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6. Resultados da pesquisa

6.6. Quanto às redes

Outro tema investigado durante as entrevistas foram as redes, que Castells (1999) enxerga como sendo o tipo de organização básica da sociedade atual. As perguntas diziam respeito ao entendimento do conceito de rede, sua utilidade na questão da transdis- ciplinaridade e à participação em redes de pesquisadores.

Com relação ao conceito de rede, discutido na revisão de literatura com o apoio de França (2002) e Marteleto (2000), chamou especialmente a atenção o fato de muitos dos entrevistados o definirem como sendo a Internet, mesmo usando, durante a entrevista, o termo rede com múltiplos significados. Isso talvez seja um indicativo da onipresença que essa ferramenta tecnológica desfruta nos dias atuais. Mas alguns dos pesquisadores demonstraram ter uma visão mais ampla do que seja uma rede. As falas apresentadas a seguir exemplificam essas duas situações:

Ela m ótima, porque, primeiro, permite essa pluralidade de acervos e arquivos, que você consegue na rede e que não teria antes. É difícil, hoje, você começar a estudar um assunto. Por exemplo, Fra Mauro, um geógrafo do smculo XV, quem m esse cara? Aí, eu vou lá, no Google, digito lá, ele já me dá acesso a uma introdução, o que antes era muito mais difícil. O primeiro ponto m esse, uma acessibilidade, uma facilidade muito grande, m genial isso. Outro ponto seria na própria produção. A confecção de produtos de forma compartilhada, interativa, em grupos, em equipes, isso nos vai levar a trabalhos fantásticos, inclusive esses trabalhos de conexão de um pesquisador da China com um dinamarquês, e comigo, aqui. A gente vai ter que se aparelhar intelectualmente para isso, para conseguir isso, porque aparelho tmcnico nós já temos para fazer isso constantemente. E isso dá origem a uma dimensão, como a gente já falou, de uma autoria coletiva do trabalho intelectual, do trabalho científico, do trabalho tecnológico, uma situação muito mais rica.

Entr. 6, IEAT Eu tambmm vou falar como leigo. Hoje, eu acordo de manhã, a primeira coisa que eu faço, quase, m ligar a Internet. E, antes de dormir, ainda vou lá e vejo se chegou alguma mensagem. É quase um vício.

Entr. 18, Projeto Manuelzão

A rede m um espaço de prática do conhecimento, não só do conhecimento, mas de relações que estabelecem instituições, grupos de pesquisa, diversos atores, para atuar em determinados temas, em que não há uma hierarquia, sob o ponto de

vista da importância disciplinar ou institucional. Cada ponto da rede tem certa independência, mas tem uma grande dependência, tambmm, dos outros, mas ele tem uma autonomia, eu quero dizer. Eu penso rede um pouco assim.

Entr. 17, Projeto Manuelzão Domingues (2005c) vê a rede como um modo de organização que favorece a instau- ração do trabalho transdisciplinar, por permitir o trabalho conjunto de ciências, tecnologias e artes, num sistema aberto, não hierárquico. Essa visão é compartilhada pelos entrevistados, mas alguns fizeram ressalvas a ela:

Uma das características da transdisciplinaridade m a propriedade emergente. Agora onde m que a propriedade emergente vai poder aflorar de forma mais plena? Quando as pessoas, aí entra o modelo de rede, estão trabalhando em rede, web 2.0, ou rede de pessoas, ou redes sociais, redes de empresas, estão trabalhando em rede. Ao estar trabalhando em rede, a comunicação, a informação, ela m a base, o subs- trato mediador de tudo isso, então a tecnologia da informação m que vai propiciar a prática da transdisciplinaridade com mais plenitude e intensidade no futuro mediado por ela.

