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3. Inovação em organizações

3.6. A inovação na perspectiva da teoria institucional – o isomorfismo

Como dito anteriormente, o trabalho do MIRP parte da visão do gestor que conduz processos de inovação. A construção de uma rede de transação e a análise do contexto em que se inserem as organizações são dois dos cinco pontos relevantes a serem considerados pelo gestor.

Transações e contexto nos remetem à discussão das relações da organização com o ambiente externo e, deste ponto de vista, encontramos na teoria institucional uma importante

perspectiva teórica para analisar a adoção de inovações organizacionais como resultado de pressões externas.

Antes de definir o conceito de inovação nesta perspectiva, parece-nos relevante apresentar brevemente os contornos da teoria institucional. Nosso objetivo não é fornecer uma explanação exaustiva de uma teoria tão complexa e sim apresentar os pontos relevantes desta perspectiva teórica para a discussão sobre inovação organizacional.

Ao estudar a teoria institucional, encontramos referências que dividem a produção entre "velhos" ou "primeiros" institucionalistas – fazendo referência a autores da segunda metade do século XIX e início do século XX – e os "novos" ou neo-institucionalistas – identificados como autores das décadas de 1980-90. A divisão não é apenas temporal, havendo distinções significativas entre os princípios e as definições que cada geração propõe na teoria institucional. A principal diferença para estudos organizacionais parece estar no fato de que os velhos institucionalistas não trataram das organizações, e focam na definição de instituições como os sistemas de valores e normas que moldam a vida do homem, governada por hábitos e convenções, além de refutarem a idéia de que as escolhas humanas são sempre racionais.

Somente a partir do trabalho de Phillips Selznick é que se passou a considerar organizações como instituições em microversão. Estudando uma agência governamental no Vale do Rio Tenessee, Selznick mostrou como o planejamento e o modo burocrático de gestão eram fortemente impactados por questões relacionadas aos interesses dos diversos atores sociais envolvidos ou afetados de alguma maneira pelos serviços da agência (ver SELZNICK, 1958).

Na visão de Scott (1994), a ascendência da teoria institucional nos estudos organizacionais pode ser vista como uma continuação e extensão da revolução intelectual que ocorreu na década de 1960. A teoria dos sistemas abertos transformou as abordagens organizacionais correntes ao insistir na importância do contexto amplo ou ambiente, que restringe, molda, penetra e renova a organização. Anteriormente, as organizações eram reconhecidas como unidades de produção e apenas as dimensões tecnológicas do ambiente eram reconhecidas como relevantes, como, por exemplo, a disponibilidade de recursos ou a aquisição de informações para o processo produtivo. Em meados da década de 1970, a produção intelectual passou a reconhecer os efeitos de forças sociais e culturais nas organizações, ou seja, o ambiente

institucional. Organizações passaram a ser reconhecidas como mais do que unidades produtivas: passaram a ser, também, sistemas sociais e culturais.

Nesta perspectiva, Meyer e Rowan (1977) apresentam como proposição principal que organizações existentes em ambientes institucionais fortemente elaborados alcançam o sucesso ao tornarem-se isomórficas em relação ao ambiente, pois assim são capazes de tornarem-se legítimas e receber os recursos necessários a sua sobrevivência (MEYER e ROWAN, 1977, p. 352). DiMaggio e Powell (1983) reforçaram a idéia de isomorfismo institucional ao destacar os mecanismos normativos e de coerção que fazem as organizações mais similares, mas não necessariamente mais eficientes.

Estes argumentos tornam possíveis duas conclusões principais. Primeiro, há similaridades observáveis nas estruturas de organizações que estão dentro do mesmo domínio. As organizações são fortemente influenciadas por características normativas e de regulação do meio ambiente, conseqüentemente, suas estruturas se parecem bastante. Segundo, os estudos em organizações devem se dar conta da presença de duas estruturas, a formal e a informal. A estrutura formal reflete as posições entre os papéis e os mecanismos de sansão, já a informal reflete os comportamentos, as rotinas de trabalho, os elementos culturais e cognitivos da organização — e há sempre uma tensão entre elas.

A teoria institucional foca a atenção nas regras do jogo social e na questão do poder que provoca oportunidades e restrições para as organizações. As organizações são, portanto, um local onde as normas reconhecidas como legítimas moderam os conflitos e definem os mecanismos de tomada de decisão, distribuindo as responsabilidades entre os atores.

