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A dependência da trajetória e a mudança institucional no institucionalismo histórico

1. MARCO TEÓRICO

1.3 Instituições e mudança institucional

1.3.2 A dependência da trajetória e a mudança institucional no institucionalismo histórico

Schmidt (2005, p. 115) argumenta que um dos problemas inerentes ao institucionalismo histórico é que sua lógica de explicação, a dependência da trajetória, é estática. Em outras palavras, seria baixa a sensibilidade para mudança institucional neste tipo de institucionalismo. Vale ressaltar que o se chama de institucionalismo histórico na verdade é uma amalgáma de várias correntes teóricas bastantes distintas

entre si. Assim, se a autora refere-se somente a “dependência de trajetórias” como em North, provavelmente tem razão. Como mostra Lanzara, “o conceito de ‘dependência das trajetórias’ é frequentemente definido segundo a noção imprecisa de que os acontecimentos passados predeterminam as ocorrências futuras. Em sua versão mais aproximada à literatura do desenvolvimento econômico, assume-se que, uma vez fixada uma dada trajetória de desenvolvimento, torna-se difícil reverter seu curso de ação futuro (2011, p. 94-95)”. Citando North (1991), o autor argumenta que nessa perspectiva as mudanças ocorreriam incrementalmente através de um processo de “equilíbrio pontuado”, estando limitadas por longos períodos de continuidade (LANZARA, 2011, p. 94-95). Nessa perspectiva, pode-se defender que é correto o argumento de Schmidt sobre o caráter estático do institucionalismo histórico.

No entanto, a alusão a outros autores muda completamente a figura. O primeiro destes é Ebbinghaus (2005, p. 5), o qual, após criticar o que chama de “dependência da trajetória determinista”, propõe alternativamente uma “dependência da trajetória não determinista”. A primeira vertente de dependência da trajetória, por ele chama também de “trodden trail”, possuiria quatro características, compiladas por Arthur (1994, apud ACKERMANN 2001): (I) probabilidades idênticas de ocorrer o fenômeno no iníco do processo dependente da trajetória; (II) o caminho escolhido é maciçamente aceito pelos participantes, gerando uma espécie de “efeito-clube”; (III) o caminho é “bloqueado” em função da incidência de custos afundados, incorridos pelos agentes quando de sua aceitação; e (IV) o caminho escolhido é potencialmente ineficiente. Segundo Ebbinghaus (2005, p.11), outra característica da “dependência da trajetória determinista” é que a mudança institucional só se processa através de choques exógenos; isto é, os agentes seriam incapazes de mudar de trajetória por conta própria.

Neste sentido, o autor propõe a supracitada “dependência da trajetória não determinista”, em que haveria maior possibilidade de mudança institucional. Para ele, as instituições emergiriam em junções críticas em que, estruturados pelas escolhas anteriormente feitas, atores estratégicos estabelecem novas regras. Na fase seguinte, essas escolhas são institucionalizadas. Os atores dariam “feedback positivo” àquela escolha, conferindo-lhe aceitação institucional e legitimidade. Seguindo um mecanismo de funcionamento que poderia ser descrita como sendo cíclico, as decisões tomadas na primeira junção crítica e que foram institucionalizadas através de “feedback positivo”, podem ser questionadas novamente em uma nova junção crítica. Já numa segunda

junção crítica podem ter mudado, inclusive, os estruturantes da decisão inicial. Mesmo assim, as decisões que são também tomadas na nova junção crítica são estruturadas pelas escolhas anteriormente feitas. Existe então a possibilidade de que o caminho se consolide ainda mais, mas também de que sofra mudanças marginais ou que seja completamente abandonado. Vale lembrar ainda que, de acordo com Streeck (2011, p. 21), as junções críticas podem ser marcadas pelo conflito entre os atores estratégicos. Quase sempre o Estado é uma parte interessada na mudança institucional, embora nem sempre consiga valer seus interesses.

Para compreender a possibilidade de mudança na segunda junção crítica são profícuos os argumentos de Streeck e Thelen (2009). Os autores pensam as instituições como regimes, nos quais se estipula comportamentos considerados adequados e se exclui os que são considerados adequados (ibidem, p. 108). Para eles, os atores sociais buscariam a todo tempo reinterpretar as regras societais a seu favor, de tal maneira que nem sempre o que é pretendido pelo formulador das regras é alcançado. Ademais, a reinterpretação das regras pode incutir vantagem para grupos ascendentes. Retomando Ebbinghaus (2005), a segunda junção crítica deve ser pensada como a oportunidade para aqueles que ditam as regras as reformularem, buscando adequá-las aos objetivos pretendidos. Para Streeck e Thelen (2009) a mudança institucional pode ser descrita como um processo dinâmico, contínuo, e muitas vezes silencioso. Não obstante, os autores enfatizam também que há limites à capacidade de se alcançar regras impossíveis de serem reinterpretadas, uma vez que o criador das regras não pode prever todos os possíveis desdobramentos ou podem desejar manter deliberadamente algum grau de não especificação para que a regra seja cumprida (ibidem, p. 110-2).

Vale a pena mencionar também o trabalho de Pierson (2004). Como explica Boschi (2011), uma das principais contribuições deste autor foi ter considerado a dimensão temporal na análise da mudança institucional (ibidem, p.14). Assim, Pierson adiciona uma quinta característica aos processos de mudança institucional dependentes da trajetória: o sequenciamento dos eventos importa, isto é, as decisões iniciais importam muito mais do que as que são tomadas depois (PIERSON, 2004, p.18). Assim, com a existência de “feedback positivo” em relação a uma dada escolha inicial, aumenta a probabilidade de que esta seja continuada. A análise de Pierson reforça também o argumento de Streeck e Thelen (2009, p.110-2) de que os processos de mudança institucional podem ser muito lentos. Ademais, sua contribuição serve para

ilustrar que aquilo que geralmente entra na história como o “estopim” da mudança institucional em realidade faz parte de um longo processo de erosão das condições de estabilidade institucionais (PIERSON, 2004, p. 135).

1.3.3 A dependência da trajetória e a mudança institucional no institucionalismo