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2.2 A P OLÍTICA I NDUSTRIAL DO GOVERNO C OLLOR

Vimos que, no governo Collor, o BNDES foi um dos alicerces da política de estabilização. Este é um aspecto novo e importante da sua trajetória. Até então, suas ações e seu papel estratégico referiam-se à centralidade ocupada nas políticas industriais e de desenvolvimento. Neste tópico, explicitaremos as características e a dinâmica da política industrial nesse governo, pois trata-se de um “campo” da ação governamental diretamente vinculado à atuação do Banco e, portanto, privilegiado para compreender sua performance.

50 Explicitaremos as congruências e incongruências entre as medidas de política industrial implementadas e as sugeridas pelo BNDES, tal como a relação destas medidas com as metas do plano de estabilização, a fim de desvendar a “trama” governamental em que a instituição se insere. Pretende-se compreender como o Banco respondeu (ou foi “chamado” a responder) aos desafios prementes do governo. Neste sentido, confrontaremos os propósitos prioritários do governo com os objetivos institucionais e o desempenho concreto do BNDES, a fim de compreender o seu lugar nesse cenário.

As Diretrizes Gerais para a Política Industrial e de Comércio Exterior são anunciadas, em 26/06/90, por meio da Portaria 363 do MEFP. Seu foco era a capacitação tecnológica para gestão e a busca de competitividade das empresas brasileiras, que seriam alcançadas por meio de três instrumentos: 1-) revisão dos sistemas de incentivos ao investimento, à produção e à exportação; 2-) apoio maciço à capacitação tecnológica de empresas nacionais; e 3-) promoção de indústrias nascentes em áreas de alta tecnologia (SUZIGAN, 1991, p. 340). Antes disso, as Medidas Provisórias 158 e 161 já haviam estabelecido a liberalização das importações88 e a eliminação de barreiras não tarifárias e suspendido grande parte dos incentivos fiscais e subsídios89. (Rua & Aguiar, 1995, pp. 261- 262). A reforma tarifária envolvia a redução, até 1994, da tarifa média de 35% para 20% e a dispersão de tarifas que oscilariam entre zero e 40%. As tarifas mais altas estavam nos setores intensivos em tecnologia como bens de informática (40% em 1991), química fina (entre 20% e 30%) e máquinas-ferramenta com controle numérico (25%)90 (DINIZ, 1994, p. 282).

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Foi abolida uma lista de 1.200 produtos, cuja importação estava proibida.

89 A Medida Provisória 158 estabeleceu: “a-) a revogação das isenções/reduções do imposto de importação e

do IPI para importação de máquinas, equipamentos, matérias primas, componentes, etc., através dos chamados Regimes Especiais de Importação, inclusive no âmbito da SUDENE e da SUDAM, ressalvando as importações ao amparo da Lei de Informática e, no caso específico da SUDAM, as importações de matérias primas, componentes etc., garantidas pela constituição; b-) revogação do decreto-lei que autoriza a formação de Zonas de Processamento de Exportações (o Congresso substituiu a revogação do decreto-lei por suspensão por 180 dias); c-) a redução de 50% do Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) e sua extinção a partir de 1º de janeiro de 1991, juntamente com o Adicional de Tarifa Portuária (ATP)” (SUZIGAN, 1991, p. 341).

90 A Medida Provisória tinha em vista, na reforma das tarifas aduaneiras, a seletividade setorial: “reduzir as

alíquotas e seu grau de dispersão, com o cuidado da seletividade setorial de forma a maximizar o impacto favorável da liberalização das importações sobre as receitas cambiais líquidas, privilegiando-se os bens finais, para os quais a redução do preço de importação não resulte em sensível elevação da demanda, e insumos e componentes, cuja produção doméstica seja particularmente ineficiente” (SUZIGAN, 1991, p. 341).

51 Para efetuar tais mudanças e elaborar a proposta de política industrial, o Ministério da Economia contou com a assessoria de um grupo, liderado por Winston Fritsch e que contava com a participação de Gustavo Franco, Wilson Suzigan, José Roberto Mendonça de Barros, Eduardo Augusto Guimarães e Fátima Dibb91. Este grupo chegou a redigir a Medida Provisória 158, mas depois se afastou do processo de formulação e implementação da Política Industrial, como ilustra a declaração de Fritsch:

Esse estudo foi feito al tiro, como dizem os italianos. Ele foi pedido pela Ministra Zélia numa terça-feira e na sexta-feira estávamos com ela no Rio, logo depois de uma viagem à Europa, em fevereiro. Em uma semana, o documento foi apresentado a ela em Brasília e depois do carnaval foi discutido com o Presidente que o aprovou. Somente depois nós escrevemos a Medida Provisória 158 e a exposição de motivos. É bom que se diga que foi muito fácil fazer esse trabalho, porque o grupo responsável por ele já tinha feito algo semelhante na campanha de Mario Covas, o documento teve o caráter de uma contribuição, atendendo a um pedido de Zélia, que ainda não era ministra. O que há de semelhante entre esse estudo e a política propriamente dita é a idéia da introdução de maior eficiência, que representa uma grande ruptura com o passado. Com essa política, o Estado tem o papel importantíssimo de fomentar a competitividade (...) a idéia do estudo foi acabar com os incentivos fiscais e concentrar-se nos incentivos creditícios, voltados em grande parte para a capacitação tecnológica das empresas nacionais (...) Acho que a equipe do governo tem algumas pessoas, como o Luiz Paulo Vellozo Lucas, entusiasmadas em reformar a política industrial (...) A

implementação da política ocorrerá muito em função do modo como o BNDES atuará e do modo como a liberalização comercial será feita

(FRITSCH, 1990a, p. 7 – grifos meus).

Cabe destacar que a proposta do grupo de Fritsch tinha em vista o fim dos incentivos fiscais, mas a permanência dos incentivos creditícios, que deveriam direcionar- se para o desenvolvimento da capacitação tecnológica das empresas92. Além disso, considerava que a redução da proteção e o aumento da exposição da indústria à competição não deveriam ocorrer no contexto de recessão. Fritsch (1991) criticou a despreocupação do

91 É importante destacar que esta última compunha o corpo técnico do BNDES, sendo membro do Deplan e

chefe do Departamento de Estudos do Banco.

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Em entrevista à revista Rumos e Desenvolvimento, Fritsch declara: “O sistema de incentivos vai ser de natureza diferente e isso eu acho que é fundamentalmente positivo, embora para alguns setores ainda haja sentido ter incentivos especiais, sobretudo os novos de alta tecnologia. (...) Todos os incentivos, agora, estão voltados para aumentar a competitividade industrial (...) Eu acho que, nesses setores nascentes de alta tecnologia existe margem para incentivos discricionários mais seletivos. O ideal seria que, para a maior parte da indústria houvesse incentivos de caráter geral. E, idealmente, e aí vem a parte do financiamento – incentivos de crédito” (FRITSCH, 1990b, pp. 4-9).

52 governo em propor novos instrumentos de política industrial para preencher o vácuo deixado pela eliminação dos antigos, destacando as incertezas e o prejuízo que isso trazia para o planejamento das empresas, causando baixa propensão ao investimento e recessão mais aguda do que a necessária ao esforço de estabilização. Além disso, considerou pernicioso o fato de a liberalização do comércio não vir acompanhada de indicações sobre a velocidade da queda da tarifa média e da seletividade setorial.

(...) o anúncio do início da liberalização comercial foi feito a toque de caixa, no contexto do nervosismo que cercou a decisão de liberalização de preços domésticos e secundada por declarações de funcionários graduados do governo que brandiam a ameaça de liberalização para quebrar resistências setoriais à redução de margens de lucro. Esta visão míope do processo de liberalização é duplamente equivocada. Em primeiro lugar, porque, ao pretender implementá-la de forma

subsidiária ao programa de estabilização, confunde uma reforma

estrutural fundamental- e que, portanto, exige estabilidade de regras para produzir os efeitos esperados - com políticas de curto prazo. Em segundo lugar, porque o problema da resistência de cartéis ao controle de preços se trata com uma legislação antitruste adequada e não ameaçando os oligopólios renitentes com a autorização de surtos de importação intermitentes (FRITSCH, 1991, p. 346 – grifos meus)

Suzigan (1991) também faz considerações críticas, destacando que a estratégia de abertura ou liberalização da economia necessita de apoio à capacitação tecnológica da empresa nacional e à promoção do desenvolvimento de indústrias de tecnologia avançada.

