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A temporalidade: os tempos verbais

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 82-91)

CAPÍTULO 3 – Análise das narrativas

3. Análise da narrativa oral

3.1. A temporalidade: os tempos verbais

A narrativa oral que analisaremos é resultado de um processo de interação em sala de aula, em que solicitamos a um aluno que relatasse uma experiência obtida em um “país estrangeiro”, visando um “relato de deslocamento”. Após comentários sobre o tema, um aluno relatou uma experiência que teve com amigos na Venezuela, desde Pacaraima à cidade de Santa Elena. Esse relato

transcrevemos abaixo para analisarmos como se constrói a temporalidade, no intuito de comparar a construção da temporalidade em narrativas orais escritas. Para tanto, o percurso inicial consiste em identificar as sequências narrativas, que separamos por fases, conforme a classificação descrita acima. Acrescentamos que a fase de ações está situada no mesmo quadro da fase de complicação por ser considerada a macroproposição por excelência da narrativa, já que introduz a perturbação (ADAM, 2009); além disso, as ações são fundamentais para o desenvolvimento da trama, ou seja, para sustentar e criar a tensão e desencadear as transformações contempladas nessa fase. Procurando identificar os elementos analisáveis e outros, as formas verbais e as locuções estão destacadas em negrito e os demais advérbios temporais estão sublinhados no texto.

Macroproposições Sequências narrativas (01)

RESUMO

01 02 03

Bom... boa tar:de... como todo mundo me conhece aqui eu sou Felipe... eu sou daqui de Pacaraima... aí o que acontece... é:: a história é a seguinte... SITUAÇÃO INICIAL (Orientação) 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15

( ) certo dia... eu e mais dois amigos... é:: um de no:me Salomão que

acabou de sair da sala... e outro é o José Luiz que esse alguns deve conhecer que tem como apelido Fumaça né... aí:: a gente ficou:: isso era umas dez horas da manhã: a gente foi pra barreira ali pra pegar

táxi pra ir pra Santa Elena a gente ia fazer umas compra por causa do... essas coisa toda do bolívar e tal... aí a gente pegou um:: aí

passou bem na hora vem um cara muito engraçado num táxi bem

velhinho assim bem velhinho aí a gente falou “vamos nesse aí vai

cobrar baratinho”... tá bom... aí a gente foi... o táxi só gasolina

dentro do carro... cara aí a gente entrou dentro do carro aí a gente foi tã::: não tem onde vocês sabem onde fica a entrada do Santo

Antonio? [“sim:::”] Sabem onde fica...

COMPLICAÇÃO (Ação complicadora) 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26

naquela curva ali... acabou a gasolina do carro ((risos)) acabou total aí ele falou... aí a gente perguntou “o que foi?” aí ele falou “não

acabou a gasolina... tem lá atrás do carro”... só que na hora que ele

abriu que ele pegou um carote de CINco litro... tava na estrada do

Santo Antonio vinha um carro da... da polícia ((risos)) la policía... não deu pra ver... ele pegou a gasolina e jogou no meio da rua e saiu

correndo e deixou a gente lá sem entender nada ((risos)) a polícia,

aí policial chegou “no chão, no chão, deita, deita, traficante,

traficante” a gente “nã::o o carro nem nosso não é:: ((risos)) nem

nosso não é”... “não entra no carro” pronto prendeu a gente dez horas da manhã...

27 28

levou a gente lá pra quer dizer posto lá onde fica naquele... onde ficam fazendo os estágios ali... como é que é o nome... [aduana] é:: a

RESOLUÇÃO (Desenlace) 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46

aduana cabala... é isso... aí chegou lá o que acontece pediram nossos documen:to... aí falaram assim “é::..” o José Luiz ele é do Peru... ele é peruano aí... eu sou do Mato Grosso e o... o Salomão é de Boa Vista eu acho que não tem problema não pera aí... o que

acontece eles falaram “a gente vai ter que deportar vocês” ((risos))

