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4. PARTE IV Trabalho de campo

4.4. Análise de dados

4.4.1. Perfil global dos aprendentes de PLE

4.4.1.3. Aquisição linguística e integração

A aquisição da língua portuguesa para os aprendentes de PLE não é só uma medida de sucesso académico, mas também de sobrevivência num novo país. Como diz Liu (2012, p. 44), “É preciso falar, compreender, ler, escrever em português para aceder ao mercado de trabalho, encontrar alojamento, pedir autorização de permanência no país, poder acompanhar a escolaridade dos filhos, aceder aos cuidados de saúde, compreender e a participar na vida social, política e cultural”. São estas facilidades trazidas pela quebra da barreira linguística que permitem gradualmente uma integração da comunidade estudantil internacional. Caso não se verifiquem estas competências linguísticas, não é possível a estes jovens assumirem-se como agentes comunicativos numa sociedade, e sentirem-se parte dela. Daí considerarmos que, no caso dos imigrantes chineses, sejam eles estudantes ou não, o fator língua é central ao seu estabelecimento harmonioso e a longo prazo em Portugal. Nas palavras de Silva (2010, p. 46):

Para o bem desses cidadãos que chegam ao nosso país e em prol da estabilização e da consolidação do tecido social, é primordial ensinar-lhes a língua portuguesa e familiarizá-los com a nossa cultura, sem lhes pedir que abdiquem da sua língua e da sua cultura. Esta é a justificação sociológica para a necessidade de se disseminar o ensino/aprendizagem do Português Língua Não Materna no território nacional.

O caso dos estudantes internacionais não é exceção, apesar de ainda não haver uma regulamentação específica ou estatutos que guiem as universidades ou outras instituições diretas de acolhimento nas suas necessidades especiais. O desencontro das necessidades dos alunos com as estratégias de acolhimento utilizadas, ou ausência das mesmas, gera por vezes grande descontentamento e desilusão por parte dos alunos chineses de PLE.

Ainda assim, e de acordo com os resultados do nosso inquérito, em geral, os aprendentes chineses gostam do ensino universitário de PLE em Portugal, mais de 80% avaliando-o como Bom e quase 10% como Muito Bom. Satisfatório foi a 3 opção mais

escolhida com 8%, sendo que as opções “fraco” e “mau” não foram sequer selecionadas por nenhum dos inquiridos.

Quando perguntámos aos inquiridos “Quais os fatores que mais facilitam a aquisição da Língua Portuguesa em Portugal?”, a qualidade do curso foi a opção menos frequente, demonstrando que a visão tradicionalista da aprendizagem em sala de aula como principal recurso para o ensino/aprendizagem de língua não se coaduna com a visão dos estudantes chineses de PLE e que não define a qualidade da experiência educativa. Pelo contrário, o “contacto com os colegas portugueses” aparece como a principal escolha (12 vezes), algo surpreendente se pensarmos no estereótipo dos chineses como culturalmente segregados dos portugueses. Seguido em ex-aequo com 11 votos, das opções “trabalhar/estagiar em Portugal” e do “acesso a bons materiais de estudo”. De facto, se, por um lado, os alunos têm acesso a materiais como manuais, dicionários, gramáticas e teses, etc, de temas de PLE fulcrais para a sua aprendizagem que não têm na China, ainda assim, a possibilidade de trabalhar ou estagiar em Portugal tem o mesmo peso em termos de elemento facilitador de aquisição da língua. O que não surpreende pois já se viu que grande parte considera trabalhar como uma excelente forma de praticar a língua.

Viver com portugueses também foi uma opção bastante votada, com 10 escolhas, demonstrando igualmente grande abertura destes alunos a formas não formais de aprendizagem da língua não materna. Estes resultados vão de encontro ao estudo de Dias (2016, p. 42), segundo o qual os alunos deram, entre outras sugestões para a melhoria do programa, a ideia de “reforço da carga horária, especialmente no que diz respeito à gramática e à oralidade. A falta de espaços destinados à prática da conversação é, aliás, usada como motivo para a procura de empregos em Portugal – algo que, a nível académico, pode ser contraproducente”. Dias lembra-nos ainda que “Na posse destas informações diversas, assume-se como particularmente urgente reanalisar a abordagem lectiva, no sentido de proporcionar uma experiência formal de ensino mais próxima das necessidades e capacidades dos alunos.”

