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A AGRICULTURA FAMILIAR NO BRASIL: A NECESSIDADE DE UMA CARACTERIZAÇÃO

Agronegócio e a agricultura familiar no Brasil: conceitos

A AGRICULTURA FAMILIAR NO BRASIL: A NECESSIDADE DE UMA CARACTERIZAÇÃO

Na elaboração das políticas públicas, é fundamental saber quem são os seus destinatários finais. No caso da agricultura, não é diferente: saber quem são, como vivem, onde estão os agricultores familiares é fundamental para melhorar a eficiência das políticas destinadas a este público, otimizando, portanto, recursos públicos.

Figura 9.4: Saber quem são, como vivem e onde

estão os agricultores familiares é fundamental para melhorar a eficiência das políticas a eles destinadas.

Resposta Comentada

É bastante comum o agronegócio ser definido como a somatória das ativida- des ligadas direta ou à indiretamente produção do campo. Nesta definição, introduzem-se os conceitos de “antes da porteira”, “dentro da porteira” e “depois da porteira”, mas não se busca saber qual a tipologia do “dono da porteira”, ou seja, não há uma preocupação em saber as características inerentes à estrutura fundiária, que no Brasil é bastante concentrada. Uma visão alternativa a esta é entender o agronegócio como um modelo de desenvolvimento rural baseado na grande propriedade, ou seja, latifúndio, na monocultura, geralmente de commodities, com foco no mercado internacional. Estas duas formas de ver o agronegócio são bastante ilustrativas da dualidade de se pensar o desenvol- vimento rural no Brasil

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Na busca de critérios metodológicos para conhecer (ou dimensio- nar) a agricultura familiar no Brasil, alguns estudos mereceram destaque. Citaremos dois que, bastante complementares, nos ajudaram a avançar nos nossos objetivos propostos. O primeiro deles foi a publicação, pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), em 2000, do trabalho

Novo Retrato da Agricultura Familiar, a partir de um convênio de coo-

peração técnica entre o Incra e a FAO, sob coordenação do professor Guanziroli (UFF), que logo na sua introdução deixa claro que:

O debate sobre os conceitos e a importância relativa da “agri- cultura familiar” também é intenso, produzindo inúmeras concepções, interpretações e propostas, oriundas das diferentes entidades representativas dos “pequenos agricultores”, dos inte- lectuais que estudam a área rural e dos técnicos governamentais encarregados de elaborar as políticas para o setor rural brasileiro (MDA, 2000, p. 7).

A citação acima demonstra que, até pouco tempo, havia uma falta de consenso metodológico sobre como aferir a agricultura familiar. Até o censo de 1996, os dados disponíveis não permitiam uma separação entre o que poderia ser considerado agricultor familiar e o não familiar (isto só foi corrigido em 2006, como veremos mais adiante).

O trabalho do MDA definiu o universo familiar como aquele que atendia às duas condições: a primeira era que a direção dos trabalhos do estabelecimento rural fosse exercida pelo próprio produtor e a segunda, que o trabalho familiar fosse superior ao trabalho contratado. Definiu-se também uma área máxima para enquadrar a produção familiar, evitando assim que latifundiários fossem considerados produtores familiares. Esta área era variável de região para região. De modo ilustrativo, o Sudeste ficou com área máxima de 384 hectares e o Norte com 1.122 hectares.

Este trabalho foi importante, pois, partindo de sua metodologia própria, fez uma tipologia e uma caracterização dos agricultores fami- liares de modo a dar visibilidade, entre outras coisas, à renda, ao pessoal ocupado, aos principais produtos, à área média, ao grau de especialização e à integração destes agricultores com o mercado.

Economia Agrária | Agronegócio e a agricultura familiar no Brasil: conceitos básicos e debates

controversos

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FAO é a sigla em inglês

para a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura. Ela foi criada em 1945, contando atualmente com 191 países membros e trabalhando para a erradicação da fome e da insegurança alimentar. Como informação complementar, o atual diretor

geral da FAO (2013) é o brasileiro José Graziano da Silva, professor aposentado do Instituto de Economia da

Unicamp. O site da entidade no Brasil é https:// www.fao.org.br/

?

O segundo trabalho que destacamos, publicado em 2001, foi

Agricultura Familiar e Reforma Agrária no Século XXI. Neste trabalho,

aprofundando a metodologia do trabalho anterior, seus autores pude- ram, além de reforçar a importância da agricultura familiar, chegar à conclusão de que a reforma agrária no Brasil não estava fora da agenda das políticas públicas, pelo contrário. Segundo os autores:

É preciso ter claro que uma verdadeira reforma agraria tem como objetivo estratégico elevar a agricultura familiar à posição de protagonista do processo de geração e distribuição de riqueza no meio rural. [...] O fortalecimento da agricultura familiar e a reforma agraria devem caminhar para isso, na mesma direção, dando capa- cidade, ao meio rural e à agricultura, de expandir sua contribuição para o desenvolvimento nacional (GUANZIROLI, 2001, p. 251).

É óbvio que não foram apenas estes trabalhos que buscaram carac- terizar a agricultura familiar no Brasil, mas eles nos servem de exemplo para entender que – a partir de um vazio legal/institucional do que seja um agricultor familiar – existe uma dificuldade adicional em se pensar políticas públicas de desenvolvimento rural.

Este vazio legal/institucional foi preenchido quando o governo federal, por meio da Lei n. 11.326, de 24 de julho de 2006, estabeleceu os conceitos e princípios que passaram não apenas a nortear a formulação de politicas voltadas à agricultura familiar como também, e principal- mente, definiu o que seria, a partir de então, considerado um agricultor familiar. Em resumo, segundo a lei, o agricultor familiar é hoje definido como sendo aquele que atende, simultaneamente, aos seguintes requisitos:

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• Não detenha, a qualquer título, área maior do que quatro módulos fiscais.

• Utilize, predominantemente, mão de obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento. • Tenha renda familiar predominantemente originada de ativi- dades econômicas vinculadas ao próprio estabelecimento ou empreendimento.

• Dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família. O Censo Agropecuário de 2006, pela primeira vez, trouxe dados agregados exclusivos para a agricultura familiar. Levou-se em conside- ração para esta agregação a Lei n. 11.326, de 24 de julho de 2006. A partir destes dados, a importância da agricultura familiar pôde sair de um plano intuitivo para um plano mais concreto, com informações de qualidade e grande abrangência.

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