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3.1 O CENÁRIO POLÍTICO ECONÔMICO DO GOVERNO I TAMAR F RANCO

Itamar Franco assumiu o comando do país em outubro de 1992 e modificou por completo a equipe ministerial176. Além do desgaste do governo anterior, o novo presidente não compartilhava do radicalismo liberal de Collor. A discordância, no entanto, não significava que existisse outro projeto a ser implementado, seja na área de política monetária, seja em relação à política industrial e à estratégia de desenvolvimento. De acordo com Rodrigues (2000), a principal fragilidade do governo estava na ausência de uma política viável de estabilização. Os dois primeiros titulares da Fazenda, Gustavo Krause e Paulo Haddad, não conseguiram implementar um plano econômico que fosse capaz de combater com sucesso a inflação177. Haddad ensaiou uma tentativa de ajuste fiscal e acreditava que, para amparar a estabilização, eram necessários algum tipo de flutuação cambial e o aumento da taxa de juros. Não pôde contar com o apoio do Presidente, que resistia às medidas ortodoxas clássicas, como o aumento dos juros (RODRIGUES, 2000, pp. 264-265). Além das dificuldades convencionais que caracterizavam, desde as fracassadas tentativas da década de 1980, a implementação de um plano de estabilização no Brasil, a desconfiança e o descrédito do próprio Presidente agravavam a situação, reduzindo ainda mais as poucas chances de êxito que um plano de combate à inflação teriam naquele

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Inicialmente, a equipe do governo Itamar foi composta por Paulo Haddad no Planejamento (seguido por Yeda Crusius, Aléxis Stepanenko e Beni Veras), Gustavo Krause na Fazenda (substituído por Haddad, Eliseu Rezende, Fernando Henrique Cardoso, Rubens Ricupero e Ciro Gomes), Gustavo Loyola no Banco Central (substituído por Paulo César Ximenes Alves Ferreira e Pedro Malan), Maurício Correa no Ministério da Justiça (substituído por Alexandre Dupeyrat Martins), Fernando Henrique nas Relações Exteriores (substituído por Celso Amorim), Paulino Cícero de Vasconcelos no Ministério de Minas e Energia (substituído por Aléxis Stapanenko e Delcídio do Amaral), Murillo de Avelar Hingel na Educação (substituído por Jerônimo Moscardo de Souza, Luiz Roberto do Nascimento e Silva), Henrique Hargreaves na Casa Civil, Alberto Goldman nos Transportes (substituído por Margarida Coimbra do Nascimento e Rubens Bayma Denis), Lázaro Ferreira Barbosa na Agricultura (substituído por Nuri Andrauss Grassani, José Antônio Barros Munhoz, Dejandir Dalpasquale e Synval Guazelli), Antônio Houaiss na Cultura, Walter Barelli no Trabalho (substituído por Marcelo Pimentel), Jamil Haddad na Saúde (seguido por Henrique Antônio Santillo), José Eduardo de Andrade Vieira na Indústria, Comércio e Turismo (seguido por Élcio Álvares), Alexandre Alves Costa na Integração Regional (substituído por Aluízio Alves), Hugo Napoleão nas Comunicações (seguido por Djalma Bastos de Moraes), Jutahy Magalhães Pinto no Bem-Estar Social (seguido por Leonor Barreto Franco), José Israel Vargas na Ciência e Tecnologia e Fernando Coutinho no Meio Ambiente (seguido por Rubens Ricupero e Henrique Brandão Cavalcanti), Antônio Britto Filho na Previdência (substituído por Sérgio Cutollo). A maior instabilidade esteve nos ministérios diretamente relacionados à área econômica, isto é, Planejamento e Fazenda. O Ministério da Agricultura também foi bastante instável e contou com quatro titulares.

177 Nos primeiros meses de 1993, a inflação foi de 28,77% em janeiro; 27,58% em fevereiro; e 28,37% em

103 conturbado contexto. Rodrigues relata que o governo era duramente criticado, sendo acusado de fraco, ineficaz e imobilista. A popularidade de Itamar Franco caía e sua base de sustentação no Congresso era frágil.

