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2. DUAS INTEPRETAÇÕES SOBRE A LEI DA PARTILHA

2.1.1 A etapa da agenda

A etapa da agenda refere-se à inclusão “(...) do pleito ou necessidade social na

agenda, na lista de prioridades, do poder público” (ibidem, p. 33).

No caso aqui analisado, a interpretação dominante é que o pleito de mudar o marco regulatório - para um que atribuísse maior papel ao controle Estado – tenha entrado na lista de prioridades do poder público quando a Petrobras anunciou, em novembro de 2007, testes confirmando a existência de uma megajazida na camada pré- sal na Bacia de Santos (PIQUET e TERRA, 2011, p. 28). Naquele momento a empresa anunciava um potencial de 5-8 bilhões de barris de óleo equivalente no campo de Tupi, que viria se chamar Lula. No mesmo mês o CNPE - publicou a Resolução nº 6/2007, destacando que os resultados dos testes da Petrobras eram bastante favoráveis. Na

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Lei nº 12.351/2010 39

mesma resolução, o órgão determinou à Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis – daqui em diante ANP - a exclusão dos blocos situados na bacia do pré-sal da Nona rodada de licitações, realizada em dezembro de 2007. Como destaca Caselli (2012, p. 109), citando o MME-, àquela época apenas 25% da área do pré-sal encontrava-se concedida pela ANP, dos quais 85% sob controle da Petrobras. Segundo o autor, tratava-se de uma área com baixo risco exploratório e geológico, de tal maneira que se deparou com um cenário distinto daquele encontrado à época da promulgação da lei do petróleo de 1997. Para Pinto Junior e Iootty (2010, p. 39), houve uma mudança na relação risco-prêmio, o que aumentaria o interesse naquelas possíveis reservas como possível riqueza nacional. Dessa maneira, urgia que se providenciassem mudanças. O pleito estava lançado.

Considerando também a dinâmica internacional como um possível fator indutor de mudanças, vale destacar que já desde o início dos anos 2000 havia uma tendência muito difundida no plano internacional da volta ao fechamento na indústria, após um intenso ciclo de reestruturações liberalizantes nos anos 1980 e 1990 (STEVENS, 2008, p. 43). Em outro trabalho, essa tendência dos Estados retomarem suas indústrias de petróleo - ao menos na Rússia, na Venezuela e no Brasil - foi chamada de “paradigma da retomada”, em oposição ao “paradigma da concessão” (EBELING, 2012, p.1). Como explica Stevens (2008), o “nacionalismo energético” seria um fenômeno cíclico, decorrente de fatores exógenos e endógenos. No plano exógeno o autor cita o grau de aceitação ideológica da intervenção estatal na economia, o grau de pobreza do país e a natureza do nacionalismo de uma forma geral. Estes fatores exógenos poderiam induzir com maior probabilidade uma nacionalização dependendo da habilidade de atores estratégicos em manobra-los junto à opinião pública. No plano endógeno, o autor cita como fatores determinantes para o “nacionalismo energético” o preço do petróleo, o grau de competição por áreas de exploração petrolífera no mundo, a habilidade dos negociadores e a necessidade de capital, tecnologia e mercados que as empresas privadas poderiam prover (ibidem, p.42-3). Ainda segundo Stevens (ibidem, p. 43), o caráter cíclico do “nacionalismo energético” seria decorrente da dinâmica dos preços petrolíferos. Para o autor, um período de “nacionalismo energético” seria desencadeado por preços altos, que por sua vez desencadeariam menores investimentos, o que teria como resultado a diminuição das reservas e da produção. Isso faria com que os preços subissem ainda mais, encorajando mais “nacionalismo energético”. Não obstante, os

maiores preços provocariam uma resposta dos mercados, que inundariam o mercado com petróleo, de tal maneira que em algum momento os preços caíssem novamente. O resultado seria, em algum ponto no futuro, a diminuição do ímpeto do “nacionalismo energético”. Essa descrição de certa maneira dialoga com a tese do superspike, elaborada por analistas do Goldman Sachs e discutida por Serrano (2008, p. 153). Segundo essa análise, preços baixos desencorajariam investimentos, reduzindo a capacidade ociosa. Em algum ponto futuro isso desencadearia preços elevados novamente. Trata-se de uma das possíveis explicações para a atual alta dos preços, iniciada no começo dos anos 2000, referente à falta de investimentos nos anos 1990.

O gráfico 2 abaixo foi elaborado por Jones Luong e Weinthal (2010, p.8) com base na estrutura de propriedade de 50 indústrias petrolíferas do mundo. Segundo o estudo, em 2005 dezoito países tinham como proprietário dos recursos petrolíferos o Estado, mas estava sob concessão. Doze países tinham como proprietário dos recursos petrolíferos o Estado e uma empresa estatal a comandá-lo. Finalmente, em 16 países empresas estrangeiras privadas eram proprietárias dos recursos petrolíferos. Dessa maneira, percebe-se uma tendência mundial de maior controle estatal sobre esses recursos. Segundo a revista The Economist, em 2012 treze gigantes petrolíferas estatais controlavam mais de três quartos das reservas petrolíferas globais40.

Gráfico 2 – Variação na estrutura de propriedade da indústria de petróleo no mundo

S1 = Propriedade estatal com controle

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S2 = Propriedade estatal sem controle P1 = Propriedade privada doméstica P2 = Propriedade privada estrangeira

Fonte: Jones Luong e Weinthal (2010, p. 8)

Embora essa narrativa cíclica sobre recursos naturais tenha funcionado razoavelmente bem, não é possível prever em que medida no futuro poderá haver uma reversão no ciclo de nacionalismo energético. No caso brasileiro, o ímpeto de “fechar” a indústria ocorreu em um período de preços altos, notadamente a partir dos anos 200041. Os fatores exógenos apontados por Stevens (2008) – visão ideológica sobre o grau de intervenção estatal na economia e pobreza – podem também ter tido um fator importante. É possível aventar também a hipótese de que foi um fator preponderante a habilidade do governo Lula de convencer a opinião pública da importância do nacionalismo energético em face dos fatores exógenos acima apontados. Essa habilidade pode ter sido fator chave para que a partilha entrasse no topo da agenda de política pública.