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A atração da imagem, cultura visual: A Lanterna Mágica

No documento A revista no Brasil, o século XIX (páginas 113-119)

Capítulo 3. A vitalidade de novos rebentos: 1831-1850

3.5. A atração da imagem, cultura visual: A Lanterna Mágica

A introdução dos desenhos e das caricaturas na imprensa brasileira causou sensação ao menos entre o público da Corte instalada no Rio de Janeiro. Embora os historiadores forneçam dados controversos sobre a circulação da primeira caricatura, pode-se dizer que a data mais aceita é a de 1837, quando o Jornal do Commercio publicou em sua edição de 14 de dezembro um anúncio que dizia “Saiu à luz o primeiro número de uma nova invenção artística, gravada sobre magnífico papel, representando uma admirável cena brasileira, e vendida pelo módico preço de 160 réis cada número, na loja de livros e gravuras de Mongie, Rua do Ouvidor n° 8713. A bela invenção de caricaturas, tão apreciada na Europa, aparece hoje pela primeira vez em nosso país, e sem dúvida receberá do público aqueles sinais de estima que ele tributa às coisas úteis, necessárias e agradáveis” (JELIN & TADDEI, 1996: 37).

O Diário do Rio de Janeiro também publicava semelhante anúncio no dia seguinte, dando a conhecer o aparecimento da Caricatura, publicação de desenhos avulsos, que foram vendidos como as “revistas-posters” oferecidas nos dias atuais nos finais de campeonatos de futebol ou pela morte de algum ídolo14. Imagens para colecionar ou guardar.

Havia muita curiosidade e, portanto, demanda para essas imagens. Tanto que logo a seguir saía nos dois jornais um novo anúncio (JELIN & TADDEI, 1996: 38):

Acham-se à venda nas lojas dos Srs. João Batista dos Santos, Rua da Cadeia n° 60; Sant’Amant, Rua de São José n° 64; R. Ogier & Cia; Rua do Rosário; E. Laemmert, Rua da Quitanda, o 1° número de Caricatura, que representa interessantíssima cena brasileira,

Capítulo 3

1831-1850

impressa em muito bom papel, e pelo módico preço de 160 réis. Sairá amanhã e acha-se à venda nas mesmas casas o 2° número de Caricatura, representando a Rocha Tarpéia. O favorável e generoso acolhimento com que recebeu o público o 1° n° deste nosso perió- dico de gravuras, havendo-se esgotado já toda a primeira edição, anima aos artistas que se acham encarregados de tão necessária, útil e patriótica empresa, a continuarem sua publicação.

As duas caricaturas tinham como tema o controvertido jornalista e político Justiniano José da Rocha15. Tanto que a segunda lâmina se chamou Rocha Tarpéia, num trocadilho com o sobrenome do jornalista. Justiniano era mostrado no desenho como se fosse a rocha dos tempos do Império Romano16. Na caricatura, de um lado se vê a paisagem de Roma e, esculpida na rocha, a cabeça enorme de Justiniano, de frente e perfil. Na testa, a inscrição: 3:600$000, o salário anual do jornalista como diretor do Correio Oficial.

Atribuídas a Manuel de Araújo Porto-Alegre, as duas caricaturas, litografadas por Pierre Victor Larée, eram como um tira-gosto para algo que viria a seguir, a revista A Lanterna Mágica, periódico plastico-philosophico. Nessa publicação, um desenho satirizando a homeopatia, recém-introduzida no Brasil, assinalava o nascimento dos personagens Laverno e Belchior dos Passos – e, com eles, a introdução da caricatura na imprensa nacional.

Manuel José de Araújo nasceu dia 29 de novembro de 1806, em Rio Pardo, na Província de São Pedro, atual Rio Grande do Sul. Filho de um negociante de fazendas e de trigo, já demonstrava na infância uma inclinação para o desenho. Quando o rapaz

completou 16 anos, em 1822, foi para Porto Alegre, estudar e trabalhar como assistente de um relojoeiro. Na capital gaúcha, de que tomou o nome17, conheceu o desenhista francês François Thér, com quem se inicia nas artes plásticas, realizando trabalhos como

desenhista e pintor.

