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3. A questão da transdisciplinaridade

3.1. A construção do debate em torno da transdisciplinaridade

A evolução do debate sobre a necessidade de adoção de abordagens que promovam a reaproximação das disciplinas, entre as quais a transdisciplinaridade, pode ser acompanhada em congressos e reuniões internacionais, reflexão a que se propõem Alvarenga, Sommerman e Alvarez, para quem, nesse espaço,

vai-se delineando e se constituindo, a partir de consensos sucessivos e progressivos, um corpo de conhecimentos acerca da transdisciplinaridade, fundamentado a partir da definição do que passa a ser caracterizado como pilares da transdisciplinaridade, considerados essenciais para a construção de uma metodologia transdisciplinar (ALVARENGA; SOMMERMAN; ALVAREZ, 2005, p.17).

Segundo Nicolescu (2003, 2005), o termo transdisciplinaridade foi empregado pela primeira vez no I Seminário Internacional Interdisciplinaridade - Problemas de Ensino e Pes-

quisa em Universidades, realizado na Universidade de Nice (França), de 7 a 12 de setembro

de 1970, sob o patrocínio do Ministério da Educação Francês e do Centro para a Pesquisa e Inovação do Ensino - CERI, órgão ligado à Organização para a Cooperação e Desenvol- vimento Econômico - OCDE, com o objetivo de elucidar os conceitos de pluridisciplinaridade e interdisciplinaridade e analisar sua utilidade no ensino e na pesquisa e sua adequação no desenvolvimento do conhecimento e da sociedade naquele momento (SANTOMÉ, 1998).

Um dos pontos de consenso desse seminário, do qual participaram representantes de 21 países, a maioria comprometida com as perspectivas sistêmica e estruturalista, foi, para Santomé, o de que “a crescente complexidade dos problemas enfrentados pelas sociedades modernas, nas quais as mudanças ocorrem a grande velocidade, exigem políticas científicas

que fomentem o trabalho e a pesquisa interdisciplinar” (SANTOMÉ, 1998, p.52). Na visão de Alvarenga, Sommerman e Alvarez (2005), esse seminário, apesar de não ter trazido gran- des avanços na discussão sobre a pluri e a interdisciplinaridade, tornou-se um marco inter- nacional importante na discussão sobre os pensamentos inter e transdisciplinar, levando a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura - UNESCO e a OCDE a desenvolver várias iniciativas destinadas a promover essas abordagens. Os trabalhos apresentados nesse seminário foram posteriormente reunidos em um livro, que se tornou referência fundamental para a discussão do tema (APOSTEL et al., 1972).

A palavra transdisciplinaridade apareceu em trabalhos de três participantes desse encontro: o psicólogo e filósofo suíço Jean Piaget (1972), o astrofísico austríaco Erich Jantsch (1972) e o matemático francês André Lichnerowicz (1972). Entretanto, Nicolescu (2005) declara ter recebido de Guy Michaud, um dos organizadores do encontro, a infor- mação de que o criador da palavra teria sido mesmo Jean Piaget, fato que ele ressalta como ainda pouco conhecido. Em seu texto, Nicolescu demonstra esse desconhecimento dizendo que pesquisou, no Google, a expressão ‘Jean Piaget’, obtendo 220.000 entradas, sendo que apenas 69 continham também o termo transdisciplinarity, metade delas citações de traba- lhos do próprio Nicolescu6.

Em 7 de março de 1986, a Unesco promoveu a realização, em Veneza, de um coló- quio intitulado A ciência diante das fronteiras do conhecimento, que Alvarenga, Sommerman e Alvarez (2005) classificam como o início da ‘história oficial da transdisciplinaridade’. Nesse congresso, foram discutidos temas como a defasagem entre o modo tradicional de fazer ciência e a nova visão de mundo trazida por descobertas das ciências naturais, principal- mente a biologia e a física. O comunicado final desse simpósio, intitulado Declaração de Veneza (ver Anexo 1), é um documento que registra uma posição crítica ao paradigma da ciência moderna e defende “a urgência de uma procura verdadeiramente transdisciplinar, de uma troca dinâmica entre as ciências ‘exatas’, as ciências ‘humanas’, a arte e a tradição” (COLÓQUIO A CIÊNCIA DIANTE DAS FRONTEIRAS DO CONHECIMENTO, 1986, p.2), que permita uma maior aproximação do real e forneça uma resposta melhor aos diferentes desafios contemporâneos. Os dezenove signatários desse documento, todos de renome internacional, eram oriundos de diferentes áreas de conhecimento e de diversos países, inclusive do Brasil, ali representado pelo matemático Ubiratan D’Ambrosio. Eles chamaram a atenção para a necessidade de responsabilidade social no desenvolvimento de pesquisas e

