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CONSTITUCIONAL EM CRISE

4.2 AS RECENTES POLÍTICAS PÚBLICAS DE FOMENTO À PRODUÇÃO DE BIOCOMBUSTÍVEIS

4.2.1 Política Nacional de Biocombustíveis Florestais

O deputado Luiz Fernando Faria, do Partido Progressista de Minas Gerais– PP-MG, propôs o Projeto de Lei nº 1.291, em 27 de abril de 2015222, tendo por objetivo a ampliação da participação dos biocombustíveis florestais na matriz energética brasileira, promovendo o cultivo de florestas plantadas, com potencial energético para a produção de biocombustíveis sustentáveis.

219 CAMARA DOS DEPUTADOS. Portal E-democracia. Disponível em:

<https://edemocracia.camara.leg.br/home>. Acesso em: 7 ago. 2017.

220 A população precisa se apropriar desses canais também para aperfeiçoá-los enquanto plataforma de

comunicação com o governo, e para cobrar um Estado mais transparente e eficiente. Uma das grandes conquistas brasileiras foi a Lei de Acesso à informação e o portal da transparência. A Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, está disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm>. Acesso em: 21 jul. 2017.

221 MME. Programa Combustível Brasil. Disponível em:

<http://www.mme.gov.br/documents/10584/24442563/2017+05+10+Combustivel+Brasil+vFinal.pdf/8e7d6447- c2f3-47c0-8c15-f3f066a54c60>. Acesso em: 22 jul. 2017.

222 O Projeto de Lei em comento está disponível no site da Câmara dos Deputados. [CAMARA DOS

DEPUTADOS. Ficha de Tramitação do Projeto de Lei nº 1.291, de 24 de abril de 2015. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=1215701>. Acesso em: 8 ago. 2017.]

O art. 2º do referido PL traz alguns conceitos importantes, como o de “biocombustíveis florestais”, considerados combustíveis sólidos, líquidos ou gasosos, produzidos a partir da biomassa florestal, como lenha, carvão vegetal, briquetes, licor negro, etanol celulósico, entre outros, tidos como fontes estratégicas e renováveis de bioenergia, em rol meramente exemplificativo.

Em confronto com o art. 6º, inciso XXIV, da Lei nº 9.478/97, a Lei do Petróleo, define um conceito mais generalista (“biocombustíveis” são derivados de biomassa, tendo o potencial de substituir total ou parcialmente, os combustíveis fósseis derivados do petróleo e do gás natural, seja em motores a combustão, seja em outras formas de geração de energia).

O inciso IV do art. 2º do PL em comento traz a definição de “florestas plantadas com potencial energético”, como aquelas florestas plantadas, cuja matéria-prima, obtida do seu manejo e colheita, bem como seus resíduos florestais possam, segundo vontade e critério do empreendedor, ser processados como biomassa para fins de produção de energia, visando à produção de biocombustíveis florestais.

Entre os objetivos da pretensa Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais (art. 3º) estão: ampliar a participação dos biocombustíveis florestais na matriz energética brasileira e promover o cultivo de florestas plantadas com potencial energético e a produção sustentável de biocombustíveis florestais. Constituindo parte da consecução do Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura – Plano ABC (de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono) e do Plano Nacional de Mudança do Clima – PNMC.

Os princípios da Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais estão dispostos no art. 4º e seus incisos, correspondendo a: livre exercício da atividade econômica, visando à redução das desigualdades sociais e regionais; e o plantio florestal em áreas degradadas, objetivando sua recuperação; assim, promovendo e desenvolvendo uma matriz energética limpa e diversificada, ampliando as fontes renováveis de energia limpa, em especial dos biocombustíveis florestais; a competitividade, inclusive em âmbito mundial, da cadeia produtiva de florestas plantadas com potencial energético.

Nos termos da Constituição, a Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais se propõe a garantir a preservação das florestas, da fauna e da flora, conforme inciso VIII do art. 23; compromete-se também com a proteção ao meio ambiente e combate à poluição, na medida em que promove o reflorestamento, nos termos do inciso VI do art. 23; compromete-

se com o desenvolvimento sustentável, quando, ao aumentar a área de florestas, promoverá a captura dos GEEs.

Propõem-se biocombustíveis florestais inseridos em uma ordem econômica e financeira constitucional, conforme o art. 170, na medida em que se busca não somente o disposto em seu inciso VI (da proteção ao meio ambiente), mas também diversos outros princípios da ordem econômica constitucional, como a livre concorrência e a busca do pleno emprego.

Ainda em termos constitucionais, a Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais relaciona-se intimamente com o art. 187 da Constituição Federal, que trata da política agrícola, percebe-se que inicialmente a lei em comento traz em seu escopo, em caráter perfunctório, instrumentos creditícios e fiscais, incentivo à pesquisa e a tecnologia, seguro agrícola, habilitação para o trabalhador rural.

Voltando à redação do PL, o art. 7º deu o mesmo tratamento das atividades agrícolas, em termos de normas ambientais, às atividades da cadeia produtiva de florestas plantadas com potencial energético (compreendendo a plantação, a recondução, o manejo, a colheita, a reforma, o armazenamento, a transformação, o transporte e a comercialização de seus produtos e derivados, incluindo os biocombustíveis florestais).

