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A Resolução nº 125 de 29 de novembro de 2010, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)

4 DO CONFLITO À MEDIAÇÃO PENAL

5 DO PROCEDIMENTO RESTAURATIVO À MEDIAÇÃO PENAL NÃO PARALELA

5.8 RESOLUÇÃO ALTERNATIVA DE CONFLITOS NO BRASIL

5.8.1 A Resolução nº 125 de 29 de novembro de 2010, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)

Compete ao Conselho Nacional de Justiça o Controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, bem como a promoção do acesso ao sistema de Justiça.415 Nos termos delineados neste trabalho, o acesso à Justiça não é acesso formal, mas acesso a uma

414 Informações disponíveis em: <http://www.senado.gov.br/atividade/Materia/detalhes.asp?p_cod_mate= 101791>. Acesso em 24 jul. de 2014.

415 Cf. BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 70, de 18 de março de 2009. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/13673:resolucao-n70-marco-2009> . Acesso em 24 jul. de 2014.

decisão justa.416 Daí decorre a necessidade de estabelecimento de uma política pública que trate de maneira adequada os conflitos de interesses entre as pessoas, para viabilizar e aperfeiçoar os instrumentos efetivos de pacificação social, tais como a mediação e a conciliação.

Foi considerando todos estes elementos417, na tentativa de uniformizar os serviços de resolução de conflitos já utilizados pelos tribunais brasileiros, para evitar disparidades de orientação e práticas, que o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 125 de 29 de novembro de 2010, já alterada pela Emenda nº 01 de 31 de janeiro de 2013.

No preâmbulo da norma, chama a atenção o fato de que “Juízos de resolução alternativa de conflitos”, como designados, foram qualificados como “verdadeiros órgãos judiciais especializados na matéria.” Nesse trecho, é clara a tentativa política de centralizar e reconhecer as técnicas alternativas de resolução como tarefas que merecem e precisam estar vinculadas à atuação jurisdicional. Essa parece ser a perspectiva mais adequada para o tratamento da matéria no país.418 Assim, foi instituída a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses (art. 1º).

O parágrafo único do referido artigo enquadrou a mediação e a conciliação como meios consensuais de resolução de conflito, devendo os órgãos judiciários orientar os cidadãos acerca desse procedimento. Estabeleceu, ainda, o prazo de 12 (doze) meses para que tais mecanismos de resolução fossem ofertados gradativamente.

Como elemento de “disseminação da cultura da pacificação social”, devem ser observados: I – centralização das estruturas judiciárias; II – adequada formação e treinamento de servidores, conciliadores e mediadores; III – acompanhamento estatístico específico. (art. 2º)

Para o cumprimento dos objetivos traçados, abriu-se a possibilidade de serem firmadas parcerias com entidades públicas e privadas (art. 3º). Nesse ponto, deve-se destacar que, mais importante que a designação da instituição de apoio como pública ou privada, é a necessidade de centralização da política de prestação do serviço. Por outro lado, não se pode olvidar que o Estado deve ser responsável pelo desenvolvimento da política de fomento às técnicas alternativas, não se tratando de mera transferência de responsabilidades para a iniciativa particular.

416 Vide item 3.3.2

417 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº. 125 de 29 de novembro de 2010. Disponível em: < http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/atos-da-presidencia/resolucoespresidencia/12243-resolucao-no-125- de-29-de-novembro-de-2010?tmpl=component&page=> . Acesso em 24 jul. de 2014.

Nesse sentido, o CNJ funciona como promotor de incentivo à autocomposição e pacificação dos litígios (art. 4º), contando com a participação de universidades e instituições de ensino (art. 5º); é responsável por estabelecer diretrizes para a implantação da política pública, por desenvolver o conteúdo programático mínimo para a capacitação de magistrados da Justiça Estadual e da Justiça Federal, servidores, mediadores, conciliadores e demais facilitadores da solução consensual de controvérsias, ressalvada a competência da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – ENFAM (art. 5º, I e II).

Nesse ponto é claro que a atividade de mediação poderá ser desenvolvida tanto de maneira anexa como conectada aos Tribunais. Em um primeiro momento, não parece inviável essa dupla atuação. Talvez, como elemento de valorização da prestação jurisdicional formal, após a implementação completa do programa, seja possível verificar qual será o caminho mais vantajoso, considerando a economia atingida e o aumento da qualidade nas decisões proferidas.

