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A PARTICIPAÇÃO NA R ECONQUISTA II: R UMO A A LBUQUERQUE ― CONQUISTA E

2. AFONSO TELES, O VELHO E O ESTABELECIMENTO DA FAMÍLIA NO

2.4. A PARTICIPAÇÃO NA R ECONQUISTA II: R UMO A A LBUQUERQUE ― CONQUISTA E

Como foi visto atrás, em momento anterior às Navas, Afonso Teles tinha sido agraciado pelo rei, pelos seus serviços e fidelidade161, com as doações de Montalbán, em 1209, e, um ano depois, de Dos Hermanas e da torre de Malamoneda, nos Montes de Toledo. A partir destas localidades fortificadas terá certamente empreendido ataques contra localidades muçulmanas, uma vez que as fortalezas de fronteira, além de uma função defensiva, serviam paralelamente como bases de excelência para lançar ofensivas. A tomada de Guadalerza é disso perfeito exemplo. E esse fito está perfeitamente patente numa das cláusulas da cedência perpétua de Montalbán com os seus termos, pela qual Afonso VIII fomentava e incitava a guerra e conquista a sul, pois previa que as áreas que viessem a ser expugnadas aos muçulmanos por Afonso Teles lhe pertencessem, aumentando o domínio a expensas de território inimigo162. A doação de Dos Hermanas e Malamoneda era feita pelos mesmos motivos e, como foi visto atrás, em momento imediatamente posterior à tomada da torre de Guadalerza, sucesso que terá influído na concessão deste benefício. Porém, não estava consignada a doação dos territórios que ocupasse, o que não impedia que a aquisição por direito de conquista fosse válida.

Estes benefícios indicam que Afonso Teles agia favoravelmente em relação aos objectivos régios, sendo assim recompensado e estimulado a continuar o trabalho na fronteira, que passava sobretudo, mais do que o lançamento além de eventuais ofensivas militares, pelo seu repovoamento e defesa. É manifesto que, após a conquista de territórios e depois da implantação de sistemas aptos a defendê-los, um dos principais objectivos imediatos procurados pelos monarcas passava pelo seu repovoamento. As doações feitas pelo rei tinham muitas vezes associada a obrigação de promover o povoamento das terras, o que era do interesse de ambos, rei e beneficiado. E a verdade é que Afonso Teles irá alcançar alguma relevância nestes aspectos na área que recebera.

161 Segundo a escritura de cedência de Montalbán, «pro multis et grátis serviciis que mihi Diu et fideliter

exibuistis et quotidie exibere non cessatis» (Alfonso VIII, doc. 837). A da doacão das outras terras tem uma

fórmula semelhante.

162 Às terras indicadas na carta de doação, com todas as suas pertenças, e limites relativamente definidos,

somava-se todas aquelas que conseguisse tomar aos muçulmanos: «et deinde usque ad Paganos quantum

potueritis acquirere» (ibidem). Os termos do território cedido estendiam-se para Este, em direcção a Toledo e

Logo depois da grande batalha das Navas, tinham sido tomados pelos cristãos alguns castelos, nomeadamente Ferral, Tolosa, Baños e Vilches163, e ainda Baeza, abandonada pelos muçulmanos, e Ubeda, onde muitos destes se haviam refugiado, que acabaria por ser arrasada, na impossibilidade de aqueles a conservarem164. Apesar de os muçulmanos terem desocupado Baeza, não parece que as suas muralhas tenham sido destruídas, nem as forças cristãs decidiram mantê-la. Nova investida teria lugar no ano seguinte, quando Afonso VIII volta a comandar as suas forças na conquista de Alcaraz e Dueñas, depois chamada Calatrava La Nueva165, e monta cerco a Baeza, já reocupada, ao mesmo tempo que Afonso IX, por sua parte, avançava sobre Alcântara, que cederia imediatamente aos frades de Calatrava166. Porém, em Fevereiro de 1214, a falta de víveres e a fome que grassava no reino criavam uma situação suficientemente grave para obrigar Afonso VIII a assinar tréguas com o novo emir almóada e levantar o sítio de Baeza167. Essas tréguas teriam uma duração de sete anos e seriam depois renovadas em 1221, já com Fernando III no trono castelhano, por mais três anos, estendendo-se até 1224168. Durante este período de tempo, Afonso Teles aproveitaria para fortalecer o seu poder na fronteira meridional.

