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CAPÍTULO 2 – A REDEMOCRATIZAÇÃO DE 1988 NO BRASIL E AS

2.5 A MODERNIDADE E O CONTEXTO POLÍTICO BRASILEIRO: A

2.5.2 A Modernidade no Brasil: Crise ou Evolução?

Num dos textos escritos por Sérgio Rouanet, chamado “Iluminismo ou Barbárie”,80 ele demonstra como o projeto civilizatório da modernidade entrou em colapso, como nada daquilo que esperávamos acontecer como melhorias sociais, autonomia e liberdade legítima, se concretizam. Pode-se dizer que a modernidade está em crise, se pensarmos que o movimento intitulado pelo autor de “projeto moderno de civilização” não se efetiva.

O projeto civilizatório da modernidade, segundo Rouanet, tem como foco três conceitos principais que, são a universalidade, a individualidade e a autonomia.

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Dados e datas foram encontrados e retirados de uma pequena biografia de James Watt presentes no site http://www.fem.unicamp.br/~em313/paginas/person/watt.htm

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No texto referenciado “Iluminismo e Barbárie” o autor fala de como a modernidade está em crise, que o projeto civilizatório a que a modernidade se propõe, que é o universalismo, a individualidade e a autonomia não se concretiza e que, ao contrário disso, vemos o particularismo através do racismo, o anonimato que é ocasionado pela sociedade de consumo e a perda de autonomia política e intelectual. Este texto faz parte do primeiro capitulo do livro de ROUANET, Sérgio Paulo. Mal-estar na modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 1993. p. 9-45.

A universalidade no sentido de que todos os seres humanos são iguais, independente de raça (barreiras étnicas), credo, barreiras nacionais, culturais, posição social etc.

A individualidade toma o significado de que as pessoas são concretas, de que cada um é um de forma independente e não apenas como parte integrante de uma coletividade.

Por fim, a respeito da autonomia, Rouanet (1993, p.09-10) afirma que: “A autonomia significa que os seres humanos individualizados são aptos a pensarem por si mesmos, sem a tutela da religião ou da ideologia, a agirem no espaço público e a adquirirem pelo seu trabalho os bens e serviços necessários a sobrevivência material.”

Pode-se presenciar que, atualmente, as três variáveis não estão sendo conduzidas como previa o projeto civilizatório de modernidade, já que elas saíram fora do seu curso normal e dessa forma não concretizaram os objetivos aos quais se propunham.

A universalidade está sendo sabotada, atrapalhada, deturpada pela proliferação de particularismos nacionais, culturais, sociais, religiosos (racismo e a xenofobia).81 Ela se esvai diante da sociedade de consumo que temos hoje, onde não se trata de pensar os pensamentos que os outros pensam, mas ter aquilo que as outras pessoas têm.

A universalidade que se compromete com a igualdade entre os homens (todos são iguais perante a lei) e a garantia dos direitos humanos a todos também não consegue se impor de fato, mas deixa uma importante contribuição e desperta a atenção da sociedade para a condenação das formas de racismo, por exemplo, e para a modificação dos direitos humanos no que se refere a grupos específicos, como os idosos, as mulheres, crianças e adolescentes.

A autonomia está ligada diretamente à liberdade e à capacidade. A liberdade se relaciona com os direitos, e a capacidade com o fato de poder ou não poder exercer esses direitos. Rouanet (1993, p.37) diz que “[...] não sou autônomo, se não sou livre para exercer uma atividade e se não tenho condições materiais para fazer uso dessa liberdade.”

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Ainda com respeito à autonomia, Rouanet (1993, p.09-10) continua:

A autonomia intelectual, baseada na visão secular do mundo, está sendo explodida pelo reencantamento do mundo, que repõe os duendes em circulação, organiza congresso de bruxas, associa-se ao guia Michelin para facilitar peregrinações esotéricas a Santiago de Compostela e fornece horóscopos eletrônicos e texanos domiciliados no Tibet. A autonomia política é negada por ditaduras ou transformada numa coreografia eleitoral encenada de quatro em quatro anos. A autonomia econômica é uma sádica para os três terços do gênero humano que vive em condições de pobreza absoluta.

Essas circunstâncias atuais se tornam responsáveis por uma aparente apatia política, uma perda de entusiasmo em relação ao presente e ao futuro do país.

Desta forma o patriotismo também é abalado, pois o Estado que representava a figura máxima responsável pela manutenção dos interesses coletivos e do bem estar social acaba tendo sua imagem deslocada de sua verdadeira função. Ele se mostra como a figura dominadora e não protetora.

A democracia provocou uma grande alteração no formato do país em que hoje convivemos, trazendo maior mobilidade e diminuindo a centralização de um poder excessivamente autoritário e até tirânico das mãos do Estado que manipulava o destino coletivo ao seu bel prazer.

A autonomia política ideal seria aquela que permitisse ao homem uma certa liberdade de movimento, de ação dentro do espaço público, de participação mais efetiva e onde o Estado não ocupe uma posição muito arbitrária e nem abuse de poder que lhe foi conferido, mas que se preocupe em dar subsídios para que a população consiga satisfazer suas necessidades materiais básicas como a alimentação, moradia, saúde e educação.

Assim, pode-se dizer que vivemos a modernidade sem nunca a termos vivido de fato. Em particular no Brasil, temos mudado de modelos, de regimes, constantemente. Desde o tempo que fomos colônia, importam-se modelos de governo, modelos econômicos, modelos de assistência social, sem que tivéssemos a oportunidade de criar o nosso próprio modelo,

aquele que nos identificasse. Tal fato cria uma expectativa confusa e demonstra uma insegurança em relação ao futuro.

Mudanças ocorrem do dia para a noite, não dando tempo da população acostumar-se com as novas realidades e procedimentos.

Segundo Rouanet (1993, p.11),

Há um certo risco de carnavalização da política: uma festa em que alguns adolescentes saem as ruas num simpaticíssimo protesto contra a corrupção e às altas mensalidades escolares, e, no intervalo a letargia. É preciso convir que esta atitude apática se justifica pela forma de funcionamento entre nós da rotina democrática. Não há como vibrar com entusiasmo cívico quando se vêem as disputas parlamentares por verbas e cargos públicos. Quando a controvérsia entre o parlamentarismo e o presidencialismo é conduzida como se fosse a competição entre dois detergentes, é preferível escolher um produto menos nocivo ao meio ambiente – por exemplo, a cerveja, tomando partido, com um chope, na guerra entre a Brahma e a Antarctica.

Sendo assim, nas condições em que as metas traçadas pelo ideário moderno não se concretizam, pode-se verificar a fragilidade do mundo moderno, cheio de progressos tecnológicos e científicos, de avanços mercadológicos, paralelos às frustrações dos seres humanos que ficam à mercê do poder dominante e não conseguem ser donos do seu destino.

Como a modernidade não concretiza os objetivos aos quais ela se propõe, não se pode realmente falar em neomodernismo ou pós-modernismo, se nem vivemos ainda a modernidade, tratando-se, aqui, em particular, do caso brasileiro.