Ao substituir, em marco de 1993, Paulo Haddad por Eliseu Rezende, Itamar cedia às pressões e também à ortodoxia, aceitando medidas como a política monetária rígida, o arrocho orçamentário com cortes de despesas, a manutenção de juros altos, facilidades para a entrada de capital estrangeiro e privatização mais agressiva (RODRIGUES, 2000, p. 267). Contudo, o Plano Elizeu, anunciado em 24/04/1993, não tocou de modo efetivo no problema da estabilização. As críticas à sua ineficiência somavam-se às denúncias de que o Ministro utilizava sua função e poder para favorecer a construtora Odebrecht, da qual havia sido conselheiro. As pressões tornaram insustentável a permanência de Elizeu Rezende, que foi substituído por Fernando Henrique Cardoso (RODRIGUES, 2000, pp. 277-280).

Fernando Henrique exigiu do Presidente carta branca para montar a equipe econômica e conduzir a estabilização e possibilitou o retorno dos pais do Cruzado ao governo178. Segundo Carlos Pio (2001), desde o fracasso do Cruzado, o grupo central de economistas da PUC-RJ – Lara Resende, Arida, Bacha e Malan – tinha decidido não integrar outra equipe de governo caso a estabilização da economia não fosse o principal projeto político do governo. Consideravam que a credibilidade das políticas de estabilização dependia diretamente da habilidade do governo em persuadir os agentes econômicos sobre sua durabilidade. Exigiam liberdade para tomar e implementar decisões sem veto ou demanda política contrária à lógica básica do programa. As condições impostas por Fernando Henrique para comandar o Ministério da Fazenda e a concordância

178 A equipe de FHC era composta por Pedro Malan (negociador da dívida), Winston Fritsch (secretário

especial de Política Econômica), Gustavo Franco (secretário adjunto de Política Econômica), Clóvis Carvalho (Secretaria Executiva do Ministério), Edmar Bacha (Assessor Especial no Rio de Janeiro), José Roberto Mendonça de Barros e André Franco Montoro Filho (Assessores Especiais em São Paulo), Sinésio Sampaio e Júlio César Gomes (Chefia de Gabinete e Secretaria Particular do Ministro), Murilo Portugal (Secretário do Tesouro Nacional), Osíris Lopes Filho (Secretaria da Receita Federal), Pedro Malan (negociador da dívida externa), Paulo César Ximenes (Banco Central), Alcir Calliari (Banco do Brasil) e Danilo de Castro (Caixa Econômica Federal) (RODRIGUES, 2000, p. 286). Posteriormente, Fernando Henrique alocou Pedro Malan no Banco Central, André Lara Resende assumiu a função de negociador da dívida externa e Gustavo Franco passou a ser diretor da área externa do Banco Central. Pérsio Arida substituiu Delben Leite na condução do BNDES (RODRIGUES, 2000, p. 299). É importante lembrar que Fritsch e Gustavo Franco compuseram o grupo que redigiu a proposta inicial de abertura da economia e política industrial do governo Collor; Pedro Malan era o negociador da dívida na gestão de Marcílio Marques Moreira na Fazenda e Murilo Portugal, coordenador do programa de desregulamentação do governo anterior.

104 do Presidente possibilitaram a concretização de tal cenário. Além disso, de acordo com Pio, a equipe era bem homogênea e o grau de conflito intra e interburocrático muito baixo. Outros ministérios foram excluídos do processo decisório e até mesmo o presidente Itamar Franco deixou de interferir nas decisões tomadas pela equipe econômica (PIO, 2001, p. 41).

O diagnóstico era o de que o orçamento equilibrado consistia num dos pré- requisitos para o sucesso do Plano Real179. Em dezembro de 1993, tiveram início as medidas drásticas para cortar gastos e ampliar a arrecadação180. A principal delas foi a criação do Fundo Social de Emergência (FSE), que permitia ao presidente reter até 20% das receitas de todos os impostos federais181. De acordo com Luiz Filgueiras (2000), o FSE permitiu ao governo executar cortes no seu orçamento para 1994 e deu maior flexibilidade na utilização dos recursos e maior controle no fluxo de caixa.

