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Ensino Superior

Capítulo 3 – Factores Explicativos do Sucesso Académico

2. Contributos das Teorias e Modelos do Desenvolvimento Psicossocial

2.1. Os trabalhos de Erikson, Sanford e Heath sobre o estudante do ensino superior

Na sua maioria, os investigadores que se dedicaram ao estudo do período da jovem adultez têm na base a investigação de Erikson (1959, 1968, 1969, 1982), numa tentativa de caracterizar o modo como o estudante se desenvolve. Neste sentido, iremos referir-nos à perspectiva de Erikson (1959), tendo em conta o seu contributo primordial para a explicação da problemática do estudante do ensino superior.

No entender do autor (Erikson, 1968) o desenvolvimento seria um processo sequencial que passava por oito estádios diferentes, do nascimento à velhice, cada um dos quais caracterizado por mudanças (que implicavam o desempenho de diferentes tarefas por parte do sujeito) ao nível físico, da maturação cognitiva e das exigências sociais. Nesta linha de pensamento, o desenvolvimento apresentava-se como um processo de interacção dinâmica entre factores de natureza individual e contextual (Medeiros et al., 2002).

Erikson referia-se a determinadas orientações que caracterizavam os diferentes estádios de desenvolvimento. No que diz respeito à adolescência, o autor falava em identidade versus confusão de identidade; quanto à fase do jovem adulto, remetia para a intimidade versus isolamento. Para Hood e Ferreira (1983) era nestes dois estádios de

desenvolvimento que o sujeito tentava atingir aquilo que os autores designaram de “auto-definição funcional”.

De entre os estádios preconizados por Erikson, destacamos aquele que remete para a puberdade e a adolescência, bem como para a jovem adultez. De acordo com Erikson (1968), o estudante do ensino superior passava por aquilo que designou de “crise da intimidade”. Nesta altura, o sujeito teria que desenvolver determinadas competências que lhe permitissem solucionar a crise que estava a vivenciar (no sentido positivo ou negativo). Por outras palavras, os sujeitos tentavam resolver as tarefas, com vista a ultrapassar a “crise de desenvolvimento”. Não obstante, o indivíduo podia sempre retornar a um estádio anterior, se não conseguisse solucionar essa mesma crise.

Bastos (1998), retirando os aspectos essenciais da perspectiva de Erikson, vem realçar a importância atribuída pelo autor ao papel do indivíduo na sequência de estádios, à contextualização sociocultural do desenvolvimento, ao desenvolvimento biológico, à maturação cognitiva e aos estímulos sociais que potenciam a resolução das tarefas de desenvolvimento.

Baseando-se nos trabalhos de Erikson, Sanford (1962, 1966) foi pioneiro ao chamar a atenção para as mudanças psicossociais que ocorrem ao longo da frequência do ensino superior. Na sua opinião, era possível observar modificações ao nível da libertação dos impulsos, da consciência e da diferenciação e integração do ego, sendo frequente os alunos do 1º ano apresentarem uma certa inibição na libertação dos impulsos, na medida em que são alvo de uma oposição directa de uma “consciência atenta, rígida, punitiva e moral/restrita” (Sanford, 1962, cit. in Chickering, 1969, p. 10). Na sua opinião, essa inibição teria na base a própria estrutura da personalidade, a

ignorância em relação à forma de expressar sentimentos e a manutenção de modos de expressão infantis.

Neste quadro, interessava, de acordo com Ferreira e Hood (1990), que o estudante fosse capaz de conhecer e de tomar consciência dos seus sentimentos, reconhecendo o seu valor e importância para o desenvolvimento. Para os autores, é ao longo da frequência do ensino superior que os estudantes vão, progressivamente, passar de um período de inibição para uma fase mais aberta, em que os seus impulsos se expressam de uma forma mais satisfatória e variada. Simultaneamente, verifica-se também um aumento do grau de complexidade e integridade da personalidade do sujeito, ao assumir contornos mais ajustados e socialmente aceites.

É também nesta altura que o estudante se depara com o dilema da escolha entre os valores que lhe foram transmitidos pela família e pelo meio de origem, e os novos valores difundidos no seio da comunidade universitária. Em princípio, o indivíduo conseguirá, de uma forma progressiva, deixar de desenvolver sentimentos de culpabilidade e adoptar valores morais com elevado grau de satisfação. Este percurso só será possível se o sujeito se envolver naquilo que Sanford (1962) designava de questionamento e reflexão pessoais.

Na realidade, para Sanford a tomada de consciência não implicava obrigatoriamente uma mudança no conteúdo dos valores, conduzindo sim a alterações no modo como o estudante escolhia e justificava as suas opções por determinados padrões e valores morais (Ferreira & Hood, 1990). No seu entender, o desenvolvimento seria potenciado por duas condições, que se caracterizavam por um certo dinamismo: a condição de desafio e a de apoio. Tratava-se de condições necessárias, na medida em que, tal como afirmam Ferreira e Hood (1990), “os indivíduos não crescem sem

desafios e o montante dos desafios tolerados será dependente do apoio disponível” (p. 402).

Ainda de referir que, para Sanford (1966) se observavam com alguma frequência problemas ao nível do desempenho académico e dos relacionamentos pessoais e interpessoais, os quais iam sendo superados à medida que ocorria a diferenciação e a integração do ego. Era neste período que a auto-estima do sujeito estabilizava, mostrando maior segurança, tolerância e uma maior capacidade para desenvolver novas experiências (preferencialmente desafiantes).

Por fim, Heath (1965, 1977, cit. in Ferreira & Hood, 1990) concebe a maturação como uma componente fundamental no desenvolvimento psicossocial do indivíduo, tendo começado, para operacionalizar o conceito, por analisar e descrever as funções e processos psicológicos que caracterizam um indivíduo maduro.

Na sua tentativa de observar como se operava esse percurso psicológico, Heath atribuiu especial relevância aos períodos da adolescência e do jovem adulto, concebendo um modelo de maturidade psicológica onde propunha algumas dimensões relativas às representações simbólicas da experiência, ao alocentrismo, à integração, à estabilização e à autonomia. Na sua opinião, estas cinco dimensões de maturidade constituíam melhores preditores do sucesso do indivíduo na adultez do que o próprio rendimento escolar (Heath, 1977). É neste sentido que o autor chamava a atenção para a necessidade de as instituições educativas promoverem e incentivarem o crescimento e o desenvolvimento psicológico em direcção à maturidade (Bastos, 1998). Reportando-se a este assunto, Hood (1984) considerava que um dos principais objectivos das instituições de ensino superior devia remeter para o desenvolvimento integral do próprio estudante.

Para Heath (1977) é no período da jovem adultez que o indivíduo desenvolve relacionamentos, valores e auto-conceitos de natureza estável e autónoma, modificações estas que ocorreriam nos anos de frequência pré-universitária e universitária.

Com base numa série de entrevistas longitudinais, Heath (1964) descreveu o chamado “estudante ideal” (reasonable adventurer), capaz de combinar tendências de desenvolvimento aparentemente discrepantes, que utilizava de acordo com as exigências da situação. Em termos gerais, este estudante seria cauteloso e extrovertido, percebia as actividades académicas como desafiantes e estimulantes, revelando ainda alguma competitividade – o oposto destas características caracterizava, de acordo com Heath, o “estudante não ideal”.