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Alguns fatores apontados pela Igreja no Brasil que favorecem o aborto

2.1 Cultura de morte

2.1.1 Alguns fatores apontados pela Igreja no Brasil que favorecem o aborto

Igreja Católica em defesa da vida humana frente as mais diversas ameaças, como por exemplo, o aborto. Em seus muitos pronunciamentos, verifica-se tamanho empreendimento para levar a termo a missão de Cristo, que sempre foi em favor da vida humana: “É missão da Igreja anunciar Jesus Cristo, que venceu a morte para conquistar-nos a vida.”206

A defesa da vida tornou-se um princípio sempre assumido pela Igreja católica do Brasil, e isto se pode verificar na Conferência dos Bispos reunidos constantemente em Assembleia Geral, que tem sido verdadeiramente uma bandeira levantada em prol da vida humana em todas as suas etapas, inclusive desde a concepção. A Igreja do Brasil tem, frequentemente, se dirigido aos fiéis cristãos e a toda a sociedade, no intuito de conscientizá- los sobre a prática largamente difundida do aborto. “Estimam em milhões os abortos provocados por ano no Brasil. Multiplicam-se as clínicas da prática do aborto. Isso constitui forte interpelação à nossa sensibilidade humana e consciência cristã.”207

Os bispos fazem um levantamento sobre as causas, que acabam levando as mulheres à opção do aborto, que dentre estas causas, apontam os fatores de natureza socioeconômica, isto

      

204 MIRANDA, Gonzalo. “Cultura della morte: analisi di un concetto e di un dramma.” In: PONTIFICIA ACCADEMIA PER LA VITA. Commento Interdisciplinare Alla Evangelium Vitae, p. 233.

205 Idem, p. 234.

206 CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. Pronunciamentos de 1988 a 1989 da 27ª

Assembleia Geral (1989). “Um novo sim à vida.” Itaici, São Paulo, 14 de abril de 1989, p. 1. Disponível em: www.cnbb.org.br. Acesso em: 14 de março de 2010, 14:25.

é, colocando o fator econômico acima do fator social, considerando a política de produção, de exportação e lucrativa muito mais importante do que o ser humano na sua dignidade. É o caso das indústrias, que estão por detrás incentivando o uso dos métodos anticoncepcionais, e, que, por sua vez, são abortivos.

Outro fator é o crescente êxodo do meio rural para o meio urbano por falta de reforma agrária mediante a concentração fundiária. Este êxodo descontrolado contribui para a miséria urbana impossibilitando condições aptas a uma vida familiar digna. Neste sentido, favorece o aborto quando mães desempregadas não podem dar a devida assistência aos seus filhos, como também a não aceitação de mulheres gestantes empregadas.

Ainda sobre os fatores, que agem como causa do aborto, pode-se citar os fatores sócio- culturais, sobretudo a grande crise de valores, que tem marcado a sociedade; a falsa ideia, propagada por parte de um feminismo exacerbado, que defende o direito da mulher sobre o próprio corpo; o forte crescimento da imoralidade e da permissividade estimulada pelo mau uso dos meios de comunicação social, especialmente a televisão, acessível para quase todos os brasileiros.

No que diz respeito aos fatores sócio-religiosos, pode-se apontar a falta de fé que seja assumida e vivida de uma maneira coerente por aqueles, que dizem professar tal fé. Fé, esta, que está sempre a favor da vida. Como também pode-se assinalar a perda do sentido ético e moral já presente no coração humano desde o seu nascimento, que chama-se de lei natural – faça o bem e evite o mal. E a ausência de um ambiente familiar, que seja marcado pelos valores cristãos para o nascituro.

A cultura da morte nos desafia. Com tristeza humana e preocupação cristã, somos testemunhas das campanhas antivida, que se difundem na América Latina e no Caribe, perturbando a mentalidade do nosso povo com uma cultura da morte. O egoísmo, o medo ao sacrifício e à cruz unidos às dificuldades da vida moderna geram rejeição do filho que não é responsável e alegremente acolhido na família, mas considerado como agressor. Atemorizam-se as pessoas com um verdadeiro ‘terrorismo demográfico’ que exagera o perigo que pode representar o crescimento da população frente à qualidade de vida.208

A falta de maturidade psíquica e espiritual no casal que se deu em prática sexual sem levar em consideração as consequências que tal ato poderia resultar para ambos, os leva, em muitos casos, a optar pelo aborto. A escolha pelo aborto é ainda mais reforçada quando a

      

208 CONFERÊNCIA EPISCOPAL LATINO-AMERICANO E DO CARIBE. Santo Domingo, n. 219. In:

gestante é abandonada pelo seu parceiro e que se encontra em meio a dificuldades econômicas para assumir aquela gestação e, posteriormente, o bebê.