Luís Gonzaga Belluzzo (1999) destaca que, para debelar a inflação, o Plano Real seguiu o método convencional de recuperar a confiança na moeda nacional, por meio da garantia de seu valor externo. Considera que só foi possível manter a taxa de câmbio como âncora da nova moeda, devido à abundância de recursos externos e de oferta de ativos atraentes (títulos da dívida pública, ações de empresas em processo de privatização, bônus e papéis comerciais de empresas e bancos de boa reputação, ações depreciadas de empresas privadas) da qual o Brasil dispunha. A propósito, “O fator decisivo para a obtenção desse desfecho favorável foi a transformação dos países latino-americanos, de doadores de „poupança‟ em receptores de recursos financeiros” (BELLUZZO, 1999, p. 85). Filgueiras complementa afirmando que a fórmula que garantiu o sucesso do plano foi a abertura da

179 O déficit público era de US$ 20 bilhões e correspondia a 5% do PIB (apud RODRIGUES, 2000, p. 301). 180 As principais medidas foram: corte nas transferências voluntárias de capital do governo federal para os

estados e municípios e retomada dos pagamentos da dívida dos estados e municípios com o governo federal; imposição de rígidos limites à criação de títulos do governo; criação de controles mais rígidos para o uso de fundos do Tesouro, especialmente para gastos com pessoal e investimento e corte geral nos gastos públicos, incluindo pessoal e benefícios sociais; aumento da eficiência dos mecanismos de recolhimento de impostos, recuperação da saúde financeira dos bancos federais e expansão do programa de privatizações (Pio, 2001, p. 43). Luiz Filgueiras (2000) relata que as medidas visavam aumentar as receitas através da arrecadação das alíquotas dos impostos em 5% e da recriação do Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF) e cortar 40% nas despesas correntes, correspondentes a 20% do montante total do orçamento, com a diminuição das transferências constitucionais da União para os estados e municípios e a criação do Fundo Social de Emergência (FILGUEIRAS, 2000, p. 102).

181 Os bastidores das negociações da aprovação do FSE são relatados por Rodrigues (2000). De acordo com o

autor, Fernando Henrique conduziu as negociações e condicionou a sua permanência na Fazenda à aprovação do Plano. Antonio Carlos Magalhães afiançou o apoio do PFL à inclusão do partido na aliança para as eleições presidenciais. Jorge Bornhausen pediu, em troca da aprovação do FSE, que o PFL indicasse o candidato à vice-presidente na coligação de Fernando Henrique (RODRIGUES, 2000, p. 327).

105 economia às importações, a redução do imposto de importação, a quebra de barreiras para a entrada de capitais estrangeiros no mercado financeiro, atraído com elevadas taxas de juros e câmbio nominal e real em queda (FILGUEIRAS, 2000, p. 109). José Marcos Novelli (2007) corrobora as considerações de Belluzzo e Filgueiras, mas acrescenta que as reformas liberalizantes, iniciadas no governo Collor, também contribuíram para o sucesso do Plano182.

Depois das medidas para equacionar o orçamento, foi implementada, em março de 1994, a reforma monetária com o objetivo fundamental de eliminar o componente inercial da inflação. Considerava-se que, além do déficit público e da oferta monetária, a memória do sistema de indexação era o principal obstáculo à sua redução. Para pôr fim à memória inflacionária e eliminar de vez o seu componente inercial, não se utilizou, como nas estratégias precedentes, o congelamento de preços. Foi criada a Unidade de Referência de Valor (URV), uma unidade contábil que refletia a taxa real de inflação e correspondia a US$ 1 (PIO, 2001, pp. 43-44).

Segundo Filgueiras, a URV cumpriria a função de alinhar os preços relativos, inclusive os salários, de modo que a nova moeda não se contaminasse pela inflação passada, associada à velha moeda (FILGUEIRAS, 2000, p 105). Quando todos os contratos estivessem convertidos em URV, entraria em vigor a última etapa do Plano, a introdução do Real. A URV foi transformada em Real e a taxa de câmbio foi fixada em US$ 1 = R$ 1, mas não se instituiu a conversibilidade entre as duas moedas. O montante de real a ser emitido deveria ter correspondência com o volume de dólares depositados no Banco Central, reafirmando-se que não haveria descontrole monetário para cumprir rombos orçamentários do governo (FILGUEIRAS, 2000, pp. 107-108).

Além do domínio das variáveis econômicas, havia a preocupação em controlar também o processo político. Neste sentido, Novelli destaca que as Medidas Provisórias

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As reformas liberalizantes às quais Novelli se refere são: 1-) permissão da entrada direta de investidores institucionais estrangeiros no mercado acionário doméstico, definidos como fundos de pensão, companhias de seguro, instituições financeiras estrangeiras, fundos de investimentos constituídos no exterior, sem critérios de composição, capital mínimo inicial e período de permanência; 2-) Constituição de „Fundos de Privatização – capital estrangeiro‟ (1991), Fundos de Renda Fixa – Capital estrangeiro (1993); 3-) Permissão por meio da conta CC-5, de livre compra, pelas instituições financeiras, de moeda estrangeira no mercado de câmbio. A liberalização comercial é outro aspecto importante e que contribuiu para o sucesso do Plano Real, pois colocou os produtos nacionais em concorrência com os importados, evitando a elevação de preços (NOVELLI, 2007, p. 222).