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A título de comparação, essa autora repetiu, em maio de 2009, as consultas feitas por Nicolescu, obtendo 1.040.000 resultados para “Jean Piaget”, 2.130 para sua combinação com transdis- ciplinarity e 529 entradas para a combinação com transdisciplinarité, o que confirma o achado de Nicolescu (2005).

na sua aplicação, e expressaram a esperança de que a Unesco continuasse a estimular a reflexão orientada para a universalidade e a transdisciplinaridade, o que efetivamente acon- teceu, como veremos ao longo desse texto.

Alvarenga, Sommerman e Alvarez (2005) relatam que vários desses signatários, pre- sididos pelo físico teórico romeno Basarab Nicolescu, produziram outro fato importante no histórico da transdisciplinaridade: a criação, em 1987, do Centre International de Recher-

ches et d’Études Transdisciplinaires - CIRET, centro que congrega personalidades de dife-

rentes áreas das ciências, das artes e das tradições, oriundos de países diversos7, e que participou ativamente na realização de vários eventos internacionais posteriores à sua fun- dação. O sítio desse centro na Internet informa que seu objetivo é desenvolver a atividade de pesquisa dentro de uma nova abordagem científica e cultural, a transdisciplinaridade, levando em conta as conseqüências do fluxo de informação que circula entre os diversos campos de conhecimento, e criar um espaço de encontro e diálogo entre especialistas de diferentes áreas e de outros domínios de atividade (CIRET, 2009). Segundo Sommerman, esse “é o núcleo de pesquisas transdisciplinares mais avançado no mundo no que diz res- peito à reflexão e pesquisa teórica sobre os fundamentos e os conceitos transdisciplinares” (SOMMERMAN, 2003, p.104).

A Unesco, concretizando a esperança manifestada na Declaração de Veneza, reali- zou um outro evento com o objetivo de promover a reflexão sobre a transdisciplinaridade, que teve lugar em Paris, no período de 2 a 6 de dezembro de 1991. Trata-se do Congresso

Ciência e Tradição: Perspectivas Transdisciplinares para o século XXI, que, segundo Som-

merman (2003, 2006) teve o mérito de explicitar fundamentos teóricos e epistemológicos que nortearam as reflexões de muitos outros congressos sobre o tema. O documento final produzido nesse congresso8 (ver Anexo 2), traz sete pontos fundamentais sobre os quais os participantes estiveram de acordo e que indicam a necessidade de uma nova abordagem científica e cultural: 1) reconhece o enfraquecimento da cultura em todos os países; 2) iden- tifica como uma das causas desse enfraquecimento a onipotência da tecnociência como úni- co caminho para a verdade; 3) indica que a física quântica derrubou os conceitos clássicos de continuidade, localidade e determinismo, trazendo para a ciência a possibilidade de diálo- go com a tradição; 4) caracteriza a transdisciplinaridade como a busca de espaços de intera-

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Sommerman (2003) informa que, em 2003, o Ciret contava com 167 membros, provenientes de mais de 24 países. No sítio do Centro, seu conselho administrativo é apresentado como composto pelos seguintes nomes: Basarab NICOLESCU, Presidente; Michel CAZENAVE, Vice-Presidente; Ludovic BOT, Secretário Geral; Andreù SOLÉ, Tesoureiro; René BARBIER; René BERGER; Dominique DÉCANT; Georges GUELFAND; Edgar MORIN; Richard WELTER (CIRET, 2009).

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O comitê de redação desse documento foi composto por Rene Berger, Michel Cazenave, Roberto Juarroz, Lima de Freitas e Basarab Nicolescu.

ção entre ciência e tradição; 5) afirma que a transdisciplinaridade reconhece o valor da es- pecialização, mas busca ultrapassá-la, para recompor a unidade entre ciência e cultura; 6) reafirma a impossibilidade da existência de especialistas transdisciplinares, pois a transdisci- plinaridade não é uma metodologia ou superdisciplina, e sim uma atitude; 7) identifica como desafio da transdisciplinaridade a geração de uma civilização aberta para a singularidade de cada um e para a inteireza do ser.

