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3 O USO ESTRATÉGICO DAS INSERÇÕES NEGATIVAS NAS ELEIÇÕES

4.5 Estudo de caso: as eleições presidenciais brasileiras

4.5.6 A eleição presidencial de 2010

A eleição presidencial de 2010 consagrou a hegemonia do PT nas urnas. Dilma foi eleita a primeira mulher presidente na história do Brasil com o sufrágio de 56% dos eleitores, fortemente respaldada pelo apoio dado pelo presidente Lula, que encerrou seu mandato com 80% de aprovação popular. Ainda assim, a vitória de Dilma arrastou-se para o segundo turno, fustigada por uma série de infortúnios que se abateram sobre a sua campanha. Pesaram contra especialmente as denúncias que atribuíram à sua campanha a responsabilidade pela quebra ilegal de dados fiscais sigilosos pertencentes a elementos da oposição, as denúncias de lobby praticado pela ministra da Casa Civil, sua ex-assessora Erenice Guerra, além da campanha subterrânea de difamação que procurou jogar Dilma contra setores religiosos da sociedade.

Assim como em 2006, a eleição se estendeu para o segundo turno na reta final da campanha. Até então, a evolução da opinião pública sinalizava Dilma como candidata dominante, que se elegeria com certa facilidade. O Gráfico 15, segundo medição feita pelo Instituto Datafolha, exibe como transcorreu a intenção de voto56

. A rigor, a opinião pública evoluiu a exemplo de 1994, em três fases. Na primeira, na fase pré-eleitoral, Serra era o candidato dominante. Em janeiro de 2009, o Datafolha registrava 11% de intenções de voto para Dilma e 41% para Serra. No meio da campanha, como mostra o Gráfico 15, o cenário passou a ser polarizado entre os dois principais candidatos. A dominância de Dilma ocorre na passagem para a fase eleitoral, quando seus percentuais de voto passaram a ser superiores à soma dos percentuais dos outros candidatos.

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Gráfico 15 – Evolução da Intenção de Voto em 2010

Fonte: DataFolha

A análise das estratégias eleitorais reitera, uma vez mais, que os candidatos se comportaram segundo as premissas do modelo dominante, conforme Tabela 28. Dilma é a candidata mais atacada, a que menos ataca e quando usa a propaganda negativa é contra o segundo colocado, José Serra. O tucano, por sua vez, mira exclusivamente em Dilma e ignora os adversários. Marina segue a estratégia de atacar Dilma e Serra simultaneamente, os dois candidatos colocados à sua frente. Plínio, por sua vez, faz o estilo descompromissado: ataca tudo e todos. Por fim, o modelo é coerente com a premissa de que, em eleições dominantes, os candidatos antecipam os ataques. Serra começa os seus ataques no terceiro dia de campanha (21/8) para interromper a série no dia 25 de setembro, no antepenúltimo programa previsto para acontecer no primeiro turno.

Tabela 28 – Frequência dos Ataques na Eleição Presidencial de 2010 (%) Dilma Serra e Serra Dilma Dilma, Serra e Marina

Dilma - 100 - -

Serra 100 - - -

Marina 0,0 0,0 100 -

Plínio 9,9 22,4 47,0 20,7

4.6 Conclusão

Este capítulo procurou desenvolver um modelo de campanha negativa para a realidade eleitoral brasileira. O modelo foi construído com base na teoria dos jogos e nos modelos de análise espacial. Sua inspiração é derivada dos modelos teóricos encontrados na literatura estrangeira, sobretudo a norte-americana, mas difere, basicamente, por levar em consideração duas variáveis institucionais que são ignoradas nesses modelos originais: (i) competição multipartidária e (ii) sistema em dois turnos.

O modelo construído assume como premissa central que os candidatos são atores racionais e atacam os seus adversários como último recurso de campanha. Isso se deve ao reconhecimento do caráter alienante da propaganda negativa no comportamento do eleitor. Lau et al. (1999) analisaram toda a produção literária sobre o impacto da propaganda negativa e levantaram que, em sua maioria, o autor dos ataques sai com uma imagem pior depois que critica um concorrente.

Na elaboração do modelo, foram criados cinco cenários paradigmáticos que levaram em consideração o número de partidos competitivos bem como a distribuição relativa de poder entre eles. A partir daí foram elaboradas hipóteses sobre o comportamento dos candidatos de acordo com o posicionamento nos índices de voto. A principal hipótese sustenta que os candidatos atacam para alterar tendências favoráveis dos seus adversários. Daí supõe-se que líderes atacam menos, líderes são alvos da maioria e retardatários são esquecidos. Uma exceção é quando o retardatário cresce e ameaça o posicionamento de um concorrente. Neste caso, passa a ser alvo de quem está acima.

Uma das hipóteses do modelo tem a ver com o fator ideologia. Este capítulo procurou mostrar teórica e empiricamente que a ideologia transforma um jogo de soma zero não cooperativo em um jogo cooperativo de soma não zero. Essa hipótese pode ser verificada na comparação entre as eleições de 1989 e 2002. Em 2002, Serra não se furtou a atacar Ciro na tentativa de eliminar o adversário e avançar para o segundo turno. Serra não enfrentou qualquer dilema pois sabia que os eleitores de Ciro não comporiam a sua base social. Problema que Brizola levou em conta em 1989. No momento que passou a polarizar com Lula na reta final do primeiro turno, Brizola optou pela estratégia de não atacar Lula, possivelmente amparado na certeza de que avançaria para o turno seguinte e passaria a precisar do apoio do candidato do PT e de sua militância. Provavelmente, a derrota de Brizola

pode estar associada ao fato de ter coordenado a sua estratégia como candidato do PT no momento em que era mais indicado atacar.

Por fim, a análise empírica reiterou os demais pressupostos básicos do modelo. Candidatos líderes nas pesquisas são os que menos atacam e, quando decidem atacar, escolhem o segundo colocado como alvo. Apenas Collor, em 1989, fugiu desse script, quando iniciou uma bateria de ataques contra Afif, quando o liberal ascendeu nas pesquisas e assumiu a terceira colocação. A análise confirmou também que candidatos em segundo focam principalmente quem está à frente, a não ser quando veem sua posição ameaçada na disputa, como ocorreu entre Serra e Ciro. O candidato do PPS passou a trocar acusações com Serra quando percebeu que perderia a segunda colocação para o tucano.

A análise de quem atacou quem revelou ainda que os candidatos em terceiro possuem três estratégias básica: (i) atacar o líder das pesquisas, (ii) atacar concomitantemente o líder e o vice-líder ou (iii) atacar o candidato em segundo na tentativa de tomar o seu lugar nas pesquisas. Essa última estratégia foi usada com sucesso por Serra, mas evitada pela maioria dos candidatos. É com base nisso que, entre todas as eleições analisadas, o pleito de 2002 deve ser considerado como o caso paradigmático de campanha negativa.