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American way of life business in Brazil!

CAPÍTULO 3 – ALCANÇANDO O BRASIL

3.6 A “AMERICANIDADE” DAS PRÁTICAS DE MERCADO BRASILEIRAS

3.6.1 American way of life business in Brazil!

O cenário econômico estadunidense nos primeiros cinquenta anos do século XX demonstrou indícios de crescimento graças ao incremento da produção em larga escala, do desenvolvimento da sociedade do consumo e do aumento no volume de negócios publicitários no mercado interno. Muito embora algumas resistências a este crescimento tenham sido mapeadas na sociedade americana, principalmente porque a cultura da poupança e da sobriedade ascética foram valores herdados do final do século XIX, o que acabou prevalecendo foi a dinâmica comercial (MARCHAND, 1985; SANTOS, 1997).

O século XX, para os EUA, foi um período de consolidação da sua identidade nacional, do desenvolvimento econômico e do processo de americanização de outros países, através da indústria da tecnologia, da cultura e da comunicação. Entre as décadas de 1920 e 1930, a comunicação estadunidense se desenvolveu e os publicitários americanos assumiram o papel de missionários da modernidade, buscando estratégias de persuasão (SANTOS, 1997). No período entre guerras, a hegemonia americana enraizou e sinalizou modernidade, cabendo aos empresários e publicitários estadunidenses serem os porta-vozes dessa tendência de austeridade e diluírem qualquer argumento contrário (MARCHAND, 1985; SANTOS, 1997).

Naturalmente, as empresas americanas buscaram novos mercados. A expansão dessas empresas, entre as décadas de 1910 a 1940, permitiu que a cultura empresarial estadunidense

fosse exportada para outros países, incluindo o Brasil, influenciando as indústrias locais e instituindo a “americanidade” como valor, associando-a aos ideais de modernidade e modernização (ORTIZ, 1994; SANTOS, 1997).

Nesse contexto, o governo e as empresas estadunidenses se utilizaram da comunicação para reforçar e garantir a sua ideologia econômica e financeira. A partir das décadas de 1920 e 1930, algumas agências americanas, a exemplo da J. Walter Thompson Co., N. W. Ayer, McCann-Erickson e Grant Advertising, abriram escritórios em São Paulo e trouxeram estratégias de propaganda e análise de mercado para o Brasil (CASTELO BRANCO; MARTENSEN; REIS, 1990; SANTOS, 1997).

Uma das estratégias dos publicitários estadunidenses foi associar a “Americanidade” às práticas de consumo, e a comunicação era o principal “americanizador” (EWEN, 1977; SANTOS, 1996). A relação entre ‘modernidade’ e ‘americanização’ simbolizou a dinâmica cultural existente e o cinema foi um importante emissário e divulgador dessa relação, exportando a imagem do american way para o exterior. Através do cinema, peças publicitárias de carros, sabonetes, cigarros e câmeras fotográficas, promoviam situações de sedução para estimular os consumidores e para divulgarem a “americanidade” (MORIN, 1967; SANTOS, 1997). As novas modas estampavam a origem estadunidense das marcas e o cinema manteve- se como um dos meios fundamentais de comunicação. Entre 1928 e 1937, cerca de 85% dos filmes assistidos no Brasil vinham de Hollywood, e o nosso país era o terceiro maior importador de filmes no mundo (TUNSTALL, 1977).

Nesse contexto, as filiais das agências de propaganda, juntamente com as multinacionais americanas instaladas no Brasil, na primeira metade do século XX, influenciaram nossas práticas de mercado e introduziram conceitos e ferramentas, especialmente na área da comunicação, que foram se consolidando ao longo dos anos.

Em 1926, a General Motors estruturou no Brasil o seu departamento de propaganda e introduziu expressões como layout, slogan, copywriter, headline, market research, captions etc. (MARTENSEN, 1990). Em paralelo, a canadense Light, em 1929, inaugurou o seu Departamento Commercial através da junção de dois outros departamentos já existentes (O Departamento de Contractos de Luz e Força e o Departamento de Engenharia Commercial). Para a chefia deste novo departamento, exercendo também a função de superintendente geral de vendas, foi nomeado o senhor W. B. Piersol, cujo principal objetivo foi estruturar o setor para promover rapidez e eficiência nos serviços prestados aos consumidores (REVISTA LIGHT, 1929).