O CNJ possui tarefa fundamental para que a utilização de métodos consensuais de solução de conflitos seja considerada nas promoções e remoções dos magistrados pelo critério do merecimento (art. 5º, III), bem como, na busca de cooperação com instituições públicas e privadas de ensino para o desenvolvimento de uma cultura da solução pacífica dos conflitos (inciso V).

É essencial, ainda, a interlocução com as instituições formais de prestação dos serviços de justiça, as quais devem ter participação nos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania, valorizando-se a prevenção dos litígios (inciso VI).

Nesse ponto, é evidente a preocupação prospectiva do Estado, que pretende reduzir as possibilidades de conflitos futuros, o que, na seara penal, auxilia no controle da reincidência.

A Resolução determinou a criação, no prazo de 60 (sessenta) dias, de “Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Conflito”, os quais serão compostos por magistrados da ativa ou aposentados e servidores, preferencialmente atuantes na área (art. 7º). Conforme o que se desenvolve na presente seção, a atuação direta do juiz nessa atividade essencial não parece ser a forma mais adequada para o desenvolvimento da técnica de mediação, tendo em vista a necessidade de maior participação de particulares neutros nessa atividade, o que não afasta a obrigatoriedade de controle e fiscalização dos serviços. Ainda que a autoridade judicial possa servir como mediadora, é mais adequada a intervenção de um terceiro que não tenha poder de decidir no processo.

Os tribunais também são responsáveis pela instalação de “Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania”, que concentrarão a realização das sessões de conciliação e

mediação (art. 7º, IV). Trata-se de uma modalidade de resolução anexa, a qual se compreende como mais adequada, carente apenas da abertura do sistema para a maior participação de líderes comunitários e mediadores particulares devidamente qualificados.

A Resolução, todavia, não fecha as portas para esta possibilidade, pois incentiva a realização de convênios e parcerias dos Tribunais com entes públicos e privados para atender aos seus fins (inciso VI). Ademais, é estimulado o exercício da “mediação comunitária”419, mas não pode ocorrer uma confusão entre os centros comunitários e os “Centros de conciliação e mediação judicial” (§2º).

Novamente, percebe-se a tentativa centralizadora da Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, que integra uma série de medidas relacionadas ao fortalecimento do Poder Judiciário enquanto promotor da cidadania participativa e responsável pela efetivação da paz social. Outro traço de identificação dessa característica é justamente o dever que têm os Tribunais de manter cadastro de conciliadores e mediadores particulares (também conhecidos como “facilitadores”), regulamentando o seu processo de inscrição e desligamento (§4 do art. 7º).

Interessa, particularmente, a disposição do §3º420 da referida Resolução, pois, por meio dela é permitida expressamente a “mediação penal ou qualquer processo restaurativo”, desde que respeitados os princípios da Resolução nº. 2002/2012 do Conselho Econômico e Social da Organização das Nações Unidas421, bem como a participação do titular da ação penal em todos os atos do procedimento.

Ou seja, é essencial que a vítima, nas ações penais privadas ou privadas subsidiárias da pública, ou o Ministério Público, nas ações penais públicas ou públicas condicionadas à representação, estejam integrados à consecução e desenvolvimentos das propostas de mediação penal. Ainda não foram bem delineados os mecanismos para tal atuação, tornando- se premente a necessidade de discussão e regulamentação do tema.

Os “Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania” (Centros) devem ser criados pelos Tribunais e devem possibilitar a realização das sessões e audiências de conciliação e mediação, além de atender e orientar os cidadãos (art. 8º). Nesses centros

419 Apesar de Resolução não definir, trata-se, justamente, da modalidade de mediação que envolve a participação de líderes comunitários e mediadores particulares devidamente qualificados.

420 Pela importância, transcreve-se: “§ 3º Nos termos do art. 73 da Lei n° 9.099/95 e dos art. 112 e 116 da Lei n° 8.069/90, os Núcleos poderão centralizar e estimular programas de mediação penal ou qualquer outro processo restaurativo, desde que respeitados os princípios básicos e processos restaurativos previstos na Resolução n° 2002/12 do Conselho Econômico e Social da Organização das Nações Unidas e a participação do titular da ação penal em todos os atos.”