A abertura ou liberalização indiscriminada, sem a âncora de uma política industrial e tecnológica que dê condições efetivas para a capacitação tecnológica da empresa nacional e proteção/promoção para o desenvolvimento das indústrias de tecnologia avançada, pode colocar o País ainda mais distante da fronteira tecnológica e à margem do processo de transformação da base produtiva capitalista que está elevando extraordinariamente a produtividade e a competitividade internacional dos países desenvolvidos e de alguns NICs (Newly Industrializing Countries) mais adiantados (...) cabe insistir que não é adequado abrir indiscriminadamente a economia. Deve-se, isto sim, racionalizar os sistemas de proteção e de promoção, estruturando-os de acordo com os objetivos da política industrial, reduzindo o grau de proteção/promoção onde há redundância e mantendo, ou até mesmo aumentando, a proteção às indústrias que se quer implantar ou consolidar (SUZIGAN, 1991, p. 342).

53 Havia divergências entre o grupo que originalmente formulou a proposta de política industrial (Wilson Suzigan, Winston Fritsch, Eduardo Guimarães, Gustavo Franco, José Roberto Mendonça de Barros e Fátima Dibb) e o composto por João Maia e Luis Paulo Vellozo Lucas93, que ocuparam as secretarias de Economia e Política Industrial e saíram vencedores. Tullo Vigevani (1995) relata que a equipe econômica era favorável à eliminação de quaisquer restrições às importações e à redução da intervenção pública no setor de informática, entrando em confronto também com o Secretário de Ciência e Tecnologia, José Goldenberg, que defendeu estímulos ao aprimoramento tecnológico e apresentou uma lista composta de 64 produtos, cuja importação deveria ser proibida, pelo menos até 1995. João Maia propôs a redução dessa lista. Em outubro de 1990, a proposta de Goldenberg saiu vitoriosa, mas já em dezembro do mesmo ano enfraqueceu-se com o fortalecimento das posições do Ministério da Economia (VIGEVANI, 1995, pp. 335-336).

É importante destacar que dois técnicos oriundos do BNDES, Fátima Dibb e Vellozo Lucas, tiveram papel proeminente na formulação da política industrial do governo Collor, mas apresentavam concepções distintas em relação ao modelo a ser implementado. O grupo em que estava Fátima Dibb enfatizava a importância da capacitação tecnológica e do desenvolvimento de setores com alto potencial tecnológico, concebendo a abertura comercial atrelada a estas políticas. Já Vellozo Lucas estava imerso na lógica ortodoxa do Ministério da Economia e defendia uma abertura mais radical, sem que se privilegiassem setores específicos, e buscando, fundamentalmente, a reestruturação industrial, vista como meio primordial para alcançar a competitividade. Adiante, veremos que o Departamento de Planejamento do BNDES defendeu que se estabelecessem programas de incentivo a setores estratégicos e à capacitação tecnológica. No entanto, essas diretrizes não constaram das linhas de atuação do Banco, apresentadas nos relatórios da instituição dos anos 1990-1992. Perceber estas divergências internas nos ajuda a dimensionar a complexidade da atuação do BNDES e evidencia uma questão importantíssima a se refletir, qual seja: por que e como determinadas posições prevaleceram em determinados períodos.

Foram definidos como programas de incentivo à indústria o PACTI (Programa de Apoio à Capacitação Tecnológica da Indústria Brasileira), que estabeleceu metas para

93 Luís Paulo Vellozo Lucas foi diretor do Departamento da Indústria e do Comércio do Ministério da

54 aplicação de recursos em ciência e tecnologia, o PBQP (Programa Brasileiro de Qualidade e Competitividade), cujo objetivo era promover o desenvolvimento dos recursos humanos e de novos métodos de gestão, modernizar a infraestrutura tecnológica e aprimorar a articulação institucional entre o Estado, a indústria e o setor de ciência e tecnologia e o PCI (Programa de Competitividade Industrial), o qual pretendia estimular a competitividade em três níveis distintos: estrutural, setorial e empresarial94 (DINIZ, 1999, pp. 145-146). O PCI previa também a isenção do IPI (Imposto sobre Produtos Industriais) e do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre máquinas e equipamentos destinados à modernização da produção, além de concessão de benefícios creditícios e fiscais à exportação, por meio de programas como o PROEX (Programa de Financiamento às Exportações) e de instituições como o BNDES, que inaugurou uma linha de financiamento à exportação de bens de capital, o Finamex. Eliminava também a exigência de financiamento externo para a importação de máquinas e equipamentos e determinava a redução de 85% para 60% do limite máximo do índice de nacionalização requerido nas operações de órgãos e agências governamentais (DINIZ, 1994, p. 282).