106 foram a “âncora institucional” do Plano e da nova moeda. “As medidas provisórias seriam prorrogadas a cada trinta dias e não havia interesse do governo em colocá-las em votação. Esse fato, além de evitar a derrota, permitia ao governo fazer as alterações no plano que julgava necessárias” (NOVELLI, 2007, p. 214).

Percebe-se que há no governo Itamar a repetição, agora exitosa, de medidas políticas como a concentração de poder na equipe do Ministério da Fazenda e a utilização de Medidas Provisórias para viabilizar a implementação e a sustentabilidade do plano de estabilização. Mas não foi só. Novelli (2007) considera que as ações da equipe econômica para desarticular os atores (trabalhadores e empresários), que sustentavam a inflação, foram decisivas e, embora tenham se iniciado durante a gestão de Itamar, estenderam-se ao governo FHC. De acordo com o autor, o sucesso da estabilização foi fruto da desarticulação da coalizão inflacionária (composta por trabalhadores urbanos, parte do empresariado e funcionários públicos), assim como de reformas institucionais e de uma conjuntura financeira internacional muito favorável.

“A desarticulação da coalizão inflacionária foi patrocinada pelo Estado através de duas importantes ações: do lado do empresariado, a

liberalização comercial colocou as empresas nacionais e seus produtos em competição com os importados, o que acabou por impedir

o repasse e a elevação dos preços; do lado dos trabalhadores

organizados, o aumento do desemprego e a dureza com que a greve dos petroleiros foi combatida (mediante a participação do Exército),

bem como o rigor com que as penalidades foram impostas ao

sindicato sinalizaram um novo padrão de ação governamental no

tratamento das reivindicações dos primeiros (não há renegociação para

reposição da inflação, nem indexação salarial). Esse novo padrão

atingiu dura e especialmente os funcionários públicos” (NOVELLI, 2007, p. 224 – grifos meus).

Um exemplo claro dessa postura foi o tratamento dado às câmaras setoriais por Itamar e sua equipe econômica. Segundo Comin (1998), a principal responsabilidade pela crise das câmaras setoriais foi do governo federal. Itamar Franco decidiu incentivar a produção do carro popular e estabeleceu negociações diretas com as montadoras, sem qualquer participação dos trabalhadores e ignorando as câmaras setoriais. O governo negociou reduções tarifárias, como a taxa simbólica de 0,1% de IPI, em troca do compromisso por parte das montadoras de que o valor do carro popular não superaria 7 mil dólares, o que não foi possível devido à existência generalizada de ágio na venda do

107 produto. O resultado foi ruim porque se criou uma discrepância entre os preços dos populares e os demais modelos, gerando uma demanda altíssima pelos primeiros e uma incapacidade de atendê-la. Do ponto de vista da modernização tecnológica, o acordo também não permitiu avanços, pois a tecnologia utilizada era ultrapassada e não se exigiu modernização tecnológica. (COMIN, 1998, pp. 52-54). De acordo com Arbix (1996), não houve qualquer discussão sobre política industrial, qualidade e produtividade.

...em nenhum momento as montadoras seriam orientadas, ou disciplinadas, para respeitarem critérios de qualidade e tecnologia para a fabricação dos populares. Tampouco seriam fixadas metas de geração de empregos ou de novos investimentos. E muito menos seriam exigidos componentes e alterações visando a preservação do meio ambiente (ARBIX, 1996, p. 154).

No entanto, a política para o carro popular foi um entre outros “golpes” na atuação das câmaras setoriais. Arbix relata que outras duas mudanças substantivas foram decisivas para a sua desarticulação. A primeira diz respeito à Medida Provisória que criou a URV e atribuiu às câmaras setoriais a função de controle de preços. A segunda foi o rebaixamento da alíquota de importação, que minou a perspectiva de queda escalonada até 2000 e questionou os acordos setoriais realizados. As alíquotas não eram mais um recurso de política industrial e transformavam-se em instrumentos de punição contra os oligopólios. Além disso, o governo interferia nas negociações salariais, vetando os aumentos pretendidos pelos trabalhadores e concedidos pelas montadoras, provocando reações dos dois setores contra sua política (ARBIX, 1996, pp. 155-156).