Complementando, a proposta expõe, em seu art. 13, que os recursos oriundos das taxas de reposição florestal serão obrigatoriamente revertidos, a taxa mínima de 60%, para programas de fomento florestal para projetos de até dois mil hectares por proprietário, o objetivo é o de formação de florestas plantadas com potencial energético; e de 10% como compensação mediante plantio de florestas com potencial energético para empreendimentos sujeitos a recolhimento das taxas. Ainda, em seu parágrafo único, a taxa de reposição florestal não incidirá sobre os produtos oriundos de florestas plantadas como potencial energético.

O texto também permite o cultivo de florestas com potencial energético em áreas de preservação permanentes consolidadas (art. 9º), desde que sua reforma não resulte em destoca, preservando-se a integridade do solo através de cultivo mínimo. Esse plantio, no entanto, deverá ser informado no Programa de Regularização Ambiental (PRA) por meio de declaração expedida pelo empreendedor, acompanhada de anotação de responsabilidade técnica emitida por engenheiro florestal ou agrônomo.

Segundo o art. 11, a fiscalização da comercialização e do consumo dos biocombustíveis florestais será feita pelos órgãos competentes do Poder Público e se dará nos pontos de recepção das unidades consumidoras do produto.

Ainda segundo o projeto, a União, os estados e o Distrito Federal manterão conjuntamente um sistema nacional de informações sobre florestas com potencial energético. Tal sistema será constituído por um banco de dados sob gestão do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento em articulação com o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA.

Para o PL lograr êxito, falta apenas a análise e a aprovação do projeto pelas comissões de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania, uma vez que tramita em caráter conclusivo e que já obteve aprovação da Comissão de Minas e Energia.

Os motivos alegados para a proposição desse Projeto de Lei vão desde os acordos firmados nas Conferências das Partes – COP, tema aqui já bastante retomado; passando pela redução do rol de combustíveis verdes, pela Empresa de Pesquisa Energética – EPE (dando ênfase ao papel negativo de poluente do carvão e das usinas termelétricas).

Portanto, visando a não dependência dos combustíveis fósseis pelo Brasil, em virtude de serem excessivamente poluentes, não renováveis e de alto custo, a Política Nacional de Biocombustíveis Florestais pretende se firmar, caminhando paralelamente aos outros biocombustíveis. Ressaltando o exemplo da siderurgia nacional, movida energeticamente à base de carvão vegetal, que figura no rol dos biocombustíveis florestais especificados nesse Projeto de Lei.

Ressalta-se, ainda, o seu potencial papel de gerador de emprego e renda – papel socioeconômico –, podendo esse tipo de floresta ser utilizada para fins industriais, de construção civil, além do energético (biomassa florestal). No aspecto ambiental, as florestas energéticas são potenciais redutores do aquecimento global, agindo na captura dos GEE’s, potenciais conservadoras da fertilidade do solo e da manutenção dos recursos hídricos.

A Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais não está isolada no ordenamento jurídico brasileiro. Ao observar o seu projeto de lei, infere-se que ele se coaduna com o Decreto nº 8.375, de 11 de dezembro de 2014, que define a Política Agrícola para Florestas Plantadas223.

O Decreto em questão estabelece como princípios da Política Agrícola de Florestas Plantadas a produção de bens e serviços florestais visando ao desenvolvimento social e econômico do país e a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas (art. 3º), no mesmo diapasão dos princípios disciplinados pelo Projeto de Lei nº 1.291/ 2015.

223 BRASIL. Decreto 8.375, de 11 de dezembro de 2014. Disponível em:

Os objetivos da Política Agrícola de Florestas Plantadas são aumentar a produção e a produtividade; promover a utilização do potencial produtivo de bens e serviços econômicos das florestas plantadas; contribuir para a diminuição da pressão sobre as florestas nativas; melhorar a renda e a qualidade de vida no meio rural, notadamente em pequenas e médias propriedades rurais; estimular a integração entre produtores rurais e agroindústrias que utilizem madeira como matéria-prima.

Todavia, o Projeto de Lei em trabalho peca por apenas mencionar objetivos, mecanismos, não trazendo em seu corpo textual formas de concretização do que se pretende. Como ele faz parte de uma política pública ainda em fase de articulação, pode ser que posteriormente ele precise ser modificado, ou que seja trazido em resoluções e portarias regulamento mais técnico para viabilizar a sua implantação.

Ainda em termos infraconstitucionais, relaciona-se expressamente com a Lei nº 8.171, de 17 de janeiro de 1991, que dispõe sobre a Política Agrícola Nacional, bem mais abrangente que os diplomas normativos aqui expostos, trazendo inúmeros princípios, ações e instrumentos da política agrícola. E que a política de biocombustíveis florestais, por ser uma proposta prática inserida em uma política maior, deve buscar atuar em consonância com os preceitos por ela definidos224.

