• Nenhum resultado encontrado

A REPERCUSSÃO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL NAS DIFERENTES

3 O PAPEL DO PROCESSO ADMINISTRATIVO NA ADMINISTRAÇÃO

4.4 A REPERCUSSÃO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL NAS DIFERENTES

Foi apontada, no capítulo anterior, em tópico próprio, a existência segura de três espécies distintas de processos administrativos. Naquela ocasião, mencionou-se, ainda, que o critério de que se utiliza para que desta forma se dividam reside na dimensão ou geração do respectivo direito fundamental que visa cada um a resguardar ou realizar. Advertiu-se,

também, na mesma oportunidade, ter sido esta a classificação adotada não porque se acredita que corresponda ela à mais correta, mas sim, por haver sua proposta se revelado como a mais útil aos objetivos que neste trabalho se perseguem.

Recordadas, então, todas estas premissas, resta agora avançar, neste espaço, às diferentes repercussões que são observadas, por força do devido processo legal, à tramitação processual de cada uma dessas espécies. Enfim, não se deve deixar de admitir que, à medida que se mostra distinta, de acordo com o grupo processual, a natureza do direito material a ser resguardado ou exercitado, diversas serão, seguramente, as exigências cuja satisfação terá o condão de qualificar o processo como adequado - e, portanto, devido - à edição do ato. Atente-se, desde já, que não se trata de pretender defender, aqui, uma eventual mitigação sofrida pelo princípio em face dessa classificação, mas sim, que haverá um grau de exigência maior, a depender da espécie processual, para que se vislumbre sua plena realização.

Assim, ao tempo que serve para avaliar o caráter dispositivo ou não de muitas das regras incidentes sobre a tramitação processual, é o direito material posto em evidência pelo processo administrativo, na verdade, perceba-se, que irá desempenhar, em última análise, o papel decisivo na definição da trajetória mínima que, em respeito ao devido processo legal, deverá ser obrigatoriamente seguida até a prolação do ato final pela autoridade competente172. Essa conclusão inevitavelmente deságua, conforme observa Bockmann Moreira, na construção de uma gradação axiológica entre os vários “tipos” de processo, razão pela qual o direito à liberdade pessoal exigiria um processo mais intenso, no sentido de mais rigoroso e

172 Acenando para algo semelhante que ocorreria com o princípio do contraditório, cujas exigências se definiriam

a partir da natureza do processo - e do direito nele controvertido – sobre o qual aquele incidisse, preceitua Ada Pellegrini Grinover que: “Partindo do processo civil, plenamente dispositivo, em que talvez se possa dizer que o contraditório, em seu segundo momento, se satisfaz com a mera possibilidade de reação; passando pelo processo civil indisponível, onde a falta de participação há de ser suprida de alguma maneira, e onde se lança mão de institutos como a intervenção necessária do Ministério Público e do curador do réu revel citado por editais, ou por hora certa; tramitando pelo processo trabalhista, onde a inferioridade econômica do trabalhador, numa estrutura capitalista, cria novos hábitos assistenciais no juiz, chega-se finalmente ao processo penal, com seu máximo publicista e seu mínimo de disponibilidade: aqui, não se podendo aceitar a aquiescência da limitação da liberdade, é igualmente impossível aplicar a pena, pela omissão da defesa” (GRINOVER, Ada Pellegrini. O

zeloso de suas consequências, do que um processo em que se discutam direitos absolutamente disponíveis ou até mesmo supérfluos173.

Dentro dessa perspectiva, é inequívoco que constitui o processo administrativo sancionador, em face das demais ações processualizadas desenvolvidas na seara da Administração Pública, a espécie onde o devido processo legal deve se revelar mais rigoroso. Afinal, da forma como ocorre com o processo jurisdicional penal, decorrem suas bases da atividade punitiva que compete ao Estado exercer, na qual, como se sabe, a supremacia e a indisponibilidade do interesse público em jogo, aliadas à investida lesiva que se intenta promover junto a relevantes parcelas da esfera jurídica do particular, impõem ao poder público a mais severa e inflexível obediência aos termos e ritos processuais.

Ademais, não se deve olvidar que carregam os processos administrativos onde se discutam direitos disponíveis, nas hipóteses que digam respeito a pretensões que favoreçam aos administrados, certa identidade com o direito processual civil, precipuamente no que diz respeito à liberdade que ambos conferem às partes interessadas para dispor de determinado rol de direitos que titularizam. Desta forma, ao se tomar por base aquelas que são exigidas ao exercício da atividade sancionadora, é de se perceber que acentuadamente atenuadas se revelam, nessas atuações da Administração Pública, as obrigações processuais indispensáveis à sua conformação ao devido processo.

Assentados, então, os aspectos que se têm por mais relevantes dentro da temática relativa ao devido processo legal, e que seguramente contribuirão para a obtenção das respostas a que ao final desta monografia se almeja chegar, compete, no capítulo seguinte, abrir-se espaço para o estudo da sanção administrativa, tema que figure no cerne da temática aqui desenvolvida.

173 MOREIRA, Egon Bockmann. Processo Administrativo. Princípios Constitucionais e a Lei 9.784/1999. 4ª

5 A SANÇÃO NO REGIME JURÍDICO-ADMINISTRATIVO

Já foi dado o merecido destaque, aqui, à considerável gama de competências transferidas às agências reguladoras com o fim de se viabilizar o exercício, por aqueles organismos, da atividade regulatória que lhes atribui a lei. Naquela oportunidade, enfatizou-se bastante, e cabe agora rememorar, a natureza de deveres-poderes que todas aquelas atribuições ostentam, evidenciada, sobretudo, por sua condição instrumental.

Retomadas, então, deste ponto, estas idéias, avançar-se-á doravante, neste capítulo que ora é aberto, para o estudo específico daquela competência que, dentre as várias previstas na regulação, deve seguramente destas linhas receber, considerados os objetivos do presente trabalho, uma atenção especial. Trata-se, como é de se deduzir, do dever-poder sancionador àqueles entes atribuído, cujo exercício, por expressa ordem constitucional, necessariamente demanda, dada a sua natureza e finalidade, a deflagração de toda uma rigorosa marcha processual, que é assentada, tal como já se alertou no capítulo anterior, nas balizas demarcadas pelo princípio do devido processo legal, tomado, inclusive, em sua acepção mais rígida.

Faz-se oportuno, então, que se frise, neste momento, que a conhecida atividade de impor sanções, à medida que já possui perfil claramente definido no âmbito do Direito Administrativo, não vem a revelar qualquer peculiaridade inerente às agências e nem tampouco a representar uma novidade até então ignorada por esse ramo específico do Direito. O motivo de ser reservado um cuidado especial ao seu estudo, toda que vez for conferida a entidades incumbidas da moderna regulação, reside unicamente, na verdade, no fato de estar ela confiada a organismos estatais apartados e autônomos da estrutura burocrática comum do poder político.

Portanto, sendo uma só a essência de toda e qualquer atividade punitiva que se desenvolva em nível administrativo, resta evidente que sobre ela deve incidir, também quando desempenhada no exercício regular de competência regulatória, o mesmo regime jurídico aplicável à generalidade das situações em que é verificada, razão pela qual se dedicará este capítulo, abaixo, a abordar os aspectos gerais mais importantes atinentes à sanção administrativa, notadamente os elementos nucleares que a caracterizam e os mais importantes princípios materiais que informam a disciplina de sua aplicação.