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A classificação dos processos administrativos segundo a natureza dos

3 O PAPEL DO PROCESSO ADMINISTRATIVO NA ADMINISTRAÇÃO

3.5 AS TRÊS ESPÉCIES DE PROCESSOS ADMINISTRATIVOS: O MODELO DE

3.5.2 A classificação dos processos administrativos segundo a natureza dos

Apresentada por Egon Bockmann Moreira, parte esta teoria da premissa de que, como decorrência natural das mutações em sequencia que, incidindo sobre o modelo clássico de Direito Administrativo, conferiram a este uma feição contemporânea e mais pertinente às demandas atuais, seriam hoje observadas, no sistema brasileiro, três espécies bem definidas de processos administrativos. Pela classificação proposta, é na respectiva geração (ou dimensão) de direitos fundamentais que buscam esses processos proteger ou realizar que residiria, na verdade, o parâmetro mais adequado para promover-lhes o devido agrupamento100.

99 Perceba-se, com isso, a presença decisiva do critério da utilidade na definição de qual modelo classificatório

seguir, na mesma esteira, portanto, do clássico e preciso ensinamento de Genaro Carrió, para quem as classificações elaboradas pelos juristas não se revelariam verdadeiras ou falsas, mas sim, úteis ou inúteis, a depender da aptidão que possua cada uma para explicar uma questão de maneira mais facilmente compreensível ou mais rica em consequências de ordem prática (CARRIÓ, Genaro R. Notas sobre Derecho y Lenguaje. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1976, p. 72).

100 MOREIRA, Egon Bockmann. Processo Administrativo. Princípios Constitucionais e a Lei 9.784/1999. 4ª

Nessa perspectiva, defende-se que estariam concentrados, numa primeira espécie, todos aqueles processos que reunissem, em comum, a característica de, ao final, tornarem possível, se for o caso, a aplicação de medida administrativa de caráter punitivo, daí a razão de terem recebido a tradicional adjetivação de sancionadores101. Ademais, é de se observar que, em todos os processos deste grupo, sofre o ato administrativo visado ao fim pelo Estado inevitável controle negativo, pois, valendo-se do esquema processual, pretende o indivíduo impedir ou restringir, de qualquer forma, a investida estatal contra sua esfera jurídica, para tanto opondo o seu direito àquela ação. Assim, a obrigação do Estado de sempre agir mediante processo é aqui vislumbrada, sob o ângulo do particular, como natural decorrência da prerrogativa que este possui de defender-se contra a conduta persecutória da Administração Pública. É por tal razão que se diz que os processos administrativos deste grupo teriam por objetivo, precipuamente, “evitar um dano subjetivo, suprimindo agressão a direito fundamental de primeira dimensão (propriedade e liberdades)”102.

A segunda espécie, por sua vez, seria a responsável por abranger a integralidade dos processos por meio dos quais pretende o particular, com foco em uma perspectiva ampliativa de seu universo jurídico, a obtenção do reconhecimento de seus direitos ou interesses pela Administração Pública103. Por esse motivo, é que se pode dizer que, visando tão somente a criar vantagem pública ou privada, buscariam os processos administrativos neste rol enquadrados, em suma, apenas “o cumprimento de direitos fundamentais de segunda

101 Ressalve-se, no entanto, que, para Celso Antônio Bandeira de Mello, é preferível reservar para estes a

nomenclatura, mais genérica, de “restritivos”, dos quais os ditos “sancionadores” e os “meramente restritivos” (revogações em geral) constituiriam duas espécies (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito

Administrativo. 27ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 499-500).

102 MOREIRA, Egon Bockmann. Processo Administrativo. Princípios Constitucionais e a Lei 9.784/1999. 4ª

ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 73.

103 Logo, é evidente que não haveria, no bojo dos processos desta espécie, nenhum tipo de litígio ou acusação,

nem muito menos, ainda, a intenção de promover qualquer tipo de ofensiva contra a liberdade ou propriedade do administrado.

e terceira dimensões (o cumprimento a direito prestacional que prestigie os valores constitucionais – seja individual, seja coletivo)”104.

