• Nenhum resultado encontrado

A tolerância no contexto da Religião versus Estado

Em 16 de novembro de 1995, em Paris, a Conferência Geral da UNESCO proclamou e assinou a sua Declaração de Princípios sobre a Tolerância, estabelecendo em seu artigo 1°, item 1.1 que

A tolerância é o respeito, a aceitação e o apreço da riqueza e da diversidade das culturas de nosso mundo, de nossos modos de expressão e de nossas maneiras de exprimir nossa qualidade de seres humanos. É fomentada pelo conhecimento, a abertura de espírito, a comunicação e a liberdade de pensamento, de consciência e de crença. A tolerância é a harmonia na diferença. Não só é um dever de ordem ética; é igualmente uma necessidade política e jurídica. A tolerância é uma virtude que torna a paz possível e contribui para substituir uma cultura de guerra por uma cultura de paz. (UNESCO, 1997, p. 11).

Desde o século XVII, a questão da tolerância esteve presente nas discussões dos filósofos e teólogos europeus que viviam na Holanda. Na obra Pensées diverses écrites à un docteur de Sorbonne, á l’occasion de la comète qui parut au mois de décembre de 16801”, Pierre Bayle (2007) esboça seu conceito de tolerância ao criticar os ateístas e os fanáticos supersticiosos, sobre as discussões em torno da passagem do primeiro cometa descoberto por um telescópio, no mês de dezembro de 1680. Diante das mais diversas especulações religiosas e científicas que surgiam

1

Pensamentos diversos escritos a um doutor da Sorbonne, sobre o cometa que surgiu no mês de dezembro de 1680.

acerca desse fenômeno, Bayle aproveitou para discutir a relação entre a fé e a razão.

Enquanto alguns defensores da tolerância limitavam-se a discutir as religiões e ritos que seriam ou não aceitos, Bayle, em seu Commentaire Philosophique (1686), dedica-se a defender a tolerância religiosa como algo universal e considerando-a dever, tanto do indivíduo quanto do poder político. Dessa forma, ele contesta interpretações que fundamentavam a prática de ações intolerantes.

Neste mesmo período, John Locke redigia em latim suas três cartas sobre a tolerância, que fora publicada em 1689 sob o título de Epistola de Tolerantia. Para compreendermos a ocasião em que as cartas de Locke aparecem, é necessário retroceder um pouco na história, mais especificamente, no ano de 1517, com o surgimento da Reforma Protestante. Martin Lutero preparou uma revolta no seio da igreja baseado, na sua experiência como clérigo da própria igreja católica. Ele não se conformava com o viés mercantilista e a postura totalmente monetária que a igreja adotara com seus fiéis.

A sua inconformidade quanto à comercialização de indulgências revelava uma igreja corrupta e que cada vez mais perdia as suas razões espirituais na terra. Um ditado popular na época atribuía aos sacerdotes os seguintes versos: “assim que a moeda do cofre cai, a alma do purgatório sai”. A igreja católica avançava descontroladamente sobre a fortuna dos fiéis. Graças ao estado de eterna falência do Papa Leão X, inventou-se então uma maneira eficaz de arrecadar fundos junto aos fiéis, que se daria pela venda do perdão ainda na terra.

Ao comprar uma apólice de indulgência, o crente acreditava que estaria abreviando de forma considerável a sua estada no purgatório, e, portanto, amenizando o seu próprio sofrimento. Diante de tal procedimento Lutero percebeu que pelo simples fato de os fiéis comprarem seu perdão, estes então estariam pouco ou nada interessados em mudar de fato sua postura. Nas teses 27 e 28 Lutero (2004) escreve, “pregam doutrina humana os que dizem que, tão logo tilintar a moeda lançada na caixa, a alma sairá voando [do purgatório para o céu]. Certo é que, ao tilintar a moeda na caixa podem aumentar o lucro e a cobiça”. Por isso, na tese 31 ele conclui que “tão raro como quem é penitente de verdade é quem adquire autenticamente as indulgências, ou seja, é raríssimo”. Cabe registrar, que da mesma forma que se vendiam indulgências, também eram vendidos cargos dentro da igreja,

sem deixar de mencionar, ainda, o contrabando a céu aberto de artigos religiosos e relíquias.