DEPOR::TAR:: a gente tava lá aí dez hora e nisso tudo... de início

eu não ia falar quem era um certo personagem que estava na história que começou a chorar “nã::o eu tenho que avisar minha mãe tenho que avisar minha mãe não posso ser deportado ((risos)) muito estressado... a gente passou o dia todinho de noite... a gente

passou o dia todinho lá preso lá dentro lá na hora do almoço pegaram...((risos)) pegaram uma... levaram uma comida pra gente

daquelas comidas de presidiário uma comida de pior qualidade que

tem:... entendeu? aí gente eu sei que a gente ficou o dia todinho lá tentando sair dali e quando foi que chegou o::... o sargento lá que a

gente teve que subornar ele com o único dinheiro que a gente tinha que eram duzentos bolívar... a gente falou “ei tal” ( ) aí a gente

inventou uma historia muito louca...

AVALIAÇÃO 47 aí isso foi uma aventura muito doida, ó ((risos))

SITUAÇÃO FINAL 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 62 63 64

aí ele liberou a gente a gente ficou o quê... das dez da manhã até seis da tarde lá... aí a gente saiu de lá

DOC.: vocês tiveram algum conflito em relação ao espanhol e

português nessa negociação? ou não?

INF.: não... só quando os cara lá que não deixavam a gente falar

porque a gente falava em português né... e quem falava mais espanhol era o José Luiz porque eles não deixavam a gente falar... eles xingavam a gente de tudo lá que eu nem entendia me chamaram de

DOC.: [em espanhol?

INF.: é... cabrón baboso e não sei o que lá e tal... eu entendia nada

dos palavrão que eles falavam lá

DOC.: depois você investigou o que é cabrón:: babo::so?

INF.: [investiguei

tudo ... entrei no sáite lá e... estavam me xingando alguma coisa lá eu humm... eu tenho outra aqui pra contar

DOC.: ótimo muito bem.

(01) As convenções da transcrição utilizadas nesta narrativa constam na página 80, capítulo 02.

Nessa narrativa observamos o caráter on-line do processo comunicativo, ou seja, a co-presença dos interlocutores no momento da enunciação: o narrador relata diretamente aos seus ouvintes – os demais alunos da turma em sala de aula. Esse caráter fica evidente quando observamos que os ouvintes também interagem com o narrador, normalmente respondendo a alguma pergunta ou confirmando dados

necessários à continuidade temática da narrativa, como em (L.14-15)37 sabem onde fica a entrada do Santo Antonio?, e em seguida eles respondem [“sim:::”]. Essa situação interativa é marcada predominantemente pela forma verbal de presente, considerado o tempo zero do mundo comentado. Portanto notamos claramente o feedback, uma contextualização imediata no momento da produção.

Consoante às teorizações (clássicas e contemporâneas) que propõem definições do que seja o tempo e sua classificação (capítulo 1), Corôa (2005) fala em palavra temporal para situar temporalmente o sujeito38 (falante/ouvinte) no

desenvolvimento de ações, eventos ou processos39. Contudo a palavra temporal não

corresponde, a rigor, “apenas ao verbo em português – advérbios, conjunções, numerais e adjetivos são elementos lexicais que também dão informação quanto à ordenação temporal” (CORÔA, 2005, p.33). Assim a temporalidade constrói-se por modalidades diversificadas de referências temporais (formas verbais e locuções e conjunções com valor temporal), conforme identificaremos nessa narrativa.

Outro traço a ser considerado na construção da temporalidade refere-se aos processos de coesão verbal, os quais condicionam a coerência temática e contribuem para manter as “relações de continuidade, descontinuidade e/ou de oposição existentes entre os elementos de significação expressos pelos sintagmas verbais” (BRONCKART, 2009, p.273). Nesses processos tem-se, de um lado, a abordagem da temporalidade, e por outro, o da aspectualidade. No tocante a temporalidade, o verbo é concebido por muitos estudos (CORÔA, 2005) como o principal recurso para a compreensão do tempo nas situações comunicativas, mas, pela complexidade natural desse elemento, os tradicionais paradigmas verbais não são suficientes para expressar todas as realidades comunicativas, fato que provoca pesquisas que buscam explicar as noções semânticas mais profundas da temporalidade, e também suas expressões mais amplas nas sequências textuais (CORÔA, 2005). Com a análise seguinte visamos identificar esses recursos.

