• Nenhum resultado encontrado

Os Empreendimentos Econômicos Solidários de Autogestão – EES –, de acordo com Pontes e Ostern (2004, p. 11-13), têm características distintas, dentre as quais se destacam:

- a solidariedade e a capacidade de resistência das organizações populares; - idoneidade, transparência, práticas e princípios democráticos;

- a relação direta entre produtores e consumidores, conferindo uma face humana às relações de intercâmbio;

- sistemas de troca e colaboração (redes) e o seu potencial de crescimento e desenvolvimento qualitativo;

- desenvolvimento local respeitando a diversidade de fatores (humanos, ambientais, culturais e tecnológicos) regionais integrados em sua realização;

- o incremento da renda dos trabalhadores através de atividades solidárias de produção, comercialização e serviço;

- o respeito ao saber acumulado em suas vidas pelo conjunto dos trabalhadores e consumidores, particularmente na construção da socioeconomia solidária;

- a partilha dos saberes visando o apoderamento coletivo.

Algumas dessas características são encontradas no Núcleo de Produção Artesanal Rendeiras da Vila, local de estudo desta pesquisa, destacando-se: a) a solidariedade e a capacidade de resistência das artesãs às mudanças culturais, urbanas e históricas, b) a relação direta entre as rendeiras e os consumidores, conferindo uma face humana às relações, e c) o respeito ao saber acumulado em suas vidas.

Assim como todo empreendimento dessa natureza, o desenvolvimento sustentável torna-se uma busca constante para aqueles que o compõem. Figueiredo (2002) esboça uma crítica ao uso demasiado e controverso do termo “desenvolvimento sustentável”, ressaltando que este não traz em seu bojo elementos que contribuam para a evolução social, devendo ser discutido um conceito mais amplo, sólido e com impactos reais nas comunidades humanas. Para fins desta pesquisa, não iremos nos deter nas nuanças polêmicas do termo, mas, sim, na compreensão desse tema voltado para o entendimento da Economia Solidária e dos Empreendimentos Econômicos Solidários de Autogestão (EES).

Segundo Singer (2002), a economia solidária nasceu pouco depois do capitalismo industrial, como reação ao espantoso empobrecimento dos artesãos provocado pela difusão das máquinas e da organização fabril da produção. O mesmo autor ainda menciona que a economia solidária é um modo de produção cujos princípios básicos são a propriedade coletiva ou associada do capital e o direito à liberdade individual, tendo como resultado natural a solidariedade e a igualdade econômica.

Singer (2004, p. 1) esclarece que

[...] a economia solidária trata-se de um processo de fomento de novas forças produtivas e de instauração de novas relações de produção, de modo a promover um processo sustentável de crescimento econômico, que preserve a natureza e redistribua os frutos do crescimento a favor dos que se encontram marginalizados da produção social e da fruição dos resultados da mesma.

França Filho et al (2006) reforçam essa assertiva, explicando que

A economia popular ou solidária diz respeito a um conjunto de atividades de produção, comercialização ou prestação de serviços efetuadas coletivamente (e sob diferentes modalidades de trabalho associado) pelos grupos populares, principalmente no interior de bairros pobres e marginais das grandes cidades. Tais grupos se estruturam, em geral, de modo bastante informal e encontram nas relações de reciprocidade tecidas no cotidiano de suas formas de vida (ou seja, nos laços comunitários) os fundamentos para tais práticas.

Complementando essa idéia, os autores ressaltam que a economia solidária possui qualidades ou características próprias que necessitam ser compreendidas:

Tais qualidades compreendem um conjunto de aspectos que encontram-se absolutamente indissociáveis uns dos outros. Um primeiro desses aspectos concerne à questão da participação ou engajamento das pessoas nos projetos, o que remete ao grau de mobilização popular inerente a tais projetos. Uma segunda qualidade diz respeito ao modo de organização do trabalho, que se encontra essencialmente baseado na solidariedade (FRANÇA FILHO et al, op. cit.).

