtenção de diploma reconhecido na China) contam-se já 505 estudantes chineses num total de 19 815 alunos estrangeiros16.

Nos últimos anos foram também criados numerosos acordos bilaterais entre Portugal e a China, com o objetivo de aumentar a cooperação e as trocas institucionais ao nível da educação e investigação. Ao mesmo tempo, as universidades de ambos os países

14 2016 Report on the Development of Chinese Students Studying Abroad-http://english.gov.cn/news/international_exchanges/2016/12/13/content_281475514811918.htm

15 Fonte: DGEEC- Mobilidade Internacional no Ensino Superior: “Inscritos em mobilidade de crédito num estabelecimento de ensino superior português, na modalidade de estudo ou de estágio, por um determinado período, tendo como finalidade a obtenção de créditos académicos posteriormente reconhecidos pela instituição de origem a que pertencem.” Disponível em: http://www.dgeec.mec.pt/np4/84/

16 Fonte: DGEEC- Mobilidade Internacional no Ensino Superior: “Inscritos em mobilidade de grau que estão matriculados num estabelecimento de ensino superior português, que concluíram o ensino secundário num país estrangeiro e que têm como finalidade a obtenção de um diploma.” Disponível em:

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foram estreitando laços e criando programas de intercâmbio de alunos. No caso dos cursos de PLE na China, a prática mais usual é enviar os alunos para uma universidade de um país lusófono, nomeadamente Portugal ou Brasil. Cria-se um protocolo com uma universidade local e enviam-se os estudantes chineses de Português para estes países por um período de 1 ou 2 anos (normalmente são o 2º e 3º anos da licenciatura). Terminado o estudo no estrangeiro, os alunos regressam para a China para se prepararem para a graduação (Ye, 2014). Em Portugal, estas são as instituições de ensino superior que presentemente têm protocolos de cooperação inter-universitária com a China nos cursos de Português Língua Estrangeira que são do nosso conhecimento:

- Universidade de Lisboa - Universidade do Minho - Universidade do Porto - Universidade de Aveiro - Universidade de Coimbra - Universidade Nova de Lisboa

Apesar de não ser um curso de PLE, pela sua relevância em termos de formação de profissionais especializados em língua Chinesa/Portuguesa, destacamos também o curso de Tradução Chinês-Português do Instituto Politécnico de Leiria, que recebe todos os anos várias dezenas de alunos chineses de intercâmbio.

De destacar é também a iniciativa da Universidade de Coimbra e da criação do programa “Ano Zero”17, especialmente para alunos chineses. O “Ano Zero” é um ano preparatório especial que permite a aprendizagem intensiva da língua portuguesa e ainda de outras competências associadas à sua inserção nos cursos que os alunos pretendem frequentar na universidade portuguesa. Esta nova via de acesso resulta de uma nova lei de 2016 que permite às instituições do ensino superior portuguesas criar os seus próprios sistemas de ingresso para os estudantes internacionais. Em entrevista à Câmara de Comércio e Indústria Luso-Chinesa, o Vice-Reitor da instituição, o Professor Joaquim Ramos de Carvalho, adiantou que existe um grande interesse por parte dos jovens chineses em obter formação superior em língua portuguesa, em diferentes domínios do

17 http://www.ccilc.pt/pt/news/institutional/universidade-de-coimbra-cria-de-acesso-especial-para-estudantes-chineses

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saber. “Esse interesse decorre do volume crescente de investimento e trocas comerciais entre a República Popular da China e os países de língua portuguesa e das orientações estratégicas da política externa chinesa atual", diz o professor. Reforçando a relevância deste programa declarou também que “ao aceitarmos os exames chineses de acesso ao ensino superior, e fornecendo formação preparatória complementar, estamos a corresponder ao interesse crescente pela língua portuguesa e pelo mundo lusófono na sociedade chinesa”. Já foi criado um site totalmente em chinês com as informações sobre os cursos oferecidos e outras indicações práticas para os estudantes chineses que queiram vir para Portugal18.

2.2. A escolha de Portugal como destino

O nosso país é o destino de cada vez mais estudantes de PLE. Por sermos a pátria da língua de Camões isso não devia surpreender. No entanto, essa não é a única razão. Dias (2016) demonstrou com o inquérito aos alunos chineses de PLE da Universidade Nova que a grande razão da opção de vir para Portugal em mais de metade dos casos (55%) relacionava-se com “a possibilidade de poderem estudar português em Portugal”, em “imersão linguística” e “próximos da língua original”. No entanto, 27% dos alunos referiram antes fatores como a “curiosidade” ou a “procura de conhecimento” e 18% relacionaram a sua vinda apenas com “questões protocolares interuniversitárias”. No trabalho de campo da presente dissertação quisemos verificar também o peso das questões de empregabilidade no mercado português, análise que é feita em capítulos posteriores.