37 Neste capítulo, para nos reportarmos a trechos do texto em análise, usaremos convencionalmente “L” para abreviar “linha”, seguido do número da respectiva linha constante no quadro da transcrição. 38 Para as análises feitas neste capítulo adotamos uma noção genérica de sujeito, equivalendo ao actante ou qualquer outro ente participante da narrativa, podendo ser o autor, o narrador e demais personagens.

39 Trata-se de aspectos que contemplam uma definição ampla de narrativa, ou seja, texto que relata eventos numa ordem sequencial e temporal.

O pretérito (e sua divisão em perfeito, imperfeito e mais-que-perfeito) é o tempo verbal considerado próprio do modo de organização do discurso narrativo (cf. BRONCKART, 2009), ou seja, é o tempo do relato que marca o movimento retrospectivo. Contudo é comum a alternância com outros tempos verbais na narrativa, configurando um traço marcante da temporalidade; essa alternância revela as relações de anterioridade, simultaneidade e posterioridade – formas no passado, presente e futuro, respectivamente. Esses processos admitem ser “analisados em termos de relação entre o momento da fala (ou momento da produção) e o momento do processo expresso pelo verbo” (BRONCKART, 2009, p.275, grifo do autor). Todos esses procedimentos se articulam como mecanismo de coesão verbal, ou como recursos que, de alguma forma, “asseguram a organização temporal e/ou hierárquica dos processos (estados, acontecimentos ou ações) verbalizados no texto” (BRONCKART, 2009, p.126).

Em toda a narrativa oral percebemos a alternância dos tempos verbais, principalmente nas fases de situação inicial e resolução, com menos frequência no resumo e na avaliação. No resumo todas as formas verbais (L.01-03) estão no presente. Na fase de orientação ocorrem 25 formas verbais, destas, 13 são formas de pretérito. Exemplificamos com alguns fragmentos abaixo:

Tempo Verbal L Proposições

Pretérito Perfeito 06 a gente fico:: isso

Pretérito Imperfeito 07 era umas dez horas da manhã Forma de Infinitivo 07 a gente foi pra barreira ali pra pegar Forma de Infinitivo 08 táxi pra ir pra Santa Elena a gente ia fazer Pretérito Perfeito 09 pego’ [pegou] e ‘passo’ [passou]

Nessa fase, além do pretérito, a alternância se dá com a ocorrência de uma forma perifrástica de futuro em (L.12) vai cobrar baratium. Essas alternâncias de sintagmas verbais, conforme Bronckart (2009, p. 263), “contribuem, em princípio, sobretudo para a evolução do conteúdo temático e produzem, por isso, um efeito de progressão” do discurso da trama narrativa.

Igualmente à fase anterior, na complicação predomina o pretérito, sendo 18 formas, sem considerar duas formas elípticas (“disse”) que introduzem o discurso de um actante secundário (policial) e os actantes principais da história (os três amigos).

Tem-se, então, (L.23) aí policial chegó [e/disse:] “no chão, no chão, deita, deita, traficante, (L.24) traficante” a gente [disse:] “nã::o o carro nem nosso não é:: ((risos)) nem nosso não é”.... Não observamos a ocorrência de nenhuma estrutura verbal indicadora de tempo futuro, apenas 06 formas de presente, todas usadas para manifestar o discurso direto dos personagens, exceto em (L.22) e deixou a gente lá sem entender nada, onde observamos o pretérito perfeito (deixou) complementado pela forma verbal de uma oração reduzida de infinitivo (entender), o que nos leva à interpretação de um tempo transcorrido.

