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Para Vidal (2003), a análise global

se traduz por um primeiro levantamento da empresa e tem a finalidade de indicar situações em que caiba instruir uma demanda ergonômica. [...] nesta etapa do trabalho, o praticante de ergonomia buscará ampliar suas informações sobre os principais processos e produtos, sobre a população de trabalhadores, sobre elementos da organização do trabalho, além de conhecer e engajar pessoas nos relacionamentos focados ou de suporte [...].

Dessa forma, a análise global foi realizada com o intuito de se conhecer o contexto geral da atividade das rendeiras. Iniciou-se com o estudo dos trabalhos dos alunos da graduação em Engenharia de Produção da UFRN realizados junto às rendeiras do Núcleo em 2005 e 2006 (DINIZ et al, 2005; SILVA et al, 2006) que descreveu, de modo global, a atividade das artesãs e a organização do trabalho adotada.

Posteriormente, foi complementada por visitações ao Núcleo, onde foram observadas as condições físicas do lugar, as pessoas envolvidas, o modo de trabalho, os procedimentos do rendar, os desenhos da renda, algumas informações relativas à sua comercialização, além de questões culturais e sociais que estão no entorno dessa produção. Na análise global, foram utilizados métodos observacionais (observações abertas e registros fotográficos) e interacionais (ações conversacionais e verbalizações), além de pesquisa documental.

3.1.2 Estudo da população

Segundo Vidal (2003), a população de trabalho “refere-se ao conjunto de agentes humanos envolvidos no processo de produção no qual se realiza a Análise Ergonômica do Trabalho.” Ainda de acordo com o autor, “[...] a análise da população de trabalhadores causa um grande impacto na ação ergonômica e deve ser utilizada meticulosamente como passo metodológico de compreensão das pessoas [...]”.

O estudo da população ocorreu, principalmente, através de ações-conversacionais, um tipo de conversa dirigida em que o pesquisador extrai informações relevantes dos trabalhadores sem a utilização de perguntas prontas que gerem respostas curtas e objetivas, tampouco sem induzir ou sugestionar respostas, sendo diferenciada de uma entrevista. Para Vidal e Nunes (2004), trata-se de uma atividade interacional de escuta respeitosa que traz grandes contibuições nas descobertas das variablidades organizacionais, vez que o pesquisador se “deixa levar” pela conversa, no sentido de descrobrir e permitir que algo novo apareça na interação. Ainda segundo os autores, é realizada mediante um roteiro de conversa com as principais dúvidas e questões da equipe, configurando-se como um instrumento utilizado para entabular uma "conversa com finalidade" que permita ampliar e aprofundar a comunicação.

As ações conversacionais abordaram aspectos da vida da rendeira, do processo de produção da renda, da história dessa atividade artesanal na Vila de Ponta Negra, entre outras informações que também foram utilizadas na análise da atividade. (roteiro no anexo I).

A população em estudo compreendeu 12 (doze) rendeiras, integrantes do Núcleo de Produção, sendo quatro (4) que rendam diariamente no lugar e oito (8) que produzem em

suas residências e enviam o produto final para comercialização através do Núcleo. As ações conversacionais foram realizadas nas residências das artesãs ou no Núcleo de Produção (figuras 3-11 e 3-12), iniciando-se em setembro de 2006 e finalizando-se em março de 2007.

Integraram a equipe de pesquisa nessa etapa três alunos de mestrado e uma aluna da graduação (bolsista de iniciação científica), trabalhando em duplas, sendo que um dos integrantes se responsabilizava pela indução da conversa e o outro pelas anotações. A média de tempo de cada ação foi de 50 minutos, e utilizava-se gravação de voz com aparelho próprio para esse fim, além de anotações diversas.

Após a realização das ações conversacionais, foram realizadas as transcrições das falas. Nessa atividade, os pesquisadores escutavam a gravação pausadamente e geravam um documento individual por rendeiras que continha todas as alocuções das artesãs de forma integral. As tabulações dos dados foram realizadas através de Matrizes de Inclusão de Comentários (VIDAL, 2003).

3.1.3 Análise da atividade das Rendeiras

A análise da atividade compreendeu a etapa de investigação e compreensão das especificidades da produção da renda de bilro no Núcleo de Produção. Para isso, foi estabelecida uma rotina de visitação semanal ao Núcleo, iniciada após a oficina e que prosseguiu durante praticamente toda a pesquisa, possibilitando o acompanhamento contínuo do trabalho das artesãs.

Nessas visitas, os pesquisadores realizavam observações livres, conversas informais e direcionadas, registrando questões relevantes que possibilitassem a compreensão da atividade das rendeiras do Núcleo de Produção, destacando-se os seguintes aspectos:

a) organização do trabalho: hora de início e término da atividade, pausas para lanche e para descanso, cooperação, lideranças, etc.;

b) espaço físico: iluminação, ventilação, temperatura, estrutura, mobiliários, etc.;

c) ferramentas: almofada, cavalete, bilros, desenhos, tipos de alfinetes, tipos de linha, etc.;

d) produção: escolha do desenho, escolha do produto, início do rendar, feitio dos pontos, término da atividade, montagem das peças, produtos, etc.;

e) questões culturais e sociais que estão no entorno da atividade.

Posteriormente, eram produzidos relatórios de visita que eram compartilhados entre os membros da equipe. Nesse período, também foram realizadas as ações conversacionais que deram suporte ao estudo da população e observações, conforme descrito no item 3.1.2.

No entanto, as observações e interações tornaram-se insuficientes para o entendimento das relações existentes entre o projeto (desenho da renda e do produto) e a produção da renda. Apesar dessa limitação, o aprendizado do ofício, mesmo que em nível muito básico, associado aos métodos interacionais (ações conversacionais e verbalizações) e observacionais, inseridos em um processo de construção social, possibilitou a compreensão da atividade, em especial, das repercussões do projeto do produto ou do volume de produção em termos de demandas físicas, cognitivas e psíquicas e suas conseqüências para as artesãs. A imersão na situação de trabalho e a construção social possibilitaram, ainda, a compreensão das variabilidades humanas, técnicas e organizacionais, bem como as regulações e estratégias utilizadas para enfrentar tais variabilidades, com destaque para a cooperação.