As consequências deste modo de vida dos sacerdotes resultaram em uma dicotomia ou paradoxo de difícil explicação para a Igreja e seus valores. Tal contradição resultava na vida de luxo e mundana que era levada pelos membros ligados, sobretudo, ao alto clero da Igreja Católica. Juntando-se à postura duvidosa dos membros dirigentes da Igreja é preciso ainda salientar que o fato de a proibição de haver lucros no comércio entre mercadorias (doutrina do preço justo) ter gerado um descontentamento progressivo da classe comerciante-burguesa; havendo ainda a competição entre o poder do Papa e o poder dos reis, o que diminuía muito a influência econômica e o poder político de todas as cortes europeias.

Em síntese, juntamente com a ascensão do indivíduo proposto pelo Renascimento, e a crise das concepções políticas, sejam elas de cunho teocrático (incluímos aqui o papado, os principados e reinados), a crítica de Lutero resultará na Revolta Protestante e fraturará a Igreja para sempre. Esse conjunto de fatores será determinante para o nascimento e desenvolvimento da noção de tolerância, que em seu primeiro momento tem uma acepção profundamente religiosa.

Outro momento importante para compreender a história da tolerância deu-se com a interpretação religiosa de Calvino (2008), cujas influências em relação às interpretações e propagação do protestantismo geraram repercussões para a interpretação da sociedade que merecem ser consideradas. Calvino pode ser considerado um protestante radical, defendendo que não há outro caminho para se chegar a Deus senão por Ele mesmo. Por isso, a Sagrada Escritura seria o suficiente, enquanto um recurso teórico e de pregação, para entendermos Deus e seus desígnios. Calvino (2008, p. 66) escreve que: “[...] a Escritura, recolhendo em nossa mente um conhecimento de Deus de outro modo confuso, desfazendo a fumaça, apresenta-nos claramente o verdadeiro Deus”. Isso demonstra, sem dúvida, que não existem legítimos hermeneutas da palavra de Deus, e que não há intermediários entre Deus e os homens. Eis uma referência muito clara quanto ao papel que os sacerdotes católicos desempenharam enquanto portadores da „verdadeira‟ interpretação das Sagradas Escrituras.

O Protestantismo Calvinista termina por aprofundar ainda mais a crítica operada por Lutero, promovendo um abalo estrutural importante nos procedimentos

e ideologias defendidos pela Igreja Católica até então. Aquela que se considerava A Religião Verdadeira se vê diante de um adversário que a partir de sua existência tornou-se incontrolável. Haverá de surgir a tolerância para poder mediar da melhor forma possível esses mais diversos pontos de vista conflitantes.

A crise da Igreja Católica representa no fundo os problemas de pelo menos mil anos, que se resumem ao embate entre fé e razão. Isso também trará consequências graves para a política, em que fica cada vez mais difícil justificar racionalmente o poder e a propriedade dos reis. Maquiavel (2000) instaurará uma crise sem precedentes ao afirmar que no campo da política há um jogo entre essência e aparência, sendo que o mais importante é aparentar ter as virtudes políticas necessárias para comandar o Estado, do que realmente ser virtuoso. Inaugura assim, com sua obra O Príncipe, a cisão entre duas éticas até então pensadas como se fossem uma só: A ética da política e a ética da religião.

Naturalmente, todos os pensadores que viessem a refletir e manifestassem a sua forma de pensamento sobre o Estado e suas características, desenvolvendo uma ciência política ou, uma filosofia política, teriam que enfrentar os problemas relacionados às esferas da fé e da razão. Desta maneira, em 1695 Locke vai escrever uma obra emblemática intitulada Racionalidade do Cristianismo, no qual ele desenvolve um raciocínio que se proporá a defender o cristianismo como uma doutrina universal inteiramente compatível com a racionalidade. O pano de fundo dessa discussão paira na ideia de religião natural, muito difundida entre os séculos XIV e XV, e que tem por objetivo demonstrar que há uma semelhança máxima, senão uma igualdade absoluta, entre fé e razão, filosofia e teologia, Deus e o mundo.

