• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 3: POLÍTICAS E PROCESSOS COMUNICACIONAIS – AS

3.3 Política comunicacional: atividades comunicacionais desenvolvidas entre 1977 e

3.3.2 Exposições de longa duração

3.3.2.1 Abordagens da Arqueologia (1977-1980)

O Museu de Arqueologia de Itaipu foi inaugurado em 22 de março de 1977 com a exposição “Abordagens da Arqueologia”, elaborada pelas funcionárias do Museu Nacional/UFRJ, a arqueóloga Lina Maria Kneip e a arquiteta Maria Lúcia Goulart.

153

Figura 16 - Convite para abertura da exposição “Abordagens da Arqueologia Brasileira”.

Fonte: Arquivo Central: Arquivo Noronha Santos - IPHAN

Pela documentação encontrada, podemos afirmar que estavam previstas para a inauguração do Museu duas exposições: uma sobre a pesquisa arqueológica em sambaquis, e outra sobre pinturas rupestres. Apenas a primeira se realizou no período previsto e de acordo com o projeto expográfico apresentado. Para tanto, o MAI contou com o apoio do Centro Brasileiro de Arqueologia e do Museu Nacional, que cedeu as duas funcionárias responsáveis pela concepção da exposição e emprestou a maior parte do acervo. A análise dessa exposição se deu através das plantas, dos lay-outs e dos textos expositivos e legendas dos objetos e especificações técnicas para a produção das vitrines, documentos encontrados no arquivo Noronha Santos do IPHAN.

154 A coordenação da exposição é de responsabilidade da arqueóloga Lina Maria Kneip. Embora o projeto expositivo seja de autoria de Maria Lúcia Goulart, ela não aparece nos créditos da exposição. A ficha técnica da exposição agradece a colaboração de outros pesquisadores, entre eles as pesquisadoras do Museu Paulista/USP, Luciana Pallestrinni, Filomena Chiara, Agueda Vilhena de Moraes e Silvia Maranca; os pesquisadores do Museu Nacional/UFRJ, Fausto Luiz de Souza Cunha, Arnaldo C. dos Santos Coelho, Elisa Maria Botelho de Mello e Tarcísio Torres Messias; e ainda os pesquisadores do Instituto de geociências da UFF, Jorge Soares Marques e Dalva R. D. dos Prazeres.

A exposição contou com 28 objetos, entre artefatos líticos, ósseos e elementos faunísticos e procurava explicar o que é um sambaqui e as etapas de uma pesquisa arqueológica nessa tipologia de sítio. O acervo apresentado era proveniente do Sambaqui do Forte, localizado na cidade de Cabo Frio, RJ. A pesquisa que deu origem a esse acervo foi patrocinada pelo IPHAN e pela UFRJ, entre 1971 e 1974, e teve como responsável a mesma arqueóloga que pesquisou os sítios de Camboinhas e Duna Pequena, Lina Maria Kneip. Como podemos ver no texto de apresentação da exposição:

Esta exposição procura mostrar fases de uma pesquisa em sambaquis, no caso, no SAMBAQUI DO FORTE, situado em Cabo Frio, no Estado do Rio de Janeiro. Essa pesquisa foi patrocinada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e Conselho de Ensino para Graduados (CEPG), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). (Texto de Apresentação exposição “Abordagens da Arqueologia”. 1976. Arquivo Central: Arquivo Noronha Santos - IPHAN)

A exposição “Abordagens da Arqueologia” ocupou o espaço hoje denominado como sala de exposições temporárias. Essa sala, construída em alvenaria, é parte dos remanescentes do Recolhimento de Santa Teresa, ou seja, é parte do conjunto tombado e restaurado pelo IPHAN, o que implica na dificuldade de realizar intervenções, como furar as paredes ou instalar sistemas de iluminação. Sendo assim, poucas ações podem ser feitas sem a estrutura adequada, como a instalação de paredes falsas, por exemplo. Contígua a essa sala ficavam os sanitários e um pequeno hall, que não foi utilizado. As fotografias e os textos estão dispostos nas paredes, inclusive aproveitando alguns nichos da própria sala. Cinco vitrines ocupam o meio da sala e duas estão junto à parede. Piso e teto não são explorados e a sala não possui janelas, o que impede a utilização de iluminação natural.

