• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 4 – DAS PRÁTICAS AO ENSINO DE MARKETING

4.1.3. Dos métodos às análises dos dados

Após coletarmos os materiais em São Paulo e no Rio de Janeiro, procedemos com o tratamento e com a análise deles. Em relação à pesquisa documental, selecionamos diversos materiais entre as décadas de 1900 e 1950, tais como cartas, memorandos, resoluções, informativos, folders, projetos de cursos, programas de disciplinas, apostilas e entrevistas impressas em documentos, entre outros. Dividimos o tratamento e a análise destes materiais em três partes.

Na primeira delas, conforme descreve Cellard (2008), realizamos uma análise preliminar ou exame crítico dos documentos para verificarmos a sua credibilidade, relevância e aplicação ao objeto de estudo. Sendo assim, atentamos, com base neste autor, para cinco

dimensões: (1) o contexto global no qual foi produzido o documento; (2) a identidade das pessoas que se expressaram e quais foram os interesses e os motivos que as levaram a escrever; (3) a qualidade da informação transmitida, através da relação entre o autor e o que ele descreveu; (4) a natureza do texto, entendendo que a forma de se expressar dependeu da audiência; e, (5) os conceitos-chaves e a lógica interna do texto, ou seja, o sentido dos termos empregados pelos autores dos textos.

Na segunda parte, nós utilizamos a técnica do fichamento, para arquivarmos os documentos em pastas que continham um resumo e a referência bibliográfica da publicação. Intitulamos a pasta e caracterizamos o material e o conteúdo das fichas, facilitando o seu manuseio e controle (PIMENTEL, 2001). Em seguida, detalhamos um pouco mais as informações em uma planilha em Windows Excel para cada instituição pesquisada. Cada planilha era composta por seis colunas. Nas primeiras duas colunas, pontuamos as unidades de análises (ou locais pesquisados) e as datas das coletas dos dados. A terceira, a quarta e a quinta colunas transformaram as informações dos documentos em temas, subtemas e temporalidade. Na sexta e última coluna, descrevemos os conteúdos presentes nos materiais coletados. Estes procedimentos foram importantes para aprofundarmos o conhecimento no assunto e organizarmos cronologicamente os fatos.

Após o fichamento e a estruturação da planilha, emergiram cinco categorias de análises. Estas categorias suscitaram do argumento de que a educação em marketing, construída ao longo da primeira metade do século XX e importada para o Brasil na década de 1950, foi reflexo de uma construção histórica inglesa, alemã e estadunidense, que desenvolveu uma concepção de marketing vocacionado para o business. Assim sendo, as categorias emergidas foram: (a) contexto de criação da instituição; (b) influência do modelo de ensino estadunidense na instituição; (c) estratégias de ensino utilizadas pela instituição; e, (d) disciplinas, conteúdos e bibliografia, e corpo docente.

Por fim, fizemos a análise das categorias e as inferências no conteúdo das mensagens através da técnica da análise de conteúdo, proposta por Bardin (1977). Simultaneamente, seguimos o entendimento de Cellard (2008) de que as leituras repetidas dos materiais conduzem o pesquisador a formar relações e a reconstruir ideias ou pensamentos capazes de explicar um fato. O autor afirma ainda que o tempo destinado para a coleta dos dados é uma etapa perene de reflexão que leva à formulação de explicações plausíveis sobre um objeto de estudo.

A partir dos conceitos-chaves e das categorias de análises, ambos extraídos dos documentos pesquisados, nos foi possível formular o que Cellard (2008) chamou de explicações plausíveis, de interpretações coerentes e de reconstrução de algum aspecto da sociedade em um dado momento, no nosso caso o da educação em marketing em São Paulo até a metade do século XX. A amplitude e a variedade dos documentos coletado em São Paulo e no Rio de Janeiro corroboram a afirmação de Cellard (2008, p. 305) de que “é a qualidade da informação, a diversidade das fontes utilizadas, das corroborações, das intersecções, que dão profundidade, sua riqueza e seu refinamento a uma análise”.