De acordo com Sommerman, a Unesco estabeleceu parceria com o Ciret para a pro- moção de eventos relacionados à transdisciplinaridade, sendo o primeiro deles o I Congres-

so Mundial da Transdisciplinaridade, realizado no Convento de Arrábida, em Portugal, de 2

a 6 de novembro de 1994. Contando também com estudiosos de reconhecimento mundial, produziu um documento final, intitulado Carta da Transdisciplinaridade9, assinado por 62 participantes, oriundos de 14 países (SOMMERMAN, 2003, 2006). Os catorze artigos desse documento (ver Anexo 3) avançam na definição do conceito e da metodologia transdiscipli- nares, a partir das seguintes considerações: a proliferação das disciplinas e o crescimento do saber tornam impossível enxergar o ser humano; a compreensão do complexo mundo atual e o desafio da autodestruição só podem ser enfrentados por uma inteligência mais ampla; o triunfo da tecnociência é uma ameaça à vida; a ruptura entre conhecimento e ser humano leva a um novo obscurantismo; o crescimento do saber é um fator de desigualdade; o próprio crescimento do conhecimento pode levar a uma nova humanidade. Ali se encontram princípios que defendem a prerrogativa do ser humano em relação à economia e mesmo à ciência, a existência de diferentes níveis de realidade e lógicas, a complemen- taridade à aproximação disciplinar, a abertura da racionalidade através e além das discipli- nas e o dialogo entre ciências exatas, ciências humanas, arte, literatura e espiritualidade. A carta faz ainda a caracterização da transdisciplinaridade como multirreferencial e multidi- mensional, reconhece a ordem cósmica e planetária da dignidade humana, prega a abertura em relação a outros tipos de conhecimento, como mitos, religiões, intuição e imaginação e a necessidade de uma nova ética, e apresenta o rigor, a abertura e a tolerância como sendo as características fundamentais da atitude transdisciplinar.

Outra importante contribuição para o debate foi dada também pela parceria UNES- CO/CIRET, com a realização, em 1997, em Locarno, na Suíça, do congresso Que Universi-

dade para O Amanhã? Em Busca de uma Evolução Transdisciplinar da Universidade, fórum

no qual foram discutidas novas diretrizes para a instituição universitária, de modo a fazer dela um local de prática e disseminação do pensamento complexo e transdisciplinar.

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O documento foi redigido por um comitê composto por Lima de Freitas, Edgar Morin e Basarab Nicolescu.

Segundo Japiassu (2006), o congresso de Locarno mostrou que a universidade atual enfrenta duas ameaças, que são a ausência de sentido e a recusa em compartilhar conheci- mentos, sendo necessário que ela passe por uma reforma que lhe permita promover a con- textualização e a globalização, entendidas como a reinscrição do conhecimento em seu con- texto e em seu conjunto, ou seja, a busca de uma evolução transdisciplinar. Naquele evento, foi utilizado como documento de trabalho um projeto intitulado Evolução Transdisciplinar da

Universidade, elaborado pelo CIRET, representado por Basarab Nicolescu, e pela Unesco,

representada por Madeleine Gobeil, com o objetivo de fazer com que a Universidade retome sua missão de estudo do universal, diante de um mundo cuja complexidade cresce sem cessar. A elaboração prévia desse documento, que passou a ser conhecido como Síntese

do Congresso de Locarno (ver Anexo 4), foi feita sob a coordenação de um grupo diretor do

qual faziam parte pesquisadores das mais variadas origens, tanto em termos de países quanto das áreas de conhecimento. Novamente, o Brasil estava ali representado pelo mate- mático Ubiratan d’Ambrosio. Alvarenga, Sommerman e Alvarez (2005) creditam a esse do- cumento o mérito de terem sido ali propostas a definição dos três níveis de relações disci- plinares (pluri, inter e transdisciplinaridade) e, especialmente, a tríade que passou a ser con- siderada por muitos como o ‘paradigma transdisciplinar’, os três pilares metodológicos da pesquisa transdisciplinar que passaram a nortear avanços teórico-metodológicos na produ- ção do conhecimento transdisciplinar: a Complexidade, a Lógica do Terceiro Incluído e os Diferentes Níveis de Realidade, os quais serão discutidos na seção 3.1 deste capítulo,