Foi no estúdio de um de seus professores, o pintor João de Deus, que Porto-Alegre conheceu a desenho Desembarque da Arquiduquesa Leopoldina, do artista francês Jean-Baptiste Debret. Encantado, decide ir para o Rio, estudar com esse mestre que viera ao Brasil com a Missão Francesa trazida por Dom João VI. Porque ainda era menor de idade, a mãe não permitiu a partida para a Corte. Mas em 1827, ao completar 21 anos, convence a família e muda-se para o Rio. Admitido na primeira turma da Academia de Belas Artes, estuda com Debret, com quem logo trava amizade e passa a ser protegido. O professor teria escrito sobre o dedicado aluno: “Araújo Porto-Alegre deixa, portanto, de copiar para criar. Em vez de decalque, da ampliação ou da simples cópia, ele já reproduz o modelo vivo, concebe figuras, retrata grupos, fixa a natureza”.

Na Academia, Araújo Porto-Alegre, mesmo sendo um dos alunos mais novos, foi dos mais ativos. Conta-se que, aborrecido por não poder trabalhar na escola fora do horário de aulas para treinar e aperfeiçoar sua técnica, teria pedido ao imperador que tomasse uma atitude a respeito. E Pedro I teria atendido seu pedido, ordenando à direção da Academia de Belas Artes que permitisse a entrada dos alunos fora dos horários estabelecidos. Porto-Alegre foi estimulado a organizar mostras de arte, expondo como pintor e como arquiteto (LIMA, 1963: vol. 2. 717-723).

Com a idéia de viajar e conhecer a Europa, cursa também a Escola Militar e aulas de anatomia do curso médico, além de Filosofia. Em 1831, graças a uma subscrição promovida por Evaristo da Veiga, e à proteção dos Andradas, segue para a França como bolsista do governo, em companhia de Debret, que regressava a seu país. Em Paris residiu na casa de François Debret, irmão do pintor, onde conheceu grande parte dos intelectuais da época, sendo admitido nas aulas do Barão de Gross.

Em 1834 viaja pela Europa visitando vários países, entre eles a Itália, em companhia de outro ex-aluno de Debret, Domingos José Gonçalves de Magalhães, com quem dois anos depois, já de volta a Paris, criou a revista Nitheroy. A publicação, com o subtítulo de “Revista Brasiliense de Ciências, Letras e Artes”, tinha como epigrafe “Tudo pelo Brasil e

para o Brasil”. Escrito em português, o periódico contou entre seus colaboradores com Francisco de Salles Torres Homem. A revista exaltava o Brasil com a proposta de ser um veículo para a alta cultura nacional, revelando traços do romantismo, mas não passou do segundo número.

Em 1837, de regresso ao Brasil, Porto-Alegre é nomeado professor da Academia de Belas-Artes e estréia com as já comentadas caricaturas soltas, satirizando Justiniano José da Rocha. Em 1840 tornou-se pintor oficial da Corte e, em 1854, nomeado pelo imperador Pedro II para dirigir a Academia de Belas-Artes, procurou realizar uma reforma do currículo. Sua proposta era conciliar o ensino técnico predominante até então com uma orientação mais artística, a fim de propagar o gosto pelas artes e de incentivar o

surgimento de uma iconografia oficial que, ao definir marcos históricos e heróis nacionais, contribuísse para dar uma identidade à nação (VAINFAS, 2002: 351).

Chamado de “homem-tudo” por Max Fleiuss (filho do desenhista e revisteiro Henrique Fleiuss, criador de A Semana Illustrada), Araújo Porto-Alegre “foi um dos principais escritores de nosso primeiro Romantismo e talvez seu artista mais completo. Pintor, arquiteto, cenógrafo, poeta, dramaturgo, ensaísta e caricaturista” (FARIA, 2003: 173), era um polivalente e trabalhou em diversas frentes, como artista, educador e administrador. Menos conhecido no mundo da literatura, integrou o núcleo da primeira geração de românticos e atuou na imprensa também buscando “despertar um caráter próprio na literatura brasileira por meio da inspiração que o ambiente tropical e a ‘raça’ nativa do continente americano podiam oferecer” (VAINFAS, 2002: 351).

Capítulo 3

1831-1850

A Campainha

Quem quer; quem quer redigir O Correio Oficial!

Paga-se bem. Todos fogem? Nunca se viu coisa igual

O Cujo

Com três contos e seiscentos Eu aqui’stou, meu senhor Honra tenho e probidade Que mais quer d´um redator? A primeira caricatura brasileira, impressa e vendida como figurinha.