O pretérito se destaca na fase de resolução com 24 ocorrências e alterna-se com 21 formas de presente e 04 de futuro, as quais se articulam para a constituição dos discursos dos personagens. No caso de (L.33) a gente vai ter que deportar vocês, perífrase de futuro com oração reduzida de infinitivo, e em (L.36) e (L.37), observamos perífrases constituídas por formas do presente, mas pela análise da sequência, transmitem claramente a noção de futuro. Observamos ainda uma forma de pretérito em (L.42) entendeu? entre duas formas de presente. Em (L.42) a forma verbal tem sinaliza um processo descritivo (a comida que foi servida aos actantes recém-prisioneiros) e em (L.42) a forma sei indica o momento da narração, que é seguido da perífrase (L.43) tentando sair, que marca um processo do mundo narrado. Nas fases de avaliação e situação final predomina o pretérito, com apenas 03 formas de presente na situação final, que ocorrem para responder a perguntas do pesquisador, já marcando, portanto, o momento do discurso, finalizando a narração.

Pretérito L Proposições

Perfeito 27 levou a gente pra

Perfeito 29 é isso... aí chegou lá o que acontece pediram

Perfeito 33 falaram “a gente vi ter que deportar vocês”

Imperfeito 35 eu não ia falar quem era um certo personagem que estava na

Perfeito 36 história começou a chorar

Perfeito 39 passou o dia todinho lá preso lá dentro lá na hora do almoço

Perfeito 40 pegaram... ((risos)) pegaram uma... levaram uma comida pra gente

A identificação da alternância dos tempos verbais no texto em análise confirma que a articulação desses confere dinamismo ao curso dos acontecimentos da história e ao curso da atividade narrativa, garantindo a progressão temática. A

interpretação do discurso narrativo é possível pela compreensão dessas estruturas verbais. Depreendemos ainda que essa alternância segue a orientação dos estudos em línguas naturais de Weinrich e Benveniste (apud ADAM, 2008; BRONCKART, 2009). Weinrich afirma que ao narrar o mundo o falante se valerá dos tempos verbais do relato, ou seja, os tempos do mundo narrado. Já em outras sequências comunicativas ou tipos de discurso diferente do relato – várias ocorrências nessa narrativa – o locutor empregou os tempos próprios do mundo comentado. Recordamos que para esses dois “mundos”, Koch (2006) apresenta dois grupos de tempos verbais ou sistemas temporais que caracterizam a atitude comunicativa do locutor, sendo um relato ou um comentário.

Embora não haja uma obrigatoriedade de associação entre o relato e tempo passado, o momento da história é representado pelo pretérito. Dessa forma, na constituição dessa narrativa o grupo de verbos mais utilizado pelo narrador foi o grupo II, do qual faz parte o pretérito perfeito simples, normalmente associado ao sujeito de primeira pessoa, como em a gente ficou, a gente foi, pegou, a gente passou, a gente falou, a gente entrou, acabou, perguntou, deu, deixou, chegou, jogou, prendeu, levou, liberou, dentre outras formas (algumas recorrentes) nas demais fases, exceto no resumo. O imperfeito está presente na situação inicial, em (L.07) era umas dez horas da manhã e na perífrase em (L.08) a gente ia fazer umas compra; e na complicação está em (L.19) tava [estava] na estrada do Santo Antonio, (L.20) vinha um carro da polícia, (L.35) a gente estava.

Na fase de resolução observamos as proposições (L.34) a gente tava lá, (L.35-36) eu não ia falar quem era um certo personagem que estava na historia, (L.44-45) [a gente teve que subornar com o único dinheiro que] a gente tinha que eram duzentos bolívares. Já na fase de situação final, ao responder uma pergunta do pesquisador, o narrador referiu-se a algumas situações com o imperfeito, conforme destacamos em (L.52-55) abaixo:

os cara lá que não deixavam a gente falar porque a gente falava em português né... e quem falava mais espanhol era o José Luiz porque eles não deixavam a gente falar... eles xingavam (...) eu nem entendia.

Essas alternâncias verbais de pretérito são consideradas o tempo zero do relato – principal tempo do mundo narrado –, característica que comprovamos diante de 72 ocorrências de formas verbais em toda essa narrativa.

Além do perfeito e imperfeito, constam também nesse grupo as formas de pretérito mais-que-perfeito e futuro do pretérito, que não identificamos na narrativa em análise. Acreditamos que a não ocorrência dessas duas formas no texto tenha se dado pela natureza de seu discurso, ou seja, tratava-se de uma narrativa construída oralmente em interação com outros alunos de uma mesma turma, portanto, todos conhecidos entre si, assim a tendência natural do produtor foi utilizar a variante linguística coloquial, na qual as formas do mais-que-perfeito e do futuro do pretérito foram substituídas por outras estruturas verbais, como ocorre comumente em relatos orais diversos.

