• Nenhum resultado encontrado

De modo geral? Estrutura Veja, de manhã a gente não tem uma sala, então a gente usa a sala do Ministério Público que é aquela Então tem

outro grupo que trabalha aqui do lado, então muitas vezes a gente acaba fazendo a entrevista com algumas pessoas, que eu acho que é muito complicado, pra mim compromete muito porque eu já bloqueio, mas né... não me sinto muito a vontade. Então já compromete de alguma forma o serviço.

Os desafios apontados pelo entrevistado passam pela organização estrutural do local de trabalho, pela necessidade de construção de um espaço e da afirmação de um trabalho técnico para atender questões individuais. Sabe-se da importância de um ambiente neutro e salutar para que o profissional de psicologia possa realizar a entrevista e possíveis intervenções junto ao indivíduo.

No que se refere às condições de trabalho, bem como ás dificuldades de operacionalização do mesmo, a maioria dos entrevistados atribuiu como questão-problema a

articulação com a rede social parceira. Diversos foram os argumentos, desde a dificuldade de articulação de novas instituições para receber os cumpridores ao interesse por parte de algumas de receber, preferencialmente, os cumpridores de Prestação Pecuniária (outra modalidade de Pena Alternativa) em detrimento da Prestação de Serviços à Comunidade.

“Sendo que, eu acredito que por uma cultura, que aí eu não sei como explicar de onde vem essa cultura, de que o recebimento de uma prestação pecuniária, de uma doação, seja mais importante, mais aceito, vamos dizer assim, do que a PSC. Um exemplo bem prático, algumas entidades a gente liga pra dizer ‘olhe, tem um cumpridor que a gente está encaminhando para fazer doações no valor de x, durante tantos meses’, e aí a entidade ‘não, ok, tudo bem, mande, a gente precisa disso, aquilo e aquilo’. E quando a gente liga pra essas mesmas entidades pra dizer ‘olhe, tem uma pessoa pra prestar serviço durante tanto tempo, tantas horas mensais’, a gente percebe que a reação de quem tá recebendo essa ligação é diferente. Muitas vezes há um bloqueio mesmo e dizem ‘não, a gente não tem vaga, a gente não pode receber, se fosse uma doação a gente teria como receber’. Ela tem que se dar para as duas coisas. Se você recebe uma doação, por que não receber uma prestação de serviço? Você vai estar tendo uma pessoa que vai estar prestando um serviço gratuito na sua entidade, vai estar colaborando de alguma forma para o funcionamento do local, para o atendimento daquelas pessoas que você tem ali, e por que não receber? A gente tenta muito trabalhar isso com eles, faz reuniões semestrais com o pessoal dessa rede de parceiros e é um tecla que a gente bate muito em cima dela, para que haja essa consciência de que tão importante quanto receber uma doação é também abrir espaço para a prestação de serviço. Acho que é a principal dificuldade” (Sujeito 1).

Nesse trecho, com a descrição das dificuldades, percebe-se também o posicionamento desse sujeito acerca do que vem a ser a Prestação de Serviços, uma vez que ele elenca as atribuições do cumpridor perante a instituição. Percebe-se que o trabalho do psicólogo junto a esta modalidade de Pena Alternativa não abarca apenas o cumpridor, mas está atrelado também aos contatos frequentes com as instituições e com a captação de novas parcerias.

Interessante foi o fato de apenas um entrevistado relatar não haver dificuldades em relação à formação da rede parceira. O mesmo pontuou que, ao contrário do que acontece em outras Ceapas, a rede social formada é extensa.

“Aqui a gente não tem muita dificuldade com relação à PSC porque a gente tem uma rede muito forte. Acho que a maior dificuldade mesmo é porque nós só temos aqui o carro uma vez por semana, que é do Judiciário. O que

é importante: as Penas Alternativas elas não são difíceis de serem cumpridas, mas você precisa tá diretamente junto á rede social. Então, o monitoramento na rede social, se ele não for bem feito, isso dificulta e muito a aplicação das penas. Nós temos muito cumpridores na área rural, que é outra característica de Belas Vistas5, a gente tem uma área rural muito grande e fazer o monitoramento por telefone não é a mesma coisa de tá indo lá, porque a gente recebe, quando nós vamos visitar tanto a entidade quanto o cumpridor na entidade, ele tem uma credibilidade muito maior. “Elas visitam mesmo né... elas vêm aqui”. Então isso é uma coisa muito importante. Então a falta de monitoramento eu acho que a coisa que pode dificultar mais, mas a gente tem um nível baixo de descumprimento, mesmo quando tem, a gente tem uma relação muito boa com as varas, especialmente com a segunda vara criminal e, por exemplo, a gente manda e quinze dias depois a pessoa está em descumprimento mas quinze dias depois a pessoa já tá voltando a cumprir. Então isso é uma coisa importante, mas eu acho que a maior dificuldade é o monitoramento da rede social que você precisa não só para a entidade se sentir segura, mas para o cumpridor também sentir que você tá indo, que você visita, que você vai ver se realmente ele tá cumprindo. Porque você ver muitos casos né... já teve até casos do cumpridor querer que a mulher faça por ele. Então, é você entender que existe o monitoramento que não é um faz-de-conta, é realmente uma coisa efetiva” (Sujeito 9).