421 O estudo do texto referido enseja o desenvolvimento de um trabalho autônomo. Por hora, é valida a leitura do mesmo, razão pela qual consta como anexo desse trabalho.

ocorrem as conciliações e mediações pré-processuais, que podem, “excepcionalmente”, desenvolver-se nos próprios Juízos, Juizados ou Varas, desde que realizados por conciliadores e mediadores previamente cadastrados e supervisionados pelo Juiz Coordenador do Centro (§1º).

Compreende-se que a supervisão a que se refere à Resolução deve abarcar apenas a conferência da legalidade dos termos lavrados, sem que a estrutura de atendimento esteja anexa aos Tribunais. Nesse sentido, seria fundamental a descentralização do atendimento. Por isso, é aconselhável, inicialmente, o desenvolvimento da mediação conectada, razão pela qual não se faz opção neste ponto para o desenvolvimento de um projeto piloto.

Os Centros podem ser instalados nos locais em que exista ao menos uma unidade jurisdicional, mas será obrigatória nas comunidades que possuem 5 ou mais (§2º). Nas Comarcas das Capitais dos Estados e nas sedes das Seções e Regiões Judiciárias, bem como nas Comarcas do interior, Subseções e Regiões Judiciárias de maior movimento forense, o prazo para a instalação dos Centros será de 4 (quatro) meses, a contar do início de vigência da Resolução (§3º). Nas demais hipóteses, o prazo para a instalação dos Centros será de 12 (doze) meses.

É possível ainda o desenvolvimento de centros organizados especificamente para a área penal (§6º), o que é mais adequado, já que a especialização do atendimento poderia proporcionar uma melhor qualidade nas decisões, além de viabilizar análises estatísticas mais concretas no futuro. Não é por outra razão que as sentenças decorrentes da atuação pré- processual devem ser encaminhadas à coordenação do Centro para registro (§8º).

Conforme artigo 9º da Resolução, os Centros contarão com um Juiz Coordenador e, se necessário, com um Adjunto, aos quais caberão a sua administração e a homologação de acordos, bem como a supervisão do serviço de conciliadores e mediadores. Os magistrados da Justiça Estadual e da Justiça Federal serão designados pelo Presidente de cada Tribunal dentre aqueles que realizaram treinamento, segundo o modelo estabelecido pelo CNJ422.

422 Sem muito dizer, o Anexo I da Resolução em estudo, teria a oportunidade de melhor detalhar aspectos necessários à atuação dos juízes mediadores, mas exarou, in verbis: “DOS CURSOS DE CAPACITAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO. Considerando que a política pública de formação de instrutores em mediação e conciliação do Conselho Nacional de Justiça tem destacado entre seus princípios informadores a qualidade dos serviços como garantia de acesso a uma ordem jurídica justa, desenvolveu-se inicialmente conteúdo programático mínimo a ser seguido pelos Tribunais nos cursos de capacitação de serventuários da justiça, conciliadores e mediadores. Todavia, constatou-se que os referidos conteúdos programáticos estavam sendo implantados sem os exercícios simulados e estágios supervisionados necessários à formação de mediadores e conciliadores. Para esse fim mostrou-se necessário alterar o conteúdo programático para recomendar-se a adoção de cursos nos moldes dos conteúdos programáticos aprovados pelo Comitê Gestor do Movimento pela Conciliação. Destarte, os treinamentos referentes a Políticas Públicas de Resolução de Disputas (ou introdução aos meios adequados de solução de conflitos), Conciliação e Mediação

Os servidores que atuam nos Centros, além da capacitação necessária, devem ter dedicação exclusiva na atividade e, ao menos um, precisa estar capacitado para a triagem e encaminhamento de casos (§2 do art. 9º). Essa tarefa de triagem é essencial ao desenvolvimento dos programas de resolução alternativa, mas, certamente, só poderá ser bem desenvolvida após a implementação efetiva de um programa piloto e da análise dos primeiros resultados obtidos, o que no Brasil ainda se desenvolve lentamente.

Cada tribunal deve manter um banco de dados específico sobre as atividades realizadas no Centro (art. 13), dados que serão veiculados no “Portal da Conciliação”, sítio vinculado à rede mundial de computadores (art. 15), que vêm sendo gradativamente implantado no país.

Apesar das previsões legislativas, os tribunais no Brasil vêm realizando mediações e conciliações nas áreas civil, comercial, trabalhista, previdenciária, mas muito pouco e com aparato reduzido, na seara penal, o que denota a necessidade de uma mudança de postura, conforme se sustenta nesse trabalho.