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3 O CAMINHO PERCORRIDO PARA DESENVOLVER A PESQUISA

4.2 PROFESSOR GIRTAB

4.2.2 Girtab e sua dificuldade no processo avaliativo

Em relação ao processo avaliativo, foi possível identificar que Girtab inicia os encontros questionando o tipo de avaliação realizada na modalidade EaD. Seu questionamento se origina de um curso de formação continuada14 oferecido pela universidade, no qual foi discutida a diferencia entre avaliação e verificação15. A partir desta primeira provocação, este tema passou a ser recursivo. No decorrer dos encontros, o processo avaliativo voltou a ser objetivo de problematização, mas não apenas em relação a sua função no processo de ensino, senão também, em relação ao número de trabalhos avaliados ao longo de uma disciplina e a pontuação atribuída a cada um destes.

Ao fazer uma análise geral sobre as avaliações, Girtab apontou:

[...] particularmente acho assim, em todo o desempenho de gestão de pessoas o que eu sempre escuto, e a Betria16 quando trabalhava verificação e avaliação diz isso.

Aqui [se referindo ao conjunto de disciplinas na instituição] na verdade está se fazendo uma verificação, então onde nós levamos o aluno com o objetivo de criar autonomia, para ele correr atrás disso? [se referindo a aprendizagem e reflexão] (GIRTAB, 11/03/2016)

Na fala há indícios de que o professor compreende que o processo avaliativo é parte do processo de aprendizagem. Girtab entendia, desde o início, o processo de avaliação como importante para o processo de reflexão e aprendizagem, e se questionava sobre a capacidade de mobilizar o aluno para isso. Ele também questionava os fracionamentos das notas, isto é, quando as disciplinas trabalham com 1, 2, 3 pontos para cada trabalho dado. De forma específica argumentava:

A partir da provocação que eu fiz talvez o problema não é o fracionamento, mas o interfracionamento e as razões, porque vejamos, se nós olharmos da resolução 28 da avaliação em anos anteriores, ela já trouxe essa lógica nós temos o princípio do fracionamento previsto nos trabalhamos no presencial 20, 30, 50 e na EaD 40, 60, mas o que se quer com este fracionamento, na verdade, são etapas no processo de

14 Os cursos de Formação Continuada, acontecem na Universidade a partir do Programa de Formação para

Professores que acontecem em 4 níveis: para gestores, para professores em geral; para iniciantes e formações específicas, que dizem da formação de cada departamento ou curso.

15 A primeira é um processo diagnóstico que desencadeia em ações, a segunda termina no momento do resultado

do processo (LUCKESI, 1988).

produção e de avaliação, tanto que na minha premissa básica que estava na avaliação dos 20 pontos, você mobilizar o aluno para ele ficar atento deste processo e quando ele chega num estágio “x” você dá um toque, então avalia que não necessariamente precisa ter um método, pode ter outro, mas o que está presente depois os 20 pontos é o feedback. Essas coisas estão presentes. (GIRTAB, 18/03/2016).

Sua intervenção diz respeito à avaliação no decorrer do semestre. Nesse sentido, o desenvolvimento de um processo de aprendizagem, em que a nota ajuda a encerrar etapas, se contrapõe a uma avaliação fracionada que vai apenas remeter várias pontuações ao aluno.

Também, Girtab chamou a atenção para as provas denominadas de sistematização. Particularmente, ele buscou entender sua função na aprendizagem do aluno e analisar o tipo de prova que está sendo feito na modalidade a distância:

[...] se olharmos as provas de sistematização, ela só tem o nome de sistematização, e daí eu pergunto e o que é sistêmico? Vamos pegar esse termo: é que entradas eu tive que processo eu fiz e que saídas tenho, isso é sistêmico é sistematizar. Porque é um sistema. Se o aluno teve, que entradas ele produziu, mas como tu processou esse conhecimento e agora, que ficou (GIRTAB, 18/03/2016).

Ainda que o entendimento de sistêmico não esteja adequado, a ideia de um processo com “entrada, processo e saída”, ajudam a pensar sobre o trabalho do professor. Girtab, que demarcou a importância do diagnóstico dos conhecimentos do aluno para o desenvolvimento da disciplina, entendeu a sistematização final como resultado de um processo e não algo estanque.