Como contratualista (assim como Hobbes e Rousseau), Locke parte da necessidade de um contrato para que haja uma boa e justa formação do Estado. Dado que cada cidadão do Estado tem os seus próprios desejos e vê o mundo a sua maneira (um prelúdio ao individualismo) - e não se pode formar uma sociedade a partir destes diferentes e conflitantes interesses - , far-se-á necessário fundar o Estado que terá seu governante escolhido livremente por todos os cidadãos que fazem parte dessa sociedade. O papel do Estado deverá ser o de garantir plenamente a liberdade a todos os seus cidadãos e ainda o direito à propriedade privada.

Quaisquer que sejam as decisões desta sociedade, e que derivem em uma espécie de direito civil, não podem ser resultado senão de uma assembleia. Os cidadãos e seu conjunto utilizando-se da sua plena liberdade garantida pelo seu direito natural de serem livres, decidem os rumos da comunidade. Em certa medida, é necessário o entendimento da filosofia política de John Locke para compreendermos a fundo o seu significado de tolerância.

Segundo Höffding (1906, p. 409), “o racionalismo religioso se traduz por um movimento democrático”, demonstrando que as novas exigências da razão terminaram por „elevar‟ as exigências da fé, e por sua vez, todo fideísmo que passar muito ao largo de uma justificativa plausível e racional, também passa muito longe desta nova concepção de natureza humana fundada no humanismo. O autor destaca também que “não apenas o catolicismo e o protestantismo são intolerantes, mas que o racionalismo tem também a sua intolerância”. (ibid., p. 410).

É importante destacar que não apenas a religião pode cometer excessos e assim tentar fundar suas más ações em seus dogmas, como a própria razão também pode ir além e cair no campo das crenças. Tanto um quanto o outro podem servir de base, justificativa e guia para as nossas decisões e nossos julgamentos diante dos problemas da vida. A tolerância passa, em grande medida, pela avaliação de todos esses extremos que conduzem as ações humanas a uma decisão cega e sem medir consequências.

Locke terá importantes contribuições para a política, e assim como Maquiavel, defende que há uma distinção extrema entre os estatutos e leis que forjam o Estado e as normas a serem seguidas por um preceito religioso. Esse é o ponto de partida para entendermos como John Locke sistematiza o problema da tolerância que em seu primeiro momento tem sem dúvida, um caráter profundamente religioso. Estado e Igreja desempenham funções importantes junto aos indivíduos que compõem uma determinada comunidade. Ambos contribuem de maneira muito ativa na manutenção da ordem e das regras que mantêm a comunidade unida e pacificada. No entanto, tanto a instituição do Estado quanto a instituição da Igreja operam com leis totalmente distintas, com objetivos diferentes, e governam dois mundos que nem sempre estão em conexão.

Um exemplo do ápice dessa tensão entre religião e política pode ser considerada no evento conhecido como “A Revolução Puritana”, marcada por um

confronto cruel e sangrento entre a Coroa e o Parlamento Inglês, sendo a monarquia representada pelo Rei Carlos I - executado em 1649, culminando na Proclamação da República da Inglaterra. O que se seguiu ao regicídio foi a implantação da massiva ditadura de Cromwell.

Após a tentativa de retorno da influência da monarquia, durante o período conhecido como “A Restauração” (de 1660 a 1668), houve a revolução gloriosa que finalmente determinou a vitória do liberalismo na política sobre o sistema de governo absolutista, e limitou consideravelmente a interferência da monarquia inglesa na vida política da Inglaterra. Trata-se da “Declaração de Direitos de 1689” (Bill of Wrigts – 1689), que garantia os direitos civis relativos à liberdade, à vida e à propriedade privada.

O jusnaturalismo de Locke defende que, antes do aparecimento de qualquer sociedade ou Estado, o que existia na realidade era os indivíduos. O individualismo correspondia à única maneira pela qual os homens ocupavam os mesmos espaços e organizavam o trabalho e as suas vidas. Segundo Locke, esse estado de natureza era marcado pela perfeição da liberdade e da igualdade entre os homens. O papel do Estado é estar em conformidade com esta noção de natureza humana e garantir a propriedade privada, o que para o filósofo, é natural a todos esses indivíduos.

