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ANÁLISE DAS DIFICULDADES DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA OS BIOCOMBUSTÍVEIS: ESTUDO DE CASO DO CULTIVO DE

CONSTITUCIONAL EM CRISE

4.3 ANÁLISE DAS DIFICULDADES DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA OS BIOCOMBUSTÍVEIS: ESTUDO DE CASO DO CULTIVO DE

GIRASSOL EM PARCERIA COM A PETROBRAS EM ASSENTAMENTOS DO RIO GRANDE DO NORTE

No estado do Rio Grande do Norte, a Petrobras estabeleceu parceria com a Cooperativa dos Ricinicultores de Apodi e Região – COOPERA e realizou um trabalho com mais de 300 famílias – a maioria de assentados, em uma de área de mais de 1.500 hectares plantados, ao longo de oito municípios: Caiçara do Norte, Ceará-Mirim, Jandaíra, João

249 BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Desenvolvimento e crise no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1982. p. 15.

250 MME. RENOVABIO nota explicativa. Disponível em:

<http://www.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-combustiveis- renovaveis/programas/renovabio/documentos/apresentacoes/renovabio-detalhamento-da-proposta- 25/08/2017?p_p_id=20&p_p_lifecycle=0&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id=column- 1&p_p_col_count=1&_20_struts_action=%2Fdocument_library%2Fview_file_entry&_20_redirect=http%3A%2 F%2Fwww.mme.gov.br%2Fweb%2Fguest%2Fsecretarias%2Fpetroleo-gas-natural-e-combustiveis- renovaveis%2Fprogramas%2Frenovabio%2Fdocumentos%2Fapresentacoes%2Frenovabio-detalhamento-da- proposta- 25%2F08%2F2017%3Fp_p_id%3D20%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26p_p_mode%3Dvie w%26p_p_col_id%3Dcolumn-1%26p_p_col_count%3D1&_20_fileEntryId=32739680>. Acesso em: 29 ago. 2017.

Câmara, Parazinho, Pedra Grande, São Bento do Norte e Touros. A parceria visava à produção de óleo de girassol251. Será remontada aqui a história dessa iniciativa tão significativa com os biocombustíveis para o estado do Rio Grande do Norte.

Inicialmente, a Associação Regional e Comercial do Mato Grande – ARCO - articulou a participação dos assentados no Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel desde o ano de 2006, nesse primeiro momento por meio do plantio de pinhão- manso. Em 2007 foi realizado, com sucesso, um plantio piloto de girassol.

Em um segundo momento, a ARCO firmou parceria com a Petrobras: o girassol seria plantado nos assentamentos, a Petrobras doaria o óleo diesel para os tratores. A Petrobras ainda assumiu o compromisso de adquirir a semente de girassol por cinquenta centavos cada quilo (R$ 0,50/kg), preço de mercado à época. Nesse momento, a ARCO tornou-se, inclusive, símbolo de propaganda para o Governo Federal e Banco do Brasil e de campanha do então presidente Luís Inácio Lula da Silva252.

Entendida a importância da região do Mato Grande para a experiência com a produção de agrocombustíveis no RN, entende-se o motivo da escolha de tal experiência para ilustrar esta dissertação. Entre os questionamentos motivadores da escolha, estão: como se iniciou o processo de plantio de girassol para produção de biocombustível no Rio Grande do Norte? Ainda há essa produção de girassol ou foi interrompida? Caso tenha sido interrompida, qual a causa? Qual o saldo da experiência? Entre outras tantas inquietações.

O objetivo maior era observar como funcionou, na prática, a experiência de um programa governamental de fomento à produção de biocombustíveis. Mas vai além disso: é a tentativa lançar o olhar sobre um local que foi alcançado por uma política pública tão estratégica para o país, postas as políticas públicas serem consideradas fortes instrumentos para cumprir o ideal de Estado Social, que por vezes, infelizmente, parece uma conjectura utópica.

Passou-se então para a etapa mais prática: a coleta de informações, visitas e entrevistas. Inicialmente, foi realizada entrevista com o Professor Doutor Deusimar Freire Brasil, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e que atua em diversos projetos na região do Mato Grande. Ele fez o relato da produção de girassol e de outros projetos que

251 BARRETO NETO, Francisco Nabuco de A. Bioenergia e exclusão regional: a não política nacional

agroenergética e os girassóis do RN. 2009. 362 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Regional; Cultura e Representações) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2009. p. 10.

