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A imersão no campo da pesquisa

No documento neildarochacanedojunior (páginas 42-48)

Em abril de 2013 participei, em parceria com o orientador dessa pesquisa, da 16ª Conferência do Grupo de Pesquisa em Informática, outras Mídias e Educação Matemática (GPIMEM)6, comemorativa ao vigésimo aniversário do grupo (GPIMEM 20 ANOS), com o artigo que leva o título: Ambientes de modelagem pela ótica da

teoria da atividade: um novo olhar sobre o convite (CANEDO JR; KISTEMAMM JR,

2013). Neste evento, além de tomar parte em um grupo de discussão sobre Modelagem, coordenado pelas educadoras e pesquisadoras Ana Paula dos Santos Malheiros e Rosa Monteiro Paulo, professoras da UNESP, assistimos a palestras e participamos de mesas redondas em que o tema Modelagem na Educação Matemática esteve em pauta.

A participação nesse evento coincidiu com o início dos trabalhos de campo referentes a essa pesquisa. As primeiras observações no campo da pesquisa confirmaram uma tendência que já havia experimentado em minhas práticas de Modelagem e que também esteve em pauta nos debates realizados na conferência do GPIMEM. Falo da relação entre a Modelagem e o uso de tecnologias da

informação e comunicação (TIC), tais como computadores, calculadoras, etc7.

Para Borba e Penteado (2002), há uma sintonia entre Modelagem, enquanto enfoque pedagógico na Educação Matemática, e o uso das TIC. Araújo (2002) afirma que a sinergia entre as tecnologias digitais e as práticas de Modelagem Matemática vem desde a Matemática Aplicada. Visto que,

[...] os computadores não apenas possibilitam um maior detalhamento, uma maior precisão e rapidez nos cálculos para o tratamento de mais dados, para o exame dos efeitos de variação de parâmetros, para a obtenção de melhores ilustrações etc., como também, na maioria dos casos, eles são simplesmente indispensáveis para que a abordagem de um dado modelo matemático seja acessível ou real (ARAÚJO, 2002, p. 42).

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<http://www.rc.unesp.br/gpimem>.

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Apenas para evitar repetições, usarei nesse trabalho termos como: tecnologias computacionais, novas tecnologias, tecnologia da informação e comunicação (TIC), dentre outros, para me referir ao que Lévy (1993) denomina mídias informáticas.

Sobre essa sintonia entre Modelagem e informática, Borba e Penteado (2002) apontam que as práticas de Modelagem permitem um uso da informática diferente daquele que acompanha o modelo didático tradicional. Segundo eles, esse paradigma tradicional enaltece a sequência: exposição teórica, exemplos e exercícios, promovendo um uso domesticado dessas novas tecnologias.

Entendemos que uma mídia é domesticada quando se reproduzem nela práticas inerentes a mídias anteriores, e quando se condiciona o seu uso à expectativa de resultados iguais àqueles obtidos durante a utilização de uma mídia anterior (BORBA; PENTEADO, 2002, p. 243).

Falando especificamente do contexto da Educação Básica, Almeida, Silva e Vertuan (2012, p. 31) mencionam que a incorporação das TIC nas aulas é um aspecto relevante para a aprendizagem da Matemática. “Atividades de Modelagem Matemática são requerentes, por excelência, dessa incorporação”.

Nas pesquisas realizadas no âmbito do GPIMEM a presença das TIC na Educação Matemática, inclusive nas práticas de Modelagem, é aborda a partir dos aportes teóricos do construto seres-humanos-com-mídias8 (BORBA; VILLAREAL, 2005). Construto teórico que pode ser considerado “uma das mais frutíferas contribuições teórico-metodológicas do GPIMEM [...]” (SOUTO; ARAÚJO, 2013, p. 72).

Esse construto se baseia nas idéias de Tikhomirov (1981) e de Lévy (1993). Na perspectiva do seres-humanos-com-mídias é assumido que a unidade básica cognitiva deva ser tomada como um coletivo de humanos, que constroem conhecimento em interação com mídias. Na concepção de Levy (1993), mídias são tecnologias da inteligência que estendem o pensamento e a memória humanos e podem ser classificadas em três: oralidade, escrita e informática (apud BORBA; VILLAREAL, 2005).

Antes de avançar nas compreensões sobre o quadro teórico seres-humanos- com-mídias, é importante considerar a diferença de contexto entre as práticas de Modelagem que são foco das pesquisas do GPIMEM e a Modelagem que desenvolvo em minhas aulas de Matemática, no âmbito do Ensino Fundamental. Uma vez que as lentes das pesquisas sobre Modelagem que são desenvolvidas no

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Da mesma maneira que a Teoria da Atividade, o construto teórico seres-humanos-com-mídias será tratado nesse capítulo de forma um tanto quanto superficial, apenas no sentido de esclarecer a reação do mesmo com o processo de construção da questão diretriz. No capítulo 4 esse construto teórico, assim com a Teoria da Atividade, será abordado de maneira mais detalhada.

