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CAPÍTULO I QUESTÕES DO APRENDER: CADA LUGAR NA SUA COISA

CAPÍTULO 4 A PRÁTICA TEATRAL COMO FORMAÇÃO ARTÍSTICA

4.2 ALGUMAS PRÁTICAS TEATRAIS EM ARACAJU

Aprender alguma coisa é uma atividade de apropriação de um saber que não se possui, mas “a escola não é o lugar do Eu singular, vivenciado e empírico, ela pretende ser lugar do Eu epistêmico, universal” (CHARLOT, 2013, p. 190).

A atriz Olga Gutierrez acredita que “um professor de teatro não ensina nada” (GUTIERREZ, 2013)46. Não creio que ela pretenda dizer que um professor não tenha nenhuma função na sua relação com o aluno. Seguramente ela se refere a sua própria prática artística. De fato, há uma diferença particular entre ensinar teatro e ensinar português, por exemplo. Porque ensinar teatro envolve imaginários e memória subjetiva, tanto do professor quanto do ator e, mesmo quando o professor transmite o conteúdo teórico, é também a prática do fazer teatral que trará o conhecimento teatral 46 GUTIERREZ, Olga Maria Silva. Atriz, dançarina e produtora cultural. Nesta tese, a autora se referirá à

para esse ator, em constante formação artística, uma vez que a arte teatral é dinâmica. Nesse sentido, o “não ensinar nada” referido por Gutierrez traduz essa ideia de que o ator dribla as estratégias do professor e apresenta um jeito próprio de atuar.

Mas é interessante lembrar que o conhecimento tem variadas origens e deve incorporar a ecologia dos saberes, como aconselha o sociólogo Muniz Sodré, quando se refere a reinvenção da figura do professor na perspectiva da diversidade (VENTURA, 2014, p. s/n). Porque, o que Sodré indica é que, em termos de conteúdo arquivado, o professor não é mais o único detentor do saber e vai precisar arquitetar uma função iniciática, no trânsito das linguagens humanas, acolher o enfoque pedagógico no lugar do aluno e no compromisso sócio-político com a seleção desses saberes.

De igual maneira, Moacir Gadotti lembra que o professor é um mediador do conhecimento e o aluno, sujeito da sua própria formação.

O aluno precisa construir e reconstruir conhecimentos a partir do que faz. Para isso o professor também precisa ser curioso, buscar sentido para o que faz e apontar novos sentidos para o que fazer dos seus alunos. Ele deixará de ser um lecionador para ser um organizador do conhecimento e da aprendizagem. O professor se tornou um aprendiz permanente, um construtor de sentidos, um cooperador, e, sobretudo, um organizador da aprendizagem (GADOTTI, 2005, p. 3).

O direito de aprender coisas é imbricado no próprio direito à educação, todavia nós só acessamos a atividade do aprender quando nos conectamos com alguma coisa que precisamos aprender e quando estas coisas fazem sentido para nossas vidas. Conhecer e aprender como processos "autopoiéticos" (MATURANA; VARELA, 1995), mobilizadores de um conhecimento humano, que nos faz reconhecer o passado, projetar o futuro e afirmar a realidade do nosso tempo histórico.

A percepção de Olga Gutierrez procede pois em seu discurso, ela chama a nossa atenção para algo que ela percebeu ao longo de sua trajetória, como atriz, diretora, dançarina e professora de teatro e dança.

Na verdade, professor é apenas um mediador, ele dá pautas para o aluno e, depois vai sondando por onde ele pode tirar alguma coisa. Mas é ele que tira e se ele não tem de onde tirar, por mais exercícios que o professor proponha, por mais criativo que o professor seja, ele não tem o que tirar. O talento existe e te serve para te apontar o caminho, tudo mais é trabalho. Não é apenas conhecer os teóricos do

teatro que vai te fazer atuar bem. É claro que toda formação teatral precisa de embasamento teórico, sobre o que já se fez em teatro e o que ele está pensando em fazer. A formação teórica é importante, porque quando você começa a fazer teatro, você acha que está inventando tudo, e a roda já foi inventada. É importante para a pessoa em formação, saber quem já fez teatro antes dela, o que já se pensou, o que já se discutiu e o que já se escreveu sobre o teatro. Mas é ela quem vai extrair as suas reais possibilidades do fazer teatral, inclusive através de exercício de estimulação. (GUTIERREZ, 2013).

