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Acolhimento da criança

No documento Escuta da criança na mediação familiar (páginas 76-79)

4.2 PROCEDIMENTOS DOS MEDIADORES NA ESCUTA DAS CRIANÇAS

4.2.4 Acolhimento da criança

Esta categoria, acolhimento da criança, possui uma freqüência oito –, quatro deles mediadores advogados e quatro psicólogos. Eles apontam, como um dos procedimentos necessários do mediador, a escuta da criança, a necessidade do acolhimento. Os principais pontos de vista dos entrevistados são: descontração, criar certa afinidade, conquista da liberdade de falar da criança; fazer da escuta menos intelectual e mais real/verdadeira; criar um ambiente onde a criança sinta-se protegida e segura, fique à vontade para falar o que sente; falar uma linguagem que ela possa entender; ter empatia, “boas energias”, sentimento de confiança, afinidade, tranqüilidade, manter um comportamento amigável, “ter jeito”; um ambiente propício para ouvir.

O acolhimento foi um procedimento posto como imprescindível para a escuta da criança. Esse aspecto é verificado nas seguintes falas dos entrevistados:

Primeiro, o acolhimento, descontração, descer daquele posto de adulto, se for preciso sentar no chão (P1); eu acho, sei lá, o que você quer saber é se eu crio um ambiente agradável, saudável, se eu crio uma relação se eu busco uma relação para criança, sim tento falar numa linguagem que seja uma linguagem que a criança possa entender (P3); eu diria que o posicionamento é o mesmo com os pais, estar ali demonstrando que não se toma partido, que a função dele é ajudar que o processo seja o menos doloroso possível e que as coisas aconteçam de uma forma mais rápida e tranqüila e que ele está ali para ouvir todos e não está ali para julgar e nem tomar partido, então essa postura daria tranqüilidade para as pessoas de colocar seus sentimentos, sabendo que não vão ser julgados e nem confrontados com o mediador; assim eles resolveram a situação bem

mais tranqüila, coisa que lá fora não conseguiriam e com a criança seria a mesma coisa, e então, o mediador é uma pessoa que está ali para ouvir o sofrimento (P4); muita preparação, entra cuidados, acolhimento, também o ambiente (P5).

Nesses relatos, percebe-se a correlação dos dados encontrados para realização da escuta na mediação familiar e das habilidades necessárias para efetivação do projeto DSD:

Para que os objetivos do projeto sejam alcançados com maior facilidade, importante é que o técnico entrevistador – assistente social ou psicólogo – facilite o depoimento da criança. Para isso, é desejável que possua habilidade em ouvir, demonstre paciência, empatia, disposição para o acolhimento, assim como capacidade de deixar o depoente à vontade durante a audiência (DALTOÉ CEZAR, 2007, p. 66).

Essa referência a respeito do papel do exercício pelo técnico, durante o DSD é semelhante ao procedimento sugerido pelos entrevistados, para a escuta da criança na mediação familiar: eu acho, sei lá, o que você quer saber é se eu crio um ambiente agradável, saudável, se

eu crio uma relação se eu busco uma relação para criança; sim tento falar numa linguagem que seja uma linguagem que a criança possa entender (P3); primeiro, o acolhimento, descontração, descer daquele posto de adulto, se for preciso sentar no chão (P1). Esses procedimentos

apontados pelos mediadores entrevistados são equivalentes aos descritos por Malhadas e Moraes (2004, p. 56), como funções principais de um mediador:

acolher os mediandos e outros participantes do processo; assegurar a existência e funcionamento de todos os itens e serviços de apoio (condições de conforto, acústica, climatização, etc.) [...] administrar a participação de todos os envolvidos, assegurando o bom andamento dos trabalhos, a manutenção da ordem, o respeito à integridade física e emocional, a livre expressão e outras afins.

As funções expostas acima são evidenciadas nestas falas: procuro criar essa empatia,

procuro me colocar no lugar deles e criar esse ambiente de harmonia, de paz e energias boa, me entrego. Então, quando escutei esse menino, eu senti um clima que ele estava vivenciando aquela história familiar, eu me entreguei mais ainda para essa criança no sentido de acolhê-lo, de acolher essa criança em todos os sentidos e de sentir confiança em mim como pessoa (A1) ou

ainda: então a minha atuação foi de entrega, de pura sensibilidade e de querer acolher, puro

acolhimento (A1).

As palavras acima trazem a correlação com a categoria anteriormente apresentada – sensibilidade – a qual teve igual freqüência a esta. Aqui por sua vez, encontra-se o acolhimento da criança como um dos procedimentos imprescindíveis para a boa escuta. Nesta categoria, mostra-se a correlação de se obter confiança, para maior êxito na escuta. A seguinte frase

exemplifica a necessidade de manter uma linguagem compatível com a da criança: vou ver se

consigo as melhores características, habilidade no trato com as crianças, essa habilidade a gente pode dividir em muito, no comportamento e na técnica, no comportamento é no saber se posicionar, no saber falar com a criança, chegar ao linguajar da criança, demonstrar um comportamento que seja amigável com a criança e com técnicas não de influência, técnicas para deixar a criança extremamente à vontade (A4).

Segundo Ávila (2004, p. 33), uma das qualidades de um mediador eficaz é a capacidade de entrar na relação, utilizando uma linguagem neutra, facilitando assim o estabelecimento da relação; além disso, deve haver a arte de saber bem resumir a situação, assegurando a todos os participantes a mesma compreensão dos fatos. Todos esses relatos enfatizam a linguagem, confiança e habilidades para deixar a criança à vontade. Tais características são comentadas na literatura e mostradas na prática, como algo necessário à boa escuta da criança.

Para os autores Andrade e Morato (2004) o acolhimento não são regras de condutas, estaria relacionado com o significado de ética: “ética se referiria mais propriamente à etimologia de éthos (que, originalmente, significava assento, morada), designando posturas existenciais e/ou concepções de mundo capazes de dar acolhimento assento ou morada à alteridade” (p. 346). Outros autores, como por exemplo, Lourenço, Lemes e Sequeira (2005) corroboram com a compreensão especificamente ao acolhimento do mediador com a família, inclusive com as crianças sendo consideradas sujeitos, com a seguinte afirmação: “cabe ao mediador entender o que se passa na família e qual o lugar que ocupam os indivíduos, sobretudo as crianças, fazendo um exame do sistema familiar, fortalecendo-o para que encontre o caminho da autonomia” (p. 15-16). Isso denota uma compreensão ampla acerca do acolhimento, a qual envolve a questão ética e uma visão sistêmica, atribuindo a necessidade de inclusão e acolhimento de todos os integrantes da família.

De acordo com o exposto, o acolhimento na mediação envolve a ética que, para Warat (2001), aproxima a mediação da holística, “a mediação e a holística têm em comum a procura de um ser integralmente ético, comprometido profundamente com o outro” (p. 71). Essa idéia de Warat que é a ética que se resolve no conflito está consistente com a visão sistêmica que esse acolhimento resultará na transformação dos vínculos rompidos ou adoecidos emocionalmente em vínculos saudáveis com o outro.

No documento Escuta da criança na mediação familiar (páginas 76-79)