As terras a sul de Toledo encontravam-se, de uma forma geral, quase completamente despovoadas169. A partir dos castelos recentemente recebidos, Afonso Teles podia vigiar o acesso a Montalbán e a Toledo e, ao mesmo tempo, aproveitar os terrenos para promover a criação e desenvolvimento de alguns povoados, ao permitir a prática da agricultura com alguma segurança e sobretudo da pastorícia, que tinha naqueles montes excelentes condições ao nível dos pastos e linhas de água170. Teriam assim surgido algumas aldeias, entre as quais Hontanar, junto à torre de Malamoneda, e Navahermosa, que mais tarde iria mesmo absorver Dos Hermanas171.

Afonso Teles irá rapidamente reforçar o seu domínio sobre estas terras. De forma a tornar mais eficaz a vigilância da região, teria levantado em Malamoneda, como

163 Cf. De Rebus Hispaniae, pp. 324-325. 164 Cf. ibidem, p. 325. 165 Cf. Crónica Latina, p. 36. 166 Cf. De Rebus Hispaniae, p. 327.

167 Cf. ibidem, pp. 327-328. As pazes também eram pretendidas pelos muçulmanos, pois Anasir, vencido

nas Navas, falecera em Dezembro de 1213, sendo aclamado Almustansir bi-llah, que estava agora mais interessado em consolidar o seu poder nos nos seus domínios (cf. Fernando III, 1º vol., pp. 278-279).

168 Cf. Gonzalo Martínez Diez, Fernando III. 1217-1252, Palência, La Olmeda – Diputación Provincial,

1993, pp. 63-65, e Fernando III, 1º vol., pp. 278-291.

169 Julio Gonzalez aponta que os fracos recursos económicos e as limitações ao nível das vias de

comunicação, que se reflectiam na escassez de fortificações, haviam tornado esta enorme região numa área pouco povoada, onde apenas se encontravam poucos e pequenos povoados. Cf. Repoblación de Castilla la

Nueva, 1º vol., Madrid, Universidad Complutense, 1975, p. 322.

170 Os principais recursos das terras seriam a caça, os pastos, o mel e a madeira. Cf. ibidem. 171

importante complemento da torre já existente, um castelo a cerca de 100 metros desta172. Mas as construções iriam continuar e às duas bases de Dos Hermanas e Malamoneda terá sido mais tarde somado o castelo de Cedenilla, de localização incerta173. Terá ainda, por iniciativa sua, tomado e reocupado, mais a sul, o castelo de Muro, também hoje desaparecido, na serra de Muro, vale do Estena, junto ao Guadiana174.

Não é improvável que entre D. Rodrigo, arcebispo de Toledo e Afonso Teles pudesse surgir um conflito de interesses ou algumas desavenças sobre as áreas de expansão a sul, sobretudo a partir de 6 de Novembro de 1214, momento em que Henrique I doa Estena e os seus termos ao primeiro175. Situando-se este vale imediatamente a sul dos domínios de Afonso Teles, criava-se assim, de certa forma, um tampão ao avanço deste último. Como tal, esta situação podia originar condições para o aparecimento de divergências entre os dois, arcebispo e magnate, caso decidissem não actuar de forma concertada. Mas esse apenas seria um eventual problema futuro ― que não se veio a verificar ―, pois a expansão para sul na raia castelhana estava momentaneamente suspensa.

Porém, apesar de vigentes as pazes na fronteira castelhana, na zona sul leonesa a guerra continuava a ter lugar. Aproveitando esta realidade, em 1218, cinco anos depois da tomada de Alcântara176, Afonso Teles vai-se apoderar de Albuquerque, a sul daquela praça e a poucos quilómetros de Badajoz.

«Dom Afonso Telez o Velho, o que pobrou Alboquerque, donde decenderom os

Telos»177, é a designação pela qual o conde D. Pedro o apresenta no início do capítulo da linhagem, o que é bem revelador da importância que Albuquerque irá adquirir após a sua ocupação. A expressão «o que povoou Albuquerque» sugere, de certa forma, ter-se tratado de uma verdadeira ocupação. Seguindo este raciocínio, a vila estaria, portanto, abandonada pelos seus habitantes e Afonso Teles, com os seus homens, ter-se-ia assenhoreado da mesma, ocupando-a. Contudo, as coisas poderão ter-se passado de forma diferente. Uma

172 Cf. ibidem. 173

Este castelo deveria situar-se no vale do Cedena, talvez nas proximidades da actual povoação homónima deste rio, cerca de 10 quilómetroa a noroeste de Navahermosa. Cf. Jean-Pierre Molénat, ob. cit., p. 241.

174 Julio Gonzalez diz que é construção a mando de Afonso Teles (cf. ob. cit., p. 323), mas Jean-Pierre

Molénat adianta que o castelo já é mencionado no século XI em textos muçulmanos (cf. ob. cit., p. 224).

