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As revistas dos estudantes de Direito: O Amigo das Letras

No documento A revista no Brasil, o século XIX (páginas 100-102)

Capítulo 3. A vitalidade de novos rebentos: 1831-1850

3.2. As revistas dos estudantes de Direito: O Amigo das Letras

Os jornais e pasquins ligados às academias de Direito, de São Paulo e Olinda, foram o grande caldeirão onde se formou mais de uma geração de escritores e

personagens que depois influiriam decisivamente nos destinos do país e nos rumos da imprensa brasileira. A criação dos cursos de Direito em São Paulo e Olinda, como se disse, atendeu a uma necessidade tanto política quanto administrativa, visando a preparar um corpo técnico-burocrático para o Estado, que se formava na primeira metade do século X IX . A escolha de cidades distantes da Corte para instalar as duas escolas traduziu o empenho dos liberais em afastar os futuros operadores do direito e do Estado da política absolutista do Rio de Janeiro. E os fatos comprovam que essa postura cumpriu seus propósitos, pois, no caso de São Paulo, após iniciadas as aulas no Convento dos Franciscanos, em 1828, não tardou para que muitos alunos se associassem a liberais como o médico e jornalista italiano Líbero Badaró e o alemão Julius Frank. De

aproximações como essas resulta a criação do primeiro jornal estudantil, o Amigo das Letras (1830), e das “Burschenschaft”, a conhecida Bucha, ou confraria dos camaradas, freqüentada por muitos dos nomes que iriam depois fazer e escrever a história do país.

O Amigo das Letras, redigido por Josino do Nascimento Silva, além de ser o primeiro jornal estudantil do país, marcou o início de longa lista de publicações. Impresso nas oficinas do jornal Farol Paulistano, o Amigo teve periodicidade semanal e chegou a circular 24 edições, de abril a setembro de 1830. Um ano depois surgia A Voz Paulistana, editado por Francisco Bernardino Ribeiro: um jornal de oposição cujo alvo preferido era o irrequieto D. Pedro I. Em 1833 aparece a Revista da Sociedade Philomathica,

que exaltava o papel das associações. Diz seu editorial: “Associação! tal é o destino da humanidade. Tal a convicção universal, espontânea e distintiva do gênero humano”. Um conceito até então pouco usual aqui: a sociedade vista como obra de uma decisão, de um contrato social, da livre manifestação da vontade, como queria o genebrino Jean- Jacques Rousseau.

Mas a série de publicações nascidas nas Arcadas da Faculdade de Direito continua, segundo Paulo Ferraz (2003: 28). Muitos anos depois, em 1851, deixou marca aRevista Mensal do Ensaio Filosófico Paulistano, com Álvares de Azevedo entre seus criadores.Seguiram-se

O Acayaba, redigido por Quintino Bocaiúva, e O Guayaná. Dizia o editorial desse periódico: “Filhos dos princípios liberais, eis-nos em luta no majestoso anfiteatro das idéias. […] Somos do presente e caminhamos para o futuro; obedecemos às forças irresistíveis das necessidades e legítimas aspirações do país”.

A lista continuaria ainda com a Arcádia Paulistana, a Revista Paulistana, O Lírio, a Revista Dramática, O Kaleidoscópio, a Revista da Associação Tributo às Letras, O Radical Paulistano, numa sucessão de títulos, quase todos de curta duração – mas que na prática foram os jornais- laboratório que formaram os jornalistas e escritores que darão a pauta e o tom dos periódicos da segunda metade do século X IX .

Na escola do Largo de São Francisco, a partir de 1860, o ideal liberal e romântico vai sendo substituído pelo republicano ativista, de que é tradução o jornal O Futuro, de Teófilo Otoni, que bradava: “Soldados da democracia, a postos! Façamos da constituição nossa bandeira, da pena e da palavra nossas armas. Levantemo-nos e sejamos livres”. Já iam avançadas as discussões a esse momento, e A Independência (1868) resume pontos defendidos pelos estudantes mais progressistas: “aulas abertas a todos os meninos, liberdade de ensino […], liberdade de culto. Força para a opinião, garantia para o voto […], o governo do povo pelo povo, extensão do sufrágio, sufrágio universal.

Independência do poder legislativo […], responsabilidade dos ministros, representação das minorias […], casamento civil”. Entre os redatores dessa publicação estudantil A

Independência estavam alunos do curso de Direito, como Rui Barbosa e Castro Alves (FERRAZ, 2003: 27).

Mas na São Francisco, a despeito do que se propaga, não estudavam apenas republicanos e abolicionistas. Muitos alunos eram monarquistas e escravocratas (entre esses escravocratas, alguns eram republicanos, como Campos Sales, que só alforriou seus escravos em 1887). Dessa linha de pensamento era o Clube

Constitucional Acadêmico, jornal fundado em 1871. Dizia, em seu terceiro número, de 23 de maio de 1871:

Mas essa vitória lenta [da monarquia] não está isenta de perigos, uma escola política que ostensivamente fala em liberdade, quando é sua mais cruel inimiga, que mais declama sentimentos humanitários, quando é a mais desumana, que fala mais em paz, quando é mais sanguinária, a escola revolucionária, premeditada tentativa sacrílega, sofismando a razão e a justiça […]. Essa escola, pobre de razão e pobre de poder, vai inspirar-se nos exemplos perniciosos, ferozes e revolucionários do republicanismo fran- cês (FERRAZ, 2003: 27-28).

Enquanto isso, na Faculdade de Olinda, estudantes como Medeiros e Albuquerque (pai), Maciel Pinheiro, Tobias Barreto, Franklin Távora e Silvio Romero iriam colaborar em revistas como A Estréia, O Ateneu Pernambucano, Arena, O Futuro, Ensaio Literário, O Acadêmico, A Luz, A Faculdade e o Povo, Crença e o Movimento.

Nas páginas dessas publicações, quase todas empreitadas estudantis, desfilaram artigos e ensaios assinados por alguns dos personagens que marcariam época na política, na literatura e no jornalismo. Além dos já citados Rui Barbosa e Castro Alves, Joaquim Nabuco e Álvares de Azevedo, Luis Gama, Quintino Bocaiúva, Pinheiro Machado, Fagundes Varela, Teófilo Otoni, Francisco Rangel Pestana, Américo de Campos, Júlio de Mesquita, entre tantos outros.

Apresentada por Ana Luiza Martins como “a primeira revista paulista”, a Revista da Sociedade Philomathica, de 1833, era impressa na Typographia do Novo Farol Paulistano.

Capítulo 3

No documento A revista no Brasil, o século XIX (páginas 100-102)