Nos estudos existentes sobre os estudantes chineses em Portugal, para além das questões protocolares, obviamente razão facilitadora da sua vinda, destacamos 3 razões fundamentais para a escolha dos alunos chineses: 1 - a possibilidade de estudar num ambiente linguístico de imersão; 2 - a facilidade na obtenção do visto de estudante no ensino superior em Portugal; 3 - a facilidade legal para os estudantes estrangeiros de permanência em Portugal por motivo de procura de emprego no período pós-graduação.

1 - A possibilidade de estudar num ambiente linguístico de imersão

Toda a gente que aprendeu uma língua estrangeira sabe da importância do fator ambiente e da necessidade de se estar rodeado de falantes nativos quando se quer

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realmente aprender a língua. Para Maria Helena Mateus (cit. por Silva 2010, p. 47) “a distinção entre aprendizagem de uma língua estrangeira e a aquisição de uma língua não materna (ou língua segunda) passa pela afirmação de que uma língua estrangeira é aprendida apenas em contexto formal, enquanto uma língua segunda implica que o aprendente seja imerso num contexto em que a língua é utilizada no seu dia-a-dia”. Isto porque, em imersão linguística, o estudante está também imerso na cultura do povo que fala a língua, e no seu dia-a-dia vai adequando a sua comunicação às necessidades efetivas que vão surgindo, criando automaticamente soluções e competências que de outra forma não conseguiria. Para quem quer usar a língua portuguesa como língua de trabalho isso é ainda mais relevante. Silva (2010, p. 58) reflete esta mesma ideia nas seguintes palavras:

Ao aprender em contexto de imersão, onde o público aprendente vive e trabalha, as tarefas ganham sentido mobilizando competências linguísticas e comunicativas em atividades que envolvem o aprendente numa comunicação real, como por exemplo, ir ao hospital, supermercado, comunicar no trabalho, executar outras tarefas, pois o objectivo é saber usar a língua nas determinadas situações.

Sobre o ponto 2 - A facilidade na obtenção do visto de estudante no ensino superior em Portugal, de acordo com o Plano Estratégico para as Migrações, existe uma série de ações com o objetivo de atrair a mobilidade de alunos do ensino terciário, como a criação de um guia de acolhimento e integração e a promoção de uma plataforma que facilite os procedimentos de visto para eles. Da mesma forma, um regulamento de março de 2014 garantia o estatuto de estudante internacional para estrangeiros de fora da União Europeia que não vivessem em Portugal ou que tivessem vivido no país num período de menos de 2 anos, quando são aceites por uma instituição portuguesa do ensino superior. Também uma alteração posterior do mesmo ano vinha facilitar a obtenção dos vistos aos investigadores e académicos.19 Para muitos chineses, estar em Portugal significa estar na Europa, perto de cidades da sua eleição como Londres, Paris ou Berlim. O acesso ao espaço europeu torna-se mais direto, e possível, pois que noutras capitais europeias a obtenção de vistos é muito mais concorrida ou de difícil acesso.

19 International Migration Outlook 2016

http://www.integrazionemigranti.gov.it/Attualita/Notizie/Documents/IMO2016_ENG.pdf

(35)

Quanto ao ponto 3 - a facilidade legal para os estudantes estrangeiros de permanência em Portugal por motivo de procura de emprego no período de pós-graduação, este motivo mostra-se ainda mais relevante para o presente estudo. Durante o curso, os estudantes podem envolver-se numa atividade profissional desde que essa atividade ocorra fora do período estipulado pelo programa do curso e na modalidade a tempo parcial. Isto é muito importante no caso dos alunos chineses que vêm normalmente a expensas próprias e que procuram começar a estagiar ainda durante o curso. Segundo o