175

Cf. Julio González, ob. cit., 3º vol., doc. 965. Tratar-se-ia do vale do rio Estena, então desabitado (Cf. Jean-Pierre Molénat, ob. cit., p. 189).

176 Cf. Crónica de Alcántara, fl, 5.

177 Livro de Linhagens, título LVII. No Livro do Deão, 1A6 e 19X4 também é apontado como «dom

cantiga de Afonso X178 fala-nos que «Na fronteira un castelo de mouros mui fort’ avia /

que combateron crischãos que sayan d’ açaria / d’ Ucres e de Calatrava con muita cavalaria; / e era y Don Affonsso Telez, ric-ome preçado / (…) / [Q]eu tragia gran conpanna de mui bõos cavaleiros, / ardidos e arrizados, e demais bõos guerreiros / e almogavares muitos, peões e baesteiros, / per que o castelo todo muit’ agỹa foi entrado»179. Segundo este poema, o forte castelo de mouros acaba por ser tomado pela força, e é possível que se tratasse de Albuquerque180. Se esta hipótese estiver certa, a fortaleza terá sido conquistada pelas armas, e num ataque coordenado das forças de Afonso Teles e das Ordens Militares de Santiago e de Calatrava181. Tal circunstância não deixaria de ser altamente provável, pois estranho seria que uma vila como Albuquerque, importante elemento do sistema de defesa de Badajoz, estivesse abandonada. De uma forma ou de outra, sendo que a versão da conquista pelas armas parece ser mais válida, a verdade é que D. Afonso Teles teria tomado posse e tratado de povoar Albuquerque por volta do ano de 1218182.

À primeira vista, a localização da vila poderia colocar algumas interrogações. Apesar de não ser estranha a presença de Afonso Teles nas regiões meridionais castelhanas, este episódio reveste-se de especial particularidade na medida em que a sua intervenção se fazia não nas tradicionais zonas de actuação castelhana, como sempre tinha acontecido, mas sim na área de expansão leonesa. Visto desta forma, um ataque a Albuquerque surgia quase como uma expedição avulsa, desconexa. Mas as relações temporariamente pacíficas na fronteira de Castela impediam que pudesse desenvolver aí operações militares, e privavam os nobres de aceder assim aos proveitos resultantes da guerra. Com Albuquerque, Afonso Teles tinha aberta uma porta para o sul podendo lançar ataques a partir de um local bem

178 Cantiga nº 205. Cf. Afonso X, Cantigas de Santa Maria, ed. Walter Mettmann, vol. II, Universidade

de Coimbra, 1961, p.265.

179 Ibidem.

180 A hipótese é avançada por Joseph F. O‘Callaghan in Alfonso X and The Cantigas de Santa Maria: A

Poetic Biography, Brill Academic Publishers, 1998, pp. 89-90.

181

A cantiga indica o nome do mestre de Calatrava, Gonçalo Eanes, que governou a Ordem durante vinte anos, entre 1218 e 1238 (cf. Crónica de Calatrava, fls. 34v e 39), o que permite balizar o acontecimento narrado pela cantiga em limites que ainda compreendem o ano da tomada de Albuquerque. É certo que o Afonso Teles da cantiga poderia tratar-se do filho homónimo de Afonso Teles, Afonso Teles de Córdova, bastante activo na fronteira sul, como se verá adiante. Contudo, até 1238 Afonso Teles de Córdova surge sobretudo como parceiro privilegiado de Telo Afonso, seu irmão mais velho, que virá a morrer por estas datas, e não se conhece «castelo de mouros» que fosse tomado cuja tomada fosse por si empreendida. A sua vida será alvo de análise em capítulo seguinte, relativo aos senhores Meneses.

182

Este parece ser o ano da tomada, de acordo com documentos pontifícios de Honório III datados de 3 de Junho e de 15 de Julho 1225, que dizem que Afonso Teles, desde Albuquerque, fazia a guerra aos muçulmanos há sete anos: «etiam per septem annos eis continue guerram de castro fuerit». Cf. Demetrio Mansilla, La documentación pontifícia de Honorio III (1216-1227), Roma, Instituto Español de Historia Eclesiástica, 1965, docs. 559 e 569, respectivamente (citação do 2º doc.).

fortificado. Contudo, se é certo que em Albuquerque Afonso Teles tinha mais uma base de operações adequada à actividade guerreira, e agora numa fronteira que se eximia às tréguas entre Castela e os almóadas, não é menos verdade que a manutenção desta e das outras praças dos Montes de Toledo era extremamente exigente do ponto de vista financeiro.

