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3 O USO ESTRATÉGICO DAS INSERÇÕES NEGATIVAS NAS ELEIÇÕES

4.4 A realidade eleitoral brasileira: cenários de competição

4.4.1 Eleições Majoritárias com Dois Candidatos

4.4.1.1 Cenário dominante

Os cenários de competição com a presença de somente dois partidos são raros na realidade eleitoral brasileira, dado o elevado nível de fragmentação do sistema político brasileiro. Encontramos essa formação obrigatoriamente nas disputas de segundo turno ou, em escala menor, nos pequenos municípios do país. Por conseguinte, o padrão de disputa entre dois candidatos resume-se, na maior parte das vezes, a duas grandes coalizões de partidos que contrapõem, de um lado, a força política que se encontra no governo e, de outro, a força política desafiante40

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Nas competições entre dois candidatos é aceitável supor a existência de dois cenários distintos de competição: (i) o cenário dominante e (ii) o cenário polarizado. O cenário de candidatura dominante caracteriza-se pela existência de um único partido com chances reais de conquistar a maioria dos votos. Essa configuração acontece sempre que o candidato dominante soma mais de 50% das intenções de voto e o seu adversário não tem como sobrepujar o seu favoritismo. No vocabulário da competição espacial, significa uma distribuição unimodal em que apenas um partido está instalado sobre a mediana do eleitorado.

O Gráfico 4 ilustra o padrão dominante de disputa. Do ponto de vista da competição espacial, observamos um caso singular de partido que controla a mediana da distribuição e não tem incentivo para alterar seu posicionamento. O padrão dominante consiste na formulação de um discurso estrategicamente conservador, em que o candidato defende a permanência do cenário, acenando para um futuro ainda melhor (Figueiredo et all., 1998). O candidato dominante não tem incentivos para atacar o seu adversário e sua estratégia consistirá na emissão de mensagens de caráter maciçamente positivas, numa postura “acima da briga”, quando muito poderá adotar como estratégia a tática do “terror”, aquela em que o candidato estimula nos eleitores o medo da mudança, representado pela candidatura do candidato desafiante (Enelow e Hinich, 1984).

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Gráfico 4 – Cenário Dominante com Dois Candidatos 0 10 20 30 40 50 60 70

Extrema Esquerda Esquerda Centro Direita Extrema Direita

Indeciso Indeciso Candidato 1 Candidato 2 Indeciso

Fonte: Elaboração do autor.

No cenário dominante, a estratégia do partido desafiante é distinta por natureza. Ele tem como opções desalojar o partido dominante da mediana para se tornar mediano ou buscar atrair a mediana para si – tática que consiste em alterar a percepção das pessoas sobre as questões políticas e fazê-las entender que o posicionamento do candidato desafiante é o que melhor atende às suas necessidades. Numa competição de curto prazo, essa alternativa parece inviável. Durante um período eleitoral, o partido desafiante não tem tempo hábil para alterar a percepção das pessoas sobre o que é melhor para elas, a não ser se considerarmos condições excepcionais41

. Nas competições de longo prazo, no entanto, as duas alternativas parecem funcionar perfeitamente bem. O tempo deixa de ser um adversário do partido desafiante, que pode perder uma ou duas eleições, desde que consiga modificar a opinião dos eleitores sobre as principais questões políticas, obtendo votos no momento futuro.

Para pôr em prática a estratégia de tornar-se mediano, o partido desafiante precisará encontrar o equilíbrio ideal entre a campanha positiva (tornar-se mediano) e a campanha negativa (tirar o partido dominante da mediana). A hipótese central é a de que, em situações de nítida desvantagem, o partido desafiante não terá como evitar a estratégia de atacar o seu

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adversário. A intensidade dos ataques variará de acordo com as circunstâncias: quanto maior forem os percentuais de intenção de voto entre ambos, maior será a incidência dos ataques.

4.4.1.2 Cenário polarizado

Na competição entre dois partidos, o segundo cenário possível é o polarizado. O cenário polarizado caracteriza-se por uma distribuição de poder na qual a maioria absoluta de votos está igualmente ao alcance dos dois partidos. Na linguagem da teoria espacial, denota uma distribuição bimodal em que cada candidato ocupa uma das modas.

Gráfico 5 – Cenário Bimodal com Dois Candidatos

0 10 20 30 40 50

Extrema Esquerda Esquerda Centro Direita Extrema Direita

Indeciso Candidato 1 Indeciso Candidato 2 Indeciso

Fonte: Elaboração do autor.

No Gráfico 5 acima, podemos visualizar um formato de distribuição bimodal cujas modalidades estão situadas entre o centro e os extremos. Uma configuração do tipo revela que o traço marcante da competição bipartidária é a igualdade de recursos no início da campanha. Cada candidato conta com 35% das intenções de voto e o sucesso eleitoral dependerá da capacidade de atrair os eleitores indecisos, localizados no centro e nos extremos da distribuição, além da capacidade de subtrair os votos do adversário.

Do ponto de vista da competição espacial, a necessidade de conquistar a maioria absoluta dos votos levará, obrigatoriamente, a uma convergência dos partidos para o centro político, segundo salienta Anthony Downs (1957). A possível perda de extremistas não deterá

o movimento de cada um em direção ao centro, uma vez que os eleitores localizados nas margens estão ideologicamente muito distantes do partido localizado no extremo oposto (voto por proximidade).

A existência de cenários como o descrito acima é muito difícil de observarmos na realidade. Por mais equilibrada que seja a competição, sempre haverá um candidato em situação mais confortável do que outro – por menor que seja essa diferença. Neste caso, a hipótese principal é a de que o candidato que estiver atrás nas sondagens de intenção de voto iniciará o jogo efetivando o primeiro ataque da eleição e usará o recurso de maneira mais constante e intensa do que o candidato líder nas pesquisas, pois é do seu interesse desestabilizar o status quo e alterar a tendência eleitoral que se demonstra desfavorável. Esse é o modelo tradicional observado na literatura estrangeira e não há razão teórica para duvidar dele.