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3 CONCEPÇÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS E OS MODELOS DE

3.2 Concepções teórico-metodológicas da educação: a escolha das trilhas para o ensino-

3.2.2 Abordagens pedagógicas críticas

As abordagens críticas, diferentemente das conservadoras, têm a pretensão de mobilizar o conjunto da sociedade para transformação social. A intenção política dessas correntes pedagógicas é proporcionar conhecimentos necessários sobre a realidade capitalista e o papel da escola, nesse contexto, seria mobilizar os indivíduos para organização de uma relação social mais horizontal, sem estratificação social. Entre essas abordagens, se destacam: a Pedagogia libertadora; a libertária; a crítico-social dos conteúdos. Essas abordagens não são utilizadas, com frequência, na modalidade educacional a distância, visto que o perfil dos cursos concebidos, especialmente no Brasil, se caracterizam por uma ótica mais instrumentalista, possivelmente, por ausência de discussão com a comunidade acadêmica.

No entanto, elas existem e são caracterizadas por um viés crítico de sociedade na busca de transformar a realidade social. A pedagogia libertadora pressupõe, por exemplo, que alunos e professores, mediatizados pela realidade que apreendem e da qual extraem o conteúdo de aprendizagem, atinjam um nível de consciência dessa realidade, a fim de nela atuarem, no sentido da transformação social, porque, na sociedade capitalista, a educação não é una, segundo admitiu Durkheim; ela é de classe, e nesse sentido, a escolarização tem dois objetivos:

[...] preparar a consciência do indivíduo para perceber apenas a visão de mundo da classe empresarial como correta, isto é, transmissão de ideologia; preparar o indivíduo para o trabalho, fazendo com que aprenda o necessário e suficiente para lidar com seus instrumentos de trabalho, disciplinando e treinando o corpo/mente da classe trabalhadora para que possa desempenhar

adequadamente suas tarefas no trabalho. [...] por outro lado, a classe empresarial recebe outro tipo de escolarização, muito mais aperfeiçoado e completo, com acesso às melhores escolas, aos melhores professores e materiais didáticos para assim, com bom nível de conhecimentos, poder se aperfeiçoar e se perpetuar na função de classe dirigente. O conhecimento é fonte de poder; a partir do conhecimento, é possível dominar mais facilmente outra pessoa; faz sentido que em nossa sociedade a classe empresarial tenha acesso as melhores escolas enquanto aos trabalhadores reste apenas o acesso àquele conhecimento parcial que lhe garanta a condição de dominado “eficiente”. (MEKSENAS, 2007, p. 68).

Por isso, Paulo Freire - o mentor intelectual dessa abordagem pedagógica - critica a educação tradicional, qualificada por ele como educação bancária, por servir, apenas, de depósito de conteúdos, sem nenhuma pretensão de alterar o nível de consciência dos indivíduos. Libâneo (2006) complementa dizendo que, tanto a educação tradicional, denominada “bancária” – que visa, apenas, depositar informações sobre o aluno -, quanto a educação renovada – que pretenderia uma libertação psicológica individual – são domesticadoras, visto que pouco ou nada contribuem para desvelar a realidade social de opressão.

Freire (1974a, p. 42) ressalta que é preciso que a educação esteja em seu conteúdo, em seus programas e em seus métodos, adaptada ao fim que se persegue: permitir ao homem chegar a ser sujeito, construir-se como pessoa, transformar o mundo e estabelecer com os outros homens relações de reciprocidade, fazer a cultura e a história. Nessa ótica, ressalta que

A libertação autentica, que é a humanização em processo, não é uma coisa que se deposita nos homens. Não é uma palavra a mais, oca, mitificante, É práxis, que implica a ação e a reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo. [...] A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como seres “vazios” a quem o mundo “encha” de conteúdos; não pode basear-se numa consciência especializada, mecanicistamente compartimentada, mas nos homens como “corpos conscientes” e na consciência como consciência intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de conteúdos, mas a da problematização dos homens em suas relações com o mundo.(FREIRE, 2001, p. 67).

Portanto, a abordagem libertadora vê a educação como um ato político intencional que deve servir para elevação da consciência dos homens, a fim de que possam se tornar sujeitos da práxis. Isso exige que o processo educacional aconteça de forma recíproca, dialogicamente, para que as pessoas aprendam interagindo com as outras, porque ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo mundo. (FREIRE, 2001).