Talvez assim se explique que, a 20 de Janeiro de 1222, Afonso Teles, com a sua esposa Teresa Sanches e os filhos Telo Afonso, Afonso Teles, Maior Afonso e Teresa Afonso183, cedesse perpetuamente a D. Rodrigo e à catedral de Toledo os castelos de Dos Hermanas, Cenedilla, Malamoneda e Muro com todos os seus termos, pertenças e direitos184; e fizesse ainda a demarcação do termo de Muro em relação a Cañamero, ficando o limite a meia distância de ambos. Todavia, reservava-se o direito de pastagem para os seus gados nos termos de todos os lugares entregues, o que é representativo da importância da região ao nível pastorício. Na realidade, esta não era a única compensação outorgada por D. Rodrigo e pelo cabido toledano, pois além disso obrigavam-se a pagar a Afonso Teles 8000 maravedis e 1000 cahizes de grão, metade cevada e metade trigo, em prazos estabelecidos e era instituída uma capela na catedral de Toledo com missa diária pela alma do doador e dos seus parentes185. A venda fazia-se com a aquiescência de Fernando III, que a confirmava 3 dias depois, a 23 de Janeiro de 1222186. Este pagamento estava liquidado quatro anos passados, pois a 7 de Outubro de 1226 o rei confirmava que a dívida fora convenientemente saldada187. Os documentos são bastante explícitos acerca da existência de quatro castelos ― «quatuor castra, scilicet, Dos Hermanas, Malamoneda,

Cedeniella et Murum»188 ― e do facto de se tratarem de locais povoados ― «in frontaria

sarracenorum castra aliqua populavi»189, o que é indicativo que Afonso Teles levara a cabo as tarefas de defesa e repovoamento do território com alguma eficácia. Nas cartas de venda, recordava que se havia dedicado à guerra contra os muçulmanos, a dilatar o território cristão e a povoá-lo a fim de recuperar a graça divina que colocara em causa nas guerras contra cristãos, onde cometera inumeráveis excessos: «ego utaque Alfonsus Telli

de Meneses propter innumeros excessus quos in guerra contra Christianos inconsulte comissi summe Maiestatis occulos provocando olim in frontaria Sarracenorum castra

183 Teresa Sanches era a sua segunda esposa e os filhos apontados haviam nascido todos do sseu

casamento com D. Elvira Rodrigues Girón.

184 Cf. Salazar y Castro, maço D-16, fº 57. 185

Estabelecem-se as compensações pela entrega numa outra escritura do mesmo dia. Cf. ibidem, fº 56.

186 Cf. Fernando III, 2º vol., doc. 153. 187 Cf. ibidem, doc. 219.

188 Ibidem. 189

aliqua (penitens) populavi»190. As guerras a que se refere deverão com grande grau de probabilidade tratar-se dos conflitos com os reinos de Leão e Navarra que se seguiram ao desastre de Alarcos. Sobretudo os combates com Leão, tendo em conta a implantação senhorial de Afonso Teles.

Estes negócios com o arcebispo de Toledo devem entender-se como uma opção tomada por Afonso Teles para aliviar o esforço financeiro necessário para manter tantas fortalezas aptas militarmente, sobretudo quando verificamos que as tréguas com os muçulmanos se mantinham válidas e que por isso a guerra, neste período e nesta área, não seria uma fonte de rendimento regular, ao contrário do que sucedia com Albuquerque. É provável que, sentindo dificuldades, optasse por alienar as que considerava menos vantajosas. Na medida em que escolhe vender as fortalezas da fronteira castelhana e manter aquela que se localizava numa frente militar activa, torna-se claro que a sua prioridade era fazer a guerra contra os muçulmanos. O que não implica que descuidasse outros negócios, pois apesar de se desfazer dos castelos e suas pertenças, Afonso Teles mantinha direitos de utilização dos pastos dos domínios cedidos que, como foi mencionado, detinham boas pastagens.

Mas não era só Afonso Teles que via vantagens em fazer a guerra. Esta começava a entrar nas cogitações de Fernando III. Em Junho de 1224, encontrando-se este rei em Muñó, acompanhado dos seus principais privados, de onde se destacavam Lopo Dias de Haro, os irmãos Gonçalo Rodrigues e Rodrigo Rodrigues Girón, Afonso Teles e outros dos mais importantes magnates, anuncia-lhes o seu propósito em não renovar as tréguas com os almóadas, advogando que a ocasião era propícia, e consulta-os a esse respeito, vindo a receber opinião unanimemente favorável por parte deles e de D. Berenguela, sua mãe191. É facilmente compreensível que aqueles nobres pretendessem por fim às pazes com os muçulmanos, a fim de adquirirem honra e proveito pelas armas. E certamente que essa pretensão não seria desconhecida pelo rei. Com toda a probabilidade, haveria mesmo importantes correntes de opinião junto dele que defendiam essa viragem política.