De fato, esta transmissão do conhecimento humano e artístico remete a um imaginário de informações historicamente construído, inclusive a partir de uma formação não formal. Por isso, quando me refiro ao funcionamento das coisas ao meu redor, desde aqueles primeiros registros teatrais, quando eu observava a carpintaria teatral dos circos, eu me inquietava por uma busca de conhecimento teatral. Ali, eu estava diante de um conhecimento artístico em meio ao espaço dos saberes circenses que me eram transmitidos em sua prática metodológica oral.

Concordo com Gutierrez, à medida que defende se fazer necessário uma mobilização interna na prática artística do ator, para que, assim, ele possa desenvolver uma atividade teatral amparada pela sua estrutura de formação simbólica e pelo desejo de realizar a arte teatral. Essa mobilização interna, a propósito da relação com o aprender, é um tema que se acha nas ideias de Charlot (2013), o qual destaca a importância do conhecimento prévio dos alunos no cenário pedagógico, por parte tanto dos pesquisadores, quanto das escolas e seus professores.

O ator sergipano Márcio Aislan iniciou-se no teatro, no ano de 1995, no espaço do Centro de Criatividade, em um período em que quase nada sabia sobre esse universo, mas foi tocado pela novidade e pelo processo, “que abriu meus horizontes e a percepção

de vida e o teatro entrou em minha vida, eu devo muito ao teatro” (AISLAN, 2013)47.

Aislan conta, que naquele período, um carro de som circulava pelo bairro de Cirurgia convidando para os cursos de verão e inverno, que aconteciam no Centro de Criatividade.

47 SANTOS, Marcio Aislan dos. Ator. Nesta tese, a autora se referirá ao artista através de seu nome

Eu me inscrevi em um curso de inverno, na linguagem teatral, que seria ministrado por Luís Carlos Dussantus. Ele fazia aqueles trabalhos corporais e vocais, de aquecimento e desaquecimento, trabalhava com cantigas de música folclórica, para aquecer as partes do corpo e da voz e deixava a gente à vontade para improvisar. A preocupação dele era que a gente se desinibisse, e quebrasse os bloqueios. Ele sempre dizia que o lugar era ali. A base teórica dele era Stanislavski e dele se apropriava da frase emblemática, “o essencial é visível aos olhos. Vê mais longe quem vê com o coração”. (AISLAN, 2013)

Além do ator Luís Carlos Dussantus, em sua trajetória de formação teatral, Aislan aprendeu a fazer teatro com outros artistas do teatro sergipano, entre eles, destaca

Rivaldino Santos, que tinha uma técnica mais próxima da antropologia corporal, teatral e primitiva; Tetê Nahas, uma multiartista, ela consegue extrair tanta coisa da gente; Virgínia Lúcia, aquele teatro popular, de rua e Raimundo Venâncio, um grande artista de teatro de rua. Antigamente aprendia-se teatro praticando no ato do fazer teatral. Produzia-se muito, é verdade, porque, na prática, se trabalhava muito, montava-se muito trabalho de teatro de rua, de palco, circo, era tanta coisa. Mas era tudo de uma maneira mais intuitiva, como uma coisa assim, autodidata, cada um por si, era muito superficial, o que os professores passavam, a nível teórico, porque não se aprofundava muito a respeito de teoria. Lia-se muito pouco e hoje eu sei quanto é importante ter uma boa base de leitura. Hoje eu sei que, para eu ter uma boa formação teatral, eu preciso ter conhecimento de técnicas, assistir espetáculos, observando outros atores em cena, assistindo debates, fazendo aulas de práticas artísticas, de corpo, de circo, de improvisação, observar as pessoas na rua. Todavia, em minha prática teatral, com o Grupo Oxente, por exemplo, o grupo só se encontrava quando a gente ia montar ou para se apresentar. Era só decorar o texto e pronto, ir para cena, que era sempre na temática da Comédia de Costumes. Nós montávamos as peças de Ariano Suassuna, que eu adoro e acho muito próximo ao povo sergipano, na questão dos ritos, na linguagem nas anedotas, no humor simples. Mas o Grupo Oxente não desenvolveu uma pesquisa estética, a rigor, não havia uma rotina para trocarmos experiências ou outra discussão mais necessária. (AISLAN, 2013).

