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Caso 7 (Demissão): Cristina Ou me mandam ou eu pulo a cerca: o pedido de demissão [Auxiliar de Montagem Mãe de dois filhos Funcionária dedicada e apaixonada

3 A INDÚSTRIA CALÇADISTA DE IPIRÁ NO CONTEXTO DA DIVISÃO INTERNACIONAL DA PRODUÇÃO DE CALÇADOS

3.4 A TERCEIRIZAÇÃO E A OCUPAÇÃO DE NOVOS TERRITÓRIOS

3.5.2 A fábrica de IPIRÁ e seu grupo empresarial

A fábrica foi implantada em abril de 2003. É de capital nacional, mas integra um grande grupo multinacional. Sua matriz encontra-se no Rio Grande do Sul. De acordo com informações disponíveis no site da empresa, sua produção diária é de 65.000 pares de calçados esportivos, infantis e femininos, sendo que estes são voltados para exportação na categoria “alta qualidade” e são produzidos em uma unidade no Brasil e na República Dominicana. No que diz respeito ao esportivo, a empresa produz cinco milhões de pares ao ano para marcas como Adidas, Asics, Oakley, DC e Shoes.

O grupo possui sete plantas industriais em três estados brasileiros (RS, CE e BA), na Argentina e na República Dominicana, onde possui apenas unidade de produção. No Rio Grande do Sul, há uma unidade produtiva em Teotônio e atividades administrativas em Sapiranga, o segundo município em número de estabelecimentos e no volume de empregos formais, segundo o ObservaSinos51. Segundo este Observatório, o município de Sapiranga era o maior produtor da região, até o ano de 2002: “Sapiranga, município cuja participação do setor era a maior na região em 2002, registrou participação de 17,90% em 2014, com redução significativa se comparado a 2013, ano no qual o município havia registrado participação de 19,05%”.

Neste município encontra-se toda a cadeia produtiva que envolve fazendas, operações financeiras e empreendimentos, como lojas e indústria. Na Argentina, o grupo mantém um escritório geral.

A missão do grupo encontra-se no site52 com a seguinte formulação: “Atender com excelência as expectativas, desejos e sonhos dos nossos clientes, com colaboradores

motivados e satisfeitos, gerando resultados de forma sustentável” (grifo nosso).

Segundo Silva e Silva (2014, p. 2): “O Grupo53 é um dos maiores conglomerados

calçadistas brasileiros. Além de fábricas na Argentina e na República Dominicana, dispõe de redes de varejo em vários países, em que opera por meio de franquias máster”.

A estratégia de internacionalização das vendas de marca própria por meio da franquia máster vem ampliando o número de países onde o Grupo possui lojas, como Canadá, Líbano, Costa Rica, Arábia Saudita, Hahrain, Kuwait, Angola, Omã, Emirados Árabes Unidos, Qatar

51 Observatório da Realidade e das políticas Públicas do Vale do Rio dos Sinos. Disponível em

http://www.ihu.unisinos.br/observasinos/vale/trabalho/para-onde-esta-indo-a-industria-de-calcados-do-vale-do- sinos, em 05/01/2017.

52 O site não foi divulgado para sigilo da empresa. 53 Retiramos o nome do Grupo.

e Filipinas. O estudo de caso realizado por Silva e Silva (2014) nos permitiu construir a trajetória do Grupo – o que torna possível visibilizar o seu patrimônio, tamanho e sua articulação mundial, o número de unidades produtivas e de lojas, sua produção anual, número de funcionários no Brasil e no exterior e projetos para o futuro54.

Tabela 8 – Trajetória do Grupo 1945 Surgiu a empresa em Sapiranga – RS.

Até 196055 Atendia apenas ao mercado regional.

Em 1960 Abriu sua primeira loja de varejo. Em 1969 Iniciou suas exportações.

Em 197056 Ampliou produção, modernizou a empresa; foco: exportação para os EUA.

Em 198057 Expandiu-se no mercado doméstico, por meio da abertura de rede de varejo.

Produzia para uma única marca estrangeira: a norte americana Nine West. Em 199058 Aumento das vendas e da produção. Período de concorrência com produtos

asiáticos. Para fazer frente à concorrência, instalou em 1997 duas novas fábricas no Nordeste do Brasil (Ceará e Bahia59). Investiu em programa de

qualidade e qualificação de fornecedores. Realizou reestruturação interna. Aumentou para 25 o número de clientes internacionais.

Em 1994 Adquiriu a rede de varejo gaúcha Gaston.

Em 1997 Adquiriu a marca carioca Dumond, e obteve licenciamento para produzir a marca italiana Diadora para o Brasil, Argentina e Uruguai.