Em uma análise estrutural, a Política Nacional de Biocombustíveis Florestais, apesar de em um primeiro momento causar estranheza e soar como retrocesso ambiental devido à utilização de carvão vegetal, lenha, entre outros biocombustíveis nessa linha; tem bases coerentes, afinal é melhor a boa gestão energética do potencial de florestas plantadas do que, por exemplo, ocorrer a inundação de milhares de hectares de florestas, como ocorreu com a usina hidrelétrica de Belo Monte; ou o contínuo uso de termelétricas.

Outro aspecto importante é que o PL está inserido em um contexto de uma política mais ampla, que lhe dará suporte, caso haja sua aprovação. No que concerne ao arcabouço legislativo, está em consonância, como exposto, com os preceitos constitucionais.

Quanto às estatísticas, as florestas plantadas, no Brasil, têm aumentado consideravelmente de número e de extensão, conforme Gráfico 8, a seguir, trazendo dados obtidos por dois órgãos diferentes, mostrando ainda que as principais espécies plantadas são o eucalipto e o pinus.

Os setores econômicos das florestas plantadas defendem os investimentos na área, como é o caso da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA, que emitiu o

224 BRASIL. Lei 8.171, de 17 de janeiro de 1991. Disponível em:

relatório: “Plantio de Eucalipto no Brasil: mitos e verdades”, enfatizando diversos pontos positivos do plantio dessa espécie (mesmo sob o formato da monocultura), dentre eles: consumo de água menor que o da cana-de-açúcar e do café (p. 11), e perda de solo pela erosão menor que em plantios de milho, pastagem e cana-de-açúcar (p. 13)225.

Defendendo o plantio do eucalipto de forma a compor sistemas agroflorestais, em que o uso da terra e dos recursos naturais combina a utilização de espécies florestais, agrícolas e/ou a criação de animais, em uma mesma área, de maneira simultânea ou escalonada no tempo. Ressaltando como vantagens para o produtor: aumento da renda, maior variedade de produtos e serviços, melhoria da alimentação do homem do campo, redução do risco de perdas totais, redução dos custos de plantio, melhoria da distribuição da mão de obra rural, e redução da necessidade de capinas226.

Já como vantagens biológicas, apontam-se: melhor ocupação da área; aumento da matéria orgânica; melhoria das propriedades do solo; retenção e conservação de água no solo; controle da erosão; aumento da produtividade por unidade de superfície; redução das variáveis microclimáticas; diminuição dos riscos de perdas de produção; uso adequado do sombreamento; e agregação de valores. Para o sistema como um todo, são vantagens: ampliação da estação de pastejo; maior incremento no peso dos animais, na produção de leite e lã; e aumento na taxa de reprodução227.

225 CNA. Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil. Planto de eucalipto no Brasil: mitos e verdades.

Brasília: CNA, 2011. Disponível em: <http://www.canaldoprodutor.com.br/sites/default/files/mitos-e-verdades- low.pdf>. Acesso em: 21 jul. 2017.

226 CNA. Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil. Planto de eucalipto no Brasil: mitos e verdades.

Brasília: CNA, 2011. Disponível em: <http://www.canaldoprodutor.com.br/sites/default/files/mitos-e-verdades- low.pdf>. Acesso em: 21 jul. 2017. p. 17.

227

Gráfico 8. Área com florestas plantadas no Brasil228.

Entre os questionamentos de Ignacy Sachs está: “como conservar escolhendo-se estratégias corretas de desenvolvimento em vez de simplesmente multiplicarem-se as reservas supostamente invioláveis?” 229

Pode ser que, dependendo da forma que se conduza a Política Nacional dos Biocombustíveis Florestais, esse tipo de ecossistema antrópico ajude-nos a responder o questionamento acima.

Por fim, de fato os biocombustíveis florestais podem ser uma alternativa para o desenvolvimento energético brasileiro, mas ainda são necessários projetos, estudos, testes, para ver a viabilidade prática de tais ideias. Na seara dos biocombustíveis não existem soluções milagrosas, para que se consiga visualizar a viabilizar de aparentes boas ideias, elas têm de ser postas em prática sob a forma de testes, demanda tempo e muitos aportes de recursos financeiros, os resultados podem ser razoáveis ou não. Afinal, quantos anos não se levaram até a Petrobras desenvolver o know-how em tecnologia para exploração do petróleo em águas ultraprofundas até atingir a camada do Pré-sal? Quanto não foi gasto!

Desenvolver uma política energética, principalmente em um país com as dimensões do Brasil e com os problemas históricos que ele possui, apesar de parecer clichê e senso

228 Áreas com florestas plantadas no Brasil. Disponível em:

<http://sistemafamato.org.br/portal/famato/bioenergiamt/palestras/palestra-14-9-JOAO-ANTONIO.pdf >. Acesso em: 21 jul. 2017.

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comum, é um terreno muito incerto, flutuante, vulnerável às influências externas, às pressões internacionais. Mas inegavelmente é uma área estratégica para o desenvolvimento da população, do futuro e do Estado, que precisa ser pensada e repensada com antecedência para que sejam evitados colapsos.