Na realidade, o facto de alguns deles empreenderem operações militares por iniciativa individual a partir das fronteiras dos reinos vizinhos já era revelador dessa vontade. É o caso do ataque a Albuquerque levado a cabo por Afonso Teles em 1218. Ou da expedição desenvolvida pelo arcebispo de Toledo, D. Rodrigo Ximenes, a partir de Aragão, em 1219, tendo como alvo Requena. Falha a tomada desta praça, mas consegue

190 Ibidem. 191

conquistar três castelos menos importantes: Sierra, Serrezuela e Mira192. Na medida em que algumas das mais relevantes figuras do reino já antes procuravam fazer a guerra com os muçulmanos, a proposta de Fernando III mais não vinha do que responder aos desejos desse sector da nobreza, que veria na guerra uma actividade bastante aliciante economicamente. Afonso Teles era um desses nobres, e certamente que em Muñó defenderia o fim das tréguas. No mês de Julho seguinte, em cúria reunida em Carrión, confirmava-se a posição adoptada em Muñó de não renovar as pazes e declarar guerra aos muçulmanos. Ainda em 1224, as milícias de Cuenca, Huete, Alarcón e Moya penetravam o território almóada e D. Fernando III reunia uma hoste de 500 cavaleiros bem armados sob o comando de Lopo Dias de Haro, Gonçalo Rodrigues Girón e Afonso Teles para que corressem as terras inimigas, vindo a tomar Quesada e outros castelos193.

Apesar de não solucionar imediatamente os seus problemas em manter os seus domínios na fronteira de forma militarmente operacional ― e em Albuquerque as dificuldades eram muitas, sobretudo pela falta de dinheiro ― o retomar da guerra por Castela seria certamente favorável a Afonso Teles. A reactivação de toda uma extensa frente permitia, em primeiro lugar ― não obstante ter cedido os seus domínios nos Montes de Toledo em 1222 a D. Rodrigo Ximenes ― aumentar a franja de território apta a lançar possíveis expedições sobre todo o sul. Mas tão importante quanto isso era o facto dessa nova frente permitir de certa maneira aliviar a intensa pressão dos muçulmanos sobre Albuquerque, uma vez que estes tinham, a partir de agora, de repartir as suas forças por todas as fronteiras dos reinos cristãos.

Este último aspecto não era de somenos importância, quando se sabe que as dificuldades em manter e defender Albuquerque eram enormes, apesar de dirigir para aí, desde 1222, a maior parte das suas forças e recursos. De forma a conseguir atingir este propósito ― manter a posse de Albuquerque ― Afonso Teles vai procurar ajuda na Igreja, onde contava com o apoio de dois preciosos aliados: o arcebispo de Toledo, D. Rodrigo Ximenes de Rada, precisamente quem havia adquirido os seus castelos dos Montes de Toledo e que seguramente manteria consigo relações favoráveis; e sobretudo o seu irmão, bispo de Palência, D. Telo Teles. Em 1225, este último encontra-se em Roma194, permanecendo aí durante alguns meses, onde entre outros assuntos relacionados com a sua diocese e sobretudo com a universidade palentina, cuja instituição havia promovido a partir

192 Cf. Gonzalo Martínez Diez, Fernando III… cit., p. 66. 193 Cf. Crónica de Castilla, p. 301.

194 Cf. Modesto Salcedo, «Vida de don Tello Téllez de Meneses, Obispo de Palencia», Publicaciones de

dos estudos já existentes195, irá defender a causa do irmão. Terá sido ele a apresentar a Honório III o pedido de apoio de Afonso Teles, onde este lembrava que desde que tomara Albuquerque, há sete anos, fora constantemente assediado pelos muçulmanos, resistindo com imensas dificuldades, incluindo de víveres. Pretendia manter a fortaleza e estava empenhado em fazer a guerra aos infiéis para glória da fé cristã, mas a situação em que se encontrava não se iria alterar sem auxílio, e receava mesmo ver-se obrigado a abandonar o castelo. Estes argumentos são perfeitamente registados na bula que o papa envia aos cavaleiros de Santiago, a 15 de Julho de 1225, mandando-os socorrer Afonso Teles no seu castelo de Albuquerque sempre que este o solicitar: «nobilis viri Alfonsi Tellii fuit nobis