Nesse sentido, ao lado de tantos fatores que acabam levando à prática do aborto, verifica-se ainda uma crise do amor como consequência de uma crise da própria sexualidade, quando aquele é reduzido somente ao sexo.209 O amor entre um homem e uma mulher não pode consistir somente na prática sexual, pois, seguindo esta linha de raciocínio, o amor estará sendo anulado em proveito do prazer carnal. O amor deve ser caracterizado pelo dom recíproco e por uma pertença recíproca das pessoas. “O amor faz com que o homem se realize através do dom sincero de si: amar significa dar e receber aquilo que não se pode comprar nem vender, mas apenas livre e reciprocamente oferecer.”210 E o fruto desta união é a sua recíproca pertença

nas relações sexuais, que o Magistério Católico chama de relações conjugais.

Contrariamente às opiniões que consideram o problema sexual dum modo superficial e vêem a ação do amor apenas no abandono carnal da mulher ao homem, é preciso pelo contrário, ver aí o dom recíproco e a mútua pertença de duas pessoas. Não um prazer sexual recíproco em que um abandona o seu corpo ao outro para que ambos experimentem o máximo de voluptuosidade sensual, mas precisamente um dom recíproco e uma pertença recíproca das pessoas.211

A relação que deve existir entre o casal, que assume a responsabilidade mútua e pela procriação como fruto do amor autêntico de doar-se e receber, é sustentada pela plena consciência que um tem do outro como pessoa humana. Até mesmo, em se tratando de uma relação estável entre o casal, a escolha da pessoa amada deve ser feita não somente embasada nos valores sexuais, mas acima de tudo nos valores da pessoa, uma vez que os valores sexuais podem sofrer mudanças e até desaparecer, ao passo que o valor essencial, isto é, o da pessoa, permanece sempre.212

Subjetivamente, o amor é sempre uma situação psicológica, um estado psíquico provocado por valores sexuais e que gira à volta deles no sujeito ou nos sujeitos que o experimentam. Objetivamente, o amor é um fato interpessoal, é reciprocidade e amizade fundadas numa comunhão no bem, é

      

209 Cf. RUSSO, Giovanni. Bioética em diálogo com os jovens. Lisboa: Paulus, 2010, p. 20. 210 DSI 221.

211 WOJTYLA, Karol. Amor e Responsabilidade. Moral sexual e vida interpessoal. Braga-Portugal: Editora A.O., 1979, p.116.

portanto sempre uma união de pessoas que pode tornar-se pertença recíproca.213

Falar de valores sexuais dentro de um relacionamento interpessoal como motivo único ou mesmo principal, não se poderia falar de escolha da pessoa entendida segundo o que ela é em si mesma, mas somente da escolha do sexo oposto representado meramente por um corpo concebido como objeto de gozo.

A Igreja do Brasil, quando se pronuncia a favor da vida, e neste caso especificamente contra o aborto, é imprescindível falar que, ela não está fazendo uma apologia somente em defesa do embrião ou do feto humano, que está sendo gerado no útero materno, mas a Igreja também está voltada para a própria dignidade da gestante, “tantas vezes marginalizada e instrumentalizada, que se torna, no caso do aborto, não apenas sujeito, mas também objeto de profunda agressão física e psicológica, gerando-se nela forte sentimento de culpa.”214

O Dr. Edgar Hernández Gálvez, médico cirurgião e especialista em Psiquiatria e Psicologia pela Faculdade de Medicna da Universadade de Navarra na Espanha comenta que, nos casos de aborto provocado, surgirão, frequentemente, efeitos psicológicos nas mulheres. No entanto, o tempo em que esses efeitos surgirão dependerá do tipo de conflito vivenciado pela mulher, de modo que, se tal conflito for consciente, as consequências surgirão imediatamente após o aborto, e se for inconsciente, surgirão meses ou até anos depois. Esse conjunto de sintomas é chamado de “síndrome pós-parto” e que pode ser vivenciado pela mãe, pelo pai e pela equipe de saúde que o realizou. Entre esse conjunto de sintomas, verifica- se a depressão, o isolamento, a angústia, a ansiedade, um grande sentimento de culpa, somatizações de caráter autopunitivas em que a mulher transfere para o próprio corpo a angústia e a culpa que sente, adoecendo, por exemplo, de gastrite, falta de ar, taquicardia, câncer no útero etc, insônia e pesadelos noturnos, raiva e agressividade em relação à equipe de saúde, irritabilidade e explosões de ira, dificuldade para se concentrar, perda de interesse pela relação sexual, como também frigidez (relação sexual de prazer e sem alcançar o orgasmo), a dispaurenia (relação sexual com dor), o vaginismo (a vagina se fecha e não é possível a penetração), a depressão de aniversário na época do aborto, perda de confiança em si mesmas e em sua capacidade de tomar decisões, auto-estima baixa, dependência de