A maior dificuldade apontada nesse caso foi a frequência do carro para realizar o monitoramento. O entrevistado deixa explícita a importância desse acompanhamento técnico para que se possa ter o efetivo cumprimento da pena. Merece destaque o trecho que aponta a necessidade de “fiscalização” do cumpridor “mas para o cumpridor também sentir que você tá indo, que você visita, que você vai ver se realmente ele tá cumprindo”. Nessa fala fica clara, conforme aponta Flores (2010), “a matriz jurídica e a função policialesca” (p. 96) do profissional de Psicologia que atua no monitoramento da PSC.

Enquanto respostas devem ser dadas ao Estado, o psicólogo pode ocupar o lugar de quem detém a verdade e a fiscalização sobre o sujeito, colocando em jogo o dispositivo saber/poder que pode permear a atuação do psicólogo em searas jurídicas. Não cabe neste trabalho um aprofundamento maior acerca dessa problemática, mas falas como a supracitada instigam a reflexão sobre os efeitos do saber psicológico e como o seu uso está sendo utilizado no campo jurídico.

Em contrapartida, outro entrevistado apontou a dificuldade de formação de redes sociais parceiras como barreira ao seu trabalho.

5

“A gente muitas vezes se depara com uma dificuldade e que de certa maneira vem trabalhando pra ver se diminui essa dificuldade que é com a formação de rede de parceiros. Porque hoje a gente tem uma rede enorme na região metropolitana, uma rede grande, muito grande. Só na cidade do Recife eu acho que poucos locais não têm parceiros nossos, entidades que recebem cumpridores. Sendo que, eu acredito que por uma cultura, que aí eu não sei como explicar de onde vem essa cultura, de que o recebimento de uma prestação pecuniária, de uma doação, seja mais importante, mais aceito, vamos dizer assim, do que a PSC. Um exemplo bem prático, algumas entidades a gente liga pra dizer “olhe, tem um cumpridor que a gente está encaminhando para fazer doações no valor de X, durante tantos meses” e aí a entidade “não, ok, tudo bem, mande, a gente precisa disso, aquilo e aquilo”. E quando a gente liga pra essas mesmas entidades pra dizer “olhe tem uma pessoa pra prestar serviço durante tanto tempo, tantas horas mensais” a gente percebe que a reação de quem tá recebendo essa ligação é diferente. Muitas vezes há um bloqueio mesmo e dizem “não, a gente não tem vaga, a gente não pode receber, se fosse uma doação a gente teria como receber, mas prestação de serviço a gente não tem”. E eu acho que a função dessa parceria, ela tem que se dar para as duas coisas. Se você recebe uma doação, porque não receber uma prestação de serviço? Você vai estar tendo uma pessoa que vai estar prestando um serviço gratuito na sua entidade, vai estar colaborando de alguma forma para o funcionamento do local, para o atendimento daquelas pessoas que você tem ali, e por que não receber? A gente tenta muito trabalhar isso com eles, faz reuniões semestrais com o pessoal dessa rede de parceiros e é uma tecla que a gente bate muito em cima dela, para que haja essa consciência de que tão importante quanto receber uma doação é também abrir espaço para a prestação de serviço. Acho que é a principal dificuldade” (Sujeito1).

O entrevistado também apontou a preferência por parte de algumas instituições em receber recursos materiais em detrimento de mão-de-obra. No entanto, em relação à PSC, faz-se necessária a cooperação não só para receber cumpridores, mas, essencialmente, promover o apoio e acompanhamento da pena/medida alternativa e a promoção da pessoa envolvida no litígio, como ente social voltado para o exercício de seus direitos e deveres.

Resende (2009) afirma que em depoimentos de instituições parceiras e também de pessoas que já passaram pela sistemática de responsabilização penal versus promoção da pessoa sempre se destaca a necessidade de um pacto de confiança e integração entre Sistema de Justiça, Sociedade e Cumpridores na sistemática de aplicação das alternativas penais a não privação de liberdade como forma de promover a cidadania.