A política industrial do governo Collor causou mudanças significativas no setor. Pesquisa realizada por Bielchowsky e Stumpo demonstrou que o impulso para uma racionalização radical veio dos prejuízos alcançados em 1990 e 1991, momento em que indústria passou pela maior crise de sua história. As expectativas de saída da crise eram muito negativas e o empresariado aceitava a abertura econômica como irreversível. Além disso, estavam cientes do atraso do Brasil em termos das práticas organizacionais modernas e dos desperdícios no processo produtivo de suas empresas, de modo que a racionalização se generalizou em cadeia e em grande velocidade95.

94 O PACTI foi lançado em 12/09/1990, o PBQP em 07/11/1990 e o PCI em 28/02/1991. (RUA & AGUIAR,

1995, p. 262).

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Segundo relatório produzido por Ricardo Bielchowsky para Cepal, as empresas dispensaram, em média, 20,1% dos empregados. O setor de equipamentos de transporte foi o que mais demitiu (29%), seguido pelo subsetor de eletrônica / telecomunicações, equipamentos elétricos e mecânicos, químico e de metalurgia, que dispensaram entre 20% e 23% dos funcionários. (BIELCHOWSKY, 2002)

O relatório se chama “Two studies on transnational Corporations in the Brazilian Manufacturing Sector: the 1980s and early 1990s e está publicado no Desarrollo Productivo, 18, Cepal e no livro Investimento e

Reformas no Brasil – indústria e infraestrutura nos anos 1990. Ricardo Bielschowsky (coordenador) Brasília,

IPEA/Cepal. Lia Haguenauer,João Carlos Ferraz e David S. Kupfer afirmam que entre finais dos anos 80 e 1992, houve queda de 20% no nível de emprego, nos setores de duráveis e commodities. O setor de

55 De modo geral, a reestruturação trouxe, segundo Bielchowsky & Stumpo, ganhos de produtividade de quase 40% no trabalho e, com exceção dos setores de fármacos e componentes eletrônicos, conseguiu-se manter intacta a estrutura produtiva anterior à abertura. Os autores notaram ainda que o Brasil apresentou mais capacidade de gerar saldos positivos na balança comercial do que países com estrutura econômica similar, como México e Argentina. Atribuem o melhor desempenho brasileiro a fatores como o tamanho do mercado interno, a complexidade das indústrias mecânica e eletroeletrônica ao final do processo de industrialização, o acúmulo de capital industrial, a abertura exportadora iniciada nos anos 70 e ampliada durante os anos 80, os elevados investimentos prévios das empresas multinacionais instaladas no país e o estreito contato com o resto do mundo (BIELCHOWSKY & STUMPO, 1996, pp. 181-182).

A análise de Luciano Coutinho esclarece o processo de adaptação e reestruturação do setor industrial à abertura comercial no início dos anos 90:

Nesse contexto de abertura com instabilidade, foi notável a capacidade de resposta defensiva demonstrada pelo sistema empresarial. Reestruturações incisivas e em vários casos brutais foram implantadas para reduzir o nível operacional de braken even ainda que isto significasse profundos cortes de pessoal, custos fixos e de administração. No chão de fábrica compactaram-se os processos de produção, com modificações dos layouts e racionalização dos fluxos, visando adotar as técnicas de just in time e reduzir ao máximo os estoques na linha. As atividades e segmentos auxiliares foram terceirizados, isto é, expulsos da estrutura e transformados em supridores externos. O resultado: notáveis ganhos de produtividade e significativa economia de capital de giro (...) As estratégias dos grupos econômicos foram em geral reorientadas, buscando-se concentrar as atividades nos respectivos core business abandonando-se (por venda ou por simples fechamento) as áreas de negócios consideradas não competitivas ou não – sinérgicas. Na maioria dos casos, esse movimento significou desistir de áreas ou linhas –

produtos de intensidade tecnológica mais elevada e maior risco mercadológico, substituindo-as por importações, particularmente no caso de componentes e equipamentos. No plano da gestão financeira

aprofundou-se a tendência que já vinha sendo firmemente adotada desde os anos 80 de minimizar os níveis de endividamento e de acumular liquidez para realizar ganhos de capital e de juros, buscando-se tirar proveito das extraordinárias oportunidades de efetuar operações de arbitragem financeira ou cambial (COUTINHO, 1996, p. 233 – grifos meus)

equipamentos foi o que mais demitiu, apresentando queda de 27,3% da mão de obra. Já o setor de indústrias tradicionais dispensou em média 13%. (HAGUENAUER, FERRAZ & KUPFER, 1996, p. 202).