A propriedade privada nasce de três princípios fundamentais: o corpo, o trabalho e Deus. Nesse sentido, pode-se inferir desses três princípios a seguinte posição: A terra oferecida por Deus a todos os homens é transformada por cada pessoa na medida em que essa trabalha sobre ela. O trabalho representa a capacidade que cada um tem de, mediante suas próprias forças, seu savoir-faire e seus atributos, transformar a terra em que vive.

Se o trabalho se dava como a única justificativa de possuir uma determinada propriedade, o aparecimento do dinheiro (moeda), desregulou esta balança „divina‟, e promoveu a desigualdade entre os homens com a ideia da acumulação de riquezas. Enquanto por um lado, há homens que possuem mais terras do que podem trabalhar, apenas pelo fato de terem dinheiro, no outro lado, estão aqueles que não detêm posse alguma. Neste momento está fundada para Locke a desigualdade entre os homens. Mas tendo ainda o trabalho como o principal meio de acumular riquezas, e portanto, propriedades, o Estado deve garantir que o trabalho

realizado seja mantido, e que a propriedade privada ligada ao seu dono, seja protegida.

Segundo Locke (1998), a razão natural consiste em ensinar os homens, partindo de sua condição igualitária e de liberdade, que ninguém tem o direito de malfazer a outrem, quanto à vida, à saúde, à liberdade e ao próprio bem. Essa razão natural seria a condição necessária para o fundamento para um pacto de anuência entre os homens, que busca equalizar os direitos naturais e os direitos civis, a partir da premissa da liberdade.

Nas primeiras linhas da primeira carta sobre tolerância, Locke (2004, p. 75) diz que “a tolerância é marca característica principal da verdadeira igreja”, e que a religião “não foi instituída para construir uma pompa externa, nem obter o domínio eclesiástico, nem exercitar uma força compulsiva, mas para regular a vida dos homens conforme as regras de virtude e piedade”. (Idem, p. 76). Chegamos aqui na distinção fundamental desenvolvida por Locke, que resultará em dois entes com identidade e dinâmica próprias: O governo civil e a religião. Compreender essa separação e quais os atributos e características que são concernentes seja ao Estado, seja à Igreja, é de fundamental importância para compreendermos o problema da tolerância.

O Estado, composto de homens livres que formam a sociedade, deseja manter esta liberdade a todos que estão associados a ele. Para tanto, o Estado agora é investido de leis e torna-se representante absoluto do poder civil. São esses códigos que irão deliberar através dos magistrados que compõem essa estrutura, definindo se determinados comportamentos podem ser aceitos ou não. Na eminente ameaça do Estado de Direito, e na infração das leis, o magistrado, então, em nome da sociedade, e como guardião da justiça, irá julgar e condenar aqueles que ameaçam a ordem e a paz estabelecidos pelo direito natural. Portanto, a ruptura severa que deu-se entre o Estado e a Igreja tirou do poder eclesiástico a possibilidade do uso da força, sendo este poder agora de uso exclusivo do Estado nas suas atribuições.

Locke (2004, p. 105) explica que,

[...] se a lei da tolerância fosse estabelecida, de que todas as igrejas fossem obrigadas a estabelecer a tolerância, como fundamento para

sua própria liberdade e ensinar a liberdade de consciência como o direito natural de todo homem natural, sejam igualmente dissidentes ou membros. E que ninguém pode ser compelido a assuntos religiosos pela lei ou pela força.

Significa dizer que nenhum homem deveria seguir essa ou aquela religião impostos nem pela Igreja, tampouco pelo Estado. O homem deveria ter o livre arbítrio de escolher, por si mesmo, qual religião deveria seguir, e até mesmo, não seguir religião alguma, não podendo ser punido por nenhum tipo de violência, independentemente da sua escolha. Isto demonstra que as leis do Estado são distintas das leis divinas, no entanto, ambas convivem no mesmo mundo, e em grande medida, precisam buscar sempre o consenso.