Entr. 3, IEAT Nas redes sociais, eu acho que, atravms do contato entre as pessoas, no convívio das pessoas, nos debates etc., você consegue trabalhar, debater questões de interpretação individual pessoal, dentro da vivência, da experiência de cada um, do conhecimento de cada um, e ali você consegue atravms da reunião dos grupos nas redes sociais, tentar emergir um caráter transdisciplinar, ao fazer a discussão com todo mundo, atravms de debates, discussões etc. E as redes de informação, as redes sociais estão embutidas tambmm nas redes de informação, elas proporcionam uma interlocução, elas proporcionam uma facilidade de encontro das pessoas em rede, do meio, do grupo social em rede, para que cada um, com suas experiências, possa trazer à tona um pensar ou uma reflexão trans, em que você aproveita a contribuição de cada um, a experiência de cada um e emerge um sentido transdisciplinar.

Entr. 16, Projeto Manuelzão O fato de estar em rede não significa que o trabalho m transdisciplinar, ela serve para lá e para cá. Mas como não tem o trans e o inter sem a disciplina, que não m inimiga, a rede favorece, vai ser o lugar da emergência do inter e do trans. A pirâmide não, a pirâmide m mais complicada, o sujeito vai se isolar e vai procurar a hegemonia, vai procurar o topo. O mais esperto vai procurar o topo da pirâmide. [...] Então, para mim m isso, a rede m o que tem, m o que importa. [...] A rede pode servir para lá ou para cá. O fato de estar rede não garante nada. A maioria dos que trabalham em rede trabalham em base disciplinar.

Entr. 2, IEAT Por fim, foi perguntado aos entrevistados sobre sua participação em redes de pesqui- sadores. A maioria respondeu afirmativamente a essa pergunta, mas surpreendeu o fato de

que dois entrevistados ligados ao IEAT, cuja defesa da importância das redes na transdisci- plinaridade havia sido veemente, disseram não participar de redes desse tipo:

Eu trabalho em rede, m. O que eu faço m uma coisa muito especializada e, no Brasil, tem pouca gente que faz e, no mundo, inclusive, como m um trabalho meio árduo, só os loucos, os poucos, que fazem. Acaba que está diminuindo o número de pessoas que fazem este tipo de trabalho. Então, com freqüência eu sou solicitado para colaborar. Hoje mesmo eu recebi convite da Funed. Tem um material meu no Mmxico, já colaborei com uma pessoa da Suíça. Por outro lado, eu tambmm preciso de colaboração. Atm porque, se eu fizesse a coisa sozinho, ia ficar muito limitado. Quer dizer, eu colaborar com essas pessoas m muito bom, porque elas estão descobrindo umas coisas novas, que fazem um tipo de trabalho que eu não faço. Poderia fazer, mas eu acho que m besteira ficar reproduzindo, se eu posso colaborar com essas pessoas. Então, na verdade, o meu trabalho m muito em rede. Eu tenho alguns traba- lhos com um número enorme de autores.

Entr. 1, IEAT Eu, propriamente, não me sinto bem na rede. Algumas coisas do IEAT, a gente define em rede, mas eu não me sinto bem, pela minha própria formação, meu trabalho intelectual m muito solitário. Eu sou um cara meio solitário, meio monástico, eu não sou um cara que trabalha bem na rede. Eu prego muito a solidão monástica do trabalho intelectual, pelo menos eu cresci nela, então nada melhor para mim do que ser capturado pela rede de um livro, de um texto, de poesia ou de história, eu prefiro ser capturado nela do que pela rede de gente na Internet, ou no telefone celular. Minha grande dificuldade hoje, eu que sou meio quixotesco, ou seja, uma pessoa que tinha uns códigos de vida em sociedade que não funcionam mais nessa sociedade contemporânea, minha grande dificuldade hoje m manter o meu lugar, porque, às vezes, o celular ou a Internet, eles sempre te tiram do lugar. Eu estou aqui e toca o celular, ou então estou com uma preocupação aqui, estou na Internet vendo uma coisa, e a minha preocupação se desloca, atm para o mesmo assunto, mas eu perco o jeito, então eu tenho muita dificuldade com isso, atm talvez pela questão da idade, eu estou ficando mais impaciente. Então, eu acho que o meu trabalho em rede, ele não rola muito. Eu disponibilizo meu trabalho em rede, na revista eletrônica, uma das poucas da UFMG. [...] Então, o trabalho eu disponibilizo, prezo e uso muito a rede, mas a produção do trabalho em rede eu tenho dificuldade.

Entr. 6, IEAT