International Migration Outlook 201620, após o término do seu programa de estudo, muitos estudantes internacionais desejam permanecer no país que os acolheu para poder arranjar emprego e pôr as suas aptidões adquiridas em prática. Portugal faz parte do grupo dos países da EU que facilita o acesso ao emprego aos estudantes internacionais em termos legais, permitindo aos alunos internacionais graduados permanecer em território nacional com o propósito de procurar trabalho, enquanto outros países, como é o caso de Espanha, fazem parte do grupo que só permite aos alunos internacionais permanecer no caso de terem um trabalho ou estarem continuamente empregados. Assim, os estudantes chineses podem continuar cá, no caso de desejarem entrar no mercado de trabalho. O visto para a atividade profissional neste caso é temporário, válido pelo período de um ano e renovável por períodos sucessivos de dois anos. Ademais, podem inscrever-se no centro de emprego e concorrer a trabalhos e formação profissional. Por fim, os estudantes internacionais podem tomar ainda iniciativas de autoemprego. 21

2.3. A integração dos estudantes chineses

A migração para um país diferente é sempre um processo complexo, sobretudo quando há diferenças culturais tão grandes como entre Portugal e a China. Na maior parte das vezes, os estudantes chineses caem “de pára-quedas” num ambiente linguístico e cultural completamente diferente do seu e a adaptação nem sempre é fácil. Segundo o Relatório EU-China22, os países que acolhem alunos estrangeiros devem ter em conta os fatores de risco da sua integração, com vista a uma melhoria das políticas e procedimentos com busca a uma melhor integração. Os fatores de integração verificados para os

20 ibidem

21 International Migration Outlook 2016

22 EU-China Student and Academic staff mobility: Present Situation and Future Developments., Joint study between the European Commission and the Ministry of Education in China, A report submitted

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estudantes internacionais em geral, por ordem de importância, são: a questão das despesas; a barreira linguística; a falta de informação; assuntos legais e administrativos; falta de serviços de apoio; questões de reconhecimento de documentos e diplomas. Todos eles estão presentes no caso da comunidade estudantil em estudo.

A questão das despesas inclui o financiamento das despesas de estudo em si, as bolsas de estudo, as propinas e o custo de vida. Isto tem um grande peso no caso dos alunos chineses pois é estimado que 92% dos alunos chineses que estudam no estrangeiro sejam autofinanciados (com grande investimento familiar)23. O caso dos alunos de PLE não é exceção, o que leva à necessidade de conciliação do estudo com atividades profissionais em regime de tempo parcial, o que pode, até certo ponto, dificultar a aprendizagem (Dias, 2016, p. 38). De acordo com a experiência dos alunos que já estudaram em Portugal ou no Brasil, os gastos anuais rondam um mínimo de 100 mil yuans, o equivalente a aproximadamente 136 500€ representando um forte encargo, e levando a que eles optem por começar a trabalhar ainda durante o curso.

Tal como referiu Santos (2011, p. 58) no seu estudo sobre a comunidade chinesa em Portugal, a pouca proficiência no idioma do país de acolhimento, é um problema bastante comum na comunidade imigrante chinesa. A língua enquanto barreira à integração é um aspeto de peso. Por isso, como notou Silva (2010, p. 85), “é necessário agilizar a aprendizagem do Português, pois a barreira linguística está na origem de preconceitos de quem chega e de quem acolhe, e é fonte de conflito e de falta de comunicação, o que contribui para a exclusão social”.

Apesar de estes aprendentes em estudo serem estudantes de português, o nível com que vêm para Portugal é muito básico, regra geral. Por isso, quando chegam estão completamente dependentes dos tutores e do próprio grupo de colegas chineses e outros conhecidos chineses para tratarem das coisas básicas do dia-a-dia, como deslocarem-se ou fazer uma compra. A falta de autonomia sentida durante o tempo de estudo em Portugal é uma das maiores frustrações destes jovens (Dias, 2016, p. 33). Essa dificuldade vai-se repercutir também necessariamente na relação destes migrantes com o mercado de trabalho, pois o pouco conhecimento da língua dificulta a procura de emprego bem como a criação de relações fora do seu grupo étnico (Ying 1996 cit. por Santos, 2011).

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TABELA Nº 2- Números dos Cursos de Português nas Universidades Chinesas  (2013)
TABELA Nº 4- Aquisições chinesas mais significativas em Portugal 11
TABELA Nº 6 - TOP 10 das oportunidades profissionais para os alunos de PLE  Nº  Área Profissional  Exemplos de profissões
TABELA Nº 7- DESIGNAÇÃO DOS NÍVEIS DO  QECRL  A- Utilizador básico  A1- Inicial  A2- Básico  B- Utilizador independente  B1- Intermédio  B2- independente  C- Utilizador avançado  C1- Fluente eficaz  C2- Fluente estruturado   Fonte: wikipedia 54

Referências

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