Definindo a transdisciplinaridade, ao se enfocar a proposta de Nicolescu para a abordagem

transdisciplinar. Já os pontos levantados em Locarno para direcionar a universidade rumo ao trabalho transdisciplinar serão apresentados na seção 4.4, Universidade e transdiscipli-

naridade. Alvarenga, Sommerman e Alvarez ressaltam a importância do documento Síntese

do Congresso de Locarno, por considerar que ele

passa a representar o ponto de partida, a matriz básica de um pensamento transdisciplinar que se estrutura a partir dos vários colóquios e congressos internacionais já mencionados, capaz de representar, pelo poder heurístico que encerra uma ampla fertilização cruzada de saberes (ALVARENGA, SOMMERMAN E ALVAREZ, 2005)

Em 2000, teve lugar em Zurique, Suíça, no período de 27 de fevereiro a 01 de mar- ço, mais uma grande conferência transdisciplinar, a International Transdisciplinarity Confe-

rence: Transdisciplinarity: Joint Problem-Solving among Science, Technology and Society,

organizada em conjunto pela Fundação Nacional de Ciência da Suíça, pelo Instituto Federal de Tecnologia da Suíça e pela empresa Asea Brown Bovery, também com o patrocínio da Unesco (SOMMERMAN, 2003; KLEIN et al., 2001). Essa conferência contou com quase 800 participantes, de cerca de 50 países, e resultou na publicação de um livro com o mesmo

nome10. Na síntese da conferência, elaborada pelos editores do livro, a transdisciplinaridade é apresentada como uma palavra relativamente nova, mas como uma atitude já de longa tradição na busca de soluções de problemas concretos pelo trabalho conjunto de cientistas e outros atores. Ela é vista, ali, como “um termo que abarca uma variedade de diferentes formas de ciência cujo objetivo não é apenas ganhar conhecimento, mas estimular inova- ções” (KLEIN et al., 2001, p.263), estabelecendo novas parcerias entre ciência, política, administração, setor econômico e o público, disso emergindo um novo acordo entre a aca- demia e o meio externo a ela. Ela seria “uma nova forma de conhecimento e solução de pro- blemas envolvendo a cooperação entre diferentes partes da sociedade e a academia, de modo a enfrentar os desafios complexos da sociedade” (KLEIN et al., 2001, p.7), uma forma de pesquisa dirigida à demanda, que inclui parceiros externos à academia. O conhecimento resultante da interação entre os diversos atores envolvidos na busca de solução de um problema específico, incluindo-se aí o conhecimento local, o conhecimento científico, o conhecimento das empresas em geral e de ONGs, é mais amplo que aquele que cada parti- cipante detém e o viés que cada perspectiva carrega também é minimizado por essa interação.

O desenvolvimento de projetos transdisciplinares implica em algumas exigências: metas claras, para que os participantes possam se engajar nesses objetivos; preparação cuidadosa, que leve em conta a exeqüibilidade do projeto; gerenciamento competente, para minimizar atritos entre os membros da equipe e promover a criatividade; e, por fim, recursos suficientes para sua execução, pois geralmente esse tipo de pesquisa tem um custo maior que o da pesquisa tradicional (KLEIN et al., 2001). O documento chama a atenção, entre- tanto, para o risco de a transdisciplinaridade ser tomada como mais uma moda, deixando claro que é necessário ter paciência, pois o desenvolvimento da cooperação transdisciplinar ainda está em construção, mas ela terá um papel decisivo nas relações entre democracia, economia de mercado e ciência. As conclusões da conferência de Zurique, que também estão reunidas no livro gerado pelo evento, chamam a atenção para a introdução de novas formas de comunicação, cooperação e gerenciamento de conflitos, que retira a ciência de sua torre de marfim e a expõe ao público, o que estaria, de certa forma, desconcertando a comunidade científica.

Segundo Sommerman (2003, 2005), que participou dessa conferência, ali se impri- miu uma perspectiva quase puramente pragmática à transdisciplinaridade, desconsiderando os avanços teóricos e epistemológicos decorrentes dos eventos anteriores relacionados à transdisciplinaridade. Tal atitude reduziria as possibilidades de tratar o tema de forma ade-

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quada, fato que provocou a reação de um grupo de participantes, os quais formularam e distribuíram aos demais uma declaração (ver Anexo 5), que foi também anexada às atas da conferência e parcialmente incluída no livro publicado posteriormente, em que os signatários destacam pontos contidos nos documentos finais dos congressos de Arrábida, em 1994, e o de Locarno, em 1997, para protestar contra essa redução e defender uma visão mais ampla da transdisciplinaridade. Essa mesma posição havia levado, segundo relato de Sommerman (2003), o presidente do CIRET, Basarab Nicolescu, a desligar-se do Comitê Científico dessa conferência, do qual ele inicialmente fazia parte. Em função disso, Alvarenga, Sommerman e Alvarez (2005) optam por não incluir esse evento entre os que contribuíram para o avanço do pensamento transdisciplinar. Entretanto, é preciso ressaltar que Julie Klein, uma das organizadoras da conferência e também editora do livro dali resultante, é um dos nomes mais reconhecidos na discussão sobre transdisciplinaridade.

