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Contribuições Intelectuais para a formação não formal

CAPÍTULO I QUESTÕES DO APRENDER: CADA LUGAR NA SUA COISA

1.2 O CONTEXTO DA EDUCAÇÃO INFORMAL, FORMAL E NÃO FORMAL

1.2.1 Contribuições Intelectuais para a formação não formal

Sobre a questão dos conceitos e das práticas da educação não formal, constatamos as contribuições de Cortella (2007, p. 47), Libâneo (2005, p. 95), Jussara Vital (2009) e Gadotti (1998, 2005, 2009), que se debruçaram sobre o estudo das formalidades e informalidades escolares, das interpenetrações entre o escolar e o extraescolar, as necessidades especiais, da educação não formal como mais difusa, menos hierárquica e menos burocrática do que a educação formal.

Além disso, podemos elencar, conforme os estudos de Gohn, alguns autores que trata da educação não formal, de modo que se aproximam ou se distanciam em suas percepções conceituais. Jaune Trilla (1996, 2008), um referencial dos anos de 1990 defendia a educação não formal como uma oposição à educação formal em seu modo formal de trabalhar os processos escolares, esses organizados por normas e procedimentos preestabelecidos.

Posteriormente, Almerindo Janela (1989, 2006) sugeriu o termo “não escolar” e, ao lado de Afonso (1989, p. 90), Cortella (2006, 2007) e Brennan (1997), argumentou que a educação não formal deveria atuar ao lado da educação formal, como acontece com as atividades extraescolares, em outro turno que não o estabelecido pela educação formal. No caso de Brennan, até mesmo sinalizando a educação não formal como a estratégia ideal para “conter” os alunos insubordinados ou rebeldes, uma espécie de educação alternativa.

No passado, a perspectiva da Educação de Jovens e Adultos/EJA já foi vinculada ao conceito de educação não formal, assim como também a Educação Popular, sendo que Gohn, não concorda particularmente, a respeito da segunda associação já que, segundo ela

A educação não formal não tem recorte de faixa social. Ao nominar uma modalidade como Popular, estou fazendo alusão a categoria povo – em sentido genérico ou específico – camadas desfavorecidas socioeconomicamente; ou estou contrapondo um dualismo – haveria uma educação popular e uma das elites ou classes ou camadas mais abastadas. Nos dois sentidos, estarei fazendo um recorte socioeconômico. E postulo, neste livro, que a educação não formal deve ser vista também pelo seu caráter universal, no sentido de

abranger e abarcar todos os seres humanos, independentemente de classe social, idade, sexo, etnia, religião, etc (GOHN, 2010, p. 25).

Educação Social é uma categoria apresentada por Pérez (1999), o qual pensa a aprendizagem como possibilidade alternativa à escola, uma vez que ela, sendo menos rígida e formal, poderia oferecer respostas às novas ações da educação contemporânea.

Outras práticas educativas solidárias foram postas para se pensar educação não formal, Poster e Zimmer (1995) elegeram o termo Educação Comunitária, aquela que fez a releitura das primeiras intenções pedagógicas sobre as comunidades em situação de vulnerabilidade ou exclusão social. E, de igual modo, em Groppo (2006), com a nomenclatura de Educação Sociocomunitária, uma espécie de cruzamento entre as ideias contidas nas propostas da Educação Social e da Educação Comunitária, mas ressaltando as distintas lógicas sociais que interagem com as práticas educativas, sob a inspiração de M. Burber (1987), para pensar a educação sociocomunitária.

A Educação Permanente ou Educação para a Vida foi ressignificada por Pierre Furter (1976), que a fez cruzar satisfatoriamente com uma perspectiva cultural, mas, em si, a educação permanente tem sua própria identidade, em oposição à educação não formal, a qual defende a “emancipação e autonomia dos indivíduos, vistos como sujeitos do processo de construção de saberes e do próprio processo de conhecimento, é algo fundamental”. A educação não formal também se viu atrelada à Educação Continuada, outra modalidade pedagógica inspiradora da atualização pós-profissional, inclusive aliada ao crescimento das Novas Tecnologias.

A Educação Integral, apesar do seu nome sugerir propostas mais articuladas com a diversidade das dimensões filosóficas da nossa vida, na verdade, foca seus interesses no ambiente escolar e tem defensores de que a educação escolar formal pudesse gerenciar, em seu âmago, as características da educação formal e também não formal. Para essa proposta pedagógica, o que importa é o Projeto Pedagógico da Escola e Formação dos professores. Porém, ela não conseguiu projetar “uma grade curricular que forme para a vida, a partir da cultura, das experiências e vivências, tendo em vista a burocratização dos sistemas de ensino escolar/formal” (GOHN. 2010, p. 29).

A presença da Educação Social, orientada pela Pedagogia Social, foi outra modalidade pedagógica em oposição a educação não formal, e se constituiu a partir das referências de Platão, Comenius, Pestalozzi, entre outros (MACHADO, 2008;

LUZURIAGA, 1993), influenciados pela ação caritativa do cristianismo. E, igualmente, na perspectiva das metodologias de socialização do sujeito e do universo do trabalho e das configurações socioeconômicas de se gerar emprego e renda.