Locke nos dá um exemplo importante acerca desta reunião entre Estado e Igreja na vida do cidadão. Ele escreve sobre o magistrado que frequentando a Igreja, não pode, em alguns casos aplicar o código civil, ao menos que as ações dos fiéis sejam extrapoladas. Da mesma forma, quando ele está exercendo sua função de garantir as leis do Estado, não poderá de forma alguma utilizar de suas crenças religiosas para julgar ou fundamentar seus pareceres jurídicos sobre os casos demandados.

Entendemos dessa forma, que não havendo leis capazes de dar conta de sentimentos importantes como a fé e a crença humana, e que por sua vez formam associações e comunidades que conhecemos como igrejas, é necessário para garantir a mínima convivência entre os associados, que existam algumas regras. O ponto de partida dessas normas e regras, muitas vezes oculto e invisível, gera dificuldades entre os fiéis de uma mesma sociedade eclesiástica, e ocasiona ainda mais problemas na convivência entre várias sociedades eclesiásticas.

Por isso, no âmago desse problema, a tolerância aparece como única regra, ainda que não muito clara e distinta, capaz de guiar os cidadãos em suas crenças particulares, mantendo assim como no estado civil, uma ordem mínima que garanta a convivência entre todos os membros da comunidade.

Se a igreja não pode, como em outros momentos o fez, punir seus fieis com a força e a brutalidade, uma vez que “nenhuma força deveria ser usada, em qualquer ocasião, pois a força pertence totalmente ao magistrado civil e a posse de todos os bens exteriores está sujeita à sua jurisdição” (LOCKE, 2004, p. 83), torna-se

necessário estabelecer novas regras de convivência entre as diferentes pessoas que compõem uma determinada comunidade. Eis o papel fundamental da tolerância: promover a mediação entre os diferentes desejos dos membros de um certo grupo, e entre as distintas finalidades em que se manifestam os mais diversos grupos que compõem a sociedade.

Podemos perceber que a primeira acepção de tolerância advém do contexto religioso. Isso não quer dizer, todavia, que a tolerância se encerre absolutamente dentro da religião. A contribuição da reflexão de Locke deu-se exatamente no extrapolamento da noção de tolerância demonstrando que esta forma de pensar se alastra em outras formas da vida humana.

Tocqueville (2005), que promove uma análise profunda das concepções políticas norte americanas e suas motivações, compreende que as crenças políticas e religiosas dos cidadãos são realidades que não podem ser negadas na construção de um Estado. Por isso ele define que,

A liberdade vê na religião a companheira de suas lutas e seus triunfos, o berço da sua infância, a fonte divina de seus direitos. Ela considera a religião como a salva guarda dos costumes; os costumes como garantia das leis e penhor de sua própria duração. [...] A religião vê na liberdade civil um nobre exercício das faculdades do homem; no mundo político, um campo entregue pelo criador aos esforços da inteligência. (TOCQUEVILLE, 2005, p. 74).

Locke, Na Constituição da Carolina2, ao tratar das questões religiosas e mesmo defendendo uma espécie de dever à adoração de Deus, exige que a mesma postura que ele julga como sendo de tolerância seja adotada por todas as igrejas consideradas cristãs, e também por todas as outras religiões. A questão principal nesse conjunto de leis sistematizado por Locke é que há uma regulamentação do culto religioso por parte do Estado, que em grande medida, sendo antiquado ou não, procura garantir a liberdade de culto aos seus cidadãos.

Os americanos têm tanta obsessão por sua liberdade, que procuram assegurá-la a qualquer preço, inclusive atacando sem muitas justificativas outras

2

nações, alegando estarem se defendendo e garantindo a manutenção da liberdade de seu povo. A liberdade, apresentada por Tocqueville como extremamente frágil e delicada, deve ser conservada, protegida e valorizada, para que a ideia de uma verdadeira nação possa não apenas emergir, mas se solidificar. No entanto, lembramos que, “para viver livre é necessário habituar-se a uma existência plena de agitação, de movimento, de perigo; velar sem cessar e lançar a todo momento um olhar inquieto em torno de si: este é o preço da liberdade”. (TOCQUEVILLE, 1957, p. 91).

Essas noções demonstram como o povo americano se conduz num paradoxo. De um lado temos a consciência extrema da questão política pela via da liberdade,