Todos esses traços podem ser percebidos numa de suas obras de maior destaque, A Lanterna Mágica – Periódico Plastico-Philosophico. Produzida em parceria com os ilustradores Rafael Mendes de Carvalho e Lopes Cabral, que haviam sido seus alunos na Academia, a publicação teve o primeiro número circulando em janeiro de 1844. Foi festejado pela imprensa, sendo considerado pelo Diário do Rio de Janeiro como “o mais importante jornal até hoje aparecido”. A revista, no entanto, teve também duração pequena: em março de 1845 circulava o último número, o 23.

A ficha catalográfica da publicação na Biblioteca Nacional é lacônica: a freqüência do periódico é descrita como desconhecida, mas seguramente a intenção seria de uma publicação quinzenal: em 14 meses de circulação, atingiu 23 números. A ficha apresentada pelo Cedap-Centro de Documentação e Apoio a Pesquisa, da Faculdade de Filosofia da Unesp em Assis, informa que a publicação seria semanal, aparecendo aos domingos – o que deve ser um engano. Ainda segundo o Cedap, A Lanterna Mágica é “um jornal filosófico que trata do cenário político, utilizando-se da sátira em forma de peça teatral. Assim, os personagens e seus diálogos flagram momentos da vida política e seus

protagonistas oficiais, além de assinalar o início das publicações ilustradas com caricaturas impressas”.

Detenhamo-nos na análise de seu primeiro número. A revista tem formato de 21 x 29 centímetros. A primeira página, ou capa, traz o desenho de uma cabeça envolta em folhas de louro, como a de um ator (dá impressão de uma cabeça com máscara). Ao lado direito, sob a cabeça, uma corneta. Atrás, um livro em que se pode ler “L’Inmortalité”. À esquerda do livro, um tinteiro com a pena. Abaixo do desenho, o título em maiúsculas: “A Lanterna Mágica”. Na linha de baixo, em caracteres menores, “periódico plástico-

philosophico”. A seguir, o número “1”.

Assim a proposta da revista é anunciada no número 1 (PR SOR 00748):

Carissimos Leitores. Não é com o intuito de especular sobre a vossa amável bolça, nem tão pouco por amor d’esse vil metal, que os séculos apelidárão ouro, que vai comparecer no tribunal de vossas vistas mais esta publicação.

Um gigantesco patriotismo, uma d’essas erupçoens de amor pelo bem do paiz, uma attracção irresistível para a salvação da humanidade, uma coisa que se não pode explicar senão com os tempos, nos obriga a emprehender esta obra classica, e este bosquejo do seculo, que dará mais que fazer aos vindouros philosophos e estadistas do que o morro do Castello, esse ladrão que nos furta todos os dias a viração da barra, e que passa de anno a anno impunemente, sem achar uma alma caridosa que o ponha de crista baixa.

A Lanterna Magica é filha de profundas convicções, é o theatro onde se representarão as principaes scenas da nossa epoca, sem resaibos de personalidades, e sem o intuito de fazer illusoens a este ou aquelle individuo: a scena das generalidades reinará no seu proscenio, e seus quadros representarão sempre os mesmos individuos, os mesmos actos revestidos somente do caracter que lhes der na oportunidade.

Faz sentido. A Lanterna Mágica se apresenta, após as duas páginas introdutórias, como “drama em tresentos e sessenta e seis actos, representado durante a successão dos tempos no theatro do Beco da Patuscada. A scena passa-se no Imperio do Brasil, dentro do círculo do Zodiaco”. A linguagem busca o tom irônico, como se vê.

O autor segue a apresentação de sua revista. O protagonista das cenas será sempre Laverno, nas palavras do apresentador “esse homem prodigioso, espécie de Mefistófeles, de judeu errante, que anda entre nós nas praças, nos templos, nos salões dourados, no parlamento, nas estalagens, nas lojas e nos ranchos das estradas”. Tem como companheiro e íntimo amigo Belchior dos Passos. Humilde, o revisteiro garante: “esta publicação haverá de melhorar muito com o andar dos tempos”.

Terminadas as duas páginas de apresentação, a revista começa seu primeiro numero. Ou seu primeiro ato.