A variedade e a qualidade dos documentos coletados já foram suficientes para tentarmos reconstruir e explicar a educação em marketing em São Paulo até a década de 1950. Entretanto, apenas como adicional, realizamos duas entrevistas com acadêmicos que vivenciaram ou tiveram conhecimento acerca desse período. Adotamos o método da história oral, abordagem complementar à pesquisa documental (BRÊTAS, 2000; ICHIKAWA; SANTOS, 2006), pois é construído em torno de pessoas que revelam acontecimentos, experiências e mentalidades muitas vezes não encontradas nos documentos escritos (THOMPSON, 1992).

Uma perspectiva histórica contempla a descrição, a análise e a explicação dos acontecimentos ao longo do tempo (SAVITT, 1980). Nesse contexto, a história oral se insere como método de coleta de dados das fontes primárias, pois capta as memórias suscitadas pelos sujeitos da pesquisa, valorizando o registro das narrativas da experiência humana. Ichikawa e Santos (2006) acrescentam que o fundamento da história oral é o sentido do passado no presente imediato das pessoas, um sentido social à vida de depoentes e de leitores, que começam a entender a sequência histórica e a sentir-se parte do contexto em que vivem. A partir do método da história oral, definimos pela utilização da história oral temática para tratar do contexto de formação da educação em marketing em São Paulo na primeira metade do século XX. A história oral temática é apontada como uma modalidade focada em eventos ou temas específicos, esclarecidos ou opinados pelos entrevistados (BOM-MEIHY, 1996; ICHIKAWA; SANTOS, 2006).

Priorizamos as entrevistas não estruturadas com os acadêmicos. Este tipo de entrevista permite que o entrevistado construa a sua resposta (MATTOS, 2005), o que entendemos ser adequado pela abordagem histórica deste estudo. Foram utilizadas entrevistas não diretivas, visto que elas conseguem explorar um assunto em profundidade, sem a necessidade de

perguntas previamente planejadas (GRAY, 2012), além de permitirem que os entrevistados fiquem mais à vontade para refletirem sobre os eventos do passado (LIMA, 2015).

Concluídas as duas entrevistas em São Paulo, procedemos a sua transcrição literal, ou seja, a passagem completa dos diálogos e dos sons que foram captados. Muito embora haja o entendimento de que a transcrição editada torna o texto mais fluido e lógico (BOM MEIHY, 1996), trabalhamos com a transcrição integral, pois as entrevistas foram utilizadas apenas para as análises. De acordo com Ichikawa e Santos (2006), quando o pesquisador não tem a intenção de publicar na íntegra as entrevistas de história oral, as transcrições completas são interessantes, já que captam momentos de emoção, risos, gestos, entre outros.

Igualmente à análise documental, as categorias de análises emergidas das entrevistas se fundamentaram na construção da educação em marketing em São Paulo até a década de 1950 e convergiram para duas dimensões: a influência do modelo de ensino estadunidense na instituição e as estratégias de ensino utilizadas pela instituição. As categorias são elementos conceituais que abrangem a convergência dos relatos dos entrevistados (MERRIAM, 2009) e requerem análises e inferências no conteúdo das mensagens. Dessa forma, pautamo-nos na proposta de Bardin (1977).

Ressaltamos que as categorias analisadas, tanto na pesquisa documental quanto nas entrevistas, foram decisivas para a compreensão do nosso objeto de estudo e para a estrutura que adotamos para apresentar os resultados. Partindo do entendimento de que, ao logo da primeira metade do século XX, houve uma paulatina aproximação das instituições de ensino com os conteúdos de marketing que se consolidou com a concepção de marketing vocacionado para o business importado pela EAESP em 1954, nós optamos por apresentar os resultados destas análises dentro de uma sequência cronológica e encadeada de fatos, diluindo as categorias emergidas ao longo do texto. As descrições feitas a seguir não são nada além da forma como visualizamos as origens da nossa formação em marketing. Representam explicações plausíveis, assim como posto por Cellard (2008).