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3 O CAMINHO PERCORRIDO PARA DESENVOLVER A PESQUISA

3.4 COMO FOI A CAMINHADA: OS ENCONTROS

Depois da compreensão do meu papel como pesquisadora, elaborei um roteiro para os encontros, entendendo que estes estariam subdivididos em 4 partes como mostra o Quadro 2.

Quadro 2 – Organização dos Encontros

Etapas Primeira parte Segunda parte Terceira parte Quarta parte

Número de encontros previstos 1 2 5 2 Foco dos encontros Apresentação do problema e da proposta inicial de organização da pesquisa, além da organização prática dos encontros. Explicitação da proposta da disciplina - cada professor apresenta a sua. Reflexão sobre as disciplinas, processo de discussão de temas a partir da leitura de Pozo (2002) “Aprendizes e

mestres: a nova cultura de aprendizagem”

Reconstrução dos planos de aula.

Fonte: A autora (2016)

Nesse momento, também defini os instrumentos da pesquisa, que foram, a observação participante com o registro em um diário de campo e gravação em áudio das reuniões. Também foram utilizadas algumas produções dos professores (planejamentos) e e-mail intercambiados no processo. A escolha destes instrumentos ajuda na produção dos dados de análise, já que:

Na observação participante, o pesquisador (a) deve interagir como contexto pesquisado, ou seja, deve estabelecer uma relação direta com grupos ou pessoas, acompanhando-os em situações informais ou formais e interrogando-os sobre os atos e seus significados por meio de um constante diálogo (OLIVEIRA, 2005, p. 87)

Junto com a observação participante, a gravação, com as transcrições feitas por mim, propiciou a escuta sempre que necessário. Também a imediata transcrição de cada uma das

reuniões, permitiu-me a escuta e análise das discussões em andamento, facilitando a adaptação da proposta de trabalho. Já o diário instrumentalizou-me como pesquisadora, ao concebê-lo com quatro características:

a) a regularidade do registro: uma sequência de entradas regulares durante um período de tempo; b) ser pessoal: feito por um indivíduo identificável; c) ser contemporâneo: os registros são feitos no momento ou perto o suficiente do momento em que os eventos ou atividades ocorreram; e d) ser um registro propriamente dito: os apontamentos gravam o que o indivíduo considera relevante e importante e podem incluir o relato de eventos, atividades, interações, impressões e sentimentos (ZACARELLI; GODY, 2010, p. 551).

A mobilização das reflexões dos professores em um primeiro momento, não foi planejada a partir de perguntas específicas ou entrevistas, mas da leitura do livro de Juan Inácio Pozo (2002) “Aprendizes e mestres: a nova cultura de aprendizagem”. Nesse sentido, concebi os encontros partindo da leitura e posterior discussão e reflexão sobre o lido. A intervenção prevista era sempre voltada à reflexão das disciplinas que foram apresentadas no primeiro encontro. As perguntas que surgiram posteriormente nos encontros não foram só minhas. Na medida que o espaço se constituiu efetivamente como de formação colaborativa, houve questionamento e referências entre os professores.

No Quadro 4, apresentado a seguir, consta um resumo da descrição dos encontros. A coluna da “Programação inicial” se refere ao que foi planejado, e a coluna “Como aconteceu” diz da efetividade dos encontros. Estas duas colunas já representam parte do processo reflexivo que foi ocorrendo durante os encontros, exigindo adaptações, ajustes e inserções de novas discussões. Esses movimentos que aconteceram, são amparados na afirmação de Mallmann:

Produzir conhecimento científico-tecnológico educacional no âmbito da pesquisa- ação como abordagem interpretativa-crítica qualitativa implica ações e operações, tais como: (re)formular questões; planejar; estabelecer objetivos; buscar alternativas; tomar decisões; aplicar e avaliar soluções; comparar resultados; determinar critérios; avaliar escolhas; e identificar avanços e retrocessos (MALLMANN, 2015, p.94).

O quadro explicita especialmente o planejamento e as reformulações, mas também diz das alternativas que tomei, da terminação de critérios, das tomadas de decisões. Na sequência do quadro, trarei a explicação dos encontros ocorridos, e como cada uma destas mudanças ocorreram.