A Lanterna adota a paginação de uma coluna, o que a torna um pouco pesada, por se assemelhar a um livro. Essa coluna única é colocada dentro de um quadro de fios duplos, dando um aspecto de “caixa” às páginas – algo que qualquer designer hoje em dia sabe que é marca de arquiteto e decorador, não de um comunicador visual. Em média, cada página comporta 40 linhas de texto, que usa uma tipologia serifada: linhas largas, portanto, que são compensadas por um entrelinhamento medianamente aberto.

O texto da revista é, na realidade, um diálogo em que Laverno discute e disputa com Belchior dos Passos – são dois malandros espertos, sempre em busca de algum expediente para conseguir dinheiro fácil. Na sétima página da publicação aparece o desenho que resume toda a cena descrita.

Visualmente a publicação é pobre. Na terceira página, em que a revista começa, após a apresentação, há no frontispício ou cabeçalho uma figura. São elementos de desenho e arquitetura: um globo terrestre, uma âncora, compasso. Na última página, ao

Capítulo 3

1831-1850

Laverno e Belchior projetando.

Laverno diz: “O nome é sempre o mesmo, pateta, a ter- minação faz a nacionalidade. Serei francês sendo Laverne; russo, Lavernoff; inglês Lavernson; italiano, Lavernini ou Lavernelli; polaco, Lavernock; alemão, von Lavernitz; holan- dês, Van Lavernisck; egípcio, Laverma-bei; espanhol, Don Laverno d´Alfaro, e assim por diante. Porém, não me inter- rompas mais”.

Belchior: “Percebo, meu senhor, tu és um homem admi- rável”.

Apresentação do nº 1 (alto à esquerda) e duas lâminas com as peripécias de Laverno e Belchior, as primeiras gravuras nacionais.

terminar o texto, outra vinheta mostra um livro, folhas soltas, uma lamparina, uma pena no tinteiro e o símbolo do comércio (duas serpentes de Mercúrio envoltas num mastro).

Nesse primeiro número, Laverno propõe a Belchior ganhar dinheiro fazendo-se passar por médicos homeopatas. Laverno usa uma fala autoritária e trata seu parceiro como parvo. “Não prossigas, imbecil”, “Estúpido neófito”, “Pateta”, “Toleirão”, “Tu não és senão um animal fastidioso”, é nesse tom que ele se dirige a Belchior. Este, sempre

responde com um “Tu és um homem admirável”.

Laverno expõe suas táticas, como se apresentarão, como darão seus golpes. Belchior dos Passos, mais realista ou pessimista, pondera sobre eventuais contratempos, sobre contramarchas. Ao longo de cinco páginas discorre o diálogo. Um exemplo:

Belch. Comprehendo. Ha somente uma pequenina difficuldade, e vem a ser que não sabemos nem pitada de Medicina.

Lav. Não ha necessidade de sciencia, toleirão; no estado em que o immortal fundador poz a sciencia nada é mais facil: basta saber dividir, subdividir ao infinito, e redigir um annuncio que deixe de boca aberta o respeitavel papalvo. Annunciaremos que o Dr. Lavern...

Belch. Mas esse nome é já bastante conhecido, e tu não podes passar por estrangeiro.

Lav. O nome é sempre o mesmo, pateta, a terminação faz a nacionalidade. Serei Francez, sendo Lavernu; Russo, Lavernoff; Inglez, Lavernson; Italiano, Lavernini ou Lavernelli; Polaco, Laverniski; Allemão, Von Lavernitz; Hollandez, Van Lavernick; Egypcio, Lavermud-Bei; Hespanhol, Dr. Laverno d”Alfarrache, e assim por diante, mas não me interrompas mais (PR SOR 00748).

As aventuras e peripécias de Laverno e Belchior saíram da pena de Manuel de Araújo Porto-Alegre, mas eram ilustradas por Rafael Mendes de Carvalho19. Ao longo de 23 números da A Lanterna, entre 1844 e 1845, essas figuras satirizariam políticos,

burocratas, aproveitadores, artistas, literatos, religiosos, jornalistas – os “personagens desse drama em trezentos e sessenta e seis atos [que] se passa no Império do Brasil”. Animados por um senso crítico que provocava a reflexão, os desenhos instigavam os leitores a pensar.