GPIMEM se voltam, predominantemente, para práticas de Modelagens desenvolvidas em disciplinas de Matemática Aplicada, com conhecimentos de Cálculo Diferencial e Integral em suas grades, como são as aulas da disciplina Matemática Aplicada para o curso de Biologia da UNESP – campus de Rio Claro (SP) – ministradas pelo professor, pesquisador e educador matemático Marcelo Borba, coordenador do GPIMEM (cf. DINIS, 2007; HERMÍNIO, 2009).

Por outro lado, são muitas as similaridades entre a Modelagem que desenvolvo em minhas aulas e aquelas que são pesquisadas no GPIMEM. Uma dessas semelhanças é o fato de serem os alunos os propositores do tema a ser investigado. No caso das aulas do Prof. Marcelo Borba, os temas não precisam sequer fazer parte do escopo da Biologia. Dinis (2007), por exemplo, menciona um grupo que elegeu como tema a relação entre a UNESP e a cidade de Rio Claro, em termos dos impactos sociais; e outro que abordou em seu projeto de Modelagem o tema sinuca.

Outro ponto de concordância entre a Modelagem que pratico e aquelas que o GPIMEM investiga diz respeito ao uso das TIC. As práticas de Modelagem que os alunos desenvolvem em minhas aulas de matemática, desde o ano de 2010, têm no uso das TIC um fator relevante. A presença dessas tecnologias nesses ambientes de Modelagem foi fortalecida com a instalação do laboratório de recursos multimídias na escola em questão, no mesmo ano de 2010. Havia naqueles tempos um afã pelo uso dos recém chegados computadores, tanto por parte dos alunos como dos professores daquela escola. Dessa forma, desenvolver práticas de Modelagem foi uma iniciativa que favoreceu uma aplicação dessas novas mídias nas aulas de Matemática, por intermédio de um enfoque didático em sinergia com a presença dessas tecnologias (BORBA; VILLAREAL, 2005).

Um terceiro e último ponto em comum, é o fato de que nas aulas ministradas por Borba, os projetos de Modelagem se desenvolvem paralelamente às aulas ditas convencionais, tendo peso avaliativo à parte9. Também procedo dessa forma no intuito de não me preocupar em ter que abordar os tópicos referentes à disciplina Matemática nas tarefas de Modelagem. Acredito que a obrigação em se tratar desse ou daquele conteúdo pode vir a engessar as práticas de Modelagem. Pois entendo

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No caso das aulas de Matemática Aplicada do curso de Biologia da UNESP, o Prof. Marcelo Borba desenvolve três ambientes de aprendizagem, as aulas ditas convencionais, os projetos de modelagem, além do enfoque pedagógica experimental com tecnologia (DINIS, 2007).

que os objetivos principais dessa prática dizem respeito à formação de cidadãos atuantes em suas comunidades (BORBA; VILLAREAL, 2005); o que perpassa o desenvolvimento do conhecer reflexivo (SKOVSMOSE, 2001).

Considerando as referidas similaridades entre as práticas de Modelagem que desenvolvo, para as quais vou direcionar as lentes dessa pesquisa, e a Modelagem pesquisada no GPIMEM, mas sem desconsiderar a relevante diferença de contexto, entendo que faz sentido incorporar o construto seres-humanos-com-mídias ao quadro teórico dessa pesquisa. Até porque o seres-humanos-com-mídias brotou da mesma fonte teórica que a Teoria da Atividade, ou seja, da teoria sócio-histórica de Vygotsky (1998 e 2007), a partir, principalmente, do conceito basilar de mediação.

Porém, as aproximações entre essas duas concepções teóricas podem ir além de suas raízes sócio-históricas. A idéia central do seres-humanos-com-mídias é que, no processo de construção do conhecimento, transformações mútuas ocorrem na interação entre atores humanos e não-humanos, ou seja, entre humanos e mídias. Na Teoria da Atividade, como mencionamos anteriormente, as transformações mútuas se dão por intermédio de ações que acontecem no pólo sujeito-objeto.

