• Nenhum resultado encontrado

A importância do entendimento de tempo e lugar na modalidade EaD

2 ENSINO E APRENDIZAGEM: REFERÊNCIAS TEÓRICAS PARA

2.2 A APRENDIZAGEM E O ENSINO NA MODALIDADE EAD

2.2.1 A importância do entendimento de tempo e lugar na modalidade EaD

Como referido acima, a informação digitada e virtualizada requer uma outra forma de assimilação (AMARAL; RAMOS, 2007). O caráter menos rígido, mais flexível, e rápido, dizem respeito de um momento histórico onde tempo e lugar são compreensões cada vez mais fluidas. Esse entendimento impacta diretamente na sociedade, na nossa organização cultural e social, econômica e política. Do ponto de vista da educação, essa mudança de caráter produziu, ou está produzindo mudanças significativas. Assim, é fundamental falar do tempo e do lugar

na discussão de ensino e aprendizagem da modalidade EaD, visto que, como já afirmei, tratam de elementos centrais no conceito desta modalidade.

O entendimento de organização do lugar e do tempo são importantes e fundantes na sociedade moderna. Além de serem centrais no conceito da modalidade, esses dois aspectos também são importantes e fundantes na sociedade, estruturando a economia, a cultura, e a vida dos sujeitos através da organização do trabalho. A partir daí estes conceitos também, irão organizar instituições, como as escolas e as universidades.

Os primeiros processos de ensino aprendizado se institucionalizaram na escola e espaços educacionais formais, como universidades, a partir da Modernidade. A partir de então, a formação escolar e universitária, institucionalizada, se deu historicamente num tempo e espaço definido. Nesses espaços tínhamos/temos o professor e uma turma de alunos numa sala de aula, durante um tempo definido, no qual o primeiro instruíra ao segundo sobre determinado conteúdo. Esse cenário educacional, e suas peculiaridades, não mudaram na história, exceto pelo acréscimo de algumas ferramentas tecnológicas. Ainda assim, considerando que o desenvolvimento das tecnologias não é homogêneo em todas as instituições de ensino, ainda temos o mesmo cenário nos dias de hoje.

Essas primeiras noções são tão fundantes que Tardif e Lessard definem a escola moderna como “um espaço social autônomo, fechado e separado do ambiente comunitário e dentro do qual as crianças são submetidas a um longo processo de aprendizagem” (TARDIF; LESSARD 2005, p. 57). Nesse aspecto é claro uma determinação do local: sala de aula, preferencialmente, como espaço de ensino.

Em relação ao tempo, Tardif e Lessard afirmam que é “constituído, inicialmente por um continum objetivo, mensurável, quantificável, administrável [...]” (2005, p.75). Além disso, é “um tempo social e administrativo imposto aos indivíduos, é tempo forçado” (TARDIF; LESSARD, 2005, p. 76).

Ocorre que esses dois entendimentos de tempo e lugar nunca foram tão fluidos como na contemporaneidade. Assim como na formação da sociedade Moderna, estes entendimentos foram estruturantes antes mesmo de chegarem à escola, a noção fluida que temos agora chega à educação, mas provém de transformações sociais mais alargadas.

As TICs possibilitaram uma outra noção de tempo e espaço. Ao nos comunicarmos com pessoas de outro lado do mundo sincronicamente, ou nos informarmos de fatos mundiais quase instantaneamente, o espaço e o tempo passam a ser relativos e as possibilidades de informação, inúmeras, passam a reconstruir nossos entendimentos lineares de desenvolvimento num locus quase atemporal.

Assim, na modalidade EaD, muda-se o cenário e as possibilidades de interação e de informação. Nas instituições de ensino adeptas dessa modalidade a noção de tempo é cada vez mais relativa. De imediato, professor e aluno terão tempos diferentes no Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), além disso, o tempo virtual traz um entendimento da modalidade que está muito mais relacionado ao tempo de aprendizagem do aluno, que propriamente o tempo real compartilhado do professor no ensino (MAIA; MATTAR, 2007).

O lugar é relativizado na modalidade à distância. A web torna-se “o lugar”, e esse novo lugar é muito vasto e flutuante. O AVA está cada vez mais migrando para rede sociais, assim, até mesmo a ideia de “sala de aula virtual”, que parece se apresentar, como linguagem, uma tentativa de aproximação da referência do presencial, que é familiar, está cada vez mais efêmera.