Ainda com referência às abordagens críticas, se apresenta a pedagogia libertária, a qual tem a expectativa de que a escola exerça uma transformação na personalidade dos alunos num sentido libertário e autogestionário. A visão básica, segundo Libâneo (2006), é introduzir modificações institucionais, a partir dos níveis subalternos que, em seguida, vão “contaminando” todo o sistema. A instituição de mecanismos colegiados faz parte dessa abordagem, tais como: assembleias, conselhos, eleições, reuniões, associações. A autogestão é, assim, o conteúdo e o método; resume tanto o objetivo pedagógico quanto o político.

Tragtenberg (1985) enfatiza que, na escola, as relações vivenciadas por professores, alunos, funcionários, diretores e orientadores, reproduzem, em escala menor, a rede de relações que existe na sociedade. O autor compara as relações de poder na escola com aquelas de um presídio, em que a prática de ensino, em sua essência, reduz-se à vigilância. Não é mais necessário o recurso à força para obrigar o aluno a ser aplicado, é essencial que o aluno, como o detento, saiba que é vigiado.

O que se pretende com a pedagogia libertária é superar essas relações com uma proposta pedagógica voltada para autogestão social numa perspectiva integral, com vistas a libertar os homens das amarras da burocracia, da repressão e do controle que perverte as relações humanas, gerando o conformismo e a alienação.

Vê-se, portanto, que a pedagogia libertária constitui um viés político com a finalidade de conscientizar os homens na busca da organização da autogestão, pela vivência grupal, não, apenas, na educação escolar, mas também em múltiplos processos formativos, seja de crianças, seja de adultos trabalhadores. Assim, pode ser visto como parte dos processos educativos: cursos para adultos, palestras, seminários, ciclos de conferências, mas também um forte investimento em uma imprensa libertária, com a publicação de jornais e revistas, livros e panfletos a serem distribuídos da maneira mais ampla possível. (GALLO, 2012).

O eixo central é a demonstração da capacidade de organização intelectual de todo(a)s no processo de deliberação em todas as instâncias sociais de forma ativa e efetiva. A educação seria o instrumento para essa transformação, envolvendo, inicialmente, a consciência humana para, logo em seguida, transformar o modelo social vigente.

Portanto, para finalizar o conjunto de abordagens críticas, referenciadas, situa-se a pedagogia crítico-social dos conteúdos. Essa abordagem compreende que o papel da escola é a difusão dos conteúdos. Não conteúdos abstratos, mas vivos, concretos e, portanto indissociáveis das realidades sociais. A valorização da escola, enquanto instrumento de apropriação do saber, é o melhor serviço que se presta aos interesses populares. (LIBÂNEO, 2006).

Nessa abordagem, os alunos não desenvolvem o senso crítico apenas quando o professor problematiza a vida deles. É necessário fazer com que o aluno tenha também seu direito garantido ao conhecimento acumulado pela civilização humana. Nesse sentido, a aquisição do conhecimento não deve ter, como objetivo, a erudição, o saber pelo saber, mas sim a possibilidade de que o conhecimento possa ser ferramenta a mais no processo de transformação social. (MEKSENAS, 2007).

No entanto, para que esse saber, produzido historicamente pela humanidade, possa ser de acesso útil ao aluno, faz-se necessário que o professor seja o mediador entre o conhecimento e a prática social do aluno.

Desse modo, o aluno passa a conhecer o conteúdo de forma crítica e não apenas memorizando-o. Ou seja, com a contribuição do professor, os conteúdos das diversas áreas do conhecimento passam a ser apresentados e discutidos em sala de aula, criticamente, de forma clara e objetiva, tornando-se parte de suas vidas. Saviani (2000) compreende que o ponto de chegada de uma ação pedagógica é a relação dos conteúdos com a prática social.

Dessa maneira, são necessárias relações dos conteúdos com a prática social, a fim de que os alunos possam sentir a necessidade de apreendê-los para colocá-los em prática. O que se vê tanto na abordagem tradicional (bancária) quanto na escola nova (por experimento) é uma ação educativa sem significado algum para a vida dos indivíduos.

Libâneo (2006) advoga a intervenção do professor, porque, segundo ele, não dá para continuar com essa dicotomia, difundida por muitos educadores, que ora o ensino é centrado no professor, ora é centrado no estudante como forma de oferecer processos educativos mais adequados. Para o autor, não se pode amortecer a presença do professor como mediador dos conteúdos, como se ele não trouxesse nada de novo para o ensino-aprendizagem.