Anos 200060 Expandiu a rede de varejo para outros estados brasileiros. Abriu uma

empresa administradora de cartões para clientes da sua loja (Praticard). Em 2005 Adquiriu a Esposede, rede de sapataria localizada no Nordeste brasileiro

(PE, CE, RN, PB, MA). Aumentou sua capacidade de distribuição de produtos no Nordeste. Abriu as primeiras lojas exclusivas da marca Dumond.

Em 2007 Adquiriu duas novas marcas: Ortopé e a Capodarte (busca por marcas próprias).

54 O Grupo apresenta em seu site uma linha do tempo com a história da empresa. Nos casos em que houve

divergências entre as informações apontadas pelo estudo de caso realizado por Silva e Silva (2014) e as informadas pela empresa, indicamos estas discrepâncias através de notas explicativas.

55 Em 1964, segundo informações disponíveis no site da empresa. Com a abertura, em 1965, do segundo ponto

de venda em Porto Alegre.

56 Em 1970, segundo informações disponíveis no site da empresa. 57 Em 1984 criou sua marca esportiva.

58 Em 1992 criou mais uma marca própria.

59 A unidade do Ceará foi implantada em 1996, em Itapajé; e na Bahia foi implantada em 2003. 60 Em 2001 passou a produzir para a marca Adidas.

Em 2008 Expansão das franquias internacionais para países emergentes. Ano de crise (talvez a mais importante na história da empresa), quando perdeu 21 dos 25 clientes internacionais. Queda nas exportações e na produção. Em 2010 Lançamento da marca Lilly’s Closet e abertura das primeiras lojas da marca

Ateliê Mix. Produção total foi de 10, 5 milhões pares por ano, dos quais 7,5 milhões eram produzidos para terceiros e o restante para a marca do grupo (grifo nosso).

Em processo de relocalização, adquiriu uma fábrica na República Dominicana e através dela passou a atender o mercado norte americano; a planta contava com cerca de 1000 trabalhadores; produzia exclusivamente para marcas norte americano (produção terceirizada).

Faturamento: 1, 7 bilhão.

Em 2011 Tentou comprar a Via Uno, mas não conseguiu. Faturamento: 1, 9 bilhão.

Em 2012 Faturamento: 2,2 bilhão.

Em 2013 Produção chegou a 14 milhões de pares. Empregava 15.600 trabalhadores, destes 3.000 fora do Brasil. Operava sete unidades produtivas: cinco no Brasil (uma RS, três no CE, uma na BA61), uma na Argentina e uma na

República Dominicana. Na cidade de Sapiranga, mantinha a sede administrativa e áreas comercial e de desenvolvimento de produtos, empregando 800 trabalhadores. Possuía mais de 330 lojas no Brasil e no exterior, das quais 180 lojas multimarcas e 150 lojas de marcas da empresa.

Fonte: Os dados foram produzidos tendo como base as informações disponíveis em um estudo de caso realizado por Silva e Silva (2014) e no Site do Grupo.

A planta industrial implantada em Ipirá é peça de uma engrenagem muito complexa. Compõe uma companhia de perfil internacional que atua no mercado global da produção e da venda de calçados. Na divisão internacional do trabalho, atua produzindo para marcas próprias e para terceiros (marcas estrangeiras como Adidas). Do ponto de vista da divisão regional do trabalho, o Grupo realiza no Nordeste brasileiro as atividades intensivas em mão de obra, e também como mercado consumidor. Em entrevista concedida à Revista Veja (nov./2015)62, o diretor da Abicalçados, Heitor Klein, afirmou: “O Vale dos Sinos passa por um momento de reestruturação semelhante ao que aconteceu na Europa. Ele deixa de produzir calçados em massa e passa a desenvolver produtos de maior valor agregado, que necessitam de tecnologia e design diferenciado”.

61 Como veremos mais adiante, em 2013 a empresa abriu mais uma planta na Bahia, no município de Riachão do

Jacuípe.

62 Disponível em: <http://veja.abril.com.br/noticia/economia/para-a-industria-gaucha-a-china-fica-no-brasil/>.

Por isso, e segundo o mesmo, “Em Sapiranga, a grande fábrica63 tornou-se um elefante branco. Galpões industriais foram fechados e apenas um prédio abriga o setor de desenvolvimento”.