155

Figura 17 - Planta baixa da exposição “Abordagens da Arqueologia Brasileira” com a distribuição das vitrines.

Fonte: Arquivo Central: Arquivo Noronha Santos - IPHAN

Existem duas portas, uma para entrada e outra para saída. O visitante é induzido a entrar pela porta mais próxima e a começar a visita pelo lado esquerdo: o percurso expositivo é organizado para que o público entre em contato gradual com a informação. A exposição procurava mostrar, a partir do caso do Sambaqui do Forte, o que é um sambaqui e quais são as etapas da pesquisa arqueológica. Além dos 28 objetos expostos e suas respectivas legendas, a exposição contava com 10 fotografias e 4 textos explicativos. O primeiro texto tratava de explicar o que é um sambaqui. O segundo, as etapas da escavação, com destaque para as coordenadas vertical (trincheira e perfil) e horizontal (decapagem), e ainda a importância do estudo topográfico nesse processo. O terceiro explicava sobre as práticas alimentares relacionando-as aos vestígios dispostos nas vitrines (moluscos, peixes e pequenos mamíferos) e aos instrumentos expostos (lascas de quartzo, pontas de flechas). Por fim, o último texto tratava dos costumes funerários, em especial daqueles que puderam ser identificados em 5 dos 15 sepultamentos encontrados no Sambaqui do Forte.

Os objetos estão dispostos em 7 vitrines de centro88 não herméticas e não emolduradas, sendo 6 quadrangulares e 1 retangular. Os objetos estão divididos nessas vitrines em conjuntos tipológicos de acordo com o seu material constitutivo (líticos,

88 De acordo com a definição de Vera Regina Barbuy Wilhelm (2010, p.305): “Vitrines de centro: apresenta as faces transparentes, permitindo a visão global dos objetos, e é usada para objetos de pequeno a grande porte. Apresenta vantagens por se destacar enquanto volume na área expositiva, atraindo o público e permitindo um visão global do objetos”. A autora explica ainda que vitrines não emolduradas são aquelas cuja junção dos vidros é feita apenas com adesivo, pelo encaixe ou com auxílio de ferragens.

156 ósseos, conchas, faunísticos). Dentre os objetos, o almofariz é destacado ao receber uma vitrine exclusiva. Recebe destaque também a reconstituição do sepultamento, que é apresentada, na vitrine retangular, sobre sedimentos e com mobiliário funerário: lâmina de machado polida, almofariz, vértebras de peixe perfuradas e outros adornos. Os objetos tratam diretamente do tema proposto e estão organizados para que o visitante relacione as informações textuais com as fotografias e legendas.

A linguagem dos textos é bastante clara e sucinta, e podemos afirmar que, quando associados às fotografias e objetos, até mesmo os assuntos mais técnicos, como o perfil estratigráfico, podem ser compreendidos. O mesmo pode ser dito sobre as legendas, que por vezes surgem com expressões que procuram aproximar o enunciador do visitante, conforme exemplo: “Percutor ou martelo, destinado a esmagar, afundar,

enfim, materlar”.

Os recursos expográficos utilizados, além dos textos e legendas, são 10 fotografias tomadas durante a escavação do Sambaqui do Forte. Elas ilustram os textos e fazem referência aos objetos que estão dispostos nas vitrines. O uso de fotografias como recurso expográfico tem por objetivo fornecer um contexto prático que contribua na ação interpretativa do visitante (DEVALLON, 2010, p.27), característica que também se aplica a essa exposição. Ou seja, a partir das fotos tomadas durante a escavação, o visitante poderia observar o local da escavação, as ferramentas utilizadas, os pesquisadores e procedimentos técnicos e associá-los aos objetos e textos apresentados.

