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Ensino Superior

Capítulo 2 – Compreender a Aprendizagem dos Estudantes do Ensino

3. Abordagens ao Estudo, Concepções de Aprendizagem e Objectivos Educacionais

3.1. A Auto-regulação e a Componente Metacognitiva da Aprendizagem

A literatura sobre a auto-regulação tem demonstrado claramente que aprendizes mais activos possuem e utilizam um conhecimento de base que lhes permite organizar, planear e monitorizar de uma forma apropriada a maior parte dos aspectos relativos às tarefas de aprendizagem (Pintrich, Smith, Garcia & McKeachie, 1993; Winne, 1995;

De acordo com Winne (1995), quando os aprendizes se envolvem numa determinada forma de auto-regulação – consequência inevitável de se depararem com uma certa “falha cognitiva” (Garner, 1987) –, dificilmente se identificam as diferenças, em termos de proficiência, através das quais resolvem as exigências de auto-regulação.

Tradicionalmente, estas diferenças têm sido descritas em termos da presença ou ausência de planificação e de monitorização de comportamentos – aspectos relacionados com os objectivos de aprendizagem. Algumas das metodologias utilizadas para analisar essas diferenças são a observação (Borko, Livingstone & Shavelson, 1990) e a aplicação de instrumentos de auto-resposta (Pintrich & De Groot, 1990; Rohwer & Thomas, 1989; Zimmerman & Martinez-Pons, 1988).

Cantwell e Moore (1996) chamam a atenção para a qualidade do conhecimento substantivo na auto-regulação, definindo-a como o conjunto de estratégias que remetem, em maior ou menor grau, para o planeamento e a monitorização efectivos da actividade cognitiva. Os autores, no seguimento do trabalho de Winne (1995), sugerem que um elemento igualmente importante para a compreensão da auto-regulação eficaz seria considerar a compreensão individual de como, quando e onde é que este conhecimento auto-regulador pode ser exigido. No seu entender, independentemente das estratégias de auto-regulação que o indivíduo possui e das circunstâncias nas quais é exigida alguma forma de intervenção auto-reguladora, a direcção e a forma das respostas individuais envolve não só a quantidade de conhecimento de base, mas também o uso condicional desse mesmo conhecimento. Esta distinção reside na capacidade metacognitiva de um indivíduo, bem como na qualidade dos processos de controlo executivo, enquanto factores que influenciam a eficácia da actividade auto-reguladora.

Nesta linha de pensamento, Cantwell e Moore (1996) sugerem que as diferenças individuais na qualidade do controlo sobre a actividade auto-reguladora podem ser

descritas em termos adaptativos ou não. Uma análise da literatura sobre a aprendizagem do estudante, a monitorização, a falta de flexibilidade e a auto-regulação não resolvida, aponta para outros graus de diferenciação na forma como os indivíduos conceptualizam o controlo e a regulação na aprendizagem. Assim, num primeiro nível, os sujeitos possuem crenças adaptativas sobre os processos de controlo executivo, as quais remetem para a necessidade de planear e monitorizar de forma flexível a actividade cognitiva. Num segundo nível, podem possuir crenças não adaptativas sobre o controlo executivo, integrando quer a falta de flexibilidade na compreensão da natureza e no uso de processos auto-reguladores, quer a confusão e incerteza na percepção de como os processos auto-reguladores podem ser construídos e operacionalizados.

Em termos gerais, a literatura sobre a auto-regulação na aprendizagem parece conceber as diferenças dos indivíduos ao nível da actividade auto-reguladora num continuum (Lindner & Harris, 1992; Pintrich et al., 1993; Rohwer & Thomas, 1989; Zimmerman & Martinez-Pons, 1988).

Além de Van Rossum e Schenk (1984), também Biggs (1987a) se referia à “meta-aprendizagem” como as competências de metacognição envolvidas na aprendizagem dos estudantes – no seu entender, a metacognição seria a chave para compreender a aprendizagem dos estudantes.

Entwistle (1987a) defendia que melhorando as competências metacognitivas dos estudantes, podemos esperar abordagens à aprendizagem mais profundas e, desta forma, melhorar a motivação para aprender. No entender do autor, era fundamental que os estudantes tomassem consciência dos seus próprios processos, estilos, abordagens e orientações em relação ao estudo e à aprendizagem, tendo em vista o desenvolvimento e o aperfeiçoamento de formas mais eficazes de atingir os objectivos (Entwistle, 2000).

Deste modo, deveriam ser capazes de desenvolver, em simultâneo, o conhecimento metacognitivo e a meta-aprendizagem.

Nesta linha de pensamento, a metacognição é entendida como um processo central na auto-regulação da aprendizagem, ainda que as percepções dos estudantes e as suas crenças motivacionais também sejam percebidas como componentes que envolvem a auto-regulação (Butler & Winne, 1995; Schunk, 1996).