O investimento em marcas próprias como a Dumond e em lojas próprias aponta outra estratégia importante do ponto de vista do capital: garantir “independência no mercado externo”. Segundo Silva e Silva (2014, p. 6), a aquisição da Dumond e a internacionalização da sua marca se deram com o objetivo de “obter maior independência no mercado externo, pois até então só exportava produção para marcas de terceiros (...)”. A estratégia do uso de franquia máster consiste em “escapar da competição por preço, agregando valor à marca, por meio do reforço da imagem e oferta de um portfólio completo no ponto de venda”. Ou seja, o Grupo busca se diferenciar dos demais exportadores brasileiros e também dos estrangeiros, como a China, que concorrem em preço.

O Grupo detém quatro redes de varejo multimarcas no Brasil. Cada uma das suas marcas tem um público específico, um mercado particular e, por isso, uma identidade própria. Identidades como brasilidade, tradição européia ou posicionamento acessível em preço; produtos voltados para as crianças e para as mulheres jovens64, refletindo a lógica da diversificação de produtos típica da produção toyotizada. Afinal, um dos objetivos do Grupo é

Atender com excelência as expectativas, desejos e sonhos dos seus clientes.

A análise do perfil do grupo empresarial ao qual a grande fábrica pertence nos permite afirmar que: 1) Por possuir marcas próprias, as unidades produtivas implantadas fora do Rio Grande do Sul têm condições de produzir independentemente dos contratos com terceiros; 2) A existência de uma rede de lojas próprias garante a este grupo empresarial e às unidades produtivas certa estabilidade no mercado, mesmo em tempo de crise envolvendo o setor.

Uma universidade corporativa forma trabalhadores localmente e por meio de ensino a distância. Segundo informações do site da empresa, a universidade foi criada com os seguintes objetivos:

contribuir para o desenvolvimento pessoal e profissional de nossos colaboradores, com o objetivo principal de promover a lapidação do conhecimento por toda a corporação. Por isso, buscamos promover um ambiente com múltiplos meios de ensino, que estimule a busca por fazer mais e melhor. Oferecemos capacitações presenciais, no local de trabalho, em um centro de treinamento para o varejo e também em uma plataforma de ensino à distância, atendendo à dispersão geográfica de nossos colaboradores e às necessidades de cada uma das unidades de negócios (grifo nosso).

63 Substituímos o nome da empresa pela expressão grande fábrica. 64 Informações disponíveis também no Site da Empresa.

Ainda segundo o site, os conteúdos a serem trabalhos são “Liderança e Pessoas”, “Negócio”, “Excelência Operacional” e “Gestão e Estratégia”. O primeiro módulo – o mais citado pelas chefias da fábrica de Ipirá – “oportuniza o desenvolvimento da liderança e das equipes através do foco em conhecimento e habilidades que evoluam nas relações, sentido de equipe e desempenho65”.

No caso da empresa de Ipirá, observa-se o uso de determinadas tecnologias para a realização de atividades à distância, como reuniões por Skype, inclusive para fazer seleção das chefias que contam com a participação virtual de profissionais do Sul, como psicólogas, ou para instruir os chefes sobre a produção de um modelo novo.

Toda esta estrutura permite ao Grupo fragmentar ainda mais o processo produtivo em diversos países e regiões, por meio da articulação de redes cliente-fornecedor, pequenas e micro-empresas ligadas a um grande cliente (RUAS, 1993).

3.5.3 A fábrica e a produção na região de Ipirá

A fábrica empregava, em 2015, 1.411 trabalhadores e trabalhadoras no município de Ipirá. Entre operários, as mulheres somavam 713 contra 580 homens. As chefias somavam 118, sendo 69 coordenadores e supervisores e 49 auxiliares66. Há 15 mulheres entre os coordenadores e supervisores contra 54 homens. Elas também são minoria entre auxiliares, somando 11 contra 38. Juntos, coordenadores e auxiliares coordenam um conjunto de 1.293 trabalhadores e trabalhadoras67.

Quando se compara estes dados com os da pesquisa realizada em 2008, observamos que o contingente de mulheres voltou a apresentar crescimento entre o operariado, pois dos 1.733 trabalhadores empregados, 849 eram mulheres contra 884 homens (SILVA, 2008). É possível que o encerramento das atividades de produção do solado – setor predominantemente masculino – explique essa mudança.

65 Discorreremos sobre os cursos de qualificação da Chefia no Capítulo 5.

66 Dados disponibilizados pelo setor de recursos humanos (RH), solicitados durante a entrevista com a

responsável por este ssetor, sendo posteriormente enviados por email. Não disponibilizamos informações sobre o quadro de chefias do alto escalão da empresa, também não nos foi informado o número exato de supervisores e sua identificação regional. Assim, não sabemos informar se estes números incluem chefes do Rio Grande do Sul.