Laverno podia se passar por médico, naturalista, político ou artista, sempre

arranjando maneiras de enganar com seu cinismo. No texto A Lanterna Mágica: imagens da malandragem, entre literatura e teatro, que preparou para o catálogo da exposição A Comédia Urbana: de Daumier a Porto-Alegre, realizada pela Fundação Armando Álvares Penteado, de 26 de abril a 22 de junho de 2003, em São Paulo, João Roberto Faria, professor de Literatura Brasileira na FFLCH da Universidade de São Paulo, realiza uma minuciosa contextualização dos 23 fascículos editados por Araújo Porto-Alegre.

Ficamos sabendo, pela leitura desse trabalho, que Porto-Alegre se familiarizou com as lanternas mágicas, comuns em Paris durante seu estágio na capital francesa, e adota o nome para a publicação pois aquele aparelho realizava “com o truque das lentes, o que ele queria realizar com seu talento de pintor e escritor: projetar imagens do Rio de Janeiro que tinha diante dos olhos” (FARIA, 2003: 174).

O que surpreende é que exatamente no mesmo ano em que A Lanterna Mágica começou a circular, 1844, Martins Pena escreveu a comédia Os três médicos, na qual um personagem doente é disputado por um médico alopata, o dr. Cautério, por um homeopata, o dr. Milésimo, e por um hidropata, o dr. Aquoso. [...] Se, por um lado, Porto-Alegre e Martins Pena tinham atrás de si uma longa tradição cômica, por outro, podiam observar e colher na própria cidade do Rio de Janeiro o material para suas obras. Em 1844, surgia a Escola Homeopática, com o curso em três anos, dado por professores estrangeiros, como M. Le Boiteux, e T. Ackerman. Nesse mesmo ano, os jornais traziam artigos polêmicos sobre essas correntes médicas... Tudo indica que o charlatanismo foi comum nesses tempos em que os manuais de homeopatia punham a medicina ao alcance de qualquer um que soubesse ler (FARIA, 2003: 178).

que passavam pelo Brasil naquela quadra do século X IX . Já nos referimos a eles no capítulo 1. Se na época dos descobrimentos e nos tempos do Brasil Colônia as “viagens eram consideradas empreendimentos militares e expansionistas”, sendo por isso proibida por Portugal a entrada de visitantes20, com a chegada da Família Real inúmeros viajantes percorreram o Brasil e realizaram inventários de comunidades, geografia, fauna e flora (VAINFAS, 2002: 711).

Como pondera João Roberto Faria, “entre os viajantes e naturalistas, havia quem quisesse a fama a qualquer preço, lançando mão de estratégias desonestas para anunciar descoberta de novas espécies, um pássaro, por exemplo” (FARIA, 2003: 181). Esses impostores são outro dos alvos da sátira de Porto-Alegre, com Laverno convencendo Belchior dos Passos da rentabilidade de se meterem a vender aos naturalistas viajantes algum espécime de gato com pés de pato ou uma onça marinha.

O número 5 traz a partitura do lundo Fora o Regresso, uma referência irônica ao político e escritor Bernardo Pereira de Vasconcelos, nome de peso no período regencial, que começara como um liberal moderado para acabar nos braços do partido conservador, tornando-se líder da corrente denominada “regressista”, por apoiar a centralização do poder em torno do imperador.

Assim A Lanterna Mágica, por meio do diálogo entre os dois personagens, critica, expõe, ridiculariza e satiriza costumes e comportamento dos tipos sociais, se distanciando da rotina de louvação que era comum na época.

Outras revistas importantes tiveram a mão ou a colaboração de Araújo Porto- Alegre: ele participou da criação e colaborou com a Minerva Brasiliense (1843-1845), de seu amigo Torres Homem, e com a revista Guanabara (1849), de que foi um dos fundadores e redator, junto com Gonçalves Dias e Joaquim Manoel Macedo. Na primeira, escreveu respondendo às críticas e observações levianas ao Brasil, escritas pelo jornalista francês Louis de Chavagnes, em um relato de viagem publicado na Revue des Deux Mondes21.

No fim de sua vida, Porto-Alegre dedicou-se à carreira diplomática na Europa, sendo cônsul do Brasil na Prússia e em Lisboa, onde morreu, em 1879.

No documento A revista no Brasil, o século XIX (páginas 113-119)