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CAPÍTULO 2 – PLURALISMO EPISTÊMICO NA FILOSOFIA DA MENTE:

2.2 A integração teórica entre a neurociência cognitiva e a fenomenologia psicológica:

3ª. pessoa?

No mesmo intuito dos estudos teóricos evolutivos e formais, porém com outra metodologia e conceitos, a psicologia cognitiva (aliada a técnicas de imageamento cerebral, modelos computacionais da mente, métodos indutivos experimentais, e conceitos derivados da teoria da informação) tem apresentado fortes argumentos em favor de uma estrutura hierárquica de sistemas cognitivos descrito em termos mecanicistas (descrições em 3ª pessoa)

fundamentados em neurocomputações (incluindo aqui processos modulares e suas integrações ou sínteses). A teoria dos mecanismos hierarquizados de memórias que vamos apresentar na segunda parte desta tese, representa uma síntese evolutiva e desenvolvimental desses mecanismos, o que em si, já promoveria sua integração, apesar do processamento modular.

A descrição psicológica em 1ª pessoa (fundamento da fenomenologia) seria uma forma de integração, capaz de ampla síntese significativa, cujos processos básicos envolveriam uma percepção visual do mundo orientada por um ponto de vista particular, cujas computações (a parte do processamento visual relativa às qualidades de superfícies e formas) são processadas no córtex visual primário e suas conexões parietais (a via dorsal do processamento visual). Veremos adiante que subdivisões funcionais do processamento visual na via dorsal são orientadas para definir um enquadramento do campo e localização de objetos percebidos a partir de um ponto de vista mutante. Desta forma a via dorsal do processamento visual pode fornecer os padrões objetivos para uma descrição (interpretação) subjetiva da realidade. E dessa forma a subjetividade da consciência (seu conteúdo) e definida por seu estado (a natureza do seu processamento neuroambiental).

Estes argumentos teóricos sobre os modos de processamento visual (as operações do conhecimento visual) derivam de experimentos laboratoriais (com cérebros de pessoas normais em atividade específica; modelos computacionais de simulação; situações experimentais com animais e humanos) e, portanto não têm relação metodológica diretamente vinculada a uma fundamentação evolutiva (dedutiva à priori). Embora tais argumentos não sejam incompatíveis de forma alguma com a teoria darwinista, sua elaboração independe da teoria de Darwin. Estas diferentes teorias, no entanto indicam uma estruturação hierárquica similar ou compatível com as bases neuroevolutivas da mente (Pinker, 1998; Mithen, 1998; Gazzaniga, 2006; Eysenck, 2007; Sternberg, 2008).

Uma síntese evolutiva entre mecanismos neurocognitivos ou sistemas de memórias hierarquizados podem promover uma visão global da mente a partir da perspectiva objetivista. Isso seria uma síntese psicológica restrita (relativa aos compôs da neurociência cognitiva). Neuro computações (atividades ou estados neurais) e cognições em 3ª pessoa (tipos de memórias que são processadas ou conteúdos mentais) são fenômenos objetivos (descritos em termos objetivistas) capazes de se relacionar com harmonia conceitual não contraditória (neurônios podem fazer computações). Mas nosso problema maior, em busca de uma possível integração das teorias psicológicas (uma síntese psicológica ampla), é como

equalizar a subjetividade como fenômeno objetivo do mundo? Como integrar funcionalmente as explicações subjetivas e objetivas acerca dos estados mentais? Teremos que assumir uma ontologia relacional para os estados mentais?

Embora o conhecimento científico tenha obtido imenso sucesso em nossa cultura pós-industrial, o seu realismo objetivista não consegue sufocar inteiramente a descrição subjetivista. A subjetividade é um auto-relato que só ganha significado quando referenciado à 1ª pessoa, (a identidade explicitada do sujeito epistêmico), sua auto-referência principal, capaz de organizar os conteúdos de diferentes sistemas informativos. A subjetividade é uma descrição auto-referendada, e nesse sentido o “eu” é sempre especial em relação aos outros estímulos do mundo, e não uma mera referência qualquer entre outras no mundo. Se quisermos uma teoria geral da mente temos que estudar o lugar da subjetividade no mundo objetivo (cujo significado só faz sentido como uma descrição em 1ª pessoa, a marca privativa dos estados mentais e da experiência humana).

Uma forma de tentar equalizar uma descrição de 3ª pessoa com outra forma descritiva de 1ª pessoa deve envolver uma compreensão da subjetividade dentro de uma ciência cognitiva objetivista. Isso implica a naturalização da consciência (uma bandeira já levantada por Searle). Que mecanismos neurais poderiam dar conta desse nível de processamento? Como uma maquinaria neural cria a consciência perceptiva? O modelo hierárquico da percepção visual de Lennie (1998) e os experimentos com neuro lesão relacionada com visão às cegas, nos indicam a importância das áreas primárias da percepção (V1 e V2) na causalidade objetiva da experiência subjetiva (a consciência perceptiva visual). Lennie salienta que 60 % do processamento visual ocorrem em áreas primárias: porque tanto investimento computacional apenas para processar bordas e superfícies? Por outro lado, a teoria de Baars (1988) e os experimentos de Dehaene e Nacchache (2001) mostram a importância do córtex pré-frontal (e o córtex orbito-frontal e o giro do cíngulo anterior subcortical) para a atenção consciente (voluntária e operante sobre comportamentos). Assim, a consciência perceptiva envolve tanto o processamento visual primário (em V1), como também o direcionamento da atenção pelo pré-frontal. A atenção e seus mecanismos de codificação qualitativa (incluindo seus conteúdos perceptivos derivados de V1 que recebem

input visual do mundo) parecem estar relacionados com a base objetivista do processo

Mas além de uma percepção consciente de nosso meio imediato, uma consciência humana deve necessariamente incluir uma consciência de si, um tipo de autoconhecimento. Como afirma Pinker (1998) se nós entendermos mente como um processo de representação do mundo (no sentido de “mapa cognitivo” ou de “comportamento antecipatório”) porque seria improvável uma representação de si mesmo (uma síntese de qualias)? O nosso ponto de vista perceptivo é o foco de intersecção sensorial e simultaneamente nosso ponto de partida para respostas ao mundo, e constitui a base da nossa autodescrição em 1ª pessoa. Um autoconhecimento, fundamentado em uma descrição diferenciada das outras descrições do mundo não é de forma alguma, como querem propor algumas correntes eliminacionistas, um conceito sem sentido (como por exemplo, afirma Putnam).

2.3 É possível uma síntese psicológica ampla? Quais as implicações de uma teoria geral