A relação pedagógica é uma relação com um grupo, e o clima do grupo é essencial na pedagogia. Nesse sentido, o professor intervém, não para se opor aos desejos e necessidades ou à liberdade e autonomia do aluno, mas para ajudá-lo: a ultrapassar suas necessidades e criar outras, a ganhar autonomia, no seu esforço de distinguir a verdade do erro, a compreender as realidades sociais e sua própria experiência. Por isso, são importantes e necessárias as dinâmicas de grupo, que aproximam os alunos ao professor e vice-versa. Essa é uma das formas de conquista do respeito mútuo, momento em que são compreendidos os objetivos pedagógicos para construção de um ambiente valioso voltados à prática de uma educação transformadora. (LIBÂNEO, 2006).

As diversas abordagens pedagógicas, referenciadas nesse estudo, de certa forma, contribuíram para a definição dos modelos de cursos adotados na modalidade a distância no

ensino superior brasileiro. A filiação dos cursos a uma abordagem ou outra tem se desenvolvido, a partir das necessidades basilares do curso e de seus propósitos, o que, nesse momento, requer muitas variações por ser uma modalidade nova e aberta a estudos e pesquisas sobre o seu funcionamento.

É importante considerar que para alguns autores entre eles Santos (1988) Moraes (1997), Oliveira (2003) está se vivendo, no século XXI, uma limitação desses paradigmas que estavam em vigor até a atualidade e que tentavam explicar os fenômenos vitais. Na opinião desses autores, a visão de mundo, contemplada nesses paradigmas, é hoje uma visão obsoleta em muitos aspectos e que está emergindo uma nova visão – das ciências sociais, da vida social, dos valores, das estruturas políticas e sociais, das instituições e dos nossos comportamentos.

Nesse sentido, os autores acreditam que a crise da ciência moderna é o resultado do grande avanço no conhecimento que ele propiciou, pois o conhecimento permitiu ver a fragilidade dos pilares em que se funda. Destacam, ainda, que o desenvolvimento das tecnologias e tudo que elas permitem realizar estão, sobretudo, de acordo com um novo paradigma emergente que considera o mundo uma rede de relações na qual tudo está relacionado em uma grande teia de relações e conexões.

No campo educacional, essa visão de rede apontaria para a ultrapassagem da visão compartimentada, disciplinar, única e isolada, num esforço de reaproximar as disciplinas que devem se desencadear e se interconectar como uma rede. Segundo Santos (1997), graças ao avanço das tecnologias da comunicação e da informação pode-se acrescentar a emergência de uma pluralidade tecnológica com a possibilidade de interação de diferentes mídias – texto, som, imagem e movimento.

Não se desconhece todas as inovações que provêm das tecnologias da comunicação e da informação e as contribuições que elas podem trazer para o campo educacional; no entanto não se pode deixar de considerar que um paradigma emergente que envolva diferentes pressupostos de novas teorias que têm, em comum, a superação do pensamento mecanicista da ciência moderna, ainda é um assunto muito polêmico, pois apontaria para a superação da modernidade caracterizada pela era da razão.

Na ótica de Gamboa (2001), o ideário da modernidade ainda está inconcluso e a proclamação da entrada em uma era pós-moderna, via novas ondas tecnicistas como a informática e a microeletrônica, é muito prematuro. Assim, a revolução informática em vez de resgatar as dívidas da modernidade, na maioria dos países em desenvolvimento cria novos desafios, na medida em que surgem outros tipos de analfabetos e de excluídos.

3.3 Modelos de cursos a distância no Brasil: uma questão em aberto

O ponto de mutação da educação superior brasileira, com relação à modalidade educacional a distância, se mostra a partir da instituição do art. 80 da LDB, Lei nº 9.394/96 (BRASIL, 1996), quando foi permitido ao Poder Público incentivar o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino e de educação continuada.

Com base na aprovação dessas diretrizes, as instituições de ensino superior, públicas e privadas iniciaram uma caminhada na busca de implantar, inicialmente, de forma tímida em seus cursos presenciais, momentos a distância, atendendo à regulamentação que dava o direito de as instituições comporem suas grades curriculares com o percentual de 20% com a modalidade a distância.

