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ACESSO IMIGRANTES À SAÚDE EM PORTUGAL

Promoção do Direito Social à Saúde

INTEGRAÇÃO DOS IMIGRANTES EM PORTUGAL: IGUALDADE DE ACESSO À SAÚDE

3. ACESSO IMIGRANTES À SAÚDE EM PORTUGAL

O relatório estatístico anual de 2017, do Observatório das Migrações, reve- lou um estudo do Instituto de Medicina Tropical (IHMT) da Universidade Nova de Lisboa, cuja conclusão foi de que os imigrantes que chegam a Portu- gal apresentam um melhor estado de saúde do que os nacionais portugueses35.

32 OLIVEIRA, Cataria Reis; GOMES, Natália, Indicadores de Integração de Imigrante..., Op. cit., p. 05.

33 HUDDLESTON, Thomas; BILGILI, Özge; JOKI, Anne-Linde; VANKIVA, Zvezda, Mi- grant Integration Policy Index 2015, Barcelona/Brussels: CIDOB and MPG, 2015, pp. 17-18,

disponível em www.mipex.eu/portugal [23.04.2018].

34 Idem, ibidem.

35 Cf. OLIVEIRA e GOMES, Indicadores de Integração de Imigrantes..., Op. cit., p. 263: Os dados

do Inquérito Nacional de Saúde mostram que os 65% dos imigrantes que vivem em Portu- gal tem bom estado de saúde, enquanto os portugueses reportam 43%.

O mesmo estudo constatou que o estado de saúde dos imigrantes tende a piorar à medida que aumenta o tempo de residência no país, fato confirmado também por outros estudos internacionais, como o relatório OCDE (Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico), de 201536.

Segundo o relatório MIPEX 2015, a saúde dos imigrantes é a uma das áreas de fraqueza das políticas de integração em Portugal, classificado quanto a este tema na vigésima segunda colocação do ranking geral. A pesquisa aponta que as políticas de saúde dos deslocados a Portugal são políticas de austeridade, apenas parcialmente favoráveis para tratar adequadamente todos os tipos de pacientes.

Após a crise econômica, os imigrantes doentes encontraram mais obs- táculos administrativos ao exercício dos seus direitos e serviços de saúde responsivos, pois os direitos tradicionalmente inclusivos e as isenções legais foram minados por empecilhos de documentação e discrição. Há exigência de particulares requisitos para o direito à maioria dos serviços de saúde por parte dos imigrantes não requerentes de asilo, o que dificulta a concessão dos mesmos. Além disto, embora os pacientes elegíveis recebam algum apoio, os serviços e políticas de saúde demoram a se adaptar às necessidades específi- cas de saúde e acesso37.

O direito à saúde em Portugal é conferido a todos os cidadãos, com univer- salidade de cobertura, nos termos do artigo 64 da Constituição da República Portuguesa. O artigo 64 da Constituição combinado com a Lei de Bases da Saúde (Lei n.º 48/90), na Base XXV, indica que o sistema de saúde portu- guês se responsabiliza pela saúde de todos os cidadãos, assim considerados: os cidadãos nacionais dos Estados-membros da União Europeia, do Espaço Eco- nômico Europeu e Suíça; os cidadãos nacionais de países terceiros com quem Portugal firmou acordos bilaterais; os cidadãos nacionais de países terceiros que não firmaram nenhum acordo bilateral com Portugal ou estão no país em situação irregular, e os cidadãos nacionais de países terceiros abrangidos pelo Estatuto de Refugiados ou com direito de asilo em Portugal38.

Nesse sentido, os cidadãos nacionais dos Estados-membros da União Europeia, do Espaço Econômico Europeu e da Suíça, com residência tem- porária ou permanente, têm direito a receber cuidados de saúde primários e hospitalares, urgentes ou programados nas unidades de saúde pertencentes

36 Idem, ibidem.

37 HUDDLESTON; BILGILI; JOKI; VANKIVA, Migrant Integration Policy Index..., Op. cit., p. 28.

ao Serviço Nacional de Saúde, tal como os cidadãos portugueses, mediante o pagamento de taxas moderadoras39, de acordo com o regime legal português40.

Os países que possuem acordo bilateral com Portugal são: (a) Andorra (Convenção sobre Segurança Social entre Portugal e Andorra e respectivo Acordo Administrativo, Decreto n.º 12/90); (b) Brasil (Estatuto da Igualdade Brasil-Portugal, de 1971, substituído pelo Tratado da Amizade – Resolução da Assembleia da República n.º 83/2000 –, que prevê no artigo 63 o direito à igualdade do acesso a saúde aos brasileiros se houver reciprocidade); (c) Cabo Verde (Convenção sobre Segurança Social entre Portugal e Cabo Verde e Acordo Administrativo, Decreto n.º 2/2005); (d) Canadá (Ajuste e Ajuste Complementar – Decretos n.º 34/81 e n.º 61/91 –, entre Portugal e Quebec); (e) Marrocos (Convenção sobre Segurança Social entre Portugal e Marrocos e respetivo Acordo Administrativo, Decreto n.º 27/99); e (f) Tunísia (Con- venção sobre Segurança Social entre Portugal e Tunísia e respetivo Acordo Administrativo – Resolução da Assembleia da República n.º 29/2009; Aviso n.º 96.2010 –)41. Os indivíduos nacionais dos referidos países, em situação

de residência ou estada temporária em Portugal, tem direito a obter cuidados primários de saúde e em unidades hospitalares, mediante taxas moderadoras, em igualdade de tratamento aos nacionais portugueses.