       213 Idem, p.116.

214 CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. Pronunciamentos de 1988 a 1989 da 27ª

Assembleia Geral (1989). “Um novo sim à vida.” Itaici, São Paulo, 14 de abril de 1989, p. 2. Disponível em: www.cnbb.org.br. Acessado em: 14 de março de 2010, 14:25.

tranquilizantes, consumo de drogas, uso excessivo de álcool, distúrbios alimentares como a anorexia e a bulimia215, obesidade, alergia a crianças e creches.216

A ausência de algum sintoma na mulher pós-aborto pode ser devido a três fatores: 1. A consciência mal formada, sobretudo, nas mulheres que se consideram donas do próprio corpo e que acham que podem fazer o que quiserem com ele não levando em consideração que aquela vida que está sendo desenvolvida em seu útero não é sua, mas de um outro ser humano, que dela depende das condições elementares para sobreviver; 2. Pessoas que não possuem consciência suficiente de seus atos - certo grau de oligofrenia - não somente no que se refere ao aborto, mas em relação a qualquer decisão de sua vida; 3. Pessoas que sofrem de transtorno de personalidade do tipo sociopata, ou socialmente conhecidas como psicopatas. Estas são caracterizadas por ações violentas e até criminosas sem terem sentimento de culpa diante daquilo que cometeram.

Uma sensação positiva que as mulheres dizem sentir pós-aborto é um sentimento de alívio, o que é enormemente compreensível, quando levada em consideração a situação de pressão na qual se encontravam diante da família, dos amigos, da sociedade, da situação econômica etc. Esse sentimento de alívio, que se sucede ao aborto voluntário, é chamado por psicólogos e psiquiatras de ‘paralisia emocional’. Trata-se de um mecanismo de defesa utilizado pela mãe na tentativa de racionalizar tal ato dizendo que foi o melhor que poderia ter feito, ou que não havia outra saída.217

Portanto, quando a Igreja se encontra diante de uma mentalidade de morte, como foi o caso da legalização do aborto no Brasil de acordo com o artigo 128 do Código Penal Brasileiro, a sua participação política e social em defesa da vida humana se faz sentir fortemente, visto que a sua missão não é outra, senão a mesma iniciada e delegada por Cristo. E tal manifestação política e social da Igreja tem o intuito de atingir as consciências sob a luz do Evangelho da Vida, para que o máximo possível de brasileiros sejam despertados em suas consciências e participem nesta luta em favor do homem na sua totalidade.

Uma legislação a favor do aborto está traindo a sua função de assegurar o direito inviolável à vida. A própria Constituição Brasileira no seu artigo 5 declara que todos têm o direito à vida. Portanto, falar de direitos que garantem a vida humana e ao mesmo tempo

      

215 Pode ser que elas procurem negar seus sentimentos de dor e angústia, concentrando-se em sua estética corporal: deixam de comer, no intuito de alcançar o corpo de ‘uma modelo’, excessivamente magra. Isto pode gerar um transtorno psicológico chamado anorexia, que pode levar à morte. Porém, pode ser que, por não alcançarem a imagem corporal desejada, venham a comer compulsivamente, provocando o vômito logo depois de se alimentarem. Esse transtorno é denominado bulimia.

216 CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. Setor Família e Vida. Primeiro Fórum de

Questões de Bioética, 02/10/1999, em Brasília: O valor, a beleza e a dignidade da vida humana, pp. 56-60. 217 Cf. idem, p. 54-55.

autorizar práticas abortivas, equivale a dizer que se trata de uma contradição ou traição em função da própria lei. No entanto, se verá em seguida os dois casos permitidos pela legislação brasileira para a prática do aborto.