Essas experiências contribuíram, efetivamente, para a instituição de modelos de cursos completos, via modalidade a distância, na educação superior na graduação e pós-graduação. No Brasil, os modelos de cursos a distância se vincularam, historicamente, a interesses institucionais dos mais diversos, principalmente, aqueles cursos com viés economicista, de caráter mercantil, em detrimento de cursos de formação geral, integral, que incorporassem a indissociabilidade entre a formação intelectual e prática.

Cumpre ressaltar que o conceito de modelo pode ter vários significados e está em articulação direta com a atividade científica que procura, segundo Behar (2007), compreender, explicar e predizer fenômenos do mundo.

Desse modo, é possível considerar como modelo um sistema figurativo que reproduz a realidade de forma mais abstrata, quase esquemática e que serve de referência. Neste capítulo, o termo Modelo é, portanto, uma referência, uma diretriz, um parâmetro, um rumo, uma estrutura, que pode ser utilizada para caracterizar os diferentes tipos de cursos de educação a distância que são utilizados.

A exaltada e eufórica defesa do papel modernizante e inovador dessas tecnologias - imprescindíveis ao enfrentamento dos desafios do novo milênio - caminharam sob a égide de vários modelos de EAD os quais, situados historicamente, foram delineando uma política tipicamente liberal reeditada, apostando na capacidade de a educação mudar e transformar os indivíduos, propiciando mudanças da sociedade (RISCAL, 2010). Por esse prisma, haveria uma esperança de que as novas tecnologias,

[...] teriam a capacidade de finalmente eliminar antigos problemas da educação, permitindo o aceso de grandes contingentes de excluídos ao

processo de escolarização. Principalmente em países com grandes desigualdades sociais e econômicas como o Brasil. (RISCAL, 2010, p. 55- 56).

Há uma crença na política educacional de que a educação deve ser a força motriz para o desenvolvimento e que, em certa medida, exalta a tecnologia como alavanca da educação e do progresso nacional. (RISCAL, 2010). Ideias essas que se aproximam das orientações economicistas da Unesco e do Banco Mundial. Entretanto, para atender ao mundo do trabalho, na perspectiva da formação do capital humano, seria imprescindível um tipo de EAD que atendesse aos acordos firmados, internacionalmente, para implementação do novo paradigma educacional, que pudesse direcionar ações pedagógicas inovadoras. Para Oliveira (2003, p. 31),

[...] esse novo paradigma levaria à produção do conhecimento, centrada no sujeito aprendiz, individual e coletivo, desenvolvendo sua autonomia, criatividade, criticidade, espírito investigativo e colaborativo e que o capacite para enfrentar os desafios da sociedade contemporânea.

Desse modo, os modelos de EAD, em vigência no país, seriam condicionados pela expectativa social em torno da educação para empregabilidade33 na sociedade do conhecimento. Isso, de certa forma, sem entrar no mérito da questão, daria um alento àqueles que se encontrassem em desvantagem educacional e que estivessem pretendendo buscar a formação ou a qualificação para o trabalho.

Referente ao uso da tecnologia, Moran (2010) identifica a existência de dois grandes modelos de cursos a distância no território brasileiro com muitas variáveis.

O primeiro seria o modelo tele/videoaula em que o professor aparece no papel tradicional, onde é visto pelos alunos ao vivo (teleaula) ou em aula gravada (videoaula). Nesse modelo, há o auxílio de leituras e atividades presenciais e virtuais, correspondendo a tendência pedagógica behaviorista (grifos nosso). O segundo seria o modelo web, onde o professor não dá aula, ele se comunica por meio de materiais impressos e digitais, escritos de forma dialogada e com tutoria presencial nos polos e/ou virtual, pela internet, utilizando de alguns vídeos eventualmente, não sistematicamente, filiando-se a tendência pedagógica construtivista (grifos nosso). (MORAN, 2010, p. 129-130).

Ainda para o autor, a diversidade de modelos de cursos a distância faz parte de um sistema novo de educação que varia de acordo com a demanda. Esses modelos de cursos se pautam, por definição, em opções por algumas das abordagens pedagógicas já delineadas neste estudo. Dentre os modelos, destacam-se os cursos prontos para alunos individualmente;

cursos para pequenos grupos; modelo de aulas por tele/videoconferência; e modelo de educação on-line; e o modelo híbrido, com momentos síncronos e assíncronos.

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