252 BARRETO NETO, Francisco Nabuco de A. Bioenergia e exclusão regional: a não política nacional

agroenergética e os girassóis do RN. 2009. 362 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Regional; Cultura e Representações) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2009. p.16-17,

funcionaram de forma agregada ao do biodiesel, disponibilizou relatórios, dados, bem como grade parte das imagens constantes no Anexo II deste trabalho – para mostrar e registrar visualmente como ocorreu todo o processo de plantio da oleaginosa. Todas as conversas e relatos agregaram imenso valor ao trabalho, principalmente por meio das indicações de entrevistas com Livânia Frizon, e contatos com o Mestrado e Doutorado em Geografia e EMBRAPA.

Posteriormente, foi entrevistada Livânia Frizon, à época presidente da ARCO-Mato Grande, e líder do assentamento de Canudos – inclusive atuou junto a todo o processo de reforma agrária da região, tendo vindo do Rio Grande do Sul, juntamente com o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), com esse objetivo e aqui fixando residência após o êxito obtido na desapropriação de terras e concretização dos assentamentos com a fixação dos assentados. Sendo escolhida pelo papel estratégico e pelo conhecimento que detém, além da vivência prática de toda a situação. Além das entrevistas, dos relatórios e dados obtidos, foram utilizados alguns poucos estudos já existentes sobre a região.

Foram buscadas, ainda, informações junto à Petrobras, voltadas principalmente para a fundamentação do fechamento da planta de Biodiesel da Refinaria Clara Camarão, no município de Guamaré/RN, unidade responsável pelo processamento do óleo de girassol proveniente das plantações na Região do Mato Grande. Tentou-se também realizar uma visita técnica, mas não se obteve sucesso no pleito. Contudo já era algo esperado, em virtude de relatos de outras pesquisas (mesmo as voltadas a outros objetos): a dificuldade de conseguir dados de órgãos e empresas ligadas ao Governo, ainda que considerados os avanços na aplicação do princípio da transparência à Administração Pública.

Reunidas as informações possíveis, optou-se por não fazer o relato literal das entrevistas, relatórios, entre outros, tendo em vista que se tornaria algo de leitura densa. Proceder-se-á, então, com a junção de todas as informações coletadas e faremos suas explanações divididas em quatro pontos: como se estruturou o projeto no RN; o início dos investimentos e perspectivas; o desenrolar da experiência e as dificuldades encontradas; a tentativa de retomada que fracassou e a situação atual.

- Como se estruturou o Projeto nos municípios do Rio Grande do Norte:

As atividades do “Projeto Biodiesel” se iniciaram em 25 de dezembro de 2007, quando ocorreu o planejamento para o Plano Safra 2008, incluindo a cultura do girassol na

região do Mato Grande, com levantamento de produtores da safra 2007 e mais alguns produtores com aceitação para a nova cultura e comprometimento com o programa. Foram realizados dois seminários sobre a cultura de girassol nos municípios de Touros e Pedra Grande. Além de reuniões nos assentamentos e comunidades rurais253.

- Investimentos e perspectivas:

A Petrobras estabeleceu a meta para a Safra 2008 de implantação plantio em sequeiro de 2.000 hectares. Estabeleceu, ainda, como meta mínima a implantação de 1.000 hectares. Para o plantio foram escolhidas as variedades Catissol 01 e Iarama, mais sementes híbridas da Heliantus e da Dow, como forma de verificar qual variedade é mais produtiva.

Foi realizado, ainda, o adiantamento em óleo, esperando as condições satisfatórias para implantação da cultura, calculadas na base de 1.500 hectares plantados.

No ano de 2008, os municípios envolvidos foram: Ceará-Mirim, João Câmara, Jandaíra, São Bento do Norte, Pedra Grande, Pureza, Parazinho e Touros.

Quanto ao número de famílias: 250 famílias de agricultores participaram do projeto, 20 polos de assentamentos e 15 comunidades254.

- O desenrolar do Projeto: as dificuldades encontradas.

Quanto às principais dificuldades encontradas na execução do Projeto estavam: no que cinge ao preparo de solo, a presença de solos encharcados e vegetação natural de alto porte, as dificuldades no aluguel de máquinas e implementos adequados, dificuldade de áreas extensas, áreas dispersas, aumentando o custo nos deslocamentos e atrasando operações; nos tratos culturais, observou-se como entrave a relutância de alguns agricultores na capina e pulverização; nas medições por georreferenciamento houve diferenças significativas entre medidas métricas (manuais) e por GPS;

No plantio, as dificuldades principais foram: falta de plantadeiras adequadas (em número e pertinência), falta de vias de acesso adequadas para plantadeiras de grande porte, operadores locais não habilitados na operação e manutenção das plantadeiras255.