A partir destas reflexões, no final dos encontros, em sua última apresentação, o professor fez mudanças no processo avaliativo de sua disciplina. A proposta final introduz o diagnóstico dos conhecimentos dos alunos:

[...] o que eu imagino que tem que pensar aqui, então qual é o que nós estamos pensando os orientadores devem iniciar a avaliação fazendo uma avaliação diagnóstica das teorias implícitas dos alunos. Na verdade, orientador faz isso, só que isso lá no final do processo, ele não se lembra mais para saber qual é o estado da arte do aluno17. Quando ele recebe o orientando, um pouco dessa lógica, chega lá na

banca e eu vou dizer o quanto tu cresceste nesse ano, e aí as vezes a gente não tem as coisas como deveria ser. Então isso é uma discussão que nós temos que fazer como nós vamos fazer uma avaliação diagnóstica do estado da arte do aluno, para saber “o quê” esse cara sabia sobre esse tema quando ele entrou e até onde ele chegou lá na apresentação. Então esse é um desafio que eu estou propondo para os meus colegas professores de projetos e depois tem que passar no colegiado. Tenho que convencer o colegiado (GIRTAB, 13/05/2016).

A fala do professor evidenciou uma função para a avaliação, compreender o movimento que o aluno fez na disciplina. Girtab não será necessariamente o orientador do aluno, no entanto, ele entende que seu trabalho inicial deve estar relacionado com o trabalho dos orientadores, no sentido de chamar para as questões do diagnóstico e da avaliação final.

Em relação ao momento da avaliação, após as reuniões, passa a propor que se evidencie o caminho percorrido pelo aluno e que o próprio aluno seja questionado sobre isso:

O que eu estou propondo aqui para mexer? Para 40 pontos na banca eu entendo que os questionamentos dos examinadores devem evitar as respostas reprodutivas. Não dá para fazer pergunta assim, para ver se o aluno sustenta coisa, se não ele pega lá no texto, porque ele sabe o que tem lá. Hoje o examinador está muito mais de comentar mais o trabalho “Certo, se tu fosses aplicar em novo cenário o que tu farias?” Hoje os examinadores vão muito em cima de comentar mais o trabalho do que provocar. Deve haver um momento do aluno se auto avaliar a sua mudança conceitual no decorrer do processo. Aí ele faria isso “lá no início eu pensava isso, agora [...]”. Isso na banca, no TCC, no texto escrito, nessa discussão da generalização da compreensão eu acho que é uma coisa que nós precisamos crescer enquanto professores é valorizar as ideias pessoais dos alunos para isso é importante o professor saber qual era o estado da arte porque às vezes o professor quer que o TCC tenha a cara dele. (GIRTAB, 13/05/2016).

Nessa fala aparecem elementos do entendimento de aprendizagem da teoria de Pozo (2002). Isso se evidencia na necessidade colocada de uma avaliação evitar respostas reprodutivas ou, poderíamos dizer, repetitivas; necessidade do aluno utilizar o que foi aprendido em contextos diferentes. Além disso, a partir da valorização do que o aluno já sabe, propor que ele mesmo pense sobre o seu aprendizado, o que parece suscitar, o que ele já elencou, a necessidade da autonomia do aluno. Da mesma forma, Pozo (2002, p. 158), destaca a importância do controle da aprendizagem pelo estudante a partir do metaconhecimento. Essa consciência e controle dos seus processos cognitivos são elementos chaves para processos de aprendizagem efetivos.

Interpreto que, ao final dos encontros, Girtab apresentou uma mudança na proposta de avaliação como produto da combinação entre ideias iniciais do professor e a possibilidade de refletir de forma mais sistemática sobre as mesmas. Essa mudança, como descrito, encontra-se na busca da compreensão de como os alunos iniciam a disciplina e na preocupação em usar este parâmetro para ver e classificar o seu resultado final. Isso se evidencia nas propostas de perguntas e na orientação aos demais professores da banca.

No início dos encontros, a sua proposta de ensino não tinha incorporado esta preocupação, no entanto, é ele quem introduz a discussão já nas primeiras reuniões. Isso parece apontar que, não basta o professor ter este entendimento, se ele não parar para analisar como

este entendimento está incorporado na disciplina. Assim, também se evidencia que o processo de aprendizado do professor foi, através da prática, analisar a sua disciplina. É preciso considerar também que os primeiros questionamentos tratam de um certo tipo de incômodo, que no decorrer dos encontros, é refletido e desencadeia na proposta final da disciplina.

4.2.3 Girtab e sua dificuldade de atuação na modalidade EaD

Em relação à atuação do professor na modalidade a distância, Girtab elencou especialmente duas dificuldades: em trabalhar as habilidades dos alunos e de dar feedback qualitativos. Girtab, como os demais professores colaboradores, descreveu ter dificuldades para ensinar na modalidade a distância.