Segundo Singer (2002), o principal instrumento da chamada economia solidária tem sido a empresa cooperativa, que consiste em um agrupamento de indivíduos para exercer uma atividade econômica de forma autogestionária.

As cooperativas eram tentativas por parte de trabalhadores de recuperar trabalho e autonomia econômica, aproveitando as novas forças produtivas. Sua estruturação obedecia aos valores básicos do movimento operário de igualdade e democracia, sintetizados na ideologia do socialismo. A primeira grande vaga do cooperativismo de produção foi contemporânea, na Grã Bretanha, da expansão dos sindicatos e da luta pelo sufrágio universal. (SINGER, op. cit.)

Ainda conforme o autor, a empresa solidária nega a separação entre trabalho e posse dos meios de produção, que é reconhecidamente a base do capitalismo. O capital da empresa solidária é possuído pelos que nela trabalham e apenas por eles; por isso, sua finalidade básica não é maximizar lucro mas a quantidade e a qualidade do trabalho.

Pontes e Ostern (2004, p. 04) discorrem sobre os EES, mencionando que estes precisam ter instrumentos que permitam a sua sustentabilidade e competitividade no mercado, assegurando assim a inclusão social e econômica de enorme parcela da sociedade, que atualmente encontra-se sem perspectivas de inclusão no mercado de trabalho e de desfrutar dos benefícios resultantes do processo produtivo.

A sustentabilidade de empreendimentos econômicos solidários depende de vários fatores, dentre eles o tipo de produção e as características das pessoas envolvidas, uma vez que não se pode entender sustentabilidade como uma metodologia que se aplica a determinado setor, esperando-se o resultado; ao contrário, deve ser fruto de um compromisso sério com a produção e com o tempo, e os intervenientes externos apenas somam forças a uma aptidão que já deve existir naturalmente no local (PONTES; OSTERN, op. cit.).

Compreender as definições e peculiaridades dos empreendimentos econômicos solidários de autogestão torna-se essencial nesta pesquisa, visto que o Núcleo de Produção Artesanal Rendeiras da Vila absorve muitas características desse modelo de gestão e traz consigo outras particularidades que devem ser conhecidas e consideradas nas análises.

78

)

! *

<

Esta dissertação diz respeito ao primeiro trabalho em nível de mestrado de um total de quatro que estão sendo realizados por pesquisadores que integram o Projeto Rendeiras da Vila, desenvolvido pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Ergonomia – GREPE – do Programa de Engenharia de Produção – PEP/UFRN. Além das dissertações, o Núcleo também é foco de estudos de alunos bolsistas e voluntários da graduação em Engenharia de Produção que desenvolvem atividades de pesquisa e extensão na produção artesanal.

A pesquisa adotou uma abordagem qualitativa e se configurou como um estudo de caso. O tempo total de realização foi de 24 meses (junho de 2006 a junho de 2008), e foi impulsionada e motivada pela realização de uma Oficina de Design (detalhada no capítulo 5) no Núcleo de Produção Artesanal, da qual o autor desta dissertação foi o instrutor.

Durante a pesquisa, foram realizadas consultas em livros, artigos, documentos, catálogos, manuais, bem como buscas de internet em sites, blogs, comunidades, etc., todos com temática voltada para o estudo da Ergonomia, Antropotecnologia, Produção Artesanal e Renda de Bilro. Essas informações foram utilizadas para construção do referencial teórico e análise dos dados.

Para caracterizar a atividade da renda, compreender a organização do trabalho, investigar os resultados da oficina e identificar os fatores que influenciaram a não incorporação das propostas dos novos produtos na rotina das rendeiras, adotamos como método a Análise Ergonômica do Trabalho – AET. Apresentamos a seguir as etapas da AET que foram realizadas na pesquisa:

3.1. Análise Ergonômica do Trabalho (AET)