Souto e Araújo (2013), tomando como exemplo a Educação à Distância On- line, aventam a possibilidade de uma expansão recíproca entre o construto seres- humanos-com-mídias e a Teoria da Atividade. Para elas, de acordo com as ideias subjacentes ao seres-humanos-com-mídias, as mídias superam a noção de artefatos mediadores apresentada na Teoria da Atividade, uma vez que participam do processo como atrizes ao invés de apenas mediarem as ações dos sujeitos. Nesse quadro teórico emergente, temos uma atividade de sujeitos-com-mídias que resulta na produção de conhecimentos; o que possibilita transformações mútuas tanto no pólo sujeito-objeto, da forma que propõe a Teoria da Atividade, como no pólo sujeito-mídias. Dessa forma, objeto, sujeitos e mídias se permeiam e se formatam reciprocamente.

Se por um lado, sou levado a reconsiderar o papel das mídias enquanto elementos mediadores nos sistemas de atividades. Por outro, essa expansão pode levar ao entendimento do seres-humanos-com-mídias incluindo a possibilidade de considerar questões relativas aos motivos e às necessidades que orientam a atividade coletiva (ARAÚJO; SOUTO, 2013).

É à luz desse referencial teórico que pretendo tratar da análise das participações dos alunos em ambientes de modelagem. Frente a essas considerações, passo a assumir a noção de ambiente de Modelagem como um ambiente de aprendizagem no qual um coletivo formado por alunos-professor-e- mídias praticam ações dirigidas a um objetivo. Ações essas entendidas dentro da definição que essa categoria assume no escopo da Teoria da Atividade, em expansão com o quadro teórico seres-humanos-com-mídias.

As demandas advindas do trabalho de campo, problematizadas frente aos estudos teóricos e ao diálogo com a comunidade de pesquisadores, além das sugestões da banca de qualificação, embasaram a opção por ajustar o foco da investigação, a partir de uma expansão do quadro teórico aqui assumido. Ajuste que ressoa na questão diretriz fazendo-a assumir seu formato definitivo.

De que forma os alunos participam dos ambientes de modelagem, a partir da análise das ações de um coletivo de seres-humanos-com-mídias, pela ótica da Teoria da Atividade?

Além do objetivo geral de analisar a participação dos alunos no âmbito das ações de um coletivo pensante de seres-humanos-com-mídias considerando os aportes teóricos da Teoria da Atividade. A questão norteadora apresentada também aponta para alguns objetivos específicos.

O primeiro deles convida a uma incursão teórica na Modelagem enquanto abordagem pedagógica na Educação Matemática, no sentido de tornar claras minhas concepções a respeito dessa perspectiva didática, o que configura o tema do capítulo 3.

O outro objetivo remete a um exercício teórico a respeito das possibilidades expansivas entre a Teoria da Atividade e o construto teórico seres-humanos-com- mídias (SOUTO; ARAÚJO, 2013), e que será o objetivo central do capítulo 4. Acrescento que a elaboração e a assunção desse quadro, tornam essa teorização emergente, ao mesmo tempo, princípio analítico e objeto de estudos dessa pesquisa. O que traz para arena de inquérito uma contradição inerente à Teoria da Atividade (ENGESTRÖM, 1999).

CAPÍTULO 3

A MODELAGEM NA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

Ao longo desse capítulo 3, faço uma incursão teórica a respeito da Modelagem enquanto abordagem pedagógica no âmbito da Educação Matemática no sentido de esclarecer o que quero dizer quando falo em Modelagem na Educação Matemática10.

Tenho consciência de que a Modelagem, além de uma abordagem pedagógica, vem se tornando uma tendência na Educação Matemática e conta com uma comunidade de pesquisadores estabelecida nos cenários nacional e internacional, configurando uma linha de pesquisa com produções relevantes. Por isso, vou apresentar as produções dessa linha de pesquisa tanto no cenário nacional como internacional.

Porém, adianto que essa apresentação será feita de maneira um tanto quanto enviesada, uma vez que minhas intenções estão voltadas para as práticas de Modelagem desenvolvidas pelos alunos, o que leva a focar na Modelagem enquanto abordagem pedagógica.

Entendo que as várias maneiras como as práticas de Modelagem se desenvolvem refletem as distintas crenças, filiações teóricas e concepções educacionais dos sujeitos nela envolvidos, desaguando em uma variedade de objetivos didáticos a serem cumpridos e em uma diversidade de aportes teóricos assumidos nas pesquisas que se voltam para essa temática. Essa diversidade me impõe a necessidade, enquanto pesquisador, de tornar claras minhas concepções a respeito da Modelagem.

Outro objetivo desse capítulo é esclarecer o leitor com relação ao produto educacional que pretendo confeccionar como fruto desse trabalho de pesquisa. A confecção desse produto me permitirá compartilhar com a comunidade de professores que ensinam Matemática minhas vivências com relação à Modelagem enquanto possibilidade pedagógica.

10 Esta maneira de encaminhar uma discussão: “o que queremos dizer quando falamos em...”, foi

No documento neildarochacanedojunior (páginas 42-48)