Peters (2004) afirma sobre as diferenças entre a modalidade presencial e a distância, a partir do tempo e do lugar da seguinte forma:

O principal propósito dos espaços reais de aprendizagem, a reunião de professor e aluno, fica sem sentido [no EaD]. A esfera ilimitada, incompreensível, por trás da tela do monitor se espalha além de todos os locais de aprendizagem que conhecemos e pode abarcar o mundo, e até o cosmo. O tempo e os locais não são fixos. Este espaço inimaginável não é fechado, protegido, pessoas e objetos não são relativamente fixos, mas, pelo contrário, efêmeros e transitórios. Transforma-se frequentemente e rapidamente. Flutuam. Não há qualquer ambiente real com o qual os estudantes possam interagir e estabelecer relacionamento (PETERS, 2004, p.152).

Dessa forma, a modalidade a distância tende a romper com a ideia de tempo e lugar definido. Se nas primeiras salas de aula isso definia processos de ensino e aprendizagem, hoje, com a possibilidade de interação e uma alta intervenção tecnológica no processo, há uma fluidez nesses conceitos. Em função dessas mudanças, que não dizem respeito só à modalidade, mas refletem mudanças estruturais da sociedade, muitas questões do processo de ensino e aprendizado institucionalizados na sala de aula convencional precisam ser ressignificadas.

Efetivamente, a separação de professores e alunos de tempo e lugar pode levar à ideia de distância, que se configura para além da questão geográfica. Em função desse entendimento prévio, Moore (1993) desenvolveu a Teoria da Distância Transacional. Segundo ele, este conceito:

[...] descreve o universo de relações professor-aluno que se dão quando alunos e instrutores estão separados no espaço e/ou no tempo. Este universo de relações pode ser ordenado segundo uma tipologia construída em torno dos componentes mais elementares deste campo - a saber, a estrutura dos programas educacionais, a interação entre alunos e professores, e a natureza e o grau de autonomia do aluno (MOORE, 1993, p.2).

A partir dessa teoria, podemos ter um outro entendimento de distância, que se dá pela ideia de transação. Moore vai definir este entendimento:

A transação a que denominamos Educação a Distância ocorre entre professores e alunos num ambiente que possui como característica especial a separação entre alunos e professores. Esta separação conduz a padrões especiais de comportamento de alunos e professores. A separação entre alunos e professores afeta profundamente tanto o ensino quanto a aprendizagem. Com a separação surge um espaço psicológico e comunicacional a ser transposto, um espaço de potenciais mal-entendidos entre as intervenções do instrutor e as do aluno. Este espaço psicológico e comunicacional é a distância transacional (MOORE, 1993, p. 2).

Ainda segundo Moore (1993), a distância transacional é contínua e configura-se como termo relativo, pois acontecem por espaços psicológicos entre professores e alunos, que não são os mesmos.

Peters, referendando-se em Schulmeister (1993/1995), afirma que essa teoria é fundamental para discutir uma didática da educação a distância. Segundo ele:

Ao apresentar a distância transacional não como grandeza fixa, mas, sim, variável, que resulta do conjunto de diálogo, estruturação dos programas de ensino a serem apresentados, e da autonomia dos estudantes, diferente em cada caso, ele explica de forma convincente a enorme flexibilidade dessa forma de ensino acadêmico. Além disso, dá uma ideia da complexidade didática da educação a distância, que se torna ainda mais evidente se comparada às formas do ensino acadêmico tradicional – restritas metodicamente e unilaterais na articulação (PETERS, 2001, p. 66).

Assim, os elementos fundantes, de tempo e lugar, vão desdobrar em elementos da discussão do processo de ensino e aprendizagem da Educação a distância. Tais entendimentos diferentes dos tradicionais têm implicações grandes nos processos educacionais da modalidade. Quando essas questões fundantes, de organização de tempo e lugar, não estão claras, a tendência é que professores e alunos, transponham seu entendimento do presencial para a EaD. É o que diz Peters (2004) sobre a soma dos elementos de tempo e lugar, juntamente com outras questões como o conhecimento tecnológico, e a falta de formação, acabam levando a ação a partir daquilo que os sujeitos têm conhecimento:

Se estudantes e professores são encorajados a imaginar espaços reais de aprendizagem em espaços virtuais de aprendizagem como modelos, parece óbvio para muitos deles manter o comportamento de ensino e aprendizagem com os quais estão familiarizados dos espaços reais de aprendizagem e, na medida do possível, transpor isso para o espaço virtual de aprendizagem. (PETERS, 2004, p. 149)

Afinal, parece evidente que professor e aluno deverão repensar seus papeis a partir de um outro entendimento, diferente do culturalmente construído. Com Moore (1993), este outro entendimento significa uma flexibilização, não encontrada nos “duros” conceitos de Tardif e Lessard (2005) de um tempo e um lugar definidos.