Também André Santana pertenceu ao Grupo Teatral Oxente, que ainda tinha no elenco os atores “Edmilson Suassuna, Rose Ribeiro, Ana Maria e Márcio Aislan”

(SANTANA, 2013) 48. Ele revela que a sua experiência no grupo teve um caráter

48 SANTANA, André Luís de Jesus. Ator e produtor cultural. Nesta tese, a autora se referirá ao artista

puramente comercial, uma vez que o grupo não se encontrava “fora dos espetáculos, não havia nenhuma pesquisa estética coletiva. A gente só se encontrava para fazer as apresentações, apesar de até termos conseguido ter uma sede, no bairro Médici, em Aracaju” (SANTANA, 2013).

O grupo não tinha um diretor, “uma vez tivemos uma experiência com Lindolfo Amaral, que foi convidado para dirigir O Santo e a Porca, texto de Ariano Suassuna” (SANTANA, 2013). O ator revela que os figurinos foram desenhados pela artista plástica Marjorie Garrido, o cenário por André Giordino e o trabalho de corpo e voz ficou sob a orientação da atriz Tetê Nahas.

O depoimento do ator Gustavo Floriano revela outro aspecto interessante da formação teatral, a maturidade cênica e, especialmente, a maturidade humana, porque elas irão permitir ao ator em formação as devidas decodificações artísticas e, assim ele vai poder fazer seus próprios cruzamentos do aprender a fazer teatro.

A primeira oficina que eu participei, com o ator Luiz Carlos Dussantus, ainda no Centro de Criatividade, eu ainda era muito imaturo. Ele falava em Stanilavski e aplicava suas técnicas de construção de personagem, porque a oficina era mais voltada para a iniciação teatral, muito na estética do improviso e do naturalismo. Não havia uma relevância sobre os outros aspetos da cena teatral, como o figurino, a maquiagem, etc. Quando eu fui fazer o curso de teatro com a atriz Tetê Nahas, ela já desenvolvia uma estética na linha da Antropologia Teatral, de Eugênio Barba, algo muito diferente do que eu tinha experimentado com Dussantus. E eu não absorvi, como deveria, por conta da minha inexperiência. A metodologia de Nahas se amparava numa bateria de exercícios, laboratórios corporais, música instrumental, experimentação com os sentidos e alimentos, bastões e muito trabalho de corpo, para liberar os bloqueios. Ela rompia o espaço da caixa cênica. Era um aquecimento muito forte e era daí que se criava toda a movimentação cênica, a partir do corpo (SANTOS, 2012) 49 .

Ele se refere a um trabalho teatral em que a memória é trazida pela exaustão do corpo, não pelo entendimento da imaginação criadora, como sugere Stanislavski em seu sistema de construção do personagem. Esse interesse de investigação teatral, pelo corpo, era muito comum, sobretudo, a partir da década de 1970, quando os artistas conheceram as pesquisas e as obras de Eugênio Barba, Peter Brook, Antonin Artaud,

49 SANTOS, Gustavo Floriano dos. Diretor Teatral, ator e professor de teatro. Nesta tese, a autora se

Grotovski, entre outros pensadores, que desconstruíram o pensamento teatral, de um teatro realista que era encenado até então. Inclusive, a própria Tetê Nahas é discípula de Bosco Scafs, um ator e diretor sergipano

Luiz Carlos Dussantus defende que Scafs “trouxe uma experiência de vanguarda teatral para Aracaju. Eram espetáculos belos, inquietantes, com muita cor, muito som,

muito trabalho de corpo e imagens incríveis” (SANTOS, 2012)50. Uma estética que

primava pelo corpo, como base de seu trabalho, pois quase não havia texto, eram mais ações físicas, imagens e planos no espaço. Dussantus alerta que outro trabalho teatral desenvolvido na cidade, “muito similar ao realizado por Scafs era o que Valfran de Brito vivenciava com seu Grupo Teatral Corpo. Valfran foi meu primeiro mestre teatral” (SANTOS, 2012). Dussantus conta que, em 1979, o Grupo Corpo montou a peça Catarse, tendo no elenco, também as atrizes “Lindi, Dinha e Vitória Barreto” e, em seu processo de direção, Brito utilizava uma metodologia que levava em conta a necessidade do ator se colocar à disposição da personagem.