A concepção política da educação não formal dialoga com a democratização do conhecimento e da gestão e do acesso à escola, valores defendidos pela Educação Cidadã, mas se projeta além disso, a uma especificidade de formação de cidadãos que aponta outros encaminhamentos sobre a diversidade de categorias de aperfeiçoamento da sua própria humanidade. Assim

Chegamos portanto ao conceito que adotamos para educação não formal. É um processo sociopolítico, cultural e pedagógico de formação para a cidadania, entendendo o político como a formação do indivíduo para interagir com o outro na sociedade. Ela designa um conjunto de práticas socioculturais de aprendizagem e produção de saberes, que envolve organizações/instituições/atividades, meios e formas variadas, assim como uma multiplicidade de programas e projetos sociais (GOHN, 2010, p. 33).

Se a educação não formal tem campo próprio e intencionalidade, sua fundamentação se propõe à formação para a cidadania e emancipação social dos indivíduos

Mas a educação não formal é uma área que o senso comum e a mídia usualmente não vêm e não tratam como educação porque não são processos escolarizáveis. A educação não formal é um campo que vem se consolidando desde as últimas décadas do século XX e a explicação para este fato advém das mudanças e transformações ocorridas na sociedade neste período, especialmente com a globalização. Progressivamente inúmeras mudanças de valores e práticas sociais foram se implantando no mundo do trabalho; as novas tecnologias mudaram a cena da vida cotidiana dos indivíduos no plano doméstico e fora dele, com os celulares, internet e outras formas de comunicações. O setor do consumo ampliou-se para todas as camadas sociais, segundo as proporções de cada classe ou segmento; as estruturas e as relações familiares se alteraram, etc. Tudo isso tem gerado novas demandas e novas necessidades educacionais (GOHN, 2010, p. 34).

Pensando sobre o caráter educativo dos pressupostos contidos nos movimentos sociais e, ainda, em diferentes práticas de associação coletiva, é conveniente considerar que a educação não formal é a categoria central de trabalho de um educador social. Este,

ao colocar-se a serviço do contexto, tanto para os processos de construção de aprendizagens quanto para os saberes coletivos, revela interessantes dimensões humanas. Uma delas é a aprendizagem política dos direitos de todo cidadão. Além dessa, podemos considerar o desenvolvimento das habilidades e potencialidades de cada indivíduo com vistas ao mundo do trabalho, a aprendizagem e exercício de práticas com ênfase nos objetivos e soluções de problemas coletivos cotidianos, o cuidado com a aprendizagem de conteúdos que promovam aos sujeitos uma leitura do seu entorno e do mundo e, ainda, a formação oriunda do universo virtual.

Há na educação não formal uma consciência política que conduz ao trabalho coletivo e viabiliza aos indivíduos uma formação que leva em conta, principalmente, o exercício da cidadania, seguramente influenciada em princípios de igualdade e justiça social e, além disso, considera de modo especial o conhecimento que é trazido pelos sujeitos do grupo e sua interação com os outros parceiros sociais e suas alteridades. Essa educação interativa se configura e se materializa no fazer das ações educativas, pois são os processos sociais que dão forma ao processo educativo.

A educação não formal não se preocupa, fundamentalmente, em agrupar o participante por séries/idade/conteúdos, etc, porque ela se interessa é pela formação da cultura política, a qual podemos observar na atenção dirigida à subjetividade dos indivíduos inseridos no contexto e à construção de vínculos de pertencimento, na identidade coletiva e em valores, tais como solidariedade, dignidade humana e interesses comuns que expressam uma cidadania grupal.

Ela prepara os indivíduos para as variadas possibilidades de leituras sobre o mundo e provoca a construção interativa no processo educativo, pois que “a transmissão de informação e formação política e sociocultural é uma meta na educação não formal. Ela prepara formando e produzindo saberes nos cidadãos” (GOHN, 2010, p.19) e aperfeiçoa o ser humano pelo viés da contramão da barbárie, do egoísmo, do individualismo e de tantas circunstâncias nefastas a uma convivência pacífica entre os indivíduos. E, de toda maneira, nas relações sociais fundamentadas em princípios de igualdade, justiça social e cidadania.

Gohn garante que a educação não formal tem poder para viabilizar possíveis desdobramentos pedagógicos, entre eles.

A consciência e organização de como agir em grupos coletivos; a construção e reconstrução de concepção (s) de mundo e sobre o mundo; a contribuição para um sentimento de identidade com uma dada comunidade; forma o indivíduo para a vida e suas adversidades (e não apenas capacita-o para entrar no mercado de trabalho); quando presente em programas com crianças ou jovens adolescentes a educação não-formal resgata o sentimento de valorização de si próprio (o que a mídia e os manuais de auto-ajuda denominam, simplificadamente, como a auto-estima); ou seja dá condições aos indivíduos para desenvolverem sentimentos de autovalorização, de rejeição dos preconceitos que lhes são dirigidos, o desejo de lutarem para de ser reconhecidos como iguais (enquanto seres humanos), dentro de suas diferenças (raciais, étnicas, religiosas, culturais etc.); os indivíduos adquirem conhecimento de sua própria prática, os indivíduos aprendem a ler e interpretar o mundo que os cerca (GOHN, 2014, p. s/n).