Ele se questionou como trabalhar habilidades e atitudes, independente do conteúdo a distância, já nos primeiros encontros:

[...] e aí vem a questão da competência a gente discutiu isso na Gestão de Pessoas18,

é um composto de conhecimentos habilidades e atitudes. E aí, como é que você vai na verdade, nós entramos lá no ensino-aprendizagem, se eu entro nesta lógica, como é que eu trabalho habilidades, que é mais fácil? Mas, e as atitudes? E daí tu vais para o EaD como é que tu... (GIRTAB, 26/02/2016)

O tom da fala é realmente questionador. Ele não conseguiu ou não quer concluir seu raciocínio e o grupo, durante alguns segundos, fica emudecido. Tanto o questionamento, quanto o silêncio, leva-me a pensar que se trata de uma “impotência” (re)conhecida pelos professores. Uma dificuldade sobre a qual não conseguem formular soluções ou sequer vislumbrar possibilidades. Parece que o professor entende que as atitudes são tangíveis apenas a partir de momentos presenciais. Nesse momento, a dificuldade de um lugar que não está definido dificulta o processo de aprendizagem.

Em relação ao segundo problema, o retorno dos professores para os alunos, especialmente dos trabalhos solicitados, já no início ele se questionava, “Esse talvez seja um grande problema que nós enfrentamos... No EaD talvez seja pior que no presencial. Como é o feedback?” (GIRTAB, 18/03/2016). Mais uma vez, interagir, dar retornos aos alunos em um ambiente virtual que não define necessariamente uma sincronia entre a exposição do aluno e do professor, parece dificultar o processo de ensino.

O professor Girtab também descreveu dificuldades suas em relação à EaD, especificamente quando se refere ao ensino de habilidades aos alunos. Vale destacar que ele, já falava na primeira parte desta análise19, que iniciou a reflexão em relação ao papel do professor, este deveria centrar mais em formar um determinado tipo de aluno autônomo e reflexivo, e menos preocupado em “passar conteúdo”. Tarefa que, na perspectiva de Girtab, fica mais difícil na modalidade a distância.

Esse elemento é muito importante, pois identifica uma mudança do perfil de trabalho do professor. Como apresentei no segundo capítulo, quando tratei dos entendimentos sobre ensino e aprendizagem, é necessário que os professores mudem suas formas de trabalho se pretendem construir processos construtivos de aprendizagem onde o aluno reflita (PETERS, 2004; POZO, 2002)

Outra questão que Girtab aponta é a dificuldade de oferecer retornos qualitativos para o aluno na modalidade. Isso poderia nos sugerir que ele acredita que são tais retornos que podem ajudar o aluno a qualificar-se.

Na sua última apresentação, Girtab não expressa mais as dificuldades em relação a modalidade, mas também não deixa claro se ele conseguiu identificar saídas para seus questionamentos em relação a este tema. No entanto, se nos referirmos a sua discussão de metodologias ativas, ele vê na problematização, dialogando com a proposta de trabalhar com projetos de aprendizado, baseado em problemas (SCHLEMMER, 2001), e todas as possibilidades colocadas no capítulo anterior, que estes designam formas de trabalhar questões que vão além do conteúdo. Isso sugere que, se tivéssemos mais tempo de discussão no grupo, ele poderia analisar se realmente essas metodologias dariam conta da discussão de habilidades na modalidade EaD. Debaixo dessa perspectiva de análise, é possível pensarmos sobre a proposta da formação e acompanhamento aos professores, colocando-se como desafio para, em momentos posteriores, pensarmos em metodologias efetivas para a construção de aprendizagem desses sujeitos.

4.2.4 Girtab e a sua visão sobre os alunos

19 Em Girtab e os tipos de atividades (repetitiva e reflexiva) – “Porque eu tenho que passar tanto conteúdo textual?

Se o mundo da informação está ali... Ele [o aluno] tem que aprender a interpretar, a buscar a informação é saber interpretar e não saber tudo, pois eu fico pensando em gestão de pessoas que eu trabalho mais texto de recrutamento e seleção” (Girtab, 18/03/2016).

Na análise dos encontros, até o momento, não é possível identificar uma postura clara de Girtab sobre a disposição dos alunos a participarem ou não das aulas. Ele se limitou a falar mais do trabalho do professor. O fato de não explicitar não significa não ter entendimentos sobre o perfil do estudante. Já que, como dito acima, quando se expressa sobre a dificuldade de interpretação dos alunos, ele está falando também da pouca disposição para leitura, revelando uma visão da questão. No entanto, como esta questão foi muito evidenciada pelos demais professores, ao não se fazer explicita na fala de Girtab, parece que este diferencia-se ao entender a proposta dos encontros, isto é, pensar o trabalho docente.