O imigrante nacional de país terceiro à União não abrangido por acordo bilateral, que não seja titular de autorização de permanência ou residência, de visto de trabalho em território nacional ou de documento que certifique que esteja residindo em Portugal a mais de noventa dias, é disciplinado pelo Des- pacho n.º 25.360/2001, o qual dispõe que a prestação de cuidados de saúde ocorrerá mediante a cobrança da totalidade das despesas de saúde efetuadas. As situações abrangidas são as que põem em perigo a saúde pública, os cuidados urgentes e vitais, os cuidados materno-infantil e reprodutivos, os cuidados a menores – conforme o Decreto-Lei n.º 67/2004 –, a vacinação (nos termos do Programa Nacional de Vacinação vigente), cuidados aos estrangeiros em situação de reagrupamento familiar (quando alguém do seu agregado familiar realiza descontos para a Segurança Social), e aos cidadãos em estado de carência

39 As taxas moderadoras são valores mínimos cobrados do utente apenas para moderar o acesso dos serviços de saúde, suportados pelo Serviço Nacional de Saúde.

40 ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE (ERS), Acesso a Cuidados de Saúde por Cidadãos Estrangeiros, s/d, disponível em https://www.ers.pt/, [07.05.2018].

41 ADMINISTRAÇÃO GERAL DO SISTEMA DE SAÚDE, IP, Informação para obtenção de cuidados de saúde em Portugal por cidadãos estrangeiros, s/d, disponível em http://www2.acss.

socioeconômica, devidamente verificado pelo serviço de segurança social42. Vale

ressaltar que, relativamente aos menores em situação irregular, serão cobradas apenas taxas moderadoras, de acordo com o regime legal português43.

O imigrante nacional de país terceiro à União que não seja titular de auto- rização de residência ou que esteja em situação irregular pode solicitar à Junta de Freguesia da área de sua residência, que certifique que se encontra a residir em Portugal há mais de noventa dias, nos termos do artigo 34 do Decreto Lei n.º 135/99. Com este documento, é possível que os imigrantes tenham acesso ao Serviço Nacional de Saúde nas mesmas condições do cidadão nacional por- tuguês. No entanto, se não houver o título de autorização de residência, tam- pouco documento que comprove que o imigrante está residindo em Portugal a mais de noventa dias, as unidades de saúde, ao verificarem esta situação, prestarão determinados cuidados de saúde44, cobrando o valor total dos mes-

mos, encaminhando o imigrante, posteriormente, a um Centro Nacional de Apoio ao Imigrante (CNAI) ou a um Centro Local de Apoio à Integração dos Imigrantes, a fim de que procedam à regularização da sua situação45.

Entretanto, segundo a pesquisa MIPEX 2015, a documentação pode ser difícil para todos os pacientes imigrantes nos centros de saúde, bem como para os pacientes indocumentados obterem prova de insuficiência econômica. Os administradores têm discricionariedade para decidir se os pacientes refu- giados e os indocumentados devem pagar pelos custos dos procedimentos de saúde e se os indocumentados necessitam de cuidados de saúde urgentes46. Por

42 GEORGE, Francisco Henrique Moura, Acesso dos Imigrantes ao Serviço Nacional de Saúde, Circular Informativa n.º 12/DQS/DMD, Direção-Geral da Saúde, Ministério da Saúde, 07.05.2009.

43 ADMINISTRAÇÃO GERAL DO SISTEMA DE SAÚDE, IP, ‘Informação para obtenção de cuidados de saúde em Portugal por cidadãos estrangeiros’, Op. cit.

44 Os cuidados de saúde prestados ao imigrante irregular ou que esteja residindo em Portugal a menos de noventa dias se restringem a: Cuidados de saúde urgentes e vitais; doenças trans- missíveis que representem perigo ou ameaça para a saúde pública; cuidados no âmbito da saúde materno-infantil e saúde reprodutiva; Cuidados de saúde a menores que se encontram a residir em Portugal, nos termos definidos no Decreto-Lei n.º 67/2004; vacinação; cida- dãos estrangeiros em situação de Reagrupamento Familiar, quando alguém do seu agregado familiar efetua descontos para a Segurança Social; cidadãos em situação de exclusão social ou em situação de carência econômica comprovada pelos Serviços da Segurança Social. Cf. GEORGE, F. H. M., Acesso dos Imigrantes ao Serviço Nacional de Saúde, Circular Informa- tiva n.º 12/DQS/DMD, Op. cit.