Conforme analisamos, mesmo predominando os tempos do mundo narrado, foi-nos possível observar que em algumas dessas realizações discursivas a alternância verbal comprova o que Weinrich (KOCH, 2006) chama de metáfora temporal, ou seja, que os tempos verbais não marcam somente o tempo cronológico, mas assumem funções diferentes conforme a atitude comunicativa do locutor (narrativa ou comentadora), assim atualizando comunicativamente os demais interlocutores (alunos) em uma das duas ordens de situação do “mundo narrado” ou “mundo comentado”. Portanto esse procedimento condicionou os ouvintes em interpretar o discurso ora como um comentário da história, ora como um relato do narrador, sendo que o relato naturalmente predominou em toda a situação comunicativa.

O narrador utilizou os tempos do mundo comentado (grupo I) no momento em que invocou os demais alunos a tornarem-se ouvintes, relativamente passivos nessa interação. Ao utilizar formas verbais do mundo comentado, o locutor provocou uma tensão, introduzindo assim algo que afetava diretamente aos ouvintes, conforme observamos abaixo:

Fases L Proposições

Resumo 01 como todo mundo me conhece aqui

Koch (2006) considera que os ouvintes são também advertidos de que têm de reagir ou que o discurso exige alguma resposta verbal ou não. Isso observamos na situação inicial em (L.14-15) vocês sabem onde fica a entrada do Santo Antonio? [“sim:::”] Sabem onde fica...; e na resolução, em (L.27) levó a gente lá pra quer dizer posto lá onde fica naquele... onde (L.28) ficam fazendo os estágios ali... como é que é o nome... [aduana] é::, onde podemos perceber uma resposta verbal dos ouvintes.

Mesmo que contemos uma história no pretérito, o resumo será sempre no presente, pois normalmente essa fase serve de base para se criticar, “comentar a obra ou para facilitar a outros essa tarefa” (KOCH, 2006, p.37, grifo da autora). Assim o presente consolida-se na fase de resumo, formando proposições que “garantem a entrada e a saída do mundo da narração” (ADAM, 2008, p.228). Portanto, observamos que o mundo narrado do relato analisado foi introduzido pelo pretérito perfeito simples e imperfeito, mas as formas verbais do grupo I, principalmente o presente, ocorreram com frequência, sobretudo para introduzir outros valores semânticos às proposições, como na forma “quer dizer”, que tem valor semântico de organizador explicativo, e em (L.02) o que acontece, que indica a entrada de outra sentença, funcionando como um sequenciador. Tais variações enunciativas marcadas pelas formas verbais fazem parte dos efeitos de sentidos próprios dos textos narrativos (ADAM, 2008).

Portanto o mundo narrado desse relato pôs em destaque o tempo zero do relato, assim apresentou o perfeito e o imperfeito, que se combinaram para marcar as noções de anterioridade da ação narrada relacionada à ação enunciativa. Os tempos assumiram papéis específicos na marcação de contrastes aspectuais. Nesse sentido observamos a noção de relevo narrativo, ou seja, o passado simples, segundo Koch (2006), representando o tempo do primeiro plano na narrativa e o imperfeito como sendo o tempo do segundo plano: a gente fico:: isso era umas dez horas da manhã: a gente foi pra barreira ali pra pegar táxi pra ir pra Santa Elena a gente ia fazer umas compra. Portanto “o perfeito marca todas as unidades de ação da narrativa, o imperfeito fornece o pano de fundo, aparecendo também com frequência na introdução e na conclusão” (KOCH, 2006, p.39).

Portanto constatamos que na narrativa oral, mesmo sendo o pretérito o tempo de base, a temporalidade se constrói valendo-se de todos os tempos verbais, que se organizam de forma coesa funcionando em todas as sequências do texto, seja na interação, na descrição dos eventos, nas ações propriamente ditas e nos diálogos.

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 82-91)