253 COPEC (Cooperativa dos Produtores de Canudos). Relatório de Atividades do Projeto Biodiesel – Girassol,

2008.

254 Dados e demais informações obtidas junto à COPEC. [COPEC (Cooperativa dos Produtores de Canudos).

- A finalização do Projeto:

Não foram obtidos dados especificamente sobre essa parte do Projeto, entretanto, segundo os relatos colhidos, acabado o prazo do desenvolvimento do Projeto previsto no contrato, a Petrobras descontinuou a produção. Entre os prováveis fatores devem figurar: elevado custo de produção; maquinário precário (conseguido muitas vezes mediante empréstimos com as Prefeituras ligadas aos municípios dos assentamentos); necessidade de capacitação dos agricultores envolvidos; somados aos fatores alistados no item anterior “as dificuldades encontradas”.

Posteriormente, a Petrobras iniciou a operação comercial da Planta de Biodiesel da Refinaria Clara Camarão, entretanto, os valores que pretendia repassar para os agricultores pela compra da produção, inviabilizaram a retomada da parceria. A maior parte do óleo comprado era proveniente do estado de Pernambuco, que conseguia produzir a menores custos por meio da gordura e óleo animal256.

- Outras considerações pertinentes.

Um dos aspectos que chamam a atenção no complexo de áreas produtivas do Mato Grande é integração dos sistemas produtivos. Elucidando e exemplificando, durante a execução do Programa do Biodiesel, segundo relatos, as sementes eram esmagadas e desse processo de esmagamento obtinha-se o óleo de girassol, a ser recolhido pela Petrobras. Após o esmagamento das sementes de girassol havia como resíduo uma massa predominantemente proteica, chamada de “torta de girassol”.

Por conta do sucesso inicial dos plantios de girassol, a Petrobras adquiriu uma extratora de óleo e a cedeu em comodato à parceria com a ARCO, que assumiu o compromisso de esmagar os grãos produzidos no Mato Grande e em outras regiões do RN. Essa máquina estava, à época, instalada no Assentamento Canudos257, produzindo óleo e 255

Dados e demais informações obtidas junto à COPEC. [COPEC (Cooperativa dos Produtores de Canudos).

Relatório de Atividades do Projeto Biodiesel – Girassol, 2008.]

256 Infelizmente, a nova chance dada ao biodiesel produzido no Rio Grande do Norte foi novamente restrita. E

culminou no fechamento da Refinaria de biodiesel do estado. [FAERN. Biodiesel ganha nova chance no RN. Disponível em: <http://www.faern.com.br/novosite/noticia/biodiesel-ganha-nova-chance-no-rn>. Acesso em: 1 nov. 2016].

257 Canudos é o acampamento sede dos assentamentos da região do Mato Grande. Lá está instalada a COPEC,

tendo como subproduto a torta de girassol. Essa torta substitui o farelo de soja na confecção de ração animal e sua produção em grande quantidade, juntamente com o sorgo, determinou grande entusiasmo e perspectivas de ampliação da produção animal nos assentamentos do Mato Grande258.

Nesse contexto que foi apresentado o Projeto Mazaroio259. A perspectiva foi capacitar e preparar os agricultores assentados para realizar melhor aproveitamento da torta de girassol. Assim, as ações foram focadas na implantação de criações pilotos de avicultura, de galinha caipira e ovinocultura, com produção local de ração a partir do sorgo e da torta de girassol. A produção de mel de abelha foi outro desdobramento do plantio de girassol, então foi desenvolvida também a apicultura260.

Entre as capacitações ministradas vinculadas ao Projeto Mazaroio261 e vinculadas ao PNPB versavam sobre cidadania e comunidade; associativismo, cooperativismo e sindicatos, movimentos sociais no campo; capacitação profissional em apicultura, avicultura caipira e ovinocultura; a economia solidária, com noções de empreendimentos econômicos solidários, redes de economia solidária262.

Findas tais atividades, os agricultores tentaram, por iniciativa própria, uma cooperativa de crédito, vontade expressa em muitas reuniões comunitárias. Organizaram também um abatedouro de aves e comercialização na Feira de Ceará-Mirim e em pequenos

da Agricultura Familiar de Canudos – construídas na época do desenvolvimento do Projeto para capacitação dos envolvidos.

258

ARCO MATO GRANDE. PROJETO MAZAROIO: Consolidação de cadeias de produção animal interligadas ao Programa Biodiesel – girassol em assentamentos de reforma agrária no território do Mato Grande/RN. Relatório Final. 2011.

