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3 PSICOLOGIA SOCIAL DISCURSIVA

4.4 Análise dos dados

Para a elaboração da análise discursiva dos sujeitos entrevistados, têm-se como apoio os pressupostos que ressaltam a importância que a linguagem e o discurso têm na vida social. Desse modo, busca-se compreender o processo pelo qual as pessoas, através do seu discurso, descrevem, explicam e dão sentido ao mundo em que vivem e a si mesmas (GERGEN, 1985). Potter e Wethrerell (1987) consideram a palavra como uma forma de ação. A proposta deles baseia-se na concepção de que a linguagem pode ser compreendida por seu uso. Assim, parafraseando Iñiguez (2004), não é bom tratar as palavras ou frases como manifestações em branco de algum significado semântico neutro; ao contrário, deveríamos ver como a linguagem é usada por falantes em conversas cotidianas e também olhar mais acima do nível da palavra ou frase.

Posto isto e compartilhando desse entendimento teórico-metodológico focado na linguagem em uso, nesse estudo, foram adotadas como referências as perspectivas discursivas (GARAY; IÑIGUEZ; MARTÍNEZ, 2005) que assumem a importância da linguagem como prática social construtora de realidades. Para o olhar do material de análise serão utilizados os pressupostos trazidos pela Psicologia Social Discursiva, compreendida como um tipo particular de análise do discurso que possui como característica um desenvolvimento engajado a um nível teórico, metodológico e conceitual (POTTER, 2004).

É mister destacar que o processo que antecede à análise dos dados propriamente dita é de fundamental importância para que esta possa ser realizada. A familiarização com o

material que foi analisado começou durante as transcrições das entrevistas, realizadas pela própria pesquisadora. Uma vez transcritas as entrevistas, foram realizadas várias leituras e releituras desse material coletado, processo de codificação que consistiu em procurar, nas falas dos sujeitos entrevistados, temas ou categorias que estivessem relacionados com a temática da pesquisa, nesse caso, a Prestação de Serviços à Comunidade (PSC).

Wetherell e Potter (1992) salientam que a codificação não pode ser confundida com a análise em si. Ela é realizada principalmente com o intuito de melhorar o manejo de todo o material produzido, concentrando pontos relevantes para a discussão e, assim,

tornando as análises mais fáceis. No processo de codificação, algumas categorias de análise emergiram das preocupações que previamente estimularam este estudo, mas outras vieram da própria experiência de entrevista e das repetidas leituras que foram feitas a partir do corpo das transcrições As categorias usadas nesse trabalho dizem respeito a conteúdos que foram agrupados pela sua repetição nos discursos, ou por aparecerem permeados de tensões e/ou ambiguidades, pelos consensos que indicavam ou, ainda, por terem sido pouco mencionados ao longo das entrevistas.

Para uma melhor visualização das categorias de análise, foram copiados trechos das fala dos sujeitos entrevistados que possuíam alguma relação com o tema de interesse. Esta seleção das falas foi inclusiva à medida que emergiam novos conteúdos. No exercício analítico propriamente dito, primeiramente procurou-se por padrões nos discursos dos entrevistados. Esses padrões se apresentaram ora em forma de variabilidade, ou seja, diferenças nos conteúdos e nas formas dos discursos, ora na forma de consistência, semelhanças, nos repertórios interpretativos, nas características comuns nos diversos argumentos desenvolvidos pelos sujeitos. Após a identificação das variações e consistências discursivas, procurou-se discutir as funções e consequências desses discursos.

Procurar pela variabilidade discursiva é de fundamental importância porque ela é um sinal de que diferentes formas de construção de eventos, processos ou grupos estão sendo usados para atingir diferentes efeitos. “Padrões de variações e consistência na forma e conteúdo dos discursos ajudam o analista a mapear os padrões de repertórios interpretativos que os participantes estão construindo” (WETHERELL, POTTER, 1992, p. 102). Dito de outra forma, eles ajudam a revelar as diferentes formas pelas quais o discurso orienta-se para a ação.

É importante salientar que para a Psicologia Social Discursiva o interesse encontra-se na ação dos discursos. Assim, ao analisar uma descrição sobre as produções discursivas dos psicólogos que atuam junto à Prestação de Serviços à Comunidade, tem-se como foco a

orientação para identificar a natureza da ação realizada por tal descrição, ou seja, na ação realizada pelos entrevistados com suas falas. Desse modo, adota-se a perspectiva de que as descrições constroem o mundo, ou, pelo menos, versões dele. E ainda, que as descrições são por si só, construções de mundo.

Na Psicologia Social Discursiva, Potter e Wetherell citado por Oliveira Filho (2011) usam o termo discurso para fazer referência a todas as formas de interação pela fala e aos textos escritos de todos os tipos. Nessa perspectiva, o termo análise do discurso é usado para nomear a análise de todas essas manifestações discursivas produzidas pelo sujeito. De forma resumida, Potter e Wetherell (1992) salientam que a análise é realizada em duas etapas: na primeira, há a busca por um padrão nos dados. Este padrão virá na forma de diferenças no conteúdo e forma dos textos e na consistência, ou seja, na identificação das características compartilhadas por estes textos. Na segunda etapa, há a preocupação com a orientação funcional do discurso e suas consequências, desse modo, o pesquisador formulará hipóteses sobre as funções e efeitos que as práticas discursivas têm no contexto e procurará pelas evidências linguísticas.

De acordo com a perspectiva trazida por Potter e Wetherell (1992), não existe uma forma única nem procedimentos mecânicos que indiquem como realizar uma análise. Entretanto, os autores apontam que existe um ponto que não se deve esquecer: analisar discursos envolve leitura e releituras minuciosas, pois encontrar padrões emergentes nos discursos é uma atividade que pode levar muitas horas de trabalho. Isso porque o pesquisador não deve estar focado na ideia geral do material, no seu resumo, mas nas nuances, nos detalhes.

Para a construção da análise dos dados coletados nas entrevistas, partiu-se do pressuposto de que todo enunciado colocado em discurso por parte de um sujeito faz parte de um contexto histórico, que está a ele condicionado. Neste sentido, possibilita-se uma reflexão sobre as implicações da prática analítica discursiva dos sujeitos entrevistados, levando-se em consideração o contexto social em que o discurso foi construído e, finalmente, sobre o papel do discurso na construção, manutenção e mudança da estrutura social.

Portanto, o presente trabalho utilizará a Psicologia Social Discursiva como o instrumento de compreensão e análise dos fenômenos estudados, tendo em vista que essa abordagem possibilita uma reflexão profunda no que se refere à ênfase no uso da linguagem na constituição do mundo e das subjetividades contemporâneas. Busca-se, pois, compreender “a maneira como as interações discursivas que instauram as relações criam e adquirem

sentido” (IÑIGUEZ, 2004, p.120) através das produções discursivas dos psicólogos que atuam na execução da Prestação de Serviços à Comunidade.