O próximo evento que Alvarenga, Sommerman e Alvarez (2005) incluem no processo de construção do pensamento transdisciplinar é o II Congresso Mundial de Transdisciplinari-

dade, realizado em Vila Velha/Vitória (Espírito Santo, Brasil), de 6 a 12 de setembro de

2005, pelo Governo do Estado do Espírito Santo, pelo CIRET, pelo Centro de Educação Transdisciplinar - CETRANS, pela Universidade Federal do Espírito Santo, pela UNESCO e por outros sete centros brasileiros e europeus de estudos e pesquisas transdisciplinares. Contou com cerca de 370 participantes, representando 17 países, 50 universidades brasi- leiras e 10 estrangeiras. Ali estiveram 26 pesquisadores estrangeiros, das mais diferentes áreas do conhecimento, e foram apresentados 187 trabalhos. O objetivo principal desse congresso foi criar um espaço-tempo em que pudessem ser tratadas questões transdisci- plinares relativas à pesquisa e à ação transdisciplinar, dando especial atenção às atividades colaborativas. Segundo Alvarenga, Sommerman e Alvarez (2005), as conferências e pa- lestras ali proferidas aprofundaram e ampliaram a discussão em torno dos três pilares defini- dos no Congresso de Locarno (a Complexidade, a Lógica do Terceiro Incluído e os Diferen- tes Níveis de Realidade), chegando algumas delas a sugerir a introdução de novos pilares.

O documento final do II Congresso Mundial de Transdisciplinaridade, intitulado Men-

sagem de Vila Velha/Vitória11 (ver Anexo 6), se propõe a recordar, valorizar, ampliar e con- textualizar os princípios da Carta da Transdisciplinaridade, produzida no I Congresso Mun-

dial da Transdisciplinaridade, e foi estruturado em três eixos: 1) a atitude transdisciplinar,

que propõe a articulação dos saberes das ciências, das artes, da filosofia, das tradições sapienciais e da experiência em torno da busca da compreensão da complexidade do nosso

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O comitê editorial desse documento foi composto por Américo Sommerman, Maria F. de Mello e Vitória Mendonça de Barros, todos ligados ao CETRANS.

universo, das relações entre sujeitos, dos sujeitos consigo mesmos e com os objetos que os circundam; 2) a pesquisa transdisciplinar, que pressupõe a pluralidade epistemológica; e 3) a ação transdisciplinar, que propugna a articulação da formação do ser humano na sua relação com o mundo, com os outros, consigo mesmo, com o ser e com o conhecimento, tanto o formal quanto o não formal. A declaração de intenções que consta nessa mensagem afirma que esses três eixos devem ser articulados para servir de base à projeção de ações presentes e futuras. Nas conclusões, o documento esclarece que essa articulação é uma resposta à complexidade do mundo atual, perpassa todos os níveis da educação, assim como a Ciência, a Filosofia e as Humanidades, busca evitar a rigidez da institucionalização, mas pretende permear as instituições, sem se limitar a elas, e reconhece diferentes modos e níveis de expressão. O documento conclui recomendando a criação de cátedras trans- disciplinares itinerantes, universidades virtuais transdisciplinares, programas universitários, nos vários níveis, voltados para a transdisciplinaridade, o desenvolvimento de modelos e ações críticos ao modelo da tecnociência, bem como de critérios de avaliação transdis- ciplinar dessas ações, e, finalmente, a realização de encontros que estimulem a atitude, pesquisa e ação transdisciplinares.

Para Alvarenga, Sommerman e Alvarez (2005), os encontros internacionais voltados para a discussão da transdisciplinaridade mostram que a busca pelo pensamento transdis- ciplinar já tem uma história, sendo eles um espaço para comunhão de idéias sobre a cons- trução de conhecimento e de ideais sobre a natureza do conhecimento. Eles têm também contribuído para uma melhor definição do que seja a transdisciplinaridade, definição essa que é o tema da seção seguinte.