Quadro 3 – Programação e efetividade dos encontros

Data/encontro Programação inicial Data/encontro Como aconteceu

26/02 - 1°

encontro Apresentação da proposta combinações. 26/02 - 1° encontro Apresentação da proposta combinações. 04/03 - 2°

encontro

Apresentação dos planejamentos de disciplinas da EaD de dois

professores

04/03 - 2° encontro

Apresentação do planejamento de um professor e parte de outro

11/03 – 3°

encontro Apresentação dos planejamentos de disciplina de dois professores 11/03 – 3° encontro Conclusão do professor que começou no encontro anterior e apresentação de mais um professor

18/03 – 4°

encontro Discussão sobre Natureza dos conhecimentos 18/03 – 4° encontro Retomada da discussão sobre fracionamento de notas; apresentação de um professor; vídeo sobre natureza da aprendizagem.

01/04 – 5° encontro

Discussão sobre o processo de aprendizagem

01/04 – 5° encontro

Discussão sobre natureza dos conhecimentos e Zona de desenvolvimento proximal. 08/04 – 6 °

encontro Discussão sobre experiência de aprendizagem 08/04 – 6 ° encontro Retomada da discussão sobre interação no AVA; Discussão sobre o processo de aprendizagem

15/04 – 7°

encontro Discussão sobre os conteúdos do 4° a 6° encontro na modalidade EaD 15/04 – 7° encontro Discussão sobre a escrita em Vigotski e discussão sobre Atividades de Aprendizagem

22/04 - 8°

encontro Característica de uma boa aprendizagem 29/04 - 8° encontro Reorganização do cronograma (Construção do Plano em casa e apresentação a partir de 13 de maio); Discussão sobre Aprendizagem. 29/04 - 9°

encontro Construção do novo plano 13/05 - 9° encontro Apresentação dos novos planejamentos de disciplina de dois professores 06/05 - 10°

encontro

Construção novo plano 20/05 - 10° encontro

Apresentação dos novos planejamentos de disciplina de um professor

13/05 - 11°

encontro Apresentação do novo plano com destacando as mudanças (2 professores)

10/06 - 11°

encontro Apresentação dos novos planejamentos de disciplina de um professor 20/05 - 12°

encontro Apresentação do novo plano destacando as mudanças (2 professores)

Fonte: A autora (2016)

No primeiro encontro retomei a apresentação da proposta da pesquisa, detalhando-a aos professores, com a explicitação do objetivo e a forma como estava propondo o trabalho em relação à discussão. Os professores já conheciam um pouco da Pesquisa-ação e isso facilitou a compreensão da proposta. Neste momento foi definido, dias (todas as sextas feiras, com datas, já que houve algumas sextas em que não ocorreu encontros), tempo dos encontros, (aproximadamente 2h e 30 minutos). Também foram esclarecidas dúvidas em relação ao problema da pesquisa. A proposta dos encontros foi discutida, Izar propôs que eu olhasse as

comunidades para saber como eles propõem as disciplinas. Antes mesmo de eu me pronunciar, Girtab e posteriormente os demais argumentaram a partir do exposto por mim como proposta, que havia a necessidade de apresentação, inclusive para que se pudéssemos discutir.

Também no primeiro encontro, escolheram as disciplinas que iriam ser discutidas, já que a maioria trabalha com mais de uma modalidade EaD. A escolha foi feita a partir de uma discussão entre o grupo, onde falavam dos porquês das escolhas e também opinavam sobre as escolhas dos demais. O clima de imediato foi bastante tranquilo e amistoso. Eles demostraram uma expectativa grande em relação à proposta dos encontros. Desse primeiro, encontro os professores saíram com um roteiro para prepararem a apresentação da sua disciplina. Este roteiro foi apresentado como proposta por mim, e após alguns esclarecimentos foi assumido por eles (Figura 1).

Figura 1 - Roteiro da Apresentação da Disciplina

Roteiro da Apresentação da Disciplina - Do que se trata a disciplina: conteúdo etc.;

- Quais são os principais entendimentos que o aluno precisaria ter deste conteúdo, ou que “teria que ter a mais no aluno”;

- Quais as competências que os alunos devem ter ao final, o que está para além do conteúdo;

- O que ele pode fazer com o conhecimento, dê exemplos;

- O que vocês entendem que os alunos devem fazer para aprender este conteúdo Como me organizo:

- Como você se planeja para o semestre, passo a passo, através do cronograma, do contato com tutor;

- Que tipo de interação é: necessária/possível; - Como você apresenta o conteúdo aos alunos;

- Que tipo de atividade você dá para o aluno – qual o significado que a atividade tem para você na disciplina;

- Como você utiliza o conecta; - Que tipo de ferramentas usa.