Entendemos por sistema institucional um conjunto de normas, geralmente codificadas pelo Estado, que têm por objetivo reduzir as incertezas causadas pela natureza conflituosa das relações sociais. As instituições racionalizam a vida social, legitimando algumas manifestações e coibindo outras. Na tradição sociológica, dá-se uma significativa importância às instituições na estruturação da sociedade. Nas perspectivas funcionalistas e estruturalistas, as instituições representam um conjunto de normas coerentes, donde a ação e a inovação são improváveis, posto que os modelos de conduta mantêm as características do sistema social. Esta visão denota que os estudiosos concederam às instituições uma importância crucial, desconsiderando o poder da ação dos atores.

A questão colocada pela teoria institucional é: o que leva as organizações diferentes a possuírem características similares? Como o processo de adoção de inovações concorre para isso?

Uma vez institucionalizada uma tendência, observa-se sua adoção geral. De acordo com DiMaggio e Powell (1983), isto acontece por meio de três processos isomórficos:

1) processo coercitivo: relacionado a pressões formais e informais exercidas por outras organizações e pelo meio cultural;

2) processo mimético, relacionado à adoção de práticas consagradas como resposta à incerteza; 3) processo normativo, relacionado principalmente ao efeito provocado pela profissionalização.

De acordo com DiMaggio e Powell, a ocorrência de mudanças isomórficas em um determinado campo organizacional pode ser facilitada por fatores como um grau elevado de dependência de uma organização em relação a outra; uma grande incerteza sobre a forma de emprego de recursos e tecnologia e ambigüidade quanto a objetivos.

Ao analisar processos isomórficos, uma variável-chave é a difusão. Nesses processos, o fluxo de homogeneização é conduzido por agentes de difusão, de acordo com determinados padrões. Agentes de difusão são atores organizacionais que influenciam a adoção ou rejeição de novas práticas e sistemas. Padrões de difusão relacionam-se às formas como essas novas práticas, sistemas e modelos fluem nas organizações ou entre organizações. A compreensão dos padrões de difusão ajuda a elucidar o ritmo e a profundidade da eventual adoção.

O processo pode ser entendido melhor se estabelecermos uma cronologia, dividindo-o em três momentos:

O primeiro momento envolve as empresas pioneiras. Nessa fase do ciclo, os agentes de difusão divulgam histórias de sucesso de empresas inovadoras. Conforme essas empresas adotam novas práticas e modelos de gestão, outras empresas passam a segui-las, seja por receio de serem ultrapassadas no jogo competitivo (isomorfismo mimético), seja por pressão direta das inovadoras (isomorfismo coercitivo).

O segundo momento relaciona-se à institucionalização das novas práticas e modelos. Neste ponto do processo, as novas práticas e modelos já se popularizaram a ponto de serem

percebidas como generalizadas. As organizações tendem, então, a adotar práticas que são socialmente vistas como corretas e legítimas.

O terceiro e último momento envolve os chamados adotantes tardios, isto é, organizações que, por diversos motivos, não adotaram as novas práticas e modelos nas fases anteriores e sim tardiamente. Nesta última fase, essas organizações sofrerão pressões consideráveis para adoção.

A Teoria Institucional e o conceito de isomorfismo organizacional fornecem grande contribuição para uma reflexão crítica sobre os motivos que levam a adoção dessas características e configurações.

Kimberly (1979) discute o conceito de institucionalização ao tratar da criação de organizações. Entenda-se institucionalização como o processo pelo qual novas normas, valores e estruturas tornam-se incorporadas às normas já praticadas, processo que leva à estabilidade e à previsibilidade das relações sociais e favorece sua persistência. Esse processo é especialmente visível em organizações maduras e já formalizadas, onde um problema usual é desenvolver mecanismos para sustentar esforços de mudanças planejadas (GOODMAN e BAZERMAN, 1979).