No nosso estudo, as escolhas dos alunos, apesar de não implicarem uma aplicação na prática das escolhas no questionário por parte dos mesmos, demonstram uma abertura a programas de imersão total na língua-cultura portuguesa, uma nota bastante positiva do nosso ponto de vista, no que diz respeito à vontade de compreender a cultura portuguesa no seu âmago.

Relativamente aos “Fatores que mais dificultam a aquisição da Língua Portuguesa em Portugal”, a opção mais votada foram as “diferenças culturais” com 13 votos, logo seguido do “isolamento social” com 8 e as “metodologias” com 6 votos. Para nós, não é algo surpreendente, tendo passado pela experiência destes alunos, e por todas as dificuldades associadas ao facto de nos vermos sozinhos num país estranho e tão longe da nossa terra, sem falar a língua e sem ter uma rede de apoio que nos faça sentir seguros. Como podemos ver, os fatores de ensino formal - professores, materiais de estudo e metodologias - foram preteridos por fatores socioculturais, o que se torna ainda mais significativo se encararmos as metodologias como tendo vários elementos culturais.

Se considerarmos as questões socioculturais como um todo - isolamento social, diferenças culturais e saudades de casa, elas representam no total uma maioria de 25 votos, contra 11 votos dos fatores de ensino formal e pedagógicos - metodologias, professores, materiais de estudo. Menos significativas ainda são as questões económicas que só foram escolhidas por uma pessoa, e que se explica pela boa relação dos chineses com o trabalho. O facto de terem de trabalhar para pagar os estudos não aparece como obstáculo à aprendizagem, mas sim como algo natural. Olhando para as questões pedagógicas, o relevo dado às metodologias utilizadas confirma o que já foi referido nos capítulos anteriores, ou seja, que estas são, em geral, pouco adaptadas aos alunos internacionais, neste caso chineses.

Quisemos conhecer também a rede de apoio em Portugal destes alunos. Os chineses têm um dizer antigo que é “na nossa terra conta-se com a família, fora dela conta- se com os amigos”, daí a importância dada à amizade por esta comunidade. Este valor chinês da amizade não é estranho ao facto de, na questão “Qual o seu principal apoio em Portugal”, a resposta ser maioritariamente os amigos, quer chineses (16 votos) quer portugueses (14 votos). De valorizar o facto de 14 pessoas terem escolhido a opção “amigos portugueses”, demonstrando já um elemento de integração na sociedade portuguesa e deitando aqui por terra o preconceito de os chineses serem muito fechados entre si.

A maior parte dos alunos tem a família longe na China, mas ainda assim houve 3 votos para “família” como elemento de apoio, sendo importante relembrar que as novas tecnologias permitem hoje em dia que se comunique com os nossos entes queridos distantes em tempo real, sem custos acrescidos. Para os chineses, a sua aplicação de eleição é o Wechat, do grupo Tencent, um software que tanto pode ser utilizado no

telemóvel como no computador ou tablet, e que é um misto de Facebook e Messenger, com a opção de videochamada e mensagem de voz instantânea incorporada, ambas muito utilizadas pelos chineses.

A embaixada da China em Portugal, enquanto fonte de informações e de apoio institucional à comunidade chinesa teve 2 votos, acima da religião, apenas com 1. O associativismo religioso chinês tem mais peso no caso dos imigrantes chineses da geração anterior, que não vem para estudar e que tem um nível cultural inferior ao destes estudantes. Hoje em dia, são já dezenas as associações cristãs chinesas em Portugal, de pendor evangélico. O budismo chinês está igualmente muito bem representado com a BLIA Portugal sediada em Lisboa, que é a maior associação de chineses em Portugal, com cerca de 500 membros.