Fonte: A autora (2016)

Instantaneamente, no primeiro encontro, percebi que a maior dificuldade seria centrar a discussão no trabalho de cada um dos participantes, na sua forma de ensinar e não em outros pontos. Houve desde o início uma tendência em falar da instituição, dos alunos, das ferramentas, do trabalho de outros professores, mas não sobre a própria atuação.

A partir dessa reflexão do primeiro encontro, propus algumas combinações no início do segundo. A ideia era que pudéssemos centrar nossas discussões no trabalho de cada um a partir das disciplinas escolhidas, as propostas foram:

- O foco da discussão seria o trabalho do professor e não os problemas da instituição, nem de outros professores;

- Buscar-se-ia usar exemplos da EaD (e não das aulas no presencial);

- O aluno seria pensado como o sujeito que deve ser mobilizado pelos professores, e não partir do princípio de que eles não querem estudar.

No decorrer dos encontros, foi inevitável que eles voltassem a exemplos do presencial e falassem de suas vidas como professor na instituição. Em relação à primeira questão, segui chamando a atenção, mas em relação a segunda percebi que era uma angústia muito presente e entendi a necessidade desta discussão em alguns momentos de discussão sobre a mesma.

Durante o segundo, terceiro e uma parte do quarto encontro, os professores apresentaram disciplinas ministradas na modalidade EaD, através do plano de aula9. O primeiro professor expôs sua disciplina e, durante a apresentação, fomos fazendo questionamentos sobre metodologia e até sugestões a partir de colocações dele. Ao ver que desta forma demoraríamos muito tempo, além do planejado, propus que os comentários fossem ao final da apresentação. No primeiro momento, as explanações já traziam algumas dúvidas do próprio apresentador em relação a sua disciplina, bem como os mencionados questionamentos dos colegas.

No final do terceiro encontro houve uma discussão a partir da apresentação da disciplina por Sargas sobre avaliação, centrado no “fraccionamento das notas” ao longo do semestre vinculado com as atividades de aprendizagem. No início da quarta reunião propus a retomada da discussão do fracionamento de notas, que significava muitos trabalhos valendo poucos pontos. Outros professores questionaram o número de trabalho, o que fazia com que os 40 pontos do bimestre virassem vários trabalhos valendo 2 ou 3 pontos. Essa discussão não estava prevista na proposta inicial, no entanto, ao perceber que ela tinha importância, retomei, compreendendo que no espaço da Pesquisa-ação, tais procedimentos são importantes, pois dizem da capacidade de avaliação dos processos e tomada de decisões que cabem a mim como pesquisadora.

9 Optei por não trabalhar com o Plano de Ensino das disciplinas dos professores que participaram desta pesquisa.

Nesta, será visto apenas a fala dos sujeitos que apresentarão sua disciplina ministrada na modalidade EaD. A opção de não trazer os Planos de Ensino, tem duas justificativas: a primeira é não identificar os professore e disciplinas, e a segunda é trabalhar a partir do que eles falaram e da proposta apresentada, já que compreendo estar aí os elementos de seus fundamentos em relação ao ensino e aprendizagem.

Posteriormente, foi assistido o vídeo “Conteúdos factuais, conceituais, procedimentais e atitudinais Antoni Zabala” (GUEDES, 2016). Repassei aos professores leituras sobre estes temas do livro de Pozo (2002), base conceitual de discussão para a maioria dos encontros. Também no quarto encontro, com a discussão deste autor, entendi que seria interessante apresentar o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal de Vigotski (2008). Assim, o quinto encontro, além da sequência da discussão sobre o resultado das aprendizagens (POZO, 2001), apresentei e propus a discussão desse conceito.

Estando na metade dos encontros, questionei a mim mesma se não estaria, porventura, deixando muito “solta” a conversa. Senti que os professores tinham uma necessidade muito grande de falar de sua vida de professor, das suas dificuldades em relação ao tempo de trabalho, às limitações da instituição. Optei por deixá-los falar, o que acabou gerando um clima mais favorável para a abertura deles à discussão, reafirmando a postura colaborativa, vagarosa e silenciosa de Franco (2005).

Em relação à organização dos encontros, percebi que eles não leriam o material em casa, (exceto Girtab). Assim, teria que reorganizá-los destinando tempo às leituras. Isso diminuiu o tempo de discussão, no entanto, ao propor que lessem em casa, poderia exigir um esforço incompatível com as realidades, o que poderia levar a construção de uma ideia negativa dos encontros, como um peso, ou mais uma atividade a ser feita, já que tanto reclamaram do excesso de trabalho.