Por fim, a terceira espécie de processo administrativo relacionaria todos aqueles feitos através dos quais o particular e o poder público, em mútua colaboração, viessem a somar esforços com vistas à elaboração de normas. Neste grupo, a intensa interação verificada com os administrados, enfatize-se, dar-se-ia não somente na busca de benefícios privados para estes últimos, mas também, e principalmente, com o propósito de se auferirem vantagens coletivas ou difusas a partir da promoção desse diálogo. O cidadão, então, por meio desses processos, tencionaria, junto à Administração Pública, “o cumprimento de direito fundamental de quarta dimensão (informação, democracia e pluralismo democrático na formação das decisões políticas)”105.

Nesse passo, importa ainda notar, por último, que, em comum aos processos desses três grupos, tem-se, como não poderia ser diferente, a efetiva possibilidade que conferem aos administrados de influenciar diretamente a formação da vontade estatal, pois, conforme se viu, haverá de ser aos mesmos obrigatoriamente concedida, em todos os casos, durante a tramitação do processo, a concreta oportunidade de participar dos momentos anteriores à prolação do ato final pela autoridade administrativa.

Encerradas, então, com estas observações, as considerações que permitem demonstrar a importância que é conferida ao processo administrativo na contemporaneidade, responsável até mesmo pelo crescente interesse que se verifica na elaboração de estudos como este, cabe agora ingressar, no capítulo seguinte, em um ponto crucial ao alcance dos objetivos que ao longo destas linhas se perseguem. Trata-se da cláusula do devido processo legal, matéria que se pode reputar de fundamental importância às pretensões deste trabalho.

104 MOREIRA, Egon Bockmann. Processo Administrativo. Princípios Constitucionais e a Lei 9.784/1999. 4ª

ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 73.

4 O DEVIDO PROCESSO LEGAL NO DIREITO ADMINISTRATIVO

Compreendidas, no capítulo anterior, as razões que explicam o crescente destaque e a alta relevância que tem conquistado o processo administrativo nessa nova roupagem que tem adquirido o Direito Administrativo nas últimas décadas, necessário se faz, doravante, que avance o presente trabalho, rumo aos seus objetivos, em direção ao exame da incidência do devido processo legal, princípio expressamente consignado na atual Constituição da República, sobre a atividade punitiva da Administração Pública. Saliente-se, de antemão, no entanto, que não será essa cláusula constitucional, aqui, objeto de estudo em toda sua amplitude, pois o tratamento que lhe será dado, nas linhas abaixo, restringir-se-á, na verdade, à parte que concerne às implicações que, dela decorrentes, certamente contribuirão, de modo significativo, para o fornecimento dos elementos que ajudarão na obtenção das respostas que se perseguirão ao longo desta monografia. Deste modo, é feito o registro, desde logo, que não constitui pretensão destas linhas promover uma exposição completa – que faça referência a todos os seus aspectos - de tão rica e vasta garantia constitucional, uma vez que, conforme se perceberá, ater-se-á este capítulo, tão somente, à extração daquilo que se repute necessário à exploração da temática que se propôs este trabalho a investigar, qual seja, aquela relativa à atividade sancionadora desenvolvida pelos órgãos incumbidos de promover, na atualidade, a regulação econômica.

A abordagem, então, que irá se conferir ao princípio em tela, nestas linhas, dirá respeito, quase que integralmente, às regras que faz o mesmo incidir sobre os processos administrativos, não havendo qualquer compromisso desta obra, portanto, até mesmo por fugir aos seus objetivos, com as irradiações que seguramente detém a cláusula no campo jurisdicional. Além disso, dedicar-se-á a presente exposição, especificamente, à incidência daquele mandamento sobre a atuação sancionadora da Administração Pública, uma vez que

não irá interessar, às respostas a que aqui se almeja chegar, sua aplicação em face de outras espécies conhecidas de processos administrativos, aos quais se reportará apenas en passant.

4.1 DEVIDO PROCESSO LEGAL: PREMISSAS GERAIS À COMPREENSÃO DO