Sobre as actividades de regulação cuja função é a de controlar as actividades de aprendizagem a nível metacognitivo, Vermunt e Van Rijswijk (1988) referem-se às acções de processamento dirigidas, quer interna, quer externamente. Para os autores, os estudantes podem diferir em termos da tendência para expressar auto-regulação, depender de regulação externa, ou ainda não possuir qualquer competência de regulação.

Lonka, Lindblom-Ylänne e Maury (1993) relacionaram o grau de auto-regulação com o estudo eficaz em estudantes de Medicina, enquanto que Vermunt e Van Rijswijk (1988) encontraram a mesma relação noutros domínios.

São vários os autores (Beishuizen, Stoutjesdijk & Van Putten, 1994; Lonka & Lindblom-Ylänne, 1996; Vermunt & Van Rijswijk, 1988) que referem a auto-regulação como estando mais frequentemente associada à abordagem profunda, remetendo a regulação externa para a abordagem superficial. Beishuizen e colaboradores (1994) consideram ainda que outro tipo de combinações, especialmente a auto-regulação com a abordagem superficial, podem resultar em objectivos académicos pobres ou pouco elaborados.

Mais recentemente tem sido defendido que, para além das concepções sobre a aprendizagem e o conhecimento prévio, também as relações entre elementos do contexto e a aprendizagem integram o conhecimento metacognitivo (Elen & Lowyck,

1998; Elen, Lowyck & Proost, 1996). De acordo com estes autores, o conhecimento sobre o potencial de aprendizagem dos elementos que constituem os contextos pode ser designado de “conhecimento metacognitivo da instrução” (integrando assim o objecto do conhecimento – a instrução) e a sua auto-reflexividade (relações com a auto- aprendizagem). Esta última pode assumir-se como uma variável importante na explicação dos efeitos directos da instrução, dos métodos ou das intervenções ao nível dos objectivos de aprendizagem (Elen et al, 1996). De facto, os elementos do ambiente de instrução apenas são eficazes se houver interpretação pelos estudantes (Winne & Marx, 1982) que afecte a forma como fazem uso do potencial do ambiente. O conhecimento metacognitivo da instrução parece assim constituir um tipo específico de conhecimento prévio. Em termos de investigação, assume-se como especialmente relevante conhecer que categorias são usadas pelos estudantes para descrever e avaliar os ambientes de aprendizagem (Broder & Dorfman, 1994; Cleave-Hogg & Rothman, 1991) e de que forma as categorias dos estudantes diferem das utilizadas pelos professores (Levy, Wubbles, Brekelmans & Morganfield, 1997).

Sobre este assunto, Tynjälä (1999) propôs um modelo integrador para descrever a regulação dos processos de aprendizagem individuais (Figura 4).

Figura 4 – Regulação dos Processos de Aprendizagem Experiências anteriores Concepções de aprendizagem Estratégias de regulação Estratégias de processamento Orientação para a aprendizagem Contexto: ensino, avaliação, curriculum Percepções e interpretações dos estudantes

Fonte: Adaptado de Ramsden (1988b, p. 161) e Vermunt (1998, p. 153).

De acordo com Tynjälä (1999) as interpretações dos estudantes das suas experiências de aprendizagem anteriores, as percepções e interpretações do contexto actual de aprendizagem, os objectivos e as exigências, afectam as suas concepções de aprendizagem, as orientações para o estudo e as estratégias de regulação. Por exemplo, se um estudante apenas tiver experienciado um ensino de tipo transmissivo e no quadro do paradigma reprodutivo, a sua concepção de aprendizagem terá, naturalmente, na base esse modelo. Pelo contrário, se um estudante foi exposto a métodos de ensino e de estudo que procuram desenvolver o pensamento e a aplicação do processamento profundo do conhecimento, mais facilmente desenvolve uma concepção que enfatize a construção activa do saber.

De forma semelhante, as percepções do estudante e as suas interpretações dos ambientes de aprendizagem anteriores, exercem um impacto na escolha das estratégias de estudo e nas orientações para os novos contextos de aprendizagem.

Neste sentido, as concepções de aprendizagem e as orientações para o estudo que os estudantes adquiriram, parecem determinar a forma como regulam a sua própria aprendizagem. De acordo com Vermunt (1998), este processo remete para a auto- regulação – que envolve um processamento profundo do conhecimento – ou para a regulação externa – que implica a adopção de processamentos superficiais em situações de aprendizagem concretas – ou ainda para a ausência total de regulação – que irá impossibilitar a avaliação da aprendizagem ou das estratégias. De acordo com o modelo, o contexto de aprendizagem é de grande relevância para as orientações para o estudo dos estudantes (Entwistle, Tait & Entwistle, 1992; Prosser & Trigwell, 1999; Tynjälä, 1999).

Porque a aprendizagem é, por natureza, contextualizada, iremos debruçar-nos sobre os aspectos contextuais e ambientais no ponto que se segue.

4. Ambientes e Contextos de Aprendizagem: suas Implicações nas