45 Idem, ibidem.

46 HUDDLESTON; BILGILI; JOKI; VANKIVA, Migrant Integration Policy Index..., Op. cit., p. 29.

outro lado, todos os imigrantes titulares de autorização de residência podem se inscrever no Centro de Saúde ou Loja do Cidadão para obtenção do car- tão de utente do Serviço Nacional de Saúde (SNS) – o qual permite acesso a igual cobertura de saúde que dos cidadãos portugueses –, depois de residirem noventa dias em Portugal, nos moldes do Decreto-Lei n.º 198/95, alterado pelos Decretos-leis n.º 468/97 e n.º 52/200047.

Existem diversos meios e idiomas utilizados para informar todas as catego- rias de imigrantes sobre seus direitos, em especial sobre o acesso aos serviços de saúde, através do Alto Comissariado para as Migrações (ACM), dos Centros Nacionais de Apoio ao Imigrante (CNAI), Centros de Atendimento e Apoio ao Imigrante (CLAI) e ONGs de refugiados. Embora não existam normas específicas sobre competência cultural e linguística no sistema de saúde, as equipes de atendimento à saúde podem utilizar a interpretação gratuita via telefone e receber treinamentos ad hoc48. Os imigrantes beneficiários do Sis-

tema Nacional de Saúde também contam com um serviço intitulado “Linha Saúde 24”, o qual consiste no aconselhamento terapêutico para esclareci- mento de questões e apoio em dúvidas quanto a medicação e assistência em saúde pública, pelo canal telefônico 808 24 24 2449.

Dessarte, os cuidados de saúde equitativos para pacientes migrantes é um tópico específico em planos e estratégias de integração, mas não é uma prio- ridade para a política de saúde ou uma obrigação específica para todos os departamentos e prestadores de serviços portugueses50.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em razão da intensidade e amplitude dos fluxos migratórios, aliados a importância política que eles possuem, é possível concluir que vivemos numa era migratória. A globalização fez acentuar ainda mais o fluxo e diálogo entre culturas, no entanto, o medo da imigração, de ataques terroristas e o discurso de ódio, seguido da disseminação de estereótipos, estão aumentando a divisão entre

47 GEORGE, Acesso dos Imigrantes ao Serviço Nacional de Saúde, Circular Informativa n.º 12/ DQS/DMD, Op. cit.

48 HUDDLESTON; BILGILI; JOKI; VANKIVA, Migrant Integration Policy Index..., Op. cit., p. 29.

49 SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE 24, Quem somos: Serviços, s/d., Disponível em http:// www.saude24.pt/PresentationLayer/ctexto_00.aspx?local=18 [02.04.2018].

50 HUDDLESTON; BILGILI; JOKI; VANKIVA, Migrant Integration Policy Index..., Op. cit., p. 29.

os povos e formando um fenômeno nada sadio consubstanciado na predileção política para exclusão do outro. A história é uma arma eficaz contra a xenofobia e contra os discursos populistas atuais, eis que seguramente todos os países do mundo, em mais ou menos grau, foram beneficiados com as migrações, sobre- tudo na Primeira e Segunda Guerra Mundial. O respeito pelas diferentes cul- turas é essencial para a paz social, para uma sociedade menos beligerante e mais justa, no entanto, este é um processo contínuo, dependente da integração dos imigrantes nas respectivas sociedades de acolhimento, cujo fundamento apoia- -se no respeito pelos direitos humanos.

A União Europeia assumiu as migrações como parte da agenda política, impondo aos Estados-membros o dever de observar regras mínimas para a integração dos imigrantes. Entretanto, o discurso é sempre no sentido de restringir a entrada de imigrantes para proporcionar melhores condições de integração àqueles que já se encontram no país de acolhimento. Portugal vai além das regras estabelecidas a nível da União e tem sido considerado líder na Europa em questão de integração dos deslocados. É por tal motivo que a pesquisa MIPEX 2015 classificou Portugal em segundo lugar num ranking de trinta e oito países, em termos de integração de nacionais de países terceiros à União Europeia, só perdendo para a Suécia.

De modo geral, Portugal tem conseguido superar os inúmeros desafios que o novo cenário político, econômico e social do mundo globalizado impôs, sendo considerado um país favorável à integração dos imigrantes e exemplo a ser seguidos pelos demais países. No entanto, o Estado português é muito deficiente na questão de acesso a saúde dos imigrantes, cuja rede de atendi- mento não contempla igualmente todos os imigrantes. É excluído do direito ao pagamento de taxas moderadoras (que são dirigidas aos nacionais portugue- ses) o imigrante nacional de país terceiro à União, não abrangido por acordo bilateral, que não seja titular de autorização de permanência ou residência, de visto de trabalho em território nacional e que não possua documento que certifique que esteja residindo em Portugal a mais de noventa dias. Além disso, dados de relatórios nacionais e internacionais são categóricos em afirmar que os imigrantes ingressam em Portugal normalmente em boa condição de saúde, que é agravada conforme o tempo de residência no país. Portanto, a área da saúde deve ser um motivo de grande preocupação para o governo português, se este pretende manter o compromisso e objetivo de integrar plenamente os imigrantes na sociedade portuguesa.

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IMPRESSÕES INICIAIS SOBRE AS REPERCUSSÕES DA LEI