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CAPÍTULO 6 – CONDIÇÃO SEGUNDA: UMA ONTOLOGIA BIOLÓGICA DA

6.2 O lugar do conhecimento no mundo e sua função causal

O conhecimento pode ser tratado como apresentando uma ontologia relacional. O conhecimento é algo com dimensões descritivas próprias (epistemológicas e lingüísticas) que se relaciona com muitas coisas distintas, e que desta forma, apresenta uma ontologia relacional: só se define em relação, se não houver relação, a ontologia deixa de existir, na medida em que não se define a si mesmo, mas é definido por seu objeto e método. Para deixar mais claro esse problema da natureza relacional do conhecimento nos termos psicológicos de um conhecimento possível podemos apresentar essas questões: conhecimento sobre o que? Quem conhece? O que esse conhecimento tem haver comigo? Como posso conhecer algo? Como posso conhecer o conhecimento? Sou algo mais do que aquilo que conheço de mim, ou do que é possível conhecer sobre mim? A natureza psicológica do conhecimento como estado mental é seu significado, sempre resultante de um processo relacional.

Para estabelecer um parâmetro nesta ontologia relacional que possibilite um diálogo sobre as diferentes ciências e filosofias que investigam o mental e sua relação com o conhecimento, temos que ordenar os respectivos termos (conceituais e metodológicos destas teorias) em uma escala evolutiva (entendida como um construtivismo lógico e naturalístico) e estabelecer uma relação de dupla causalidade entre suas polaridades, se isso for de alguma forma possível (um dos problemas psicológicos não resolvidos e que geram tanta polêmica filosófica). A solução epistêmica que apresentamos para a questão do mental refere-se à

própria natureza pluralista refletida em nossa filosofia da mente e consiste num exercício de relações lógicas possíveis entre conceitos psicológicos distintos de modo não reducionista. Para tal exercício manter-se não reducionista temos que admitir (e, portanto provar) uma dupla causalidade entre os níveis de anti entropia: o cérebro e a mente.

O que queremos realmente dizer aqui é que uma dupla causalidade entre cérebro e mente não precisa ser necessariamente no mesmo grau e intensidade entre os níveis. Da mesma forma que a matéria é o fator causal da vida, e que a vida (sistemas biológicos) tem poder causal sobre a matéria (pode transformá-la, desde um metabolismo digestivo até uma modificação atmosférica), mas é obvio que a dupla causalidade entre matéria e vida não é uma mão dupla de igual proporção. O mesmo parece que pode ser dito entre cérebro e mente.

Sem dúvida, a questão do pluralismo epistêmico da psicologia tem gerado muitas discussões conceituais sobre a natureza do mental, como parece visível nas obras de muitos pensadores modernos (como Searle, Chalmers, Dennett, Teixeira, Churchland, entre outros). Dentro dessa problemática filosófica queremos justificar a adoção formal de termos evolutivos e de termos da teoria da informação (que juntos adquirem valor interdisciplinar amplo) como parâmetros de análise comparativa entre diferentes teorias mentais, favorecendo deste modo um esforço de compreensão interdisciplinar (inter epistemológica). Uma análise inter epistemológica não pode ser realizada a partir de perspectivas puramente epistêmicas (relativas às teorias particulares). Uma análise ontológica (e metafísica) se faz necessária para essa tarefa de relacionar diferentes epistemologias (possivelmente relacionáveis). Ao contrario do que apresentamos no capítulo 1, estamos propensos a acreditar que uma análise inter epistemológica não pode ser realizada a partir de perspectivas puramente epistêmicas (relativas às teorias particulares em suas lógicas próprias). Uma análise ontológica (e sua conseqüência inevitável, a metafísica) se faz necessária para essa tarefa de relacionar diferentes epistemologias.

Em sessões anteriores tratamos da questão informativa numa perspectiva ontológica da teoria holográfica do universo e antes disso, apresentamos o papel interdisciplinar e epistêmico do termo evolução, apesar de seu insucesso em estruturar uma teoria geral da mente. Informação e evolução, como apresentamos, parecem ser termos capazes de instrumentalizar uma discussão entre diferentes teorias, mas não em um patamar puramente epistêmico (relativo às teorias em si). Uma análise inter epistêmica da mente deve trabalhar simultaneamente com várias noções ontológicas sobre a mente, mas para que esse

raciocínio possa fazer sentido, deve-se agrupá-las em vários níveis de ontologias intimamente dependentes (as diferentes ontologias seriam apenas formas epistêmicas distintas de estudá-la, e que se desmontam em uma ampla ligação espacial-temporal), que estamos chamando de ontologia relacional dos estados mentais. A própria designação de “níveis” ontológicos surge da análise epistemológica pluralista possível a um mesmo fenômeno. Portanto cada epistemologia psicológica corresponde a uma forma de lidar com aspectos dessa complexa forma ontológica capaz de modificar-se radicalmente, dependendo do modo como é estudada (além de formar a base pela qual o conhecimento em si se estrutura).

Essa defesa se justifica em termos de critérios epistemológicos formais, porque alguns conceitos amplos e fundamentais (evolução e informação) podem relativizar as respectivas epistemologias de cada teoria em si, possibilitando dessa forma, certo tipo de diálogo. Tal função inter epistêmica desses conceitos, embora tenham se originado de abordagens empíricas como a biologia (no caso da “evolução” ou a engenharia no caso da “informação”), se mostraram úteis em muitas outras abordagens ou práticas científicas (como na psicologia, na sociologia, na economia). Para que esses termos sejam usados em diferentes abordagens, eles devem primeiro ser reduzidos as suas condições lógicas e formais, o que lhes conferem desse modo um status de hipótese dedutiva (passível de referência para diferentes teorias ou linguagens científicas e suas compreensões lógico-dedutivas). Os critérios evolutivos e informativos servem de referencia inter teórica não por produzirem dados empíricos importantes, mas porque produzem (também) critérios lógicos de refutabilidade conceitual.

Mas como toda hipótese evolutiva, em si mesma, é de certa forma um apelo de princípio (que se justifica antes de concluir a análise de seus termos fundamentais por sua auto-evidência implícita nesta mesma justificativa), vamos apresentá-la na forma de uma alegoria hipotética, uma histórica evolutivo-cognitiva possível. Vamos aceitar suas premissas básicas formais (seus significados descritivos) para levantar uma hipótese possível para a gênese do conhecimento, numa seqüência desenvolvimental em série temporal de caráter construtivista (descrevendo uma “evolução da informação”). Tal perspectiva epistêmica se justifica em função de seu esforço interdisciplinar sobre uma natureza ontológica do mental que se mostra essencialmente pluralista. Isso nos leva a seguinte questão: o conceito de hierarquia de diferentes níveis cognitivos, sob o ponto de vista de sua ontogênese de longa duração, pode ser amplo o suficiente para abranger todas as propriedades dos estados mentais sem fecharmos possibilidades explicativas de outras teorias possíveis?

6.3 Antes do início: as condições fundamentais (Arché: o pono zero) – A Inteligência