Também nessa altura dos encontros, tive de retomar um acordo. Apesar de um de nossos combinados ser a referência a exemplos do EaD, os exemplos das aulas presenciais eram contínuos. Assim, decidi fazer um (novo) acordo com eles: eu chamaria a atenção deles quando começassem a falar das aulas e/ou alunos da modalidade presencial.

No sexto encontro, iniciei retomando a discussão sobre interação. Isso porque ao dar um exemplo de um aluno que queria fazer uma pós-graduação na modalidade presencial, e não na modalidade EaD, como na graduação, parecia que os professores estavam pensando que não havia interação na modalidade a distância, eles negaram esta visão. Depois desta discussão, foi feita leitura e reflexão do tema de processo de aprendizagem a partir de Pozo (2002).

No sétimo encontro, em função da discussão feita no encontro anterior, onde o tema da escrita na modalidade a distância apareceu, entendi ser pertinente fazer uma apresentação sobre a importância da escrita para a aprendizagem a partir de Vigotski (2007). Depois da apresentação e discussão foi lido e discutido o tema dos “tipos de atividades para a aprendizagem” (POZO, 2002).

No encontro, os participantes pediram para revisarmos o calendário dos encontros. Apesar da importância das reflexões que estavam ocorrendo, salientada em vários encontros, estava ficando pesado reunir-se toda a semana. Desta maneira propus olhar meu cronograma e refazer a proposta na perspectiva de diminuir alguns encontros.

Ao analisar o cronograma, percebi que precisava saber se eles sentiam a necessidade de refazer seus planos de aula. No oitavo encontro, iniciei com a pergunta “A partir das discussões dos 7 encontros, vocês sentem necessidade de repensar seus planejamentos de aula? ”.

Com as respostas afirmativas, propus que eles fizessem a análise e reorganização de seus planos de aula em casa, e reorganizei o calendário para as semanas seguintes, com uma semana de intervalo. A proposta foi aceita e a orientação para fazer seus planos de aula foi sobre os seguintes pontos:

- Revisão dos planos de ensino; - Revisão do material de estudo; - Revisão da proposta de atividades;

- Preparação da apresentação que deveria salientar o que mudou, o porquê das mudanças e qual a reflexão feita para tais.

Depois dessa discussão, fiz uma apresentação e reflexão sobre os processos de aprendizagem a partir de Pozo (2002): características da aprendizagem; funções adaptativas da aprendizagem; exigências para a aprendizagem construtiva; processos de construção de conhecimento; características das tarefas de aprendizagem para construção de conhecimento; processos auxiliares de aprendizado

Os dois encontros seguintes foram de apresentação dos novos planos feitos em casa. Como um professor não veio no último encontro, foi organizado o décimo primeiro encontro, para a sua apresentação. Durante a apresentação, todos foram abertos à perguntas e sugestões do grupo. Eles traziam as mudanças e apontavam os porquês das escolhas. Neste momento, tanto quanto nos encontros, houve colaboração significativa entre todos os participantes, já que cada um opinou sobre a proposta do outro e fez sugestões.

Uma questão que ficou evidente durante o processo de pesquisa foi a dificuldade dos professores em pensar a partir da modalidade a distância. Isso porque diante destas dificuldades, que decorrem tanto no âmbito epistemológico, quanto operativo desses sujeitos, eles buscam uma transferência das formas tradicionais de interação e do processo de ensino e aprendizagem, que são tidas como modelos, próprias do ensino presencial, para o ensino a distância. Para embasar esta constatação, retomo Peters (2004, p. 149) e sua afirmação sobre a obviedade em

relação a atitude de professores e alunos em transporem seus comportamentos de ensino e aprendizagem com os quais estão familiarizados para ambiente virtuais.

Uma questão importante a ser salientada é que as discussões ocorreram entre os professores a partir do texto que era dado. Meu papel de pesquisadora-facilitadora foi primeiramente de organização do dia, início da discussão e, posteriormente, colaborativa, vagarosa, silenciosa e na escuta como recomenda Franco (2005).

Dessa forma, acredito que os encontros se efetivaram como propostas constituídas a partir da Pesquisa-ação, tanto em relação ao que já trouxe como conceito, como a partir de Elliott (2005, p. 26) que afirma: “La investigación-acción implica necesariamente a los participantes en la autorreflexión sobre su situación, en cuanto compañeros activos en la investigación”. É possível afirmar que houve um processo interessante de ensino entre os participantes e de aprendizagem, a partir de uma experiência de formação colaborativa.

Uma vez realizados os encontros e feitas as transcrições, passei ao processo de análise que construí no quinto capítulo.