Ele dizia que não podíamos ter medo nem preconceito com o corpo, nosso e o corpo do outro, que era preciso experimentar e ousar. Creio que isso se dava, especialmente por causa do movimento hippie, porque fazíamos muito trabalho de corpo, com aquelas pirâmides enormes e aquelas máquinas corporais, ao som de Pink Floyd, Janis Joplin, que ele usava muito, principalmente a música Summertime, para os momentos de relaxamento (SANTOS, 2012).

Eclético, além do Grupo Corpo, Valfran de Brito construiu uma longa história com a pesquisa cultural sergipana, talvez pela sua formação em História, na UFS, mas o certo é que, por conta dessa vivência, foi acolhido por essa vertente artística. No final dos anos de 1970, ainda estudante da universidade criou o Grupo de Teatro Experimental, junto a Antonieta Santos e César Macieira, tendo, como convidado, o diretor Bosco Seabra.

50 SANTOS, Luiz Carlos Alves dos. Diretor de teatro, ator, radialista e produtor cultural. Nesta tese, a

autora se referirá à artista através de seu nome artístico: Luiz Carlos Dussantus. Entrevista concedida em 25.10.2012.

O ator e produtor cultural Tadeu Machado (FARIAS, 2013)51 conta que Seabra era professor de português e Organização Social e Política Brasileira/OSPB do Colégio Salesiano e dirigia jograis, com suas alunas e a presença de atores convidados. Em muitas dessas encenações, Machado foi um dos seus atores convidados e, por conta desse conhecimento, Seabra o convidou para que ingressasse no Grupo Teatral Expressionista, do qual ele fazia parte, “um grupo que pertencia a Clodoaldo Alencar e Aglaé Fontes, que não era um grupo da Universidade, mas como Clodoaldo e Aglaé eram professores da UFS as pessoas confundiam” (FARIAS, 2013), explica, acrescentando, ainda que Seabra era “uma figura polêmica, dramática, shakesperiana, e uma pessoa muita culta” (FARIAS, 2013). De igual maneira, o ator Cica também destaca que Bosco Seabra “era um cara muito centrado, muito técnico” (ALCIDES CICA, 2013). Por isso, Valfran de Brito, Antonieta Santos e César Macieira o convidaram para que dirigisse o Grupo Experimental.

Brito participou igualmente do Grupo de Dança Caçuá, ao lado de “Antonieta, Mariano Antonio, Nildete e Augusto Barreto” (BRITO, 2012), o qual se apresentava com as danças do Guerreiro, sob a coordenação de Mestre Euclides, líder do Guerreiro Treme Terra e do Reisado, orientados por Dona Alzira, moradores do bairro de Cirurgia.

Em 1975, fez parte da equipe do historiador Luís Antonio Barreto, na Assessoria Cultural, que era ligada à Secretaria de Educação, uma vez que ainda não havia a Secretaria de Cultura do Estado de Sergipe. Entre diversos projetos realizados, na área da cultura popular, participou da criação do Encontro Cultural de Laranjeiras, idealizado por Barreto. No Iº Encontro Cultural, houve a inusitada apresentação dos grupos de brincantes, embaixo de uma lona de circo, pois ameaçava chover. Valfran de Brito lembra que “Nós movimentamos todos os grupos folclóricos do estado” (BRITO, 2012)52.

Brito se apresenta como um sujeito que gosta de vivenciar as questões artísticas e pedagógicas: “Eu nunca planejei nada, nunca solidifiquei nada, tudo foi acontecendo e

51 FARIAS, Tadeu Machado de. Ator e produtor cultural. Nesta tese, a autora se referirá ao artista através

de seu nome artístico: Tadeu Machado. Entrevista concedida em 21.11.2013.

52 BRITO, José Valfran de. Historiador, diretor de teatro, ator, dançarino e professor de teatro. Nesta tese,

a autora se referirá ao artista através de seu nome artístico: Valfran de Brito. Entrevista concedida em 26.10.2012.

eu só faço as coisas por prazer e pelas quais eu tenho paixão” (BRITO, 2012). Talvez aí resida a mesma paixão que o fazia, ainda criança, assistir aos espetáculos de circo que eram armados próximos à rodoviária velha, no centro da cidade, naqueles idos dos anos de 1950/1960. Ao falar sobre o seu fazer teatral ele atesta que é possível