259 O objetivo geral do Projeto Mazaroio era: “contribuir com a consolidação das cadeias produtivas de

apicultura, ovinocultura e avicultura de galinha caipira em assentamentos de reforma agrária da região do Mato Grande/RN, a partir da capacitação profissional dos criadores envolvidos e do estabelecimento de manejos de criação interligados ao plantio de girassol para produção de biodiesel; bem como, aprimorar metodologias de estabelecimento de tecnologia social voltadas para práticas associativas e solidárias e reafirmar a responsabilidade que cada indivíduo possui nas ações coletiva visando a melhoria da qualidade de vida comunitária”. [ARCO-MATO GRANDE. Proposta do Projeto Mazaroio. Disponível em: <http://www.ccet.ufrn.br/broffice/CursoBROFFICE%20-

%20ESTRUTURADO/ArquivosAulas/Microsoft%20Word%20-%20Projeto%20Mazaroio.pdf>. Acesso em: 1 nov. 2016.]

260

ARCO MATO GRANDE. PROJETO MAZAROIO: Consolidação de cadeias de produção animal interligadas ao Programa Biodiesel – girassol em assentamentos de reforma agrária no território do Mato Grande/RN. Relatório Final. 2011.

261

No Dicionário Eletrônico Aurélio, a palavra “Mazaroio” consta como substantivo masculino, gíria do Rio Grande do Norte, e significa “Grande quantidade ou porção de trabalho”.

262 ARCO MATO GRANDE. PROJETO MAZAROIO: Consolidação de cadeias de produção animal

interligadas ao Programa Biodiesel – girassol em assentamentos de reforma agrária no território do Mato Grande/RN. Relatório Final. 2011.

comércios varejistas da região; comercializaram mel e pólen em Natal, nas organizações parceiras e academias de ginástica263.

Diante do relatório disposto, percebe-se que para um Projeto na seara dos agrocombustíveis prosperar, nos moldes do PNPB, é necessário, acima de tudo, integração da cadeia produtiva com outras culturas, de modo a tornar a produção o mais sustentável possível e garantir sua viabilidade e continuidade.

Nas entrevistas realizadas, ficou evidente na fala dos interlocutores que o período do biodiesel foi muito próspero, de um otimismo, que gera saudosismo, pois a realidade do hoje não é fácil para quem trabalha no início da cadeira produtiva agrícola. Evidenciou-se que no período se havia esperança, e um esforço coletivo para se “fazer acontecer”. Melhorou-se a renda, a educação, a moradia, “vários dos filhos do assentamento se formaram numa universidade pública”. Foi transformador.

Na região do Mato Grande houve um esforço dos assentados junto às cooperativas de crédito, como a Cooperativa de Crédito Mútuo – COOPERFORTE, à Fundação Banco do Brasil, a instituições de ensino como a Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN e o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte – IFRN.

Entretanto, mesmo diante dos esforços, o encerramento do Projeto pela Petrobras inviabilizou as iniciativas que agregaram renda, educação, desenvolvimento interligado, garantiu a fixação das famílias dos assentamentos nas propriedades.

A despeito da descontinuidade do Projeto Biodiesel, independente de todos os motivos que nela culminaram, fica o legado, o conhecimento agregado, a articulação proporcionada, as parcerias firmadas e, talvez o principal: uma postura articulada, proativa e mais empreendedora, dentro das limitações existentes (que não são poucas) dos assentados (na procura por novas parcerias, novos investimentos, mercados para o escoamento dos produtos).

Atualmente, as famílias dos agricultores do território do Mato Grande comercializam parte de sua produção em feiras livres de diversos municípios do Rio Grande do Norte, e também na Central da Agricultura Familiar e Economia Solidária – CECAFES, inaugurada em março de 2017, no cruzamento das avenidas Capitão Mor Gouveia e Jaguarari, em Natal.

A central é composta de 36 boxes, 50 barracas, e beneficia em torno de 1.200 agricultores familiares, ocupando uma área de cinco mil metros quadrados ao lado da

263 ARCO MATO GRANDE. PROJETO MAZAROIO: Consolidação de cadeias de produção animal

interligadas ao Programa Biodiesel – girassol em assentamentos de reforma agrária no território do Mato Grande/RN. Relatório Final. 2011.

Ceasa/RN. É interessante na medida em que tira de cena a figura do atravessador, um dos problemas enfrentados pela agricultura familiar, uma vez que diminui muito seu lucro e dificulta a subsistência da população do campo264.