Durante o período em que esteve aberta, a exposição reuniu um expressivo número de público no primeiro ano: 5.297 pessoas. Entre 1977 e 1979, os dados apontam que a exposição foi vista por 15.143 pessoas, uma grande quantidade de pessoas, considerando as distâncias geográficas, as dificuldades de locomoção à época, o alcance dos meios de divulgação antes do advento da internet, bem como o tamanho diminuto da exposição e a inexistência de um corpo funcional que pudesse receber todas essas pessoas.

O MAI não possuía ainda nenhum sistema organizado para identificação dessas pessoas. No relatório dos três primeiros meses de gestão (março, abril e maio) da Coordenadora de Atividades, além da contagem geral de visitantes, foi identificada sobre eles a sua procedência/moradia, sendo 49% de Niterói e São Gonçalo, 40 % da

157 cidade do Rio de Janeiro, 7 % de outros Estados e 4% de outros países. Nos meses de setembro, outubro e novembro foram identificados o sexo/faixa etária, sendo 49,64% homens, 36,09% mulheres e 14,25 % crianças.

A primeira exposição do Museu não fazia referência alguma aos sítios arqueológicos de Itaipu ou da Região Oceânica. É certo que em 1977 ainda não haviam sido realizadas as pesquisas nos sambaquis Duna Pequena e de Camboinhas, que aconteceriam nos anos seguintes, entre 1978 e 1979. No entanto, o Sambaqui da Duna Grande, o mais próximo do MAI, já havia sido identificado em 1962 pelo IPHAN. De um modo geral, o acervo inicial do Museu, coletado pelo arqueólogo amador Hildo de Mello Ribeiro, era proveniente desse sítio, segundo relatos do próprio arqueólogo e dos pescadores que contribuíram para a formação dessa coleção, mas todos os objetos que compunham a exposição “Abordagens da Arqueologia” eram provenientes do Sambaqui do Forte, localizado na cidade de Cabo Frio.

Para as instalações e inauguração do Museu foram realizadas obras de consolidação das ruínas e data desse período a descoberta de artefatos cerâmicos que fazem referência ao Recolhimento de Santa Teresa. No entanto, a exposição do MAI não aborda o que era aquele prédio ou quem eram as pessoas que viviam ali recolhidas. Embora apareça no projeto de criação do Museu a intenção de recuperar o passado pré- histórico da pesca e de relacionar-se com os pescadores e com a comunidade local, esse também não é um assunto abordado na primeira exposição.

Itaipu era um dos destinos mais próximos para o veraneio dos cariocas que decidiam deixar o Rio de Janeiro, ação que se tornou ainda mais intensa depois da inauguração da ponte Rio-Niterói, em 1974. O bairro, que já sofria com a especulação imobiliária desde meados da década de 1960, passou, no período de inauguração dessa exposição e nos anos seguintes, por inúmeros loteamentos e pelo aumento considerável de moradores, culminando em 1979 com a abertura definitiva do canal da Lagoa de Itaipu, que dividiu permanentemente as praias de Itaipu e Camboinhas e diminuiu o espelho d água em 60%. É importante lembrar que esses loteamentos e construções estão diretamente associados à descoberta dos novos sítios arqueológicos. No entanto, essa exposição também não se refere às transformações urbanas e ambientais da região.

Apesar dessas considerações, é preciso lançar um olhar para o esforço dos profissionais envolvidos bem como para a concretização de suas intenções. O Museu foi

158 inaugurado sem uma equipe fixa e sem destinação orçamentária própria, fatores essenciais para promoção de ações comunicativas. Os profissionais envolvidos voluntariam-se para a produção dessa exposição e utilizaram de suas especialidades disciplinares, bem como de seus interesses profissionais – nesse caso, a arqueologia – para desenvolver o tema. Tendo como objetivo apresentar os sambaquis e as pesquisas arqueológicas nesse tipo de sítio, foram coerentes, especialmente diante desse cenário pouco favorável à comunicação museológica ou a qualquer atividade técnica no Museu.

3.3.2.2 Aspectos da pré-história do Rio de Janeiro na faixa litorânea compreendida