Para bem servir não se poupa a Light a esforço algum e agora mesmo, para que os seus fregueses e os novos consumidores de gaz, luz e força electrica encontrem maiores facilidades para tratar dos seus interesses junto à Companhia, acaba de ser reorganizada a Secção de Contractos (REVISTA

LIGHT, 1929, p. 23).

No segmento de varejo, a Sears foi uma das precursoras na implantação do sistema de autosserviço no Brasil, alterando o formato da exposição dos produtos nas lojas (DUAILIBI, 2005; FURQUIM, 1990). Nos pontos de vendas, as transformações das embalagens eram visíveis e os créditos dessa mudança foram atribuídos às multinacionais. De acordo com Cavalcanti e Chagas (2006), as multinacionais instaladas no Brasil utilizaram pesquisas de opinião e testes com grupos de compradores, técnicas até então desconhecidas aqui, promovendo a melhoria na estética e na qualidade das embalagens.

Entre as agências de propaganda, a JWT foi um importante núcleo formador de profissionais da área de comunicação, antes mesmo das escolas de propagandas brasileiras (FALCÃO, 2014), além de ter desenvolvido seu próprio departamento de mídia na década de 1940 (BARROS, 1990). A McCann-Erickson também estruturou seu centro de mídia (BARROS, 1990) e eventualmente transferiu diretores de arte dos EUA para o Brasil, devido à falta de qualificação profissional local (SARMENTO, 1990).

Outra empresa de comunicação, a N. W. Ayer, implantou a atividade de planejamento dentro da própria agência, serviço desconhecido no Brasil até a década de 1920 (FALCÃO, 2014). Na década de 1930, a Ayer introduziu, de forma pioneira, a pesquisa de mercado no Departamento Nacional do Café, objetivando investigar os hábitos dos consumidores deste produto em prol de uma campanha publicitária que estimulou o consumo do café (EDUARDO, 2003).

O serviço das agências e o conhecimento dos publicitários americanos eram relevantes e somavam-se à qualidade dos aparelhos utilizados na área da comunicação. Os EUA detinham, por exemplo, o Program Analyser – Push Button, aparelho utilizado na avaliação de rádio e de anúncios inseridos nele, instrumento exportado para o Brasil na década de 1950 (FALCÃO, 2014). Todavia, a exportação para o Brasil não se resumiu apenas aos aparelhos, mas também ao formato dos comerciais de rádio nos EUA. De acordo com Falcão (2014), a utilização de jingles em versos e com músicas e a presença de locutores ou apresentadores exclusivos para o produto eram estratégias utilizadas pelas emissoras americanas que influenciaram o rádio brasileiro na década de 1940.

Além das multinacionais e das agências de propaganda, as associações americanas também influenciaram algumas práticas de mercado. Destaque para a American Association of Advertising Agencies (AAAA), que serviu de parâmetro para a criação do documento que continha as normas e os padrões de conduta dos profissionais da propaganda brasileira na década de 1940 (FALCÃO, 2014).

Observamos que as práticas de mercado existentes no Brasil, especialmente em São Paulo, até a década de 1950 são reflexos da importação de conhecimento, somadas à cultura e aos hábitos de negociações locais. O processo de imigração e, principalmente, a expansão da cultura empresarial estadunidense contribuíram para a miscigenação das nossas práticas. Ao longo das primeiras décadas do século XX, as estratégias da indústria, do varejo e das empresas de comunicação, situadas no Brasil, foram sendo aperfeiçoadas ou inovadas à luz desse intercâmbio internacional, vocacionadas para o estímulo nas vendas. A figura 89 sumariza as práticas de mercado e os segmentos envolvidos nelas que impeliram a busca por profissionalização através do ensino.

Figura 89 - Resumo das práticas que demandaram ensino.

Fonte: Elaboração própria (2017).

Na sequência, resgatamos outros exemplos de empresas e de práticas vocacionadas ao business que estimularam a demanda por capacitação na primeira metade do século XX. A busca por melhorias na prestação dos serviços, a preocupação com o preço e com as condições de pagamento, as estratégias de estímulo às vendas e a utilização da televisão como veículo de divulgação de marcas e de aculturamento dos consumidores, todas essas ações dinamizaram o mercado de São Paulo.