Durante as entrevistas e conversas, percebeu-se que muitas mudanças são necessárias, bem como muito investimento, e os retornos demandam tempo. Em um projeto de apenas dois anos fica difícil mensurar a real viabilidade da produção em unidades de agricultura familiar e assentamentos, pois toda uma mudança estrutural e prévia é necessária. Conclui-se que hoje talvez a agricultura familiar, principalmente no Rio Grande do Norte, ainda não conseguiu se estruturar de tal forma que conseguisse uma maior viabilidade produtiva. Mesmo com essa observação, fica o questionamento se ajudar nesse desenvolvimento não seria justamente uma das propostas do PNPB?

Em seu estudo “Bioenergia e exclusão regional”, Barreto Neto afirma que um dos problemas com os biocombustíveis no Nordeste e também no Rio Grande do Norte, é a falta de investimentos. Lança mão de dados disponíveis no site da Presidência da República, a saber: no PAC, os investimentos fora de 17 bilhões para a área de biocombustíveis, desses, 30 milhões de reais no Rio Grande do Norte e 150 milhões para o Norte e Nordeste, em confronto com 16 bilhões e 850 milhões de reais para o Centro-Sul. Afirmando que o parâmetro da Petrobras é meramente lucratividade, não tendendo a atuar como integradora agrícola265.

Na pesquisa “A produção de biodiesel no assentamento de Canudos/RN”, Suzana Maia Girão tece algumas considerações interessantes sobre o que foi verificado no assentamento na época em que o programa foi desenvolvido: o PNPB é capaz de gerar renda aos agricultores e familiares que nele estejam envolvidos; a população analisada obteve melhorias a partir do cultivo do girassol; os lucros obtidos com o cultivo do girassol foram anuais, mas esperava-se que fossem mais expressivos; a renda obtida possibilitou a aquisição de bens de consumo ou tratamento de saúde; não foi verificada inclusão social via geração de emprego266.

264 CEASA. Governo inaugura Central da Agricultura Familiar nesta segunda. Disponível em:

<http://www.ceasa.rn.gov.br/Conteudo.asp?TRAN=ITEM&TARG=144113&ACT=&PAGE=&PARM=&LBL= NOT%CDCIA>. Acesso em: 20 ago. 2017.

265 BARRETO NETO, Francisco Nabuco de A. Bioenergia e exclusão regional: a não política nacional

agroenergética e os girassóis do RN. 2009. 362 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Regional; Cultura e Representações) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2009.

266 GIRÃO, Suzana Maia. A produção de biodiesel no assentamento Canudos RN: perspectivas e limites da

inclusão social. 2011. 90 f. Dissertação (Mestrado em Meio Ambiente, Cultura e Desenvolvimento) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2011.

Ao se falar em sistemas integrados de produção, como ocorreu no caso em comento neste item 4.4, tem-se um discurso em consonância com as ideias desenvolvidas por Ignacy Sachs sobre a otimização do uso da biomassa com a combinação certa dos “5-F”. Os “5-F” são sistemas integrados de alimento-energia adaptados às diferentes condições agroclimáticas e socioeconômicas; enfatizando o potencial dos sistemas produtivos artificiais, análogos a ecossistemas naturais. O objetivo é tornar os sistemas cada vez mais produtivos por intermédio da aplicação da ciência moderna. Os “5-F” (sigla em inglês) significam: suprimentos, alimento, fertilizante, ração industrializada, combustível. Assim, o papel primordial cabe às biotecnologias: aumento na produção de biomassa e expansão na faixa de produtos dela derivados267.

Outros dados interessantes é que o Nordeste possuía uma grande quantidade de estabelecimentos produtivos, mas a contribuição em relação à quantidade de matéria-prima comercializada era pequena: em 2011, correspondeu a 0,4% do volume comercializado. Segundo Paula Pedroti, tal situação justifica-se, sobretudo, pela baixa produtividade, pela falta de infraestrutura de transportes e logística, pelos prolongados períodos de estiagem, pela dispersão geográfica dos agricultores, pela assistência técnica deficitária e pela pouca tradição no cooperativismo, entre outros268. Tais fatores correspondem, justamente, aos observados em grande parte na prática produtiva dos assentamentos do Mato Grande.

Fazendo uma pertinente digressão temporal no pensamento de Celso Furtado, na década de 1960, Celso Furtado propunha levar o estado desenvolvimentista para o Nordeste, de modo a quebrar o estado oligárquico dominante, e por isso propôs a SUDENE. Entretanto, do seu sonho de desenvolvimento para a região, restou um parque industrial formado por