Kimberly desenvolveu este trabalho estudando a criação de uma escola de medicina, cuja proposta quanto a curriculum e estrutura geral da formação dos alunos era inovadora em comparação com outras escolas americanas de medicina. Dirigida por um diretor ambicioso e empreendedor, a nova escola teve que enfrentar três problemas: controle social interno, estrutura de trabalho e gerenciamento das relações com ambiente. A escola era inovadora, mas os critérios de avaliação de performance não. O sucesso e o ineditismo da proposta atraíram muita gente de alto nível, interessada em integrar a equipe que levaria ao sucesso a nova proposta de ensino médico. Porém, essas pessoas perseguiram a performance com base em critérios tradicionais da carreira universitária, como publicações e pesquisas. Como resultado, as propostas de maior tempo dispensado aos alunos e de maior intercâmbio com os hospitais da universidade geravam problemas, pois não correspondiam aos indicadores de performance socialmente reconhecidos. A fluidez, a informalidade e a pouca estruturação da proposta geravam ambigüidades e desconforto na equipe. Esse quadro se agravava pelo crescente distanciamento do diretor, que empregava cada vez mais staff, dado o crescimento da escola. Antes, o perfil empreendedor e a intervenção

direta e pessoal geravam segurança e simpatia pela proposta, aumento do comprometimento, por conseqüência. A necessidade de formalização e definição de tarefas diminuía a ambigüidade, mas acarretava insatisfação entre alunos e mestres, que haviam se juntado à escola justamente pela proximidade do diretor e pelo envolvimento com suas propostas de inovação no ambiente universitário.

A inovação na perspectiva da teoria institucional também oferece contribuição para questionar a perspectiva da adoção de inovações como um processo organizacional, pautado por racionalidade e eficiência nas escolhas de tecnologias, que vai sempre ao encontro dos objetivos organizacionais (MARCH, 1958; ROGERS, 1995). Como resultado, ocorre a geração de um viés positivo em relação a inovações, pois se assume que a difusão só existe porque as organizações adotantes são racionais e cientes de seus objetivos e, conseqüentemente, incapazes de adotar algo ineficiente ou rejeitar algo eficiente.

Nestas condições, organizações em um grupo tendem a imitar as outras na adoção de inovações, mesmo adotando inovações ineficientes e rejeitando eficientes. A segunda é a perspectiva do modismo, que também assume alto nível de incerteza entre organizações em um determinado grupo. Ao contrário da perspectiva anterior, reconhece-se a influência de outros grupos exteriores ao dela. A terceira é a perspectiva da seleção forçada, que admite tanto o alto nível de incerteza quantos aos objetivos e a alta influência de organizações de outros grupos. Organizações com alto poder de influência, como agências governamentais ou empresas de consultoria, que contam com especialistas, acabam por coibir as organizações de adotar inovações. Como exemplo dessa proposta de Abranhamson pode-se considerar a adoção de processos de certificação da ISO 9000 durante o governo Collor, que exigiu que as empresas fornecedoras do Estado estivessem certificadas.

Ao superar a perspectiva de adoção de inovações, como um ato positivo e recomendável, e questionar a capacidade de escolher segundo a maximização da eficiência, passa-se a considerar o processo de difusão das inovações como um ato de legitimação e isomorfismo. A institucionalização de uma prática, como, por exemplo, adotar uma inovação, acena para o sistema social como um indicador de legitimidade e aderência às normas.

3.7. Características da organização inovadora

Uma vez construído o panorama da produção sobre inovações em organizações é importante apresentar a tabela 3, com as principais características da organização inovadora.

Na próxima seção será tratada a inovação sob a perspectiva social. Porém é importante ressaltar, como dito anteriormente, que esta distinção entre inovação e inovação social é uma construção didática, feita para um melhor entendimento do conceito.

3. Tabela – Características da Organização Inovadora

Foco da inovação Características Autores

Estrutura Organizacional

Flexível

Descentralizada

Complexa (tolerância a conflitos e ambigüidades)

Responsabilidades bem definidas

Aigen e Hage (1971) Burns e Stalker (1961)

Zaltman, Duncan e Holbeck (1973)

Brown e Eisenhardt (1989) Comunicação Extensa

Envolvendo todos os níveis hierárquicos

Brown e Eisenhardt (1989)

Pessoas Trabalho em equipes e redes de relacionamento

Gerar interesse e comprometimento Apresentar resultados, mesmo intermediários ou preliminares

MIRP

Contexto Institucional Gerar redes de relacionamento com instituições relevantes

Alcançar legitimidade (interna e externa)

Abrahansom (1991) MIRP

Kimberly (1979)

Idéias Gerar interesse e comprometimento por novas idéias