Transformar alguma coisa em teoria, mas preciso experimentar antes, claro. Uma peça é uma pesquisa, uma peça é uma tese artística. A teoria é relevante, mas eu não gosto de ficar citando teoria. Eu a descontruo na minha prática artística, porque eu quero saber o que a minha prática apresenta. A questão pedagógica deve se estabelecer na troca, não como costumamos observar, se eu tenho o conhecimento eu vomito ele em você, é mais um passo à frente. Eu faço e eu aprendo, porque as pessoas se afetam mutuamente. O processo está implícito e acontece. O próprio curso de pedagogia tem muita dinâmica, mas elas são insuportáveis, principalmente porque elas são esvaziadas de sentido artístico Elas só existem para liberar fisicamente, geralmente do estresse, como se fosse um momento de lazer, mas o pensamento com arte é só para aquelas datas comemorativas, então não vale (BRIT0, 2012).

A atriz gaúcha Mirna Spritzer entende que, na formação do ator, há um diálogo de ações. Eis a ideia sobre a conscientização do fazer teatral.

O ator só cresce na relação com o outro, no confronto com outras ideias, na comparação com o que se fez antes, no dia-a-dia do ofício, do ensaio, do exercício, do esboço, do erro. Ao interagir com seus pares, o ator exercita a disponibilidade, a capacidade de ouvir, de improvisar e de contracenar. O que é essa contracenação senão parceria? (SPRITZER, 2007, p. 9)

Seu questionamento agrega o olhar de Valfran de Brito, quando ele sugere descontruir qualquer possibilidade pré-estabelecida de engessamento artístico, pois que ela defende que “é na conscientização do fazer que se torna possível a construção de um processo. Na disciplina do exercício, da discussão e do autoconhecimento o ator vai se revelando e criando o seu próprio método.” (SPRITZER. 2007, p. 9).

Uma formação informal, apropriada como metodologia de observação, também é verificada no fazer teatral de Luís Carlos Dussantus. Esse relata que sua formação teatral se deu de maneira intuitiva, principalmente porque o processo de concepção dos espetáculos que ele participou, em sua trajetória, era viabilizado, considerando as

habilidades individuais dos sujeitos do grupo. Se alguém no grupo entendia ou tinha mais aptidão para maquiagem, então seria o maquiador. “O diretor dirigia, mas sem uma linha estética definida a priori. Não havia discussão intelectual nem estética sobre a peça. Éramos todos autodidatas”. (DUSSANTOS, 2012).

De toda maneira, em seu discurso, podemos observar uma visão que valoriza não as possíveis carências dos grupos teatrais, comparadas a outras situações de abundância artística, mas afirmava as potencialidades de cada um, o que inclusive legitima um comprometimento de cada artista dentro do grupo. Algo muito próximo do processo colaborativo vivenciado por muitas companhias teatrais brasileiras, sobretudo nos anos de 1980 e 1990, após as experiências de criação coletiva da década de 1960 e 1970.

Dussantus revela que sua ação cultural pode ser caracterizada como a de um oficineiro, sua característica mais particular.

Eu sempre dei oficina, tanto em Aracaju quanto nas cidades do interior, e sempre surgiram, a partir dessas oficinas, muitos atores e grupos teatrais. Em minha metodologia de formação artística, eu não passo nenhuma técnica especifica, eu relato a minha experiência com o teatro. Porque eu fui aprendendo teatro, normalmente, e tudo ficou registrado em mim. Quando eu estou nas oficinas de teatro, eu vou fazendo as coisas, de acordo com o que eu sinto necessidade. Isso não é nenhuma porralouquice, é claro que tudo isso é resultado de tudo que eu vivi. Mas eu crio meu método e meu processo. Na verdade, eu nunca quis ter uma estética definida. Minha formação teatral foi dispersa, era uma oficina aqui, outra ali, era tudo muito solto, não havia uma regularidade de cursos para a formação teatral. Porém o teatro é uma arte democrática e uma arte do divã, ela nos proporciona o espaço para soltarmos nossos bichos. Porque ele lhe dá uma ousadia, uma força e a possibilidade de exercer a atividade artística mais completa de todas as artes. O conhecimento teatral é de uma potência absurda sobre o ator. Eu me identifico muito com Stanislavski, pela questão do autoconhecimento que ele provoca e Augusto Boal, pelo teatro de libertação que ele promove. Eu me