56 Lia Haguenauer, João Carlos Ferraz e David Kupfer destacam que, na entrada dos anos 1990, a racionalização de custos foi funcional para um empresariado com baixa confiança na sustentabilidade do crescimento da economia e constituiu-se no fenômeno mais relevante na indústria brasileira. Mas se por um lado deu-se um impulso à reestruturação e racionalização tal como previa o PBQP, por outro não se obteve ganho em termos de investimento em P&D, como pretendia o PACTI. Ao contrário, os autores demonstram que não houve alteração dos investimentos das empresas de commodities, que mantiveram a mesma taxa do final dos anos 1980, entre 0,5 e 0,7% das vendas. Nos setores difusores de progresso técnico, houve queda do investimento em P&D, que não passou de 1% do faturamento das empresas (HAGUENAUER, FERRAZ, KUPFER, 1996, p. 204).

Alexandre Comin destaca que a política industrial do período Collor caracterizou-se pelo abandono de políticas verticais, que implicam condicionalidades, subsídios e regras discriminatórias em termos setoriais. Para o autor, o fim da reserva de mercado para informática e a instituição do PBQP é um bom exemplo dessa opção política. Poderíamos citar ainda o fato de os programas, de modo geral, voltarem-se para a modernização da produção, da infraestrutura, dos métodos de gestão ou para o estímulo à exportação e não para o desenvolvimento de setores específicos (COMIN, 1998, p. 29).

Para Brasílio Sallum Jr., as políticas implementadas por Collor tinham em vista a preservação de ramos industriais que conseguissem mostrar vitalidade para competir abertamente numa economia internacionalizada. O parque industrial brasileiro se tornaria parte especializada de um sistema industrial transnacional. Buscava-se a integração liberal da economia doméstica ao sistema econômico mundial e abandonava-se a ideia de um Estado protetor contra a competição externa e condutor do desenvolvimento industrial (SALLUM Jr., 2001, p. 324).

Fábio Erber (1991), em entrevista à revista Rumos do Desenvolvimento, frisa as contradições entre a política de estabilização e a industrial. Enquanto a primeira era de natureza recessiva, a segunda buscava preservar o componente de fomento. Além disso, estavam desarticuladas, num contexto em que a política macroeconômica tinha peso maior.

(...)a política industrial precisaria estar integrada a um projeto de desenvolvimento de longo prazo. Esse projeto não está claro e isso tem repercussões muito grandes sobre a própria eficácia da política industrial.

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Isso aparece de uma maneira mais clara nas contradições entre a política de estabilização e a política industrial. Quer dizer, temos uma política de estabilização de natureza recessiva e uma política industrial que inclui, certamente, um componente de fomento. Agora, o peso da natureza recessiva da política macroeconômica é maior do que o peso do componente de fomento ao desenvolvimento industrial. Se se pensa num campo de forças - o retorno da política macroeconômica em oposição ao retorno da política industrial - a força da política macroeconômica é muito maior do que a da política industrial (ERBER, 1991, p. 6)

Do mesmo modo, Carlos Pio observa que os objetivos da política industrial eram garantir a competitividade sistêmica da economia nacional, a qualidade do produto e a produtividade das empresas estabelecidas no país. No entanto, tais objetivos subordinavam- se às metas da política anti-inflacionária, privilegiando instrumentos de pressão sobre o setor privado, sem a contrapartida de incentivos para assegurar sua cooperação com as medidas do governo. De acordo com o autor, a política de estabilização, cujo foco era o controle de gastos e o aumento das receitas, implicou corte nos investimentos e o fim dos incentivos estatais ao setor privado.

É importante destacar que a política de estabilização não é necessariamente um entrave ao desenvolvimento de uma política industrial. Ao contrário, Fernando Fajnzylber (1992), economista da Cepal, estruturalista e, portanto, avesso ao monetarismo e à ortodoxia, considera que o requisito para a transformação produtiva é o controle prévio dos processos inflacionários e das situações de acentuado desequilíbrio fiscal. No entanto, a natureza do processo de ajuste não deve pôr em xeque a existência dos agentes produtivos (empresas de maior conteúdo tecnológico, institutos de pesquisa, profissionais e de mão de obra qualificada, empresas de engenharia e de departamentos de engenharia de grandes empresas públicas e privadas) que protagonizam a reestruturação industrial. (FAJNZYLBER, 1992, pp. 13-14).

Além disso, a política industrial propugnada pelo autor não está tão distante dos pressupostos do modelo proposto na Medida Provisória 158. Fajnzylber defende a incorporação do progresso técnico ao setor produtivo, a priorização dos subsetores que