O enfraquecimento das câmaras era reforçado pelas divergências, entre os ministérios, sobre o papel que deveriam ocupar. No governo Itamar, elas subordinaram-se ao MICT (Ministério da Indústria, Comércio e Turismo), mas foi o Ministério da Fazenda que determinou o papel (diminuto) que tiveram. O histórico conflito entre monetaristas e desenvolvimentistas ressurgia com um vencedor (o Ministério da Fazenda) previamente determinado. “No interior do MICT, órgão incumbido de coordenar o trabalho das câmaras, a sensibilidade para a presença dominadora do Ministério da Fazenda, que tolhe os movimentos dos funcionários e das equipes constituídas, é particularmente aguda” (ARBIX, 1996, p. 151).

108 Arbix constata que a câmara deixava de ser um espaço de definição de política industrial para o setor automotivo. Mas não era apenas nesse setor que a política industrial era secundária. De modo geral, e apesar do passado nacionalista do presidente, não houve espaço para a formulação de um novo projeto de política industrial ou mesmo para a aplicação dos programas (especialmente, o PCI e o PACTI) elaborados no governo Collor e, até então, precariamente efetivados.

De acordo com Mauro Arruda e Marcelino Jorge (1994), não foram implementadas políticas industriais ofensivas ou defensivas183 para os diferentes setores da indústria. Mesmo com a aprovação da Lei 8.661/93, que instituiu o PDTI (Programa de Desenvolvimento Tecnológico e Industrial) e previa incentivos fiscais184 para projetos com esta finalidade, pouco se avançou. Até 2005, quando foi substituída pela Lei do Bem (Lei 11.196, de 21/11/2005), o PDTI aprovou 196 projetos, envolvendo apenas R$ 5 bilhões para todo o período (SALERNO; KUBOTA, 2008, p. 34). E, ainda que tenham sido concedidos incentivos fiscais ao desenvolvimento tecnológico, não houve uma política de comércio exterior ou políticas de competitividade sistêmica (ARRUDA & JORGE, 1994, p. 299). O foco permaneceu na abertura da economia.

O país saiu de uma situação de proteção absoluta, praticamente infinita de barreiras não-tarifárias, para outra, de aplicação quase exclusiva de tarifas aduaneiras185. A reestruturação da indústria dar-se-ia com proteção restrita às tarifas aduaneiras, fato incomum no cenário internacional. Com efeito, não existe exemplo de país industrializado ou em processo de

183 “As primeiras (ofensivas) visam a estruturar e fomentar os sistemas nacionais de inovação, principalmente

as atividades de P&D e os setores motores do progresso técnico, assim como estimular a difusão de inovações geradas por esses setores pelo resto do sistema, especialmente nas indústrias fornecedoras de bens de produção. As segundas (defensivas) têm por objetivo proteger, reestruturar e, eventualmente, eliminar gradualmente setores pouco estratégicos do ponto de vista econômico e social” (ERBER apud ARRUDA & JORGE, 1994, p. 299 – parênteses meus).

184 “O PDTI possibilitava dedução de até 8% do IR relativo a dispêndios em atividades de P&D tecnológico,

industrial e agropecuário; isenção de Impostos sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre equipamentos e assemelhados para P&D; amortização acelerada, mediante dedução como custo ou despesa operacional dos dispêndios, na aquisição de intangíveis para P&D; dedução, como despesa operacional, dos pagamentos de

royalties para empresas de tecnologia de ponta ou de bens de capital não seriados” (SALERNO; KUBOTA,

2008, p. 34)

185 A tabela traz os dados sobre as alíquotas:

Ano Vigência Máxima Média

1989 85 35,5 1990 105 32,2 1991 A partir de 15/12/1991 85 25,3 1992 01/01/1992 a 30/09/1992 65 20,8 1993 01/10/1992 a 10/06/1993 55 16,5 1994 A partir de 01/07/1993 40 14

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industrialização que faça ajuste estrutural em segmentos já implantados, ou se inicie em segmentos que antes não tinham presença, sem algum tipo